01
O Théo era um garotinho de pele bronzeada. Tinha cabelos pretos e cacheados. Olhos castanho-escuros, e um sorriso fácil, que não tinha nada de perfeito, mas que só de olhar fazia a gente acompanhar a risada.
Assim como eu, Théo gostava de correr e brincar na rua, com as crianças que moravam perto. Todo dia era uma festa pra gente, não cansávamos, tão pouco parávamos pra recuperar o fôlego. E quando eu precisava de auxílio, mais precisamente socorro de um oponente do jogo, ele estava lá pra me ajudar.
Não me entenda mal. Eu não acho que a definição de amor é ter um super-herói na sua vida, mas como eu já disse, eu era nova demais. Então quando eu olhava para o Théo, eu via um príncipe pronto pra salvar sua princesa dos perigos do reino. Chegava até fantasiar com isso, sabe? Ele e eu, em um cavalo branco, correndo para longe dos perversos inimigos que tentavam nos pegar a qualquer custo. Mas eu fui crescendo, e o Théo também. E ele fazia toda questão de não parecer com alguém da realeza. Aos doze anos, ele aos treze, nosso amadurecimento já era notado. Eu cresci alguns centímetros, passei a me importar mais com minha aparência ao sair na rua, comecei a usar sutiã, as primeiras espinhas despontaram, e eu prestava mais atenção nos garotos do que eu gostava de admitir... Enquanto o Théo crescia bem mais que alguns centímetros, engrossava a voz, ganhava traços mais masculinos, e como eu, tinha algumas espinhas no rosto. Isso era o mais aparente. Mas a diferença entre mim e o Théo-além dos sinais da puberdade-, era que ele parecia não perceber que estava crescendo. E se percebia, parecia ignorar o fato. Toda vez que chegávamos da escola e ele vinha me chamar pra brincar, eu sentia um frio na barriga, ficava nervosa e insegura, enquanto ele mostrava a naturalidade de sempre, de quem não estava nem aí pra nada. Não me tratava diferente por ser uma garota, pelo contrário, não usava de delicadeza ao falar ou tocar em mim. Acho até que ele me via como um garoto igual a ele. Fazia suas piadas e gracinhas infantis, me empurrava de leve sempre que achava algo que eu dizia engraçado, e nunca me olhava mais que cinco segundos nos olhos enquanto eu contava algo que achava interessante compartilhar. Você pode pensar, talvez ele só não sinta o mesmo que você... Não significa que ele ainda não amadureceu, não significa que ele ignora as mudanças ao seu redor. Mas pra mim parecia exatamente isso. E eu ficava muito, muito irritada.
Essas eram as atitudes do Théo criança. Eu precisava do Théo rapaz. Me magoava que ele não me enxergasse do jeito que eu queria. Me tirava do sério ele agir como se ainda tivesse dez anos, com sua inocência inabalável, totalmente alheia ao amor que eu sentia. Eu queria que ele crescesse, como eu. Eu queria que ele sentisse o que eu sentia! Era pedir demais que alguém que era seu melhor amigo no mundo todo, fosse também o seu amor? Eu tinha isso mais do que definido na minha cabeça. Éramos feitos um pro outro. Só ele não via. Só ele fazia questão de permanecer inocente ao que estava bem na sua frente. Sua chance de se tornar um rapaz... De se tornar um rapaz que tinha uma garota para amá-lo!
Então eu passei a ignorar os pedidos do Théo. Não aceitava mais brincar com ele quando vinha me chamar. Não demorava muito conversando com ele quando nos víamos na rua ao voltar da escola. Dizia pra ele que estava ocupada demais com os deveres, ou que minha mãe não deixava mais eu sair pra brincar até tão tarde por que a vizinhança estava mais perigosa. E quando ele perguntava se eu estava realmente bem, dizia que sim, e que ainda éramos amigos, não tinha nada com o que se preocupar... Mas tinha. E no fundo ele sabia. Ele não era burro. Eu não estava bem de verdade, eu só fingia que não estava magoada por não ter os meus sentimentos retribuídos da mesma forma. Eu ia dormir triste, tanto por não ter um amor correspondido, quanto por saber que estava perdendo o meu melhor amigo também. Os poemas e canções que eu costumava escrever sempre de um jeito alegre e otimista, agora davam lugar a versos melancólicos, sobre corações partidos e amores impossíveis. Eu amava escrever, então, derramar no papel o que estava transbordando no meu coração, era o jeito mais fácil de me consolar.
Até que um dia meus pais me disseram que precisavam conversar comigo algo muito sério. Eu fiquei um pouco assustada, mas me sentei de frente pra eles e escutei o que tinham pra me falar de tão importante.
A pior notícia da minha vida foi resumida em seis palavras:
- Sentimos muito filha. O Théo morreu.
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