Após entrarem pela porta da Heaven Hills High School, os olhos das três meninas foram logo de encontro aos três amigos que estavam conversando. Harry parecia animado — como sempre — e gesticulava com as mãos enquanto alternava o olhar entre os dois jogadores de futebol americano encostados nos armários brancos de metal. Um era Thomas Ramírez, que sorria para o amigo enquanto segurava a alça de sua mochila, e o outro era Andrew Reincke, que apenas observava o outro falar de braços cruzados e com o semblante nulo. Ambos usavam as jaquetas do time cujas possuíam as mangas longas cor de vinho e o resto azul violeta, com exceção do grande "W.H" bordado no peito — que era da cor das mangas — e do desenho de um grande lobo cinza bordado nas costas. Este era bravo, rosnava, e apresentava abaixo uma faixa em um tom mais escuro de cinza que bordava em letras brancas a palavra "Wolves de HHHS".  Algumas partes das paredes daquele colégio também apresentavam bandeiras e cartazes com esse mesmo desenho de lobo. Era o mascote e o símbolo oficial do time pertencente à Heaven Hills High School.

  As garotas se aproximaram dos garotos e Becker as recebeu com um longo sorriso, fixando seus olhos em Kate.

 — E aí está a garota mais foda do colégio de Heaven Hills! — ele apontou para ela com uma mão fazendo-a rir e levar a mão ao peito, abaixando o tronco em uma leve reverência antes de levantá-lo de novo.

 — Obrigada, muito obrigada.

 — Hey, garotas. Como vão? — indagou Thomas em um sorriso.

 — Bem — respondeu a de pele escura. Claire assentiu com a cabeça ao descer os cantos dos lábios e Heather disse:

 — É, bem... Eu acho. E vocês? — os garotos assentiram. — Andrew, seu irmão veio?

 — Ele disse que iria ao banheiro — afirmou o rapaz machucado de braços cruzados e com as costas encostadas no armário atrás de si.

 — Falando no diabo... — Kate falou ao olhar por cima do ombro de Harry, um garoto trajando uma camiseta branca com listras pretas acompanhada de uma calça-cáqui bege. Ele se aproximava, mas não de forma calma, estava correndo, parecia assustado e sua mochila vermelha balançava a cada passo ligeiro que dava.

  Os outros cinco olharam naquela direção e o garoto segurou nos ombros de Becker por trás e se virou, puxando-o junto consigo. Logo em seguida, deu dois passos para trás, encostando-se no armário e se abaixou um pouco sem soltar o de cabelos ondulados que, totalmente confuso tal como seus amigos, o olhou por cima do ombro e franziu o cenho.

 — Cara, o que é isso? — e riu anasalado. — Você está bem?

 — Ele quer me matar! — declarou quase em um sussurro.

 — Quem? — Heather e Andrew disseram em uníssono, no mesmo momento em que um garoto de cabelos negros e arrepiados entrou no campo de visão dos sete adolescentes quando virou à curva do corredor marchando em passos firmes e com os punhos cerrados em direção a eles. Este era Adam Husky, irmão de Bernarde e Rachel. Ele estava no terceiro ano, embora fosse mais novo que o irmão que repetira três vezes: uma por ter estourado o limite de faltas e duas por não ter tirado boas notas.

  Harry olhou para o garoto alto com a boca entreaberta e logo foi puxado pela sua camiseta da banda "Nirvana", sendo arremessado para trás dele, por muito pouco não indo de encontro ao chão. Victor arregalou os olhos, Heather e Kate exclamaram um "Hey!" e ele agarrou na gola da camiseta do Reincke mais novo, causando um estrondo ao bater as costas do mesmo contra o armário metálico. Andrew tentou se aproximar, mas a garota negra segurou seu pulso.

 — Fique longe da minha irmã, está me ouvindo, seu viadinho?! — cuspiu o Husky irritado. Havia um hematoma roxo em volta de seu olho, certamente havia sido ele que segurara Kate ontem à noite e acabara levando um soco.

 — Acha mesmo que isso é uma ofensa? — retrucou Victor, sentindo-se um pouco sufocado pelo punho imprensado em seu pescoço. As pessoas ali observavam tudo e cochichavam umas com as outras. Por algum motivo estranho, ninguém gritou "briga!" ou disse um "Uuuuh". Isso costumava a acontecer muito naquele colégio quando algum conflito entre dois alunos acontecia.

 — Hey, hey, vamos parar? — Harry indagou ao se aproximar em passos lentos, gesticulando com as mãos abertas, ignorando totalmente o fato de ter sido arremessado e quase ter ido de encontro ao chão. Ele detestava brigas.

 — Melhor ficar esperto, Reincke. Ou vai se arrepender — Adam soltou o garoto e olhou para cada um dos sete adolescentes. — Todos vocês, fiquem longe da minha família. — Apontou para Andrew ao parar os olhos nele. — Principalmente o assassino, o seu irmão viadinho — E em seguida os desviou para Kate, agora apontando o dedo indicador em sua direção. — E a sapatão. — A garota franziu o cenho e ficou boquiaberta, o seguindo com os olhos enquanto ele dava alguns passos para trás, a encarando antes de se virar para o lado direito e caminhar para longe deles.

 — Do que esse merda me chamou?! — ela exclamou. — Eu acho que ele está pedindo por outro soco!

 — Não é uma ofensa, Kate — Victor falou enquanto alisava a região do pescoço que fora pressionada.

  Não era a primeira vez que ela era chamada assim. Alguns costumavam a pensar desse jeito, muitas vezes por conta de seus estilos e gostos, era um pensamento ridículo que a maioria das pessoas tinham embora elas não tenham nada a ver com a sexualidade da garota. De qualquer forma, sem motivo algum, ela se incomodava quando pensavam isso sobre ela. Era apenas o seu jeito de ser, aquilo não definia sua orientação sexual.

 — Tantas garotas, Victor — Andrew disse enquanto gesticulava com a mão. — Tantas garotas para isso ter acontecido e teve de ser logo com ela?! A neta do diretor e a irmã de Bernarde e Adam?!

 — Eu não lembro de como isso aconteceu, okay? Nós estávamos falando de Breaking Bad enquanto bebíamos e de repente puf  — olhou para baixo antes de voltar a encarar o irmão. — Tudo ficou escuro e eu acordei pelado na cama dela.

 — Eu estou tão invejado... — Harry falou com os olhos fixos em Victor. Thomas lhe deu um soquinho no braço ao rir e ele se juntou, alisando o local. — Até o Victor conseguiu uma gostosa e... a propósito — Olhou em direção à jovem de pele morena e grandes cabelos cacheados que usava um vestido básico azul escuro e abraçava um caderno rosa. Ela estava encostada na fileira de armários à frente e conversava com duas outras garotas: uma loira e uma asiática. —, hey, Jackwild! — As três olharam para ele. — A noite de ontem com o novato teve o que falar, né?! — Em resposta, a garota ficou séria e levantou o dedo do meio para ele antes de segurar o pulso da asiática e andar, ambas sendo seguidas pela loira.

 — Péssimo, cara... — Victor proferiu ao olhá-lo e balançar a cabeça negativamente. Heather revirou os olhos.

 — Se não notou, Harry está apaixonado pelo novato — ela disse para o melhor amigo ao dar de ombros e arquear as sobrancelhas. Isso fez com que o de cabelos ondulados gargalhasse e desse um tapinha com as costas da mão no braço do latino que apenas sorria.

 — Ciúmes, Heath? — ele indagou. A loira novamente revirou os olhos e sua irmã Kate olhou para Becker sorrindo e assentindo com a cabeça rapidamente.

 — Em falar nisso, onde ele está? — indagou Thomas.

 — Eu não sei, não falo com ele desde a festa — o som estridente do sinal ecoou pelo corredor, perturbando os ouvidos dos alunos que se encontravam por lá. — Bom... a minha primeira aula é com você... — Disse e apontou para Kate — e com você... — Agora para Thomas. — Então vejo o resto de vocês depois.

***

 — E um... dois... três... quatro... cinco, seis, sete, oito e um... dois... três... quatro... cinco, seis, sete, oito! — Victoria dizia em alto tom enquanto via as outras líderes de torcida seguirem a coreografia que ela mesma tinha criado para a música "Run the world" da cantora Beyoncé. Era um pouco complexa, envolvendo pirâmides e giros no ar, mas todas ali sabiam bem o que fazer... bom... quase todas. — Carly, você demorou para saltar!

 — Me desculpe... — falou a ruiva um tanto ofegante. — Podemos começar de novo?

 — Nós temos de começar de novo. Me desculpem, meninas, eu sei que acabamos de começar o ano letivo, mas precisamos que tudo saia perfe... — parou de falar ao notar que as garotas não estavam dando atenção a ela, e sim para algo que parecia estar atrás dela. E então, olhou para trás, avistando Claire ali de pé, trajando um shorts de malha preto, uma regata azul a qual deixava visível seu top branco pelas grandes aberturas das alças e possuía um desenho no centro: uma caveira prateada que usava um lacinho da mesma cor. Seus tênis de corrida também eram brancos assim como o arco em sua cabeça e a alça de sua bolsa lateral rosa atravessava seu tronco na diagonal.

 — Claire! — a morena sorriu e caminhou até a amiga, envolvendo-a em um abraço. Naquela noite ela tinha sentido um pouco de ciúmes, mas não demorou muito para que notasse que não valia a pena ficar brava com sua melhor amiga por isso. Eles eram melhores amigos há muito tempo e, além do mais, mesmo que Andrew e Victoria não fossem namorados, ela achava que Claire nunca ficaria com ele pois... bom... era a Claire. Ela sequer beijou alguém na vida...

 — Hey... — a loira sorriu ao retribuir o abraço e logo a soltou. — Vim fazer o teste. — Suspirou. — Andei treinando alguns passos nas férias e finalmente tomei coragem.

 — Sério? Meu Deus, depois de tanto te pedir, você finalmente será uma de nós! — deu pulinhos em alegria. — Vamos, vamos fazer isso agora mesmo. — Segurou o pulso da outra e andou. — Com certeza você será uma de minhas subs.

 — O quê? — uma garota magra com traços asiáticos chamada Sakura e outra gorducha de pele escura chamada Janette disseram em uníssono ao terem ouvido o que a capitã falou. Ambas estavam sentadas no chão junto às outras meninas.

 — Nós somos as suas subs. Vai mesmo trocar uma de nós por uma garota... inexperiente? — perguntou Sakura. — Espero que seja a Jane. — A garota negra ao seu lado fechou o semblante e olhou para ela. — O quê? Você está fora de forma. — Ao ouvirem isso, algumas das cheerleaders cochicharam entre si.

 — O que é isso, Sakura?! — Victoria indagou e franziu o cenho ao sentir uma certa raiva tomar conta de si. — Está pedindo para sair da equipe? Eu poderia ter três subs, mas a forma que você falou da Jane... céus, você só pode estar pedindo por uma expulsão!

  Claire também ficou incomodada com a forma a qual aquela garota falou, mas como sempre, preferiu não dizer nada.

  Seu coração estava um pouco acelerado pelo nervosismo, desde o ano passado tinha vontade de fazer o teste, mas sempre teve medo. E isso só piorou após Sakura dizer aquilo. Mesmo que sua amiga fosse a capitã, ela tinha de agir de forma profissional e aceitar apenas as garotas experientes. Seus passos não eram tão profissionais, ela não sabia fazer um giro no ar e com certeza ficaria com medo de fazer uma pirâmide, mas... desejava ser uma líder de torcida. E de forma justa, não por ser amiga da capitã.

 — Não estou dizendo por mal, Vicky — a asiática tinha uma voz anasalada que para uns chegava a ser irritante. — Só estou dizendo que ela é a única aqui que está fora de forma. — Janette se manteve quieta e olhou para as próprias pernas pouco cobertas pela saia do uniforme. Achava mesmo que precisava emagrecer, mas odiava que ficassem falando isso para ela.

  Claire, ao olhar a garota ofendida, sentiu seu coração amolecer e acabou por se sentir triste com isso.

 — E? — Victoria arqueou as sobrancelhas e mexeu um pouco a cabeça.

 — Oh, deixa pra lá — revirou os olhos. — Vamos ver se a sua amiga é realmente boa.

 — Eu realmente não sei o que deu em você para dizer essas coisas, mas mais uma gracinha e está fora.

 — Deve estar na TPM — Janette finalmente disse algo e algumas garotas ali presentes concordaram com ela fazendo Sakura ficar furiosa. Ela olhou para a garota negra ao seu lado como se tivesse a fuzilando com os olhos, cerrou os próprios punhos, mas no fim ignorou.

 — Bom... — Becker sorriu e olhou para Claire novamente. — Vamos ao teste.

***

  A melodia da música “Sober”, pertencente à cantora Pink mais uma vez ecoou por aquela sala de música através do piano que Heather tocava. Tocar aquele instrumento era uma terapia tão grande para ela quanto fumar alguns de seus cigarros...

  Mais uma vez a música foi finalizada com perfeição, sem uma nota errada. Ela queria tocar até que decorasse totalmente a partitura, para acrescentar à sua pequena lista de partituras que sabia de cór. Se interessava em aprender a tocar algumas músicas clássicas também, mas no momento, decidiu ficar apenas no Pop e no Rock n' Roll.

  A porta foi aberta por um certo garoto cujo escondia um pouco de seus cabelos quase nos ombros com uma touca preta. Esta combinava com a cor de suas luvas sem dedos, sua jaqueta de couro sintético e suas botas casuais. Usava também um jeans cinza rasgado na região do joelho direito e uma camiseta azul marinho que exibia o desenho de uma mulher tatuada e seminua.

 — É... se não me desse tanto sono, eu até diria que o som é lindo... — disse no momento em que entrou à sala, fazendo a garota enrugar o cenho ao olhá-lo. Não acreditava que Derek havia vindo falar com ela sozinho. — Imaginava que você estaria aqui. — Arqueou as sobrancelhas, porém manteve o semblante sério. Heather esperava de verdade que ele tivesse vindo para pedir desculpas por ontem, confessar que estava bêbado e não sabia o que estava fazendo. Mas não era isso o que ele queria...

 — Bela roupa... — Blake tombou a cabeça para o lado, o olhando de cima a baixo ainda com uma ruga entre as sobrancelhas. — Sabe que ainda estamos no verão, né?  — Agora as ergueu. — Está um calor tremendo lá fora. Essa cidade é bastante quente nessa época... — O garoto revirou os olhos e riu anasalado antes de voltar o olhar a ela.

 — E mesmo assim os jogadores dos Wolves vivem com aquelas jaquetas abafadas — assentiu com a cabeça e logo desceu os cantos dos lábios, dando de ombros — Não sinto tanto calor.

 — Tá, pode ir direto ao assunto? Se for sobre ontem, eu perdôo você.

 — Perdoar? — agora foi ele quem franziu o cenho. — Eu vim falar sobre ontem, mas não é para pedir o seu perdão, eu nem sei por que deveria fazer isso. — Se aproximou dela, fazendo-a ter de levantar a cabeça para olhá-lo, o que a provocou uma pequena dor por conta do furo em seu pescoço. Ainda possuía um curativo na região, que sempre o colocava acompanhado de uma pomada para dor. Até que estava melhorando bem rápido. — Ainda... hm... eu ainda quero um encontro.

 — Sem chances — ela olhou para o piano e ajustou os dedos de uma mão nas teclas, tocando alguma nota aleatória. — Não está afim da Agatha Jackwild? Por que está me chamando para sair? — E logo alternou os dedos de lugar, alterando suas posições e tocando outra.

 — Não estou afim dela, foi só uma ficada — manteve a mesma expressão. Ele realmente não sentia nada por aquela garota embora tenha achado muito bom o que tinham feito no banheiro na noite anterior — E eu disse para você ontem que seria um encontro entre amigos, um encontro não necessariamente precisa ser porque uma pessoa está afim da outra ou sei lá...

 — E eu disse a você para convidar a Victoria — na tentativa de mostrar ao garoto que não queria conversar com ele, Heather começou a tocar o piano aleatoriamente, agora com ambas as mãos. Aquilo nem mesmo estava formando uma música de alguém, mas o som saía bonito mesmo assim. Daria para compor uma música bacana com ele.

  Derek olhou para o lado e para o outro sem mover a cabeça, suspirou um tanto incomodado pela atitude de Heather e umedeceu os lábios antes de dizer em um tom um pouco elevado por conta da melodia alta daquele instrumento:

 — Eu sei quem você é, Samantha. É também sobre isso que eu quero conversar.

  O coração da garota gelou e no mesmo momento ela parou de dedilhar as teclas. O medo eletrocutou seu corpo de uma forma que fez seus olhos marejarem e lentamente, com um pouco de dificuldade por ter praticamente travado, ela virou o rosto para Daniel com os olhos um pouco arregalados.

 — Então... Sexta às oito? — ele indagou.