Parte I - Capítulo I
───※ ·1· ※───
O vento estava suave. A neve já havia cessado de cair do céu naquele dia. Depois de longos sete dias após o marco do início da primavera, ainda nevava no dia anterior, mas todos sabiam que uma hora ela iria ir embora junto com a sua calmaria solitária.
Um homem olhava o tempo de dentro de sua casa, contemplando com um olhar vagante pelos campos verdes escurecidos pela noite.
- Finalmente, ela se foi. - disse o homem, balançando a cabeça ainda olhando para o campo. Ele ouve passos vindos de trás dele e torna para rumo do ruído.
- Pai, já preparei seu chá. - disse uma moça dando um sorriso ao homem, carregando uma bandeja de madeira com um bule e duas xícaras por cima. Seus cabelos eram negros e longos. Seu rosto era claro e refletia um ar de felicidade e calma.
- Obrigado, filha. Nada melhor do que um chá nesse tempo frio. Creio que o amanhã trará um calor aprazível. - disse o homem retribuindo o sorriso reciprocamente. Ele observa que, nos cabelos de sua filha, em uma das mechas do lado esquerdo, estava ficando com um tom de branco. Ao tirar sua conclusão, segura a bandeja, colocando cuidadosamente em uma pequena mesa madeirada próxima deles. Em seguida, seus dedos tocam os cabelos da moça, examinando-os franzindo os olhos. - Estrith... Seu cabelo...
- Sim, está ficando branco novamente. Essa tinta do boticário não demora muito mesmo. Ele devia aperfeiçoar sua composição. - disse a moça, olhando para o pai. Ela coloca todo o seu cabelo sob o ombro direito verificando se as pontas não estavam de igual modo. Repentinamente, ela dá um suspiro forte. - Minha nossa, amanhã é o dia da Helena!
- Sim. E você não vai. - disse o pai dando um sorriso sarcástico. O mesmo puxa uma cadeira e senta-se em seguida. Sua filha faz a mesma coisa, olhando para seu pai, surpresa. Seus olhos ficaram fixos no homem que bebia seu chá, olhando pela janela como se nada estivesse acontecendo. - Amanhã vou comprar mais tinta. Lembre-se de colocar um turbante no cabelo. Pode ser que algum estranho apareça por essas bandas. Principalmente comerciantes.
- Pai, mas é o melhor dia da vida da minha amiga! Não posso desapontá-la negando o convite que ela me fez a quinze dias atrás! - Estrith inclina seu corpo olhando para seu pai, que aparentava estar despreocupado. Ele torna para a mesa, colocando sua xícara em um pequeno prato, lentamente. Ele encara sua filha de maneira séria.
- Sabe que amanhã é o festival da primavera!? Tem muitos guardas escoltando o rei e monitorando as estradas. Seria uma missão suicida. - disse o homem, calma e docemente. Ele se preocupava demais com sua filha. Sabia que era o único tesouro que tinha e que preferia perder sua vida, do que por Estrith em perigo. - Você não vai e pronto. O que sua mãe diria se...
- A mamãe nos abandonou. Me abandonou, abandonou o senhor. Nem se importou em olhar para trás. - disse Estrith. Seu semblante pareceu um pouco triste. Ela olhava para sua xícara, que aparentava estar fria. "Não fui uma filha boa o suficiente para convencer a minha mãe de ficar...". O chá fazia ondas com os toques pensativos do seu pai com o dedo sobre a mesa.
- Olha, filha... - disse o homem, suspirando lentamente parando de bater o dedo indicador direito sob a mesa. - Sua mãe deve ter tido seus motivos. Não se culpe por uma escolha dela.
- Tudo bem. Mas por favor, não fale mais nela. Eu compreendo sua preocupação. - a moça se levanta da cadeira, andando em direção ao seu quarto.
- Não vai terminar o seu chá? - disse seu pai olhando para trás (a porta que leva ao corredor dos quartos ficava atrás dele). Estrith para no portal, olhando para seu pai com um sorriso.
- Eu só estou cansada. A propósito, o chá deve estar frio. Boa noite. - a jovem segue para seu quarto, levando seus pensamentos consigo.
───※ ·2· ※───
A realidade é o pesadelo de todos os homens, principalmente daquele que estão florescendo. A ilusão da infância, o deslumbre das paixões jovens e as grandes aventuras com os companheiros, iludem o ser humano por um pouco de tempo. Quando o jogo vira e o indivíduo torna-se o espetáculo de um mundo frio e perverso, seu interior fica convicto da verdadeira face do mal. Harold percebia isso.
Quando jovem, amava a filha de um barão que dominava o Vale de Ojan. Ao ver o rapaz pela primeira vez em sua casa, o homem logo o rejeitou, dizendo que ele não era "suficientemente bom" para sua filha. Ela não ligava, pelo menos, não ainda. Vivendo nas asas protetoras do pai e da mãe, que era condessa, a garota vivia coberta de mimos e regalias. Um dia, ela decidiu fugir com seu amado e viver um romance lindo ao lado dele.
Com o amor dos dois, veio um pequeno garotinho. Oliver nasceu e foi aí que os problemas começaram a surgir. O pai de Harold, que sempre dava dinheiro para sustentar ele e sua "esposa" (eles não eram casados), depois que seu neto nasceu, disse que já era hora de cumprirem com as responsabilidades deles. O casal entrou em discussão com o homem e, depois de muita conversa, decidiram sair dali. O pai olhou para o seu filho uma última vez antes do mesmo partir, dizendo que "logo, logo" ele voltaria.
Os mimos e regalias da moça não a ajudaram em nada. Ela não cozinhava, não sabia cuidar do seu próprio filho. Sua paciência estava saturada com o choro do bebê ressoando em sua cabeça como martelo batendo em um prego. "Se eu voltasse para casa teria muito mais trato do que aqui nesse inferno" pensava a moça.
Numa manhã, um vazio, uma carta e um choro ecoando do outro quarto de uma casa velha abandonada no campo. "Adeus". Sozinho e sem ter com quem contar, o jovem volta para a casa do pai com o seu bebê. O homem não relutou em deixar o filho entrar. Sabia que era um sentimento tolo de um jovem rapaz. Mas a realidade da vida só estava a começar o seu pequeno reino de caos.
O jovem aprendeu o ofício do seu pai, que era agricultor. Ele decidiu cumprir com o seu dever paterno, sem pestanejar. O mancebo estava de tornando um homem de verdade. Um certo dia, seu pai escorrega na lama dos porcos e choca a cabeça em uma rocha. Era o começo do fim. A renda da família era pouca para contratar um médico, então o próprio Harold decidiu cuidar do seu próprio pai. A inexperiência do jovem não pode fazer muita coisa. O homem acaba ficando em um estado vegetativo por conta do trauma.
Essa história não parava de remoer a mente do agora senhor Harold, que via sua vida como um poço de culpa e arrependimento. Com um prato coberto de uma sopa caseira, o mesmo alimentava seu pai. Um leve sopro na colher com o alimento líquido e uma colherada para o seu pai. De repente, ouve o barulho de alguém batendo na porta. O pequeno Oliver, que estava na sala vai até a porta. Aos pulinhos, ele tenta alcançar a maçaneta, mas sem sucesso. Logo, o pequeno pega um banquinho do canto da sala e leva até a porta. Subindo nele, o garoto consegue abrir a porta.
- Boa noite, senhor Garen! - disse o pequeno com um sorriso. O homem pega o garoto nos braços de um jeito carinhoso, abraçando-o docemente. Oliver dava gargalhadas.
- Oi, garotão. Onde está o seu pai? - perguntou o homem.
- Está no quarto, dando o jantar para o vovô. - disse o menino. Ele fica meio corado, mexendo em sua camisa com os pequenos dedinhos. - A senhorita Estrith está na sua casa?
- Ela foi dormir. Bem cedo, aliás. - disse o homem, esboçando mais um sorriso. O pequeno Oliver era o doce pupilo da Estrith. Ela gostava do garoto como um irmão mais novo. Um dia, o menino disse para seu pai que amava a Estrith e que "casaria com ela". Harold caiu na gargalhada. O garoto ficou vermelho de raiva e ficou sem falar com o pai por uma hora. Nada que umas cócegas na barriga não resolvessem.
Garen põe o garoto no chão, que em seguida, caminha rumo ao quarto de seu avô. O pequeno vai até seu pai, comunicando-o da chegada do vizinho. Harold ergue os olhos dando um sorriso de canto, desanimador. Garen, observou seu olhar tristonho e o silêncio invadiu aquele ambiente.
- Preciso de um favor seu, amigo. - disse Garen dando um suspiro forte e quebrando o silêncio daquele lugar.
- O que seria? - disse o homem, voltando seus olhos para o pai, dando-o mais um pouco de sopa.
- Peço que você cuide da minha casa amanhã. Vou ir para a capital. Infelizmente era para a Estrith ficar em casa, mas ela quer ir para o festival.
- Jovens... - Harold deu um risada leve balançando a cabeça. - Tudo bem, amigo. Vou fazer isso por você.
- Eu trouxe isso. - Garen mostra para o vizinho um pequeno saco de moedas. - 40 agneels. Sei que não é o suficiente, pago mais quando voltar.
- Meu amigo, isso é muito. Me recuso a aceitar.
- Aceite. Você vai me fazer mais do que um favor. - disse o homem, dando um sorriso.
- Obrigado, meu amigo. - um pequeno sorriso de canto, mais aliviado, sai do semblante de Harold.
───※ ·3· ※───
Perfeição, beleza, gentileza, etcetera, etcetera, etcetera. O padrão de formosura era a base do respeito e temor das mais grotescas paixões. Um moço romântico ficaria trêmulo ao olhar da mais bela das musas. Trazia inveja aos olhares femininos que perdiam seus amores no mar de beleza da ninfa que voa sobre os seus cabelos. Toda postura era calculável, nos mínimos detalhes, sobre a beleza de uma mulher. "Um rosto belo não era o suficiente para arrancar os olhares dos homens" dizia a mãe de Helena para ela todas vezes que seu jeito lhe trazia repulsa.
- Será que isso vai ser o suficiente para agradar o rei? - perguntou a doce Helena para a sua mãe, que penteava os cabelos loiros da moça lentamente observando cada desarrumada mecha.
- Basta manter a confiança em si mesma. Uma moça prendada deve saber transmitir a superioridade de sua pureza nos seus lábios. Não existe um rei que resista aos encantos de uma meiga mulher. - sua mãe era sábia e objetiva. Sempre conseguia o que queria e quando queria. Seu jeito ambicioso fez com que conseguisse um patamar de poder e autoridade maior do que quando era apenas uma plebeia vestida de trapos da vila de Tamyr. Era uma senhora, lady, casada com o lorde da província de Vadária. Queria que sua filha fosse além, manipulasse os reis, ou melhor, o mundo.
- Mas, e se ele não me amar? - perguntou sua filha com um ar de preocupação. Se achava diferente das outras ladies das demais províncias. Ela não era acostumada com o jeito fino e elegante dos palácios, mas dava o melhor para agradar seus pais.
- Amor nem sempre aparece quando você olha nos olhos de um homem. Conquiste ele, seja charmosa. Procure atiçar os pontos fracos dele até fisgá-lo como um peixe. - disse sua mãe. A ideia aparentava ser agradável, mas a intenção era oportunista. Seu sorriso transparecia no espelho do quarto da filha. Era banhado a ouro em suas bordas com uns detalhes vitorianos. Ela ergue levemente a cabeça, olhando para a sua filha. - Lembre-se de manter essa posição. Sorriso suave e misterioso e a cabeça erguida. Mostre ser superior e leve. Uma jóia inalcançável. A propósito, convidou seus amigos?
- Depende do que você considera "amigo", mamãe. - disse a jovem mantendo um ar de timidez.
- Todos aqueles que você conversa exceto aquela mocinha... - a mulher se referia a Estrith. Ela detestava a jovem, pois a considerava bruta e deselegante. "Não tinha ambições nem expectativas visíveis, apenas vivia sem objetivo" pensava ela. Uma vez, as duas, Estrith e Helena, junto com seu melhor amigo, Brendon, brincaram de guerra de lama em um minador que surgiu no meio da terra fora da cidade. Os guardas do lorde escoltaram Helena para casa depois de um tempo, e sua mãe, ao ver sua filha maltrapilha, foi tomada pela ira. "Nunca mais ande com aquela garota!" disse a mulher naquele dia.
- Mamãe, ela é minha melhor amiga! - disse a filha. - Aqueles outros que a senhora me força ter amizade são cheios de frescura e falsidade! Não suporto eles!
- Pelo menos, eles mantém sua postura fina e educada, honrando seus pais. A Estrith, por outro lado, foi abandonada pela sua mãe e foi criada pelo pai. E você sabe o que é uma filha cuidada pelo seu próprio pai!? Sem a delicadeza materna ela é apenas uma megera! - sua mãe se levanta olhando para a filha com um ar de indiferença. - Por causa da influência dela, está sendo difícil criar você para ser uma moça educada. Olha seu estado! Comece a aumentar o tom e vai ser desprezada pelo Erick. É isso que você quer!?
- N-não... Eu gosto dele. - disse Helena. Desde pequena, a jovem tinha uma paixão pelo rei Erick. Eles se encontram pela primeira vez no festival de outono na província de Hagasashima. Os dois estavam em lados opostos do lago cristalino Kumi. Seus olhos se encontram e ficaram vidrados um no outro. Não demorou muito para que seus pais aparecessem.
- Sei que você convidou ela. Para ter defendido ela assim, só podia ter feito. - sua mãe cruza os braços e olha para a serviçal de sua filha, andando rumo a ela. - Basta para mim! Celine, cuide do cabelo dela. Preciso de um pouco de ar.
A mulher saiu decepcionada. "Se depender dela, o príncipe morrerá em desgosto!" pensou consigo indo para o corredor.
───※ ·4· ※───
Barulhos de cavalos e galinhas saiam do lado de fora da casa de Estrith. Eram três horas da manhã quando seu pai preparava toda a carroça com frutas e algumas poucas espadas e lanças feitas para encomenda aos clientes da capital. A garota de dezesseis anos acorda ao cacarejar do Win, seu galo de estimação que estava em pé na janela, levantando a cabeça preparando-se para mais um berro galináceo.
- Já entendi... já entendi... hora de acordar... - Os cabelos longos da jovem estavam bagunçados, seus olhos queriam fechar, pois a preguiça não queria que eles começassem a trabalhar. Porém, o vigor da jovem falava mais alto e não queria deixar o seu pai sozinho no seu labor.
Garen era da idade de quarenta anos, seus cabelos eram castanho-escuros com poucas mechas grisalhas e sua aparência mentia quanto o seu vigor, que era semelhante ao de uma criança. O homem se aproximava da porta de sua residência, quando, de repente sua filha abre a mesma e dá um abraço forte em seu pai.
- Bom dia, pai! - Disse a garota, preparada para mais um dia de trabalho.
- Bom dia. Já alimentou o Win? - Garen entra na casa como se quisesse procurar alguma coisa. A jovem o acompanha.
- Sim. Se eu não fizesse isso, ele correria atrás de mim, como quando eu passei o dia fora e ele não comeu nada que o senhor lhe deu, mas quando eu cheguei, ele saiu do quarto e correu atrás de mim. - Estrith deu uma leve risada. O seu pai riu um pouco enquanto pegava um balde de maçãs.
- Seria melhor ter um cachorro. - Disse o homem olhando para o galo, que o encarava.
- Pai! Ele está logo ali! - A garota riu mais um pouco. Seu pai lhe deu o balde e ela foi em direção a carroça. - Tun, Serena, comida pra vocês!
Os cavalos mantinham-se imóveis olhando Estrith chegar com as maçãs. Ao sentir o cheiro da fruta, os dois equinos começam a relinchar, balançando suas cabeças. Ela dava uma maçã para cada um com as duas mãos. Eles não tinham muitos conflitos, pois Tun era filho de Serena.
Ouve-se um barulho vindo da porteira que ficava em um pequeno muro que limitava o terreno. Harold chegava junto aos dois. Estrith olhava para ele se aproximando e seu pai indo em direção a eles.
- A maioria das coisas estão feitas. Peço só que cuide da casa, para que ninguém venha invadi-la. - disse Garen, tocando nos ombros do amigo.
- Com certeza cuidarei de tudo. - Harold da um sorriso mais contente. Estrith ficou confusa. Ela ficaria em casa e ainda teria alguém de babá para vigiá-la. "Papai deve estar brincando. Eu sei me cuidar" pensou ela. O homem sobe na carroça e olha para ela.
- Você vem, filha? - Garen dá um sorriso leve. Os olhos da jovem brilham. Vários "obrigados" saiam dos lábios da moça que pulava de alegria. - Não está esquecendo nada?
A jovem pensa um pouco e, rapidamente, sendo movida pela lógica, volta correndo para casa pegando um pano vermelho escarlate para usá-lo como turbante. Ela retorna ao seu pai no mesmo ritmo, entretanto, ela retorna para trás e coloca Win nos braços.
- Estou pronta! - A garota sobe na carroça. Seu pai dá um sorriso balançando a cabeça. Ela olha para trás enquanto a carroça começa a se movimentar com a força dos cavalos. Ela dá um sorriso para Harold. - Diga para o Oliver que eu vou trazer um presente para ele!
- Eu direi! Não se preocupe! - disse o homem olhando os dois indo em direção a capital.
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