8 - Interrogatório

Tyler Blackburn como Derek Daniel Morris

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“Você esteve lutando contra a memória, por conta própria
Nada piora, nada cresce
Eu sei como se sente estando sozinha na chuva
Todos nós precisamos de alguém para ficar”

Someone To Stay - Vancouver Sleep Clinic

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— Sinto muito, senhor. Mas mesmo que eu soubesse onde ela está, eu não deixaria você levá-la — James afirmou, mantendo o semblante sério. Ele se encontrava sentado em uma cadeira, com suas mãos algemadas apoiadas em cima da mesa à sua frente, encarando o policial britânico Christopher Allen cujo estava de pé, com as mãos apoiadas sobre aquele móvel, tendo ao seu lado outros dois policiais: Alex Wilbert e Phill Abraham.

  Estavam em uma sala pequena e pouco iluminada, que não tinha nada além daqueles três móveis, da extensa e retangular janela vítrea a qual dava vista para uma outra sala e da câmera pregada à parede, que estava apontada para eles.

  Embora aparentasse estar sério, a aflição corria nas veias de Blake. Mais pelo fato de Heather ter desaparecido do que pelo fato de estar sendo interrogado pelo próprio pai biológico dela em carne e osso.

 — Já não tem um bom histórico aqui, Blake — o britânico afirmou, referindo-se às vezes em que o homem à sua frente, segundo sua ficha criminal, dirigiu embriagado e se meteu em algumas brigas. — Você não tem vergonha? De pegar uma criança que estava sendo procurada, trazê-la para seu país ilegalmente e resolver cuidar dela sendo que você não consegue nem cuidar de si mesmo? Sabe que isso pode ser considerado sequestro, né? — Arqueou as sobrancelhas. 

 — Sequestro?! — James se levantou de imediato, desejando socá-lo ali mesmo — Escute bem, oficial Allen. Sinceramente, devo dizer que você deveria ter ficado mais de olho na sua filha enquanto ela ainda estava com você! Ter conversado com ela, ter dado mais atenção, amor, coisa que um pai de verdade tem de fazer. Saiba que ela estava sendo muito mais feliz aqui do que na merda da sua casa! — Se exaltou um pouco, não chegando a fazer um escândalo, mas deixando o homem à sua frente mais bravo do que já estava. 

  Alex e Phill pareciam duas estátuas, apenas observando calados aquela situação.

 — Não me faça prendê-lo agora, Blake — proferiu Allen de forma serena, porém com o semblante visivelmente enfezado. — Já faz três anos que estou em busca da minha filha e, francamente, ainda estou chocado com o fato dela ter ficado sob a guarda de um bêbado irresponsável.

 — “Sua filha”? — riu com desdém. — francamente, oficial… Eu posso ser um bêbado fodido com uma carreira de merda, mas eu fui muito mais pai do que você — Declarou de forma firme e lenta, olhando bem nos olhos daquele homem, querendo que ele sentisse o peso de cada palavra dita.

  Allen manteve-se parado como uma estátua, fuzilando Blake com o olhar. Se pudesse, já teria tirado o revólver de seu cinto e atirado nele ali mesmo, não admitia que ele tivesse dito aquelas coisas, não admitia que ele tivesse “roubado” a sua filha.

 — Levem-o para a cela. Vamos tentar contatar as garotas — ordenou. Wilbert e Phill logo se dirigiram à James e, cada um segurou em um braço dele.

 — Não toque nas minhas garotas! — tentou se debater, mas não obteve sucesso. — ELAS NÃO SABEM DE NADA! — Exclamou enquanto era levado para fora daquela sala.

 — Aproveite enquanto ainda não está na prisão — disse Phill em um meio sorriso coberto de malícia, fazendo questão de apertar o braço do homem com bastante força. — Lá eles curtem caras como você.

***

  Os jovens haviam passado na casa de Victor para que ele pegasse as chaves do local, além de alguns materiais de limpeza, higiene pessoal, cobertores, repelente e também alguns itens que resolveu assaltar da dispensa de sua avó. Agradecia pelo fato dela estar dormindo quando chegou lá e também pelo fato de Andrew não ter saído do trabalho voluntário que ele resolveu participar naquele dia.

  Quando chegaram à chácara, a primeira coisa que Reincke fez foi ligar o gerador localizado no galpão. Precisou de uma certa quantidade de gasolina para fazê-lo voltar a funcionar, então utilizou uma garrafa de combustível que Derek guardava na mala de seu carro em caso de emergência, o que o deixou um pouco bravo, mas Victor prometeu-lhe pagar outra.

...

  Agora, as lâmpadas velhas e amareladas pregadas à parede amadeirada daquela chácara iluminavam a varanda onde Heather se encontrava, sentada no degrau, ainda refletindo sobre o que tinha acontecido nas últimas duas horas enquanto ouvia Harry — no lado de dentro — reclamando sobre o quanto aquela casa estava suja e Victor mandando-o calar a boca e continuar a limpar.

  O local era simples, isolado e ficava a cerca de quase duas horas da casa de Reincke, um pouco após a entrada de Flowerville. Não havia nenhuma paisagem interessante por ali, apenas muito, muito mato. A casa só possuía um andar, mas era grande horizontalmente. Continha três quartos, dois banheiros, um galpão, a sala que ficava junto da cozinha e a varanda onde a garota se encontrava, apreciando o canto de uma coruja e o ruído de um grilo juntos ao som das poucas palavras que seus dois amigos trocavam. Ouviu um espirro atrás de si e estremeceu pelo susto, virando o rosto em um rápido movimento, olhando por cima de seu ombro, o garoto que a salvara mais uma vez… porém agora com a ajuda de dois de seus amigos.

 — Poeira é uma merda — ele afirmou ao fungar, em seguida sentando-se ao lado dela no degrau. Ela o encarou fixamente, observando cada detalhe daquele garoto, desde seus coturnos pretos até a cicatriz diagonal que ele continha na testa, um pouco acima de sua sobrancelha esquerda. — Está tudo bem? — Franziu o cenho. — Sequer ouvi sua voz hoje.

 — ...Vocês são loucos… loucos pra caralho — afirmou, arqueando as sobrancelhas. — Por que se meteram nisso?

 — Porque… — esticou os lábios para baixo, desviou o olhar e deu de ombros antes de entrelaçar as próprias mãos e voltar a encará-la. — Somos seus amigos? — Heather suspirou e levou as mãos ao rosto, as tirando em seguida.

 — Tem noção do risco que colocaram suas vidas?! — se alterou um pouco, com o rosto já meio corado pelo nervosismo. 

 — Não é a minha primeira vez — desviou o olhar para o matagal à frente. — Acredite, já estou acostumado com isso.

 — O que quer dizer?

 — Um hacker que falsifica documentos e muda de cidade o tempo inteiro, o que você espera? — virou o rosto para o lado oposto a ela, espirrando novamente — Merda. — Passou a manga de sua jaqueta verde-escura no nariz e logo olhou para a loira novamente com as sobrancelhas arqueadas, deixando um suspiro escapar. — Então… como tudo aconteceu? 

  A garota o encarou em silêncio por um momento, com sua boca entreaberta. Era difícil falar e às vezes até pensar sobre aquela situação, sua cabeça latejava de culpa. Mas o que poderia fazer? Não existia uma forma de fugir de si mesma. Sentiu vontade de chorar mais uma vez, mas dessa vez, iria se segurar. Já havia chorado demais naquele período.

 — Hã… — umedeceu os lábios e desviou o olhar para baixo, levando uma mão à uma de suas madeixas, a colocando atrás da orelha. — Não quero… — Negou com a cabeça. — não quero falar sobre isso agora.

— Tudo bem — o garoto suspirou, pegando impulso com as mãos para se levantar daquele degrau. — Vou respeitar o seu espaço. Depois de tudo o que aconteceu, você merece um momento de paz.

  Heather o seguiu com os olhos enquanto ele se distanciava pelo caminho da direita, até que ela o chamou:

— Derek! — se levantou. O moreno se virou para ela, encarando seu triste olhar. — Obrigada... Por tudo.

— Acho que nunca vou me acostumar com você falando isso — sorriu ladino, o que a fez soltar um pequeno riso e revirar os olhos.

— Não se acostume — brincou, tombando a cabeça para o lado sem desmanchar o sorriso em seus lábios. O jovem a encarou por um momento, sabia que as coisas não estavam fáceis para ela, então vê-la sorrir, mesmo que por alguns segundos, acabou por fazê-lo sorrir também.

— Não vou — e se virou novamente.

 — Espera! — pediu, fazendo-o mais uma vez girar nos calcanhares. Nisso, ela caminhou até ele em passos rápidos e com toda a coragem que conseguira tomar naquele momento, levou a mão à sua nuca e o puxou para um beijo demorado, porém sem língua.

  As batidas de ambos os corações aumentaram seus ritmos, tornando-se cada vez mais velozes. Derek levou a mão à cintura daquela garota, sentindo como seu mundo estivesse parando aos poucos, e naquele momento, nada mais importava do que estar ali, agora, naquela situação, com aquela garota…

  Heather interrompeu o beijo antes mesmo que o garoto pudesse aprofundá-lo e logo colou sua testa na dele, fechando os olhos em seguida. Seu nariz doía por conta da pressão que havia sido aplicada à ele quando beijara Derek, porém não era algo insuportável. 

  Por algum motivo, aquele sentimento horrível que sentira na primeira vez em que se beijaram não estava tão presente, conseguira até ignorá-lo um pouco. Deslizou sua mão para o maxilar do garoto ainda de olhos fechados e em seguida o ouviu dizer:

 — Sou eu quem tem que agradecer agora? — riu junto a ela, que se afastou ao lhe dar um empurrãozinho.

 — Cale a boca...

  Ambos mantiveram se encarando, com os sorrisos ainda presentes em seus lábios. Blake ainda se sentia meio estranha perto dele, não só por aquele sentimento, mas também porque não superou a situação do encontro que tiveram. Ficava constrangida só de lembrar. Mas fora isso, ela gostava dele. De verdade. No início o achava extremamente irritante, até hoje o fato dele ter descoberto sua verdadeira identidade lhe incomodava, porém ela sentia dele um sentimento de cuidado ao seu ser, coisa que de fato, depois do que fez, não se achava digna de merecer.

  Quanto a Derek, ele estava feliz. Se sentia como um pré-adolescente apaixonado, especificamente aquele tipo que fica nervoso à frente de uma garota bonita, que fica feliz apenas por trocar algumas palavras com ela. Ele mal conseguia acreditar que Heather havia o beijado, e ainda por cima por livre e espontânea vontade. Ele não iria admitir para ela, mas mesmo que tenha sido algo simples, aquele beijo conseguiu trazer uma alegria indescritível a si.

— Vou ajudar os garotos lá dentro — ele disse após alguns segundos. — Se não, nunca vamos sair daqui.

 — Pra ficar espirrando sem parar? — retrucou a garota. — É melhor que eu vá.

 — Está em condições? 

 — Pfft — franziu o cenho e sorriu. — É claro que estou. 

***

 — Já faz mais de três anos desde que meu pai viajou para fazer um show em Liverpool… — afirmou Kate, sentada no sofá ao lado de Claire. — A gente… — Franziu o cenho e balançou a cabeça negativamente. — a gente não havia entendido nada, ele apenas chegou com ela pela manhã e disse: “Garotas, essa é a nova irmã de vocês. O nome dela é Heather Blake.”

  Nenhuma das duas conseguia encarar os policiais. Tinham seus olhos desviados, estavam confusas e cobertas de dúvidas sobre aquela situação. “Como assim Heather tem outro nome? Como assim ela sumiu do hospital? Como assim ela é filha deste policial? O papai foi mesmo preso?”

 — Vocês sabem algo sobre ela? — indagou o britânico, alternando o olhar entre as garotas sentadas no sofá. — Você. — Apontou para a loira com a cabeça. — Diga o que sabe.

  Claire o encarou, mas logo desviou o olhar para o lado novamente. Sentia-se armagurada, suas mãos suavam frio, sua cabeça latejava em preocupação. Aquela situação só estava ficando cada vez pior…

 — N-não… — balançou a cabeça negativamente e mordeu o lábio inferior apreensiva. — Não muito… ela… nós acabamos ficando mais próximas com o tempo, era quase como se fôssemos irmãs de verdade, de berço. — Enquanto ela dizia, Kate concordava com a cabeça. — Nós até mesmo dividíamos o quarto, mas ela nunca me disse nada sobre seu passado… só… havia um nome. Um nome que ela desesperadamente gritava durante algumas noites, pedindo-o para parar.

 — E qual era esse nome?

  As meninas se entreolharam por um momento e logo voltaram a encarar aqueles três policiais.

 — Jason — disseram em uníssono.

***

  No final, não foi tão ruim limpar a casa. Depois de varrer, aspirar, lavar e fazer uma das partes mais difíceis e assustadoras, que foi dedetizar a casa, conseguiram deixá-la impecável. Fizeram tudo ao som de algumas músicas, e até mesmo brincaram de deslizar no chão molhado. O maior problema foi a água — já que a casa não estava em uso há mais de quatro anos —, precisaram de um tempo até esvaziar a cisterna para poder religar o abastecimento hídrico da residência e poder desfrutar da água limpa e potável. Apenas torciam para não ter nenhum barro contido nos canos ou algum animal morto, mas aquilo era algo que eles conseguiriam lidar.

  Os quatro jovens suspiraram aliviados quando olharam em volta daquela sala agora limpa. Esta continha uma mobília simples e antiga, parecendo ter vindo direto de um filmes dos anos oitenta. Até mesmo havia uma vitrola posicionada na estante ao lado da que carregava um aparelho de TV antigo que possuía duas antenas acima.

 — PUTA MERDA, EU PRECISO VOLTAR PARA CASA! — exclamou Harry desesperado, levando ambas as mãos à cabeça. Os outros três se assustaram e imediatamente olharam para ele.

 — Certo, certo, então vamos — afirmou Victor, mas ninguém saiu do lugar.

  Heather abaixou o olhar. Se sentia muito grata pelo que estavam fazendo, muito mesmo, mas o pensamento de ter de ficar sozinha naquela casa isolada em meio àquela situação a deixava um tanto nervosa.

  Derek a encarou, percebendo de cara que a garota não estava confortável. E com isso, pigarreou antes de dizer:

 — Eu vou ficar — andou até Victor, retirando as chaves do carro e de casa do bolso. — Aproveite e compre a gasolina. E se puder por favor passar lá em casa e dar comida para a Debbie… eu ficaria agradecido.

  Blake sentiu seu coração se acelerar e arregalou os olhos, encarando aquele garoto. O que ele está fazendo? se perguntou. Realmente não queria ficar sozinha, mas esperava ficar com Victor.

  Centenas de paranóias invadiram sua cabeça… e todas motivadas pelo medo dele tentar ter algo a mais com ela por conta do beijo que tinha lhe dado.

Não… ele não faria isso… certo?

 — Claro... — Victor disse meio desconfiado, se perguntando por que ele queria ficar lá. Em seguida, deu de ombros antes de pegar as chaves. — Sem problemas. É melhor que ela não fique sozinha mesmo, mas… vai faltar a aula de amanhã? — Agora foi Derek quem deu de ombros. — Bom… okay, então — Andou até sua melhor amiga e a abraçou, sendo retribuído no mesmo momento.

 — Eu amo você… muito obrigada — ela disse, apertando o abraço.

 — Também te amo, vadia… sei que faria o mesmo por mim — se separou. — Né? — A garota fingiu estar pensativa.

 — Talvez — brincou, por fim recebendo um dedo do meio de seu melhor amigo, o que a fez rir. Em seguida, ela se dirigiu ao Harry, que estava com a respiração um tanto desregular. — Boa sorte, Harry… espero que fique tudo bem entre você e a sua família  — O abraçou. — Muito obrigada também. Você foi um herói.

 — E-eu sei… — gaguejou, retribuindo o abraço. — Tudo por você, princesa. Vai ficar tudo bem, não ligue para mim. Sabe que vai receber o convite para o meu funeral.

 — Tsc — se separou com um sorriso nos lábios. — Até mais, rei do drama.

  Os dois garotos caminharam em direção à porta após terem se despedido de Derek, mas antes que Victor pudesse abri-la, ele recebeu um chamado dele.

 — Traga meu carro amanhã depois da escola, certo? — arqueou as sobrancelhas. — Se ele voltar com um arranhão…

 — Nem precisa dizer — o interrompeu. — Mas pode confiar, seu carro vai estar seguro comigo. Até. — E deu um último aceno à Heather e Derek antes de sair pela porta com Harry.

  Silêncio.

  Um silêncio bem constrangedor. E de certa forma, torturante.

  Quando ouviram o barulho do carro dar a partida, Heather suspirou e seguiu para a estante onde se encontrava a vitrola, abrindo a gaveta desta e encontrando alguns discos de vinil empoeirados. Os pegou e seguiu para o sofá verde-musgo, sentando-se um pouco por cima de sua perna esquerda e começando a dar uma olhada naqueles discos.

 — Tudo bem? — Derek perguntou sem ao menos sair do lugar. A garota assentiu com a cabeça e colocou uma mecha atrás da orelha, sem tirar os olhos do que estava fazendo. — Está com fome?

 — Um pouco — retrucou.

 — Vou ver se consigo preparar alguma coisa — e caminhou em direção à geladeira presente naquele cômodo.

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Olá, meus amores. Como estão? Espero que bem. O que acharam do cap?

Quero agradecer a MayaraCardoso05 e mais uma vez ao ViniDavid pela ajuda. Sem vocês eu acabaria entrando em um bloqueio❤️

Não se esqueçam de votar e divulgar, por favor.❤️

Um beijo e até a próxima!😘

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