Capítulo 5

Naquela manhã, Sarah quase não consegue se levantar para levar os pequenos à escola. Suas costas estavam acabadas. Doíam que só. Mas com esforço e cuidado, a loira conseguiu sair da cama, fazer as coisas e levar os filhos. Depois voltou em casa e pegou os cachorros para levá-los ao médico.

Paçoca tinha uma consulta de rotina naquela manhã com seu médico, Ronan, e Sarah quis aproveitar o embalo para levar também o mais novo mascote da família afim de ser atendido também pelo veterinário, com o intuito de saber do especialista como está a saúde do novo cachorrinho.

O relógio na parede da recepção marca já quase nove da manhã e sentada na sala de espera da clínica veterinária com uma Paçoca quieta, deitada aos seus pés e um Cuscuz que não quer parar sossegado um instante no colo de Sarah, a loira aguarda ser chamada para a consulta dos pets.

Mais alguns poucos minutos à mais de espera e a secretária lhe indica que é a vez de Sarah entrar.

Ronan logo sorri ao ver o outro mascote nos braços de Sarah e em tom de brincadeira comenta enquanto se cumprimentam: "Aumentou a família, amiga?". Sorrindo sem jeito, Sarah confirma alegando que foram as crianças as responsáveis por isso.

— Filhos! Fazemos tudo pra agradá-los, não é?

O bom médico abre um sorriso. Ele assim como Sarah é alguém que dificilmente nega algo a filha de sete anos.

— E não é?!

Os dois riem. Haviam se tornado amigos por conta de suas esposas que eram velhas conhecidas. Viviane, a esposa de Ronan, havia sido colega de escola de Juliette durante todo o ensino médio. As duas eram unha e carne na época, mas perderam o contato depois que Viviane e sua família se mudaram da Paraíba. Há pouco mais de um ano acabaram se trombando no shopping e ao se reconhecerem, não se largaram mais.

— E a Ju? Não veio dessa vez com você por quê?

Na mesma época em que Viviane e Juliette se reencontraram, acabaram por descobrir que o marido de Pocah seria o mais novo médico de Paçoca, já que o antecessor de Ronan havia sido transferido. E tanto Ronan quanto Sarah acabaram por se tornarem amigos assim como suas mulheres e suas famílias.

E quase sempre quando Sarah vinha trazer Paçoca para consultar, Juliette fazia questão de vir junto e ao não ver a esposa da amiga acompanhando-a, o veterinário estranhou a ausência.

— A Ju está viajando. - Sarah conta com desânimo. A esposa já faz falta e não tê-la em casa lhe deixa desanimada.

— Ixi! Ela também é?!

— O quê? Viviane também?

— Sim! - Afirma Ronan com o mesmo desânimo da amiga e tocando a cabeça de Paçoca. - Ela foi com a superiora dela ao México visitar uma sucursal da empresa.

A esposa do veterinário é assistente da vice-presidente de uma importante multinacional.

— Já a Ju foi participar​ de um curso em Recife.

— Estamos sem nossas esposas.

— Pois é!

— Tenho que te confidenciar que não tá sendo fácil sem a Ker em casa. Estamos apenas Toya e eu, e estou me vendo as voltas com o trabalho, cuidar da Totoya, pois a babá dela pegou uma virose horrível e ainda tenho que dá conta da casa. Tá puxado!

— Pra mim também. Mas pelo menos estou de licença no trabalho. Só me preocupo com a casa e os filhos, que no meu caso são dois, ao contrário de você, que tem só uma.

— Mas a Toya vale por dois, três, quiça até quatro crianças, amiga.

Realmente, a garota é uma espoleta. Mais até que os gêmeos! E olha que a menina é maior que os filhos de Sarah.

Após esse papo todo, o médico foi cuidar de ver como está sua "menina obediente", como costuma se referir à Paçoca. Sarah acha a maior graça de como o médico atende Paçoca. Ronan sempre conversa com a cachorrinha como se Paçoca fosse uma criança e não um animal. É o jeito "Dr. Dolittle" de Ronan que Sarah havia apelidado e o médico se divertia disso.

Após uma checada, Ronan conclui que Paçoca está com uma saúde de ferro, como sempre. E para agradar a paciente mais calma e dócil que tem, o médico dá um biscoito que Paçoca adora.

À pedido de Sarah, Ronan consulta também Cuscuz. O diagnóstico do médico ao filhote é de que ele está anêmico e abaixo do peso para a idade dele. Segundo o veterinário, o cãozinho deve ter pouco mais de dois meses.

Ronan aplica logo no animalzinho uma injeção com a dose certa do remédio para verme. Depois de um pequeno escândalo feito pelo cãozinho e de Ronan presenteá-lo com o mesmo biscoito que deu a Paçoca, o veterinário então receita algumas vitaminas para dar ao pequeno filhote e marca para o próximo mês o retornou de Cuscuz. Depois disso, os dois amigos se despedem e Sarah sai do consultório.

*****

A ex-perita entra em casa e leva os dois cães para o lugar deles. Troca a água deles e quando está fechando a porta da geladeira ouve o celular tocar alto na sala. Havia deixado o aparelho lá sobre a mesa junto com a sacola dos remédios de Cuscuz.

Corre até a sala e ao apanhar o celular da mesa, a loira vê o nome de sua amiga e compadre piscar na tela do aparelho.

— Oi, Thaís. - Saúda ao atender a chamada.

Sarah como vai?

— Bem, na medida do possível.

Imagino. Os meninos não estão te dando trégua, né?

Trégua é a última coisa que aqueles dois lhe davam.

— Não! Ontem mesmo eles quase puseram a sala à baixo. - Conta Sarah apenas um dos apuros que já havia passado nesses dois dias sozinha com os filhos.

Meu Deus, Sar! - Thaís gargalha do outro lado da linha. Conhece a fama dos afilhados e sabe bem o dobrado que sua amiga deve estar comendo com aqueles dois sem Juliette por perto. - Qualquer coisa eu tô aqui. Me liga se precisar de ajuda.

— Eu dou conta, Thaís. Não se preocupe.

Mas você é orgulhosa mesmo, né?

Ela sorri.

As duas conversam por longos minutos sobre as outras peraltices dos gêmeos. Thaís ri se divertindo em ouvir os pequenos apuros que a amiga estava passando sozinha com os filhos.

As comadres logo se despedem e nem bem Sarah deposita o aparelho sobre a mesinha de centro e o mesmo torna a tocar.

Dessa vez é da escola dos gêmeos. Noan havia se metido em confusão. Brigou na escola para total surpresa de Sarah.

*****

Sentada diante da diretora, Sarah e a mulher ouvem o relato da professora que lhes conta o que Noan havia feito. Ao saber o que seu menino fez, a loira por dentro fica orgulhosa, mas sabe que a forma como Noan agiu não é a certa.

Segundo a professora, Noan empurrou e bateu em um coleguinha de sala arrancando-lhe um pouco de sangue da boca. Tudo porquê o mesmo empurrou sua irmã Liah, que caiu sentada no chão e chorou.

Tomando as dores da irmã, o pequeno foi para cima do amiguinho "feito uma fera", segundo relato de Ana. E as palavras que Noan proferiu ao menino que empurrou sua irmã, as quais a professora repetiu para Sarah e a diretora, deixaram a loira emocionada e mais cheia de orgulho do filho apesar da atitude nada bonita do mesmo de bater em alguém.

Segundo Ana, Noan disse ao garoto em quem batia que: "Meu vô Evandro diz que menino não bate em menina!"

Sarah cansou de ver seu pai sempre ensinar isso a Noan desde que seu garoto começou a entender as coisas e pelo visto, ele assimilou isso muito bem. Evandro ficaria orgulhoso se estivesse aqui para ver. Uma pena que partiu ano passado em uma viagem sem volta.

— Eu entendo que ele agiu mal em bater no amiguinho, mas o outro menino também agiu mal.

— Com certeza. Mas não é com briga que se resolve as coisas, a senhora não concorda comigo?

Sarah pensou na esposa e com ela as coisas algumas vezes eram assim também, e com Noan parece que serão do mesmo modo. Seu filho havia puxado mesmo o temperamento da advogada completamente.

— Concordo. E qual vai ser a punição do meu filho? Espero que o outro garoto receba a mesma também.

— Como foi a primeira vez que isso aconteceu da parte do seu filho, não haverá punição à ele. Só peço que converse com seu menino para que ele não repita o que fez. E quanto ao outro garoto, ele sim terá uma boa punição, já que essa não é a primeira vez que ele faz isso.

— Ok! Eu vou conversar com Noan para que o que aconteceu não se repita.

— Ótimo!

Ela se despede da diretora e pede desculpas pelo mal comportamento de Noan. Depois segue Ana pelos corredores da escola até a sala de aula para buscar seus filhotes.

— Posso lhe confidenciar uma coisa, Sarah?

— Claro, Ana.

— Fiquei espantada com a reação super protetora do Noan. Ele é um menino tão doce e de repente agiu feito uma fera quando viu a irmã sendo empurrada e chorar após cair sentada no chão.

Sarah sorri e lembra da esposa.

— Ele tem o instinto super protetor e o jeito explosivo da mãe. Juliette é assim também.

Ana apenas sorri. Tinha sido a primeira vez que presenciou tal comportamento em um menino tão pequeno como seu aluno.

Elas chegam a porta da sala de aula e pelo pequeno círculo de vidro que há ali, Sarah vê enternecida seu menino sentado ao lado da irmã, com o braço sobre os ombros dela e cochichando algo com Liah que apenas assente para ele.

Seu pequeno homenzinho cuidando da irmã!

— Ele não deixou mais nenhum menino chegar perto da Liah. - Ana murmura para Sarah.

— Posso ir lá sozinha com eles?

— Pode, claro!

Sarah entra na sala e na mesma hora que os gêmeos a vêem, correm até ela.

— Mamãe Sar, Noan bateu num menino, porque ele me empurrou. - Liah conta tão logo desfaz o abraço em sua mãe.

— A professora me contou e depois a gente vai conversar sobre isso, rapazinho. - Ela diz de forma amável sem zanga.

— Vai brigar comigo? Eu só defendi a Liah como o vovô dizia pra eu fazer.

— Mas você machucou um coleguinha, filho.

— Ele empurrou a minha irmã. - Retruca Noan cruzando os braços e fazendo um bico zangado que nem o que Juliette faz.

Quanto orgulho ela sente de seu garoto por defender a irmã mesmo não tendo sido da maneira mais correta que ele tenha feito aquilo.

— Eu sei, filho, mas o que você fez foi tão errado quanto o seu coleguinha. Não tinha que bater nele.

— E ele não tinha nada que empurrar a Liah! - Rebate Noan sem titubear.

*****

Dentro do carro à caminho de casa, Sarah quis saber como tudo aconteceu na versão de seu filho. A professora contou o que viu, agora ela queria ouvir da boca do filho como as coisas aconteceram.

Noan lhe conta que estava brincando com Tom quando viu Ruy tomar de sua irmã a maçã dela. Liah foi tomar de volta da mão do menino a fruta, mas Ruy lhe deu um empurrão quando ela foi para cima dele. Foi quando Noan viu a irmã cair e começar a chorar. No mesmo instante, ele foi até o menino e também o empurrou e ainda bateu com seu boneco em Ruy acertando a boca do garoto, que chorou no mesmo instante, e mais ainda quando viu o sangue.

Sarah fica espantada com aquela reação destemperada do filho. Por mais que por dentro tenha ficado de certo modo orgulhosa por seu menino defender a irmã com esse afinco todo, ela tinha que chamar sua atenção. Aquela atitude de Noan não foi das mais louváveis, assim como, não foi a do outro menino.

— Filho... - Ela começa a falar e dá uma olhada pelo retrovisor no garoto acomodado em sua cadeirinha ao lado da de Liah. -...Eu sei que fez o que fez pra defender sua irmã, mas bater no seu coleguinha não foi certo. Você devia ter chamado a tia e dito o que ele fez pra ela chamar a atenção dele. Não devia ter batido nele.

— A tia disse isso também.

— Pois é. Me promete que não vai brigar mais na escola. Você podia ter se machucado sério ou pior, machucado o outro menino mais do que machucou.

— Se ele não empurrar mais a Liah, eu não bato nele de novo.

Mas que molequinho mais espevitado!

— Se ele fizer isso, você diz pra professora. Mas tenho certeza que ele não fará isso de novo. A diretora me disse que ele vai receber um castigo por isso. Então você também não vai fazer mais, não é, promete?

— Tá bom, prometo!

— Noan isso é sério. Não é pra brigar mais na escola e nem bater em nenhum coleguinha.

— Eu não vou brigar mais e nem bater em ninguém, mamãe Sar.

Ela assente vendo o filho segurar na mão da irmã. Depois, Sarah ouve seu pequeno murmurar para a irmã:

— Liah, você vai ficar longe do Ruy pra ele não empurrar mais você, tá bem?

— Tá, Noan!

A loira sorri do 'pedido' de Noan. Aquele molequinho é o cão de guarda da irmã. Ai, de quem ousar se meter com Liah de novo como o tal Ruy se meteu!

*****

— Não acredito que ele fez isso!

Pelo telefone, Juliette estava embasbacada com a atitude do filho.

— Fez! Segundo Ana, ele agiu feito uma fera quando viu o outro menino empurrar Liah e ela começar a chorar após cair sentada no chão.

Sarah revela. Aproveitando que os filhos estavam no cochilo da tarde deles. A loira ligou para a esposa, já que a mesma não ligou no horário do almoço, e lhe disse o que houve na escola.

— Mas o que está havendo com esses dois, Sarah? Bastou eu me ausentar de casa pra eles resolverem se rebelar desse jeito na escola.

A loira sorri do modo engraçado como a esposa falou.

— E que menino foi esse que empurrou a Liah, bebê?

— Segundo o Noan foi um tal de Ruy.

— Ruy... Ruy... Ah, mas eu sei quem é esse garoto. Ele é uma peste mesmo. Se foi ele então teve o que mereceu.

— Juliette do céu!!

Sarah fica chocada com as palavras da esposa. Achou que ela ia desaprovar terminantemente o que Noan fez, mas ao invés disso, ela aprovava a atitude destemperada do filho. E ainda dizia, que o outro menino mereceu aquilo que teve.

— O quê? Não é a primeira vez que esse menino faz isso, Sarah. Semana passada ele empurrou a filha da Susi. A menina se machucou. Mas agora ele sentiu na pele o que as meninas sentem, quando ele as empurra.

— Não me diga que está aprovando e achando certo o que Noan fez?

— Claro que não, óbvio. Violência nunca é a melhor solução pra se resolver as coisas.

— Você dizendo isso soa até estranho pra mim, sabia?

— Não vi graça nenhuma nessas suas palavras, tá?

Sarah sorri.

— Mas eu vi. - rebate ainda sorrindo.

E quanto a esse garoto que Noan bateu.... Ele mereceu pelo que fez. Sentiu na pele o que é ser empurrado. E o Noan merece muitos beijos por defender a irmã desse jeito. Mas claro que eu não vou dizer à ele isso, pois não é certo. Vou chamar sua atenção como é o correto a se fazer.

— Eu sinceramente às vezes não te entendo, Ju!

Quando foi à noite, mais uma vez lá estava Juliette dando um pequeno puxão de orelha no filho pelo o que ele fez na escola, como disse que faria a esposa.

O pequeno assim como prometeu a Sarah que não brigaria mais e nem bateria em ninguém, prometeu à outra mãe o mesmo. Mas se ele herdara mesmo o gênio e o temperamento dela como cada vez mais se mostrava, Juliette sabia que aquela promessa logo seria quebrada.

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