Capítulo 34

John

O cansaço enraizado em meu corpo impede que eu reaja ao empurrão que um dos lupinos desfere em minhas costas. Enfraquecido, posso apenas tentar absorver da melhor forma possível o impacto dos meus joelhos contra o solo seco.

Desde que nos encontraram, gentileza não pode ser considerada uma característica do tratamento dos lobos em relação a estrangeiros em seu território. Em todo o trajeto até ali, julgando que ali seja a aldeia, levando em conta minha perda da capacidade de predizer a passagem das horas e dos dias, nos forneceram somente água. Além disso, poucos momentos de descanso foram permitidos.

O estado em que nos encontramos é deplorável. Suzi desmaiou diversas vezes ao longo do caminho e minha mãe não consegue mais ficar em pé.

Morgana é a única que parece estar mantendo a lucidez e que tentou conduzir algum diálogo com nossos carcereiros, intercedendo por intervalos de repouso. Pela aparência dos mesmos, creio que se trata de jovens tentando provar sua força e utilidade. Nosso grupo foi um achado perfeito para seus objetivos.

Um bando de dez lupinos nos capturou naquela clareira. Assim que os viu, Morgana ordenou que não atacássemos. Félix e eu não tivemos chance de protestar porque fomos os primeiros a ser imobilizados. Os demais, aceitaram a corda para atar seus braços, substituta das algemas tradicionais, e passamos a ser arrastados em meio à mata fechada.

Uma multidão cada vez maior se reuni ao nosso redor, provavelmente atraída pela cena inusitada que protagonizamos. As pessoas nos encaram com expressões de desgosto e apontam em nossa direção disparando xingamentos impróprios, enquanto as crianças são mantidas longe.

Olhando para meus companheiros, vejo Suzi desacorda e jogada no chão, fato que me enfurece. Utilizando a pouca força restante em meu corpo, tento chegar até ela, porém, é um esforço inútil. Tal atitude serve somente para a intensificação do aperto em meus pulsos, gerando mais dor.

Minha consciência começa a oscilar por conta da fome corroendo minhas entranhas, levando-me a cerrar os olhos. Sussurro por água, entretanto, os brados de indignação me silenciam. Chegando ao limite, acredito que a morte esteja próxima.

Um intenso sentimento de frustração me consome. Não atingi meus propósitos desde que abandonei o castelo em Aurora Negra. Nem mesmo tive a chance de me desculpar com Scarlett, desfazer todas as intrigas que meu pai construiu para nos separar.

De repente, despertando-me dos meus devaneios e me impulsionando a mais um sopro de vida, sou envolvido em um abraço. A pessoa convulsiona em um choro profundo, deixando-me confuso.

-John. -Escuto uma voz familiar sussurrar.

Cecília. Seu nome surge tão rápido em minha mente que uma tontura me atinge. Não consigo acreditar que minha irmã está ali, tão perto. Se ela não estivesse me tocando, presumiria que se trata de um delírio.

Em todos os períodos de inatividade na floresta até a vila lupina, diferentes sonhos me envolveram em um sono inquieto. Cecília apareceu em praticamente todos, assim como Scarlett. Desde que encontramos os lupinos, supus que essas imagens seriam minhas últimas memórias.

Forçando meus olhos a se abrirem outra vez, enxergo o cabelo preto comprido de Cecília caindo por suas costas. Seu rosto está encaixado em meu pescoço, o que dificulta sua visualização. O alívio em vê-la viva me ajuda a respirar novamente.

Quando ergo minha cabeça, deparo-me com o objeto de todas as minhas fantasias a alguns metros de distância com uma expressão de incredulidade: Scarlett. Sua boca está aberta em um perfeito "O" ao me encarar com seus olhos dourados. Ela aparece não crer no que enxerga, assim como eu.

Meu coração acelera ao mirá-la e preciso me concentrar para continuar consciente. Se essa for a única chance que terei de chegar perto dela, não a desperdiçarei desmaiando.

-AFASTE-SE, GAROTA! -Um dos lupinos grita para Cecília, que se retrai em nosso meio abraço.

Impotente, assisto enquanto o homem se aproxima para afastar minha irmã de mim. Por mais que eu me esforço, não posso fazer nada para impedi-lo.

Os acontecimentos que se seguem são tão rápidos que quase não consigo acompanhar: o lupino estende sua mão em direção à Cecília ao mesmo tempo em que Scarlett se movimento em uma velocidade sobre-humana e se coloca entre os dois, segurando o pulso dele. Seu semblante está carregado de determinação e seus olhos impregnados de uma intensidade que nunca vi.

-Se colocar suas mãos nela, quebrarei seu braço. -Scarlett ameaça, sua voz transbordando de fúria. 

Olá :)

Mais um capítulo! Gostaram? 

Ficou curtinho, mas traz um pouco do que aconteceu com John e seus sentimentos. Espero que gostem!

Boa semana a todos!

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top