Eu sou o futuro

De: Liv

Para: Fernanda

Então, eu não vou começar isso com uma saudação gentil, pois você não tem sido nada gentil comigo.

É isso mesmo.

Achei que fosse só um desanimo temporário, que logo você sacudiria a poeira da caneta e voltasse a pegar o caderno que sempre fica embaixo da cama, mas adivinha só? Ele está criando poeira também!

Não vou falar que estou irritada ou coisa parecida, porque parece que nós duas nem nos conhecemos mais. Quando foi a última vez que você imaginou um dragão ao ver um avião pousando, ou pensou em qualquer criatura mitológica invadindo a sala de aula e coreografou uma possível ação de cada um?

Parece que escrita não é para adultos, e é o que você está se tornando agora: uma adulta chata e entediante ― não sinto-me nem um pouco arrependida de te chamar assim, na realidade se quer mesmo isso, passe a pensar nos futuros boletos que vai ter que pagar e me esqueça de vez.

Ainda me lembro da criança que você costumava ser, sério, ela era muito mais legal. Vivia metade o dia segurando livros (até parou na diretoria por isso) e o caderno de matérias era só um disfarce para a verdadeira coisa que te captava atenção, ― meu amigo próximo e falecido caderno vermelho. E você prometeu que crescer não mudaria a sua imaginação.

Oras, que grande mentira. Se pudéssemos sentar frente a frente, eu jogaria uma pilha de canetas na sua cara até você resolver escrever novamente. Veríamos com quantas promessas falsas se faz um escritor.

Quer dizer, você ainda é uma escritora? Ao invés de me dar novas idéias, você tem me dado veneno. No antigo quarto da sua criatividade ― onde ainda resido ― costumava ser servida com espadas, castelos e piadas sarcásticas de velhos medievais. Agora a única coisa da qual me alimento é do passado.

Você me deixou no passado.

O único problema é que você não consegue me esquecer, não é mesmo? No entanto, Fernanda, eu sou o futuro. Eu, não essa adulta chata que você está criando. Se alimentar essa daí, em alguns anos talvez esteja arrependida assistindo televisão e se perguntando o que aconteceria se tivesse me ouvido.

Por que eu sou menos importante do que algo que te forçam a ser?

Continuo vivendo, não tão pacificamente, nas suas cidades fictícias e lidando com os problemas delas.

Não com essa sua falta de coragem, pelo amor de Deus se livre sozinha disso.

Então, quando decidir voltar presentearei como dádiva o meu nome novamente, pois eu sou tudo o que você quer ser.

Tudo o que você vai ser. 

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