twenty seven
Eu já tinha ficado em várias situações intensas, coisas que eu julgava que não conseguiria me sair bem, e no final, conseguia. Agora não era diferente, minha irmã estava chorando no chão ao meu lado, quase que atrás de mim encostada perto da porta, enquanto no lobby da casa, eu e Richard estávamos um frente ao outro, com as armas prontas para terem o gatilho puxado. Aonde estavam os reforços que Duane havia pedido?
O pior é que eu sabia como esse tipo de coisa funcionava. Se estivesse acontecendo qualquer outra coisa no mesmo momento com pessoas grandes, eles colocariam o tal evento com gente rica, como prioridade e que a gente se acabasse tentando prender esse maluco.
− Eu não sou sua irmãzinha, detetive. Eu vou dizer algumas coisas, não vou me deixar levar, e vou puxar o gatilho. – A voz de Richard me irritava, eu tinha vontade de me aproximar colocar uma fita em sua boca e dizer, "cala a boca pelo amor de Deus". – Ravenna está tão diferente, ela costumava ser mais amorosa. Ela foi amorosa quando vocês transaram? Porque ela estava nervosa demais quando eu o tentei fazer.
− O que você fez... – Eu conseguia imaginar, óbvio que desde muito antes, só o fato dele ter conseguido sequestrá-la já tinha me feito pensar em estupro. Mas, com ele ali falando tudo aquilo na minha frente parecia muito surreal para acreditar. – Você vai apodrecer na cadeia. Você vai ser preso por homicídio, contra os pais de Ravenna, vou fazer com que seja provado o tiro que deu em minha irmã e a deixou nesse estado.
− Eu não posso ser indiciado por estupro, não é? – Ele revirou os olhos balançando a cabeça e eu vi a silhueta de Duane aparecendo perto da escada. – Ela estava pedindo por aquilo, você viu, ela usou toda essa coisa de fugir de mim, para me atrair, com certeza.
Eu nem sabia mais o que ele estava falando. No topo da escada, vi a cabeleira roxa de Ravenna aparecendo se arrastando com uma arma em uma das mãos, seu corpo estava envolvo por um lençol, provavelmente não havia nada por baixo. Eu estava em choque, mas não podia abandonar a situação.
Infelizmente, meu olhar sendo atraído pela escada também chamou a atenção de Richard que virou a cabeça na mesma direção vendo Ravenna com a arma em punho. Duane pareceu perceber que tinha um tiro livre na direção do vilão, pelo menos no ombro, apenas para que pudesse ser impedido. Analisando essa situação eu esqueci a coisa mais importante: pessoas cometem loucuras. Escutei um barulho atrás de mim, e quando me virei Rose estava de pé muito perto de mim, tinha uma arma pequena entre os dedos e por mais que tivesse que atirar de costas, ela o faria.
Quando seu corpo começou a se afastar com ela puxando o gatilho, eu abaixei a minha arma e tentei pegá-la pelos braços. Richard se abaixou e correu para o canto antes mesmo dela conseguir atirar, mas o tiro foi dado de qualquer forma. Meu corpo parou enquanto o de minha irmã despencava contra o chão e meu olhar subiu para Ravenna que agora estava de pé no corrimão segurando o lençol com uma mão e a arma com a outra. Richard continuava abaixado no canto e quando meus olhos cruzaram com Duane, foi a minha vez de se abaixar.
A bala que Rose havia atirado pegou contra meu amigo, no ombro e agora por conta do choque, mais do que um tiro fora disparado em nossa direção. Meu corpo se abaixou por instinto e quando levantei meus olhos Duane tinha a mão pressionando o ferimento no ombro de onde saía muito sangue. Era possível ouvir algumas sirenes do lado de fora, finalmente o reforço tinha chegado, não que fosse fazer alguma diferença. Olhei para Ravenna que estava com a mão tremula enquanto segurava a arma e por mais que tivesse coragem, não atiraria em ninguém.
Me levantei correndo até minha irmã que por algum motivo não tinha levantado do chão ainda, e enquanto isso pude ver Duane correndo até Richard e chutando sua arma para longe.
Agora o idiota não poderia ameaçar mais ninguém, e mesmo com um ombro machucado, Duane o prenderia.
Me abaixei perto de Rose que estava com o rosto virado para o chão e a virei, a trazendo para meu colo. Meu coração disparou com a imagem, minha garganta secou e não foi como se eu pudesse impedir os olhos de encherem de lágrimas. Um ferimento de bala enorme estava alojado em seu estomago, e o sangue agora jorrava livremente com seu corpo virado para cima.
− Rose, o reforço chegou, aguente firme, vou te levar a um médico. – Alisei seu rosto jogando os cabelos para trás, mas sua testa já estava suando provavelmente pela dor que ela sentia.
Provavelmente tinha sido acertada pela série de tiros que Duane soltou ao levar o choque do tiro no ombro. Sorte a dele o tiro ter pego no ombro, mesmo estando de costas se Rose tivesse uma boa pontaria, teria sido na testa. Olhei para trás vendo que pelo menos ele tinha conseguido algemar Richard e agora os dois estavam de pé caminhando na direção da porta.
− Elliot... – A voz de Rose voltou a me chamar atenção e eu não consegui mais pensar em qualquer outra coisa. – Desculpe...
− O que? Não, não, não. – Tentei pressionar a ferida para estancar o sangue, mas não estava adiantando nada, os olhos de Rose já rolavam com a escuridão a levando. – Fique comigo Rose, fica comigo.
Depois de alguns segundos eu não consegui nem mesmo ouvir sua respiração ou batimento. Meu corpo inteiro estava retesado, porque naquele momento existia um corpo morto em meu colo. O corpo morte da minha irmã. A culpa não era de ninguém se não dela mesma, eu sei, o tiro foi um acidente, mas era impossível não ter vontade de chorar por conta daquilo.
Me levantei deixando Rose no chão e ao me virar, meu coração disparou. Ravenna tinha descido a escada e agora estava bem próximo de Richard segurando a arma quase que contra sua cabeça. Duane estava de costas e o cano da arma passava por cima de seu ombro. Se ela o matasse também seria presa, e os reforços estavam chegando, todos seriam testemunhas do tiro.
− Ravenna, não!
Meu grito ecoou pelo lobby da casa, junto do barulho que foi a porta ter sido arrombada pelos reforços. Mas nada conseguiu cobrir o barulho do tiro que ecoou pela casa inteira.
Ravenna havia matado Richard.
[...]
Já era a terceira xicara de café que eu tomava naquele saguão esperando noticias de Duane, e Ravenna. Além do mais, eu já estava começando a ficar irritado com a ideia do enterro de Rose. Eu não podia fraquejar, eu não podia nada, mas ela não merecia aquilo. Como eu daria a noticia de tudo aos meus pais? Não que eles já não soubessem a televisão era o suficiente para levar esse tipo de notícia, mas eu nunca havia me sentido tão impotente quanto a algo na minha vida.
− Senhor Green? – me virei vendo uma enfermeira baixinha com profundas olheiras. Não duvido nada que o turno noturno era difícil para a maior parte das pessoas. – Pode me acompanhar por favor.
Apenas concordei com a cabeça enquanto dava um último gole no café, jogando o copo descartável na lixeira e a acompanhando. Eu sabia o que tinha acontecido com Ravenna. Richard havia espancado a moça, ela tinha roxos horríveis pelo corpo, eles não tinham a mesma vibração da dor de seu cabelo. Mesmo assim, o que mais me deixava irritado foi a parte da violação. Ele tinha dito na minha cara com todas as letras que a havia estuprado, e eu não sabia o peso psicológico que isso teria para ela. Eu só queria poder ajudá-la, depois de tudo o que passou essa menina só precisa de ajuda. Me envolver com a moça tinha sido o erro mais gostoso que eu cometi na vida e eu não podia deixar que ela me escapasse agora.
− Pode ficar à vontade, o doutor já vem.
Agradeci a enfermeira e entrei no quarto vendo o brilho dos olhos de Ravenna, apagado. Por mais que ela estivesse me olhando não havia muito coisa ali, era um desses olhares vazios. Eu podia jurar que senti meu coração se partir só com o peso daquilo.
− Ei, como você está? – Me aproximei meio desajeitado. Não sabia o que podia fazer, mas acabei erguendo uma das mãos e pegando a dela que estava depositada em cima da cama ao lado do seu corpo.
− Eu estou cansada. – Apesar do comentário ter saído baixo e sofrido, ela conseguiu sorrir de canto. – Sei o que está pensando, Elliot. Não precisa se preocupar com isso, nem mesmo foi a primeira vez que ele me forçou a algo. Eu não estou chateada com isso, eu mal posso conseguir formular sentimentos quanto a ter sido violentada por ele. – A mão dela apertou a minha e eu vi uma lágrima descer por seu rosto. – Eu só não consigo acreditar que realmente acabou e que ele realmente está morto.
Puxei seu corpo na minha direção e me sentei na ponta da cama com sua cabeça contra meu peito. Seus braços também me circularam e aquele abraço foi o suficiente não só como um consolo, mas para me dizer que ela ainda estava ali depois de tudo. Aquilo era a prova de que eu havia conseguido, eu havia livrado Ravenna das acusações.
− Vai ficar tudo bem agora, você será livre, Ravenna. Você será livre. – Segurei seu queixo e beijei o topo de sua testa. – E eu posso esperar o tempo que for para que você decida passar a sua liberdade comigo. Sou completamente apaixonado por você, se é que isso ainda não ficou visível.
− Acho que tenho um espaço para você na minha nova agenda, detetive.
Beijei sua testa até que ouvimos um pigarro vindo da direção da porta, e eu rapidamente me levantei vendo que era o doutor. Ele parecia bem simpático já que apenas sustentava nos lábios um sorriso discreto pela cena anterior.
− Olá, desculpem-me pela interrupção, sou Joseph Dalton. Posso ter um minuto com o senhor, detetive?
Lancei um sorriso para Ravenna e logo depois saí acompanhando o médico em uma longa caminhada pelo corredor.
− Seu companheiro vai se recuperar logo, já extraímos a bala de seu ombro. Quanto a senhorita Tucker, vamos querer que ela fique mais alguns dias aqui no hospital só para termos certeza de que nada afetou a saúde do feto...
− Feto? – Parei de caminhar naquele momento e até mesmo olhei para trás novamente na direção do quarto. – Ravenna estava grávida durante o sequestro?
− Desculpe, eu achei que... – O médico havia ficado completamente sem graça. Ele achou que eu sabia. – Eu pensei que pudesse ser seu.
Realmente, só podia ser meu. Um misto de sensações começou a se formar dentro de mim, e eu não tive outra reação a não ser correr pelo corredor de volta ao quarto de Ravenna. Queria abraçá-la, e beijar seu rosto com toda a felicidade do mundo. Infelizmente parei na porta com meu queixo no chão e um sinal característico soando pelo hospital.
A cama estava vazia e haviam enfermeiras no quarto, todas com a mesma expressão perdida no rosto.
− Aonde ela está? – Perguntei exasperado, não podia nem cogitar a ideia de tê-la perdido novamente.
Ninguém respondia. Meu coração estava batendo rápido a ponto de me dar um ataque, e então uma das enfermeiras se aproximou e me entregou um papel dobrado. Aparentemente uma carta. Antes mesmo de abri-la eu já sabia o que era.
Aquilo era Ravenna me dando um Adeus.
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