Capítulo 85

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"O telefone que você ligou se encontra desligado ou fora da área de cobertura."

— Mais que merda! - largo o celular ao meu lado no sofá. A raiva que sinto àquela altura já alcança níveis altos. É para lá da DÉCIMA QUINTA vez naquela noite que eu tento entrar em contato com Sarah pelo celular e nada. O telefone dessa casa em Nova York, eu não tenho somente da casa de Nova Jersey. - Onde você se meteu, cretina?

Ela sabia que eu ligaria a noite, porque tinha lhe dito na nossa despedida na frente do cemitério pela manhã e Sarah assentiu em concordância. Agora, cá estou há sei lá quanto tempo fazendo tentativas atrás de tentativas de entrar em contato com ela, mas nada de conseguir.

— E aí, Ju?

Camilla retorna para à sala com os nossos talheres para comermos o jantar que chegou ainda pouco pelo delivery.

— Nada!

— Vai ver que ela tomou um remédio pra dormir e apagou. - Camilla me estende os talheres ao se acomodar do meu lado no sofá.

— Mas eu disse que ia ligar. E, além do mais, Sarah não me parece ser alguém que faz uso de remédio para dormir.

— Amiga as últimas horas pra ela e a Carla foram bem trash. Dormir por vontade própria nesse momento não é uma tarefa fácil e recorrer à medicamentos para isso é uma solução nesses casos. Bem, no meu caso seria. Eu no lugar delas iria me entupir de remédios para conseguir dormir. Liga amanhã. Ela não te disse que queria ficar sozinha?

— Disse!

— Então. Deixa à Sarah curtir o luto dela sozinha. Olha, vai começar a série. Silêncio!

Sem ter outra opção melhor para fazer, só me resta acatar o conselho da minha amiga. Ligarei amanhã. 

Momentos mais tarde, quando eu já estava terminando de jantar, o celular toca e sob o olhar de Camilla apanho o aparelho com demasiada pressa achando que é Sarah, só que para a minha frustração não se trata da cretina da minha noiva. É a minha mãe que está ligando por conta da morte de Abadia. Vou para à cozinha conversar melhor com ela e assim não atrapalhar Camilla que quer assistir TV. Por quase meia hora dona Fátima e eu ficamos conversando sobre o ocorrido. Ela meio que já sabia de algumas coisas por intermédio de Anitta (o que para mim não é novidade. É óbvio que minha prima seria a primeira a dar a notícia aos meus pais), segundo minha mãe, ela e meu pai chegaram até a falar com Sarah e lhe dar as devidas condolências, quando ligaram para Anitta mais cedo e esta os informou que estava dando carona à Sarah após o velório de Abadia. Não gosto nada de saber que minha prima deu tal carona à Sarah. E chego mais ainda a conclusão de que Anitta não se emenda mesmo. Só espero que tenha ficado apenas na carona e que ela não seja a responsável por Sarah estar sumida.

Quando a ligação da minha mãe se encerra, eu retorno à sala. Horas mais tarde, antes de dormir, não resisto e faço mais duas tentativas de entrar em contato com Sarah, sem obter sucesso.

— Por que você não está atendendo?

Não insisto mais e largo de mão. Amanhã tentarei novamente entrar em contato com ela e espero conseguir.

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Tarde do dia seguinte...

— Oi! Sou eu de novo. Onde você está? Tô preocupada com a sua falta de notícias. Me liga assim que ouvir os meus recados, por favor. Beijos. Te amo! - finalizo a ligação e devolvo o celular à mesa.

Suspiro, massageando as têmporas. Já consigo sentir os indícios de uma enxaqueca daquelas vir atormentar minha cabeça. Tudo graças ao silêncio de Sarah. O celular dela segue desde ontem a noite dando sempre naquela mensagem eletrônica irritante, que a cada nova tentativa que eu faço de contato com aquela cretina e esbarro na mensagem, mais raiva me dá.

O que estará acontecendo com Sarah e seu celular?

Se eu não conseguir entrar em contato com essa mulher até a noite, ligarei para Carla. Decerto, a irmã da minha noiva saberá me dizer o que está acontecendo com Sarah e seu celular.

— Juliette está tudo bem?

Levanto a cabeça e dou de cara com Pocah me olhando com certa preocupação.

— Dor de cabeça apenas. Mas já, já passa.

Pelo menos é o que eu espero.

— Hum... Quer um remédio? Tenho na minha sala.

- Não, obrigada. É uma dor leve.

- Tem certeza que não quer?

- Sim.

- Tá bom então. Se quiser depois é só pedir. - assinto. - Agora temos aquela reunião com os demais editores e assistentes lá com a chefia. Vamos?

— Ah, claro, vamos. - levanto e sigo minha chefe com minha caderneta de anotação e alguns relatórios que entrego a Viviane quando entramos na sala de reuniões.

Durante a reunião, eu pouco presto atenção no que dizem, porque estou com a cabeça mais preocupada na desaparecida da minha noiva cretina. Pensando no por quê dela não ter entrado em contato comigo desde ontem. Estou muito preocupada com ela por esse sumiço. E começo também a ficar irritada.

Quando a reunião acaba uma hora e meia depois, eu agradeço porque ao que parece ninguém nota a minha falta de interesse nela. Só que me engano feio quanto a isso. Camilla e minha chefe notaram. A primeira sabe a razão de eu estar assim, já a segunda não e assim que saímos da sala de reunião, ela me questiona:

— Você não está legal, não é Ju? - ela me olha de lado.

— Não se preocupe que vou ficar bem. - me esforço para parecer convincente, contudo falho aos olhos astutos de minha chefe.

— Tem certeza? Durante a reunião notei você quase o tempo todo alheia ao que era dito.

Touché! Ela te pegou, insolente.

O que eu digo?

A verdade?!

— Minha noiva não anda me atendendo desde ontem e estou preocupada com ela. - resolvo compartilhar com Pocah o que me aflige. - Ligo para o celular dela e só dá desligado.

Só irei me tranquilizar quando conseguir falar com Sarah.

— Já tentou o número da casa dela?

— Não tenho o da casa que ela está. Acho que irei lá depois do trabalho.

— Ju, melhor não ir. Ela deve está querendo ficar sozinha. Algumas pessoas gostam de se isolar e ficar incomunicáveis após perderem alguém importante. É o meio delas de lidar com o luto. Dá um pouco de tempo e espaço pra ela lidar com o que houve. Tenho certeza que logo ela te liga. - Pocah me abraça pelos ombros e dá duas tapinhas de leve no meu braço.

Vai ver minha chefe tem razão.

Claro que tem!

Ih, não vem, me encher!

— Vou fazer o que você disse.

Engraçado que os outros tu escuta, mas quando sou eu que dou o conselho sou ignorada e até mandada calar a boca.

Lá lá lá lá...

Quanta infantilidade!

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À noite, já em casa, eu sinto ímpetos enormes de fazer novas tentativas de entrar em contato com Sarah, mas seguro a onda e sigo o conselho de Pocah. Nem para à Carla, eu ligo apesar de também sentir enorme vontade disso.

Tempo e espaço!

Darei essas duas coisas à Sarah. Vai ver que ela precisa mesmo disso!

Vem a quarta-feira e ao longo dela nada de sinal daquele mulher. A minha preocupação já dá sério lugar a irritabilidade! Camilla tenta amenizar a situação alegando que Sarah, certamente terá uma boa explicação para esse sumiço. É o que eu espero mesmo.

Quinta-feira de tempo nublado como o meu estado de espírito, já que também ao longo daquele dia acontece o mesmo que ontem e antes de ontem: sem notícias de Sarah!

Céus! Quanto tempo e espaço mais essa mulher vai precisar para entrar em contato comigo?

Eu já mal sabia se estava preocupada, irritada ou louca de raiva dela. Talvez fosse uma junção perfeita dos três!

Quando é na sexta-feira de manhã, eu digo a mim mesma que basta. E no meu horário de almoço ligo para Sarah e como nas minhas inúmeras tentativas anteriores também não obtenho êxito nessas. Resolvo buscar informação com Carla. Acredito que ela possa me dizer algo. Ligo para à minha cunhada que atende a chamada no quarto toque.

— Carla sou eu, Juliette. Como vai?

— Oi, Juliette. — seu cumprimento sai amuado como não pode deixar de ser dada a perda ainda recente que ela sofreu. — Eu vou indo. Tentando me adaptar a ausência da minha mãe, mas tá difícil.

Sempre é difícil se acostumar com a ausência deixada por alguém amado que partiu e não voltará mais.

— No começo é difícil mesmo. Mas com o tempo a dor da perda e a saudade se tornam menos dolorosas e mais suportáveis.

— É o que dizem?

— É!

— E você como está?

Diante do questionamento é impossível conter um suspiro de frustração escapar pela minha boca.

— Preocupada, frustrada e irritada com a sua irmã. - enumero com amargor. - Desde segunda que o celular dela só dá desligado. Você sabe me dizer o que está acontecendo, Carla? - despejo de uma vez.

Antes de responder minha cunhada fala com alguém que ao fundo ouço lhe chamar. Carla resmunga um "esse modelo é melhor" à pessoa e então torna a se dirigir à mim, pedindo desculpas pela interrupção. Conta que é um de seus colaboradores querendo saber qual modelo de relógio vai estampar a campanha publicitária. Só então me dou conta de que estou lhe atrapalhando. Me sinto um pouco mal por estar lhe importunando na hora do trabalho, mas preciso sanar minha preocupação e curiosidade a respeito da irmã dela.

— Olha, Juliette... Tudo o que eu sei é que a Sarah viajou e não levou o celular.

Minha boca se abre em um descrente e enorme O.

Como assim ela viajou?

Viajando, né insolente?!

Não enche!

Eu não sei se fico aliviada por nada de mau ter acontecido à Sarah ou se fico puta de raiva por ela viajar sem ao menos ter a atenção de me avisar para não me deixar preocupada como fiquei. E, ainda por cima, não leva celular.

Que inferno!

— Viajou quando? E pra onde, você sabe me dizer?

Segundo Carla, sua irmã lhe ligou segunda à tarde avisando que viajaria, porém não disse seu destino e que deixaria o celular em casa. Minha cunhada garantiu que para à Alemanha Sarah não foi, porque Carla ontem ligou tanto para à casa da irmã quanto para o escritório da Care em Munique, além da fábrica em Frankfurt, e nos três lugares as pessoas com as quais falou, afirmaram que Sarah não pôs os pés por lá.

— Onde diabos essa mulher se enfiou, Carla?

— Também adoraria saber, Juliette. Mas assim como você, eu nada sei.

Parece que Sarah resolveu sumir e não ser localizada!

Minha esperança era Carla saber de algo, contudo, ela sabe tão pouco quanto eu. Ao menos, eu já posso respirar aliviada por saber que Sarah está bem e viajando por aí.

Peço à Carla que se acaso sua irmã entrar em contato com ela, para dizer-lhe que me ligue, porque estou preocupada com ela. Minha cunhada garante que fará isso. A gente se despede depois disso e cada uma desliga.

Quer dizer que Sarah viajou para sabe-se lá onde?

Você podia ter ao menos mandado uma mensagem avisando: ô, sua idiota, eu vou viajar!

O celular em minha mão toca. Logo eu já me encho de esperanças de que por pura coincidência ou casualidade seja a minha noiva desmazelada. Mas ao olhar na tela do aparelho visualizo com certa decepção, que não é ela e sim, Owen ligando para confirmar nosso jantar mais à noite.

Putz! O jantar!

Com todos os últimos acontecimentos, eu acabei esquecendo completamente que é hoje o tal jantar com o meu amigo. E para ser bem honesta, no atual momento, estou com zero vontade de sair, mas diante da voz empolgada de Owen me sinto incapaz de desmarcar nosso compromisso e transferi-lo para outro dia, então confirmo o nosso jantar para aquela noite de sexta.

— Às oito no Juliette, né?

— Isso! - confirmo. E agradeço o fato de ele falar o horário e o local, porque me dá um branco enorme que sequer me lembrava mais que horas e onde tínhamos combinado de jantar.

Meu amigo pede para que eu lhe passe por mensagem depois o endereço direitinho de lá. Concordo e nos despedimos com a promessa de mais tarde estarmos nos encontrando na frente do restaurante.

Assim que finalizo a chamada digito a mensagem com o endereço correto do restaurante Juliette e envio ao Owen.

Nem mesmo a curiosidade por saber o que o meu amigo quer me contar mais tarde, faz diminuir ou amenizar a raiva e o ressentimento com Sarah por ter viajado sem se dar ao trabalho de me avisar.

— Ei, Ju! Você não vem almoçar? Daqui a pouco acaba o horário do almoço e você sequer comeu. Anda, vem!

Camilla sai me arrastando refeitório adentro até chegarmos a nossa mesa onde o pessoal está.

— Larga mão de namoro nesse celular, Juliette, e vem almoçar com a gente.

— Quem me dera estar namorando pelo telefone, Rafa. Tem dias que não falo com a Sarah. Inclusive, ela viajou para sabe lá Deus onde. Soube disso agora pouco pela irmã dela.

— Quer dizer que ela viajou?

— Exatamente, Cami! - lanço um olhar nada amistoso.

— Ih, alguém tá encrencada, quando aparecer. - sibila minha amiga.

E ela está certa! Entendo perfeitamente que Sarah queira um tempo sozinha para superar a perda da mãe, mas não custava nada me avisar que ficaria off, viajando para sei lá onde e sem querer conversar com ninguém. Eu juro que entenderia isso. De verdade! Agora, sumir assim, sem dar notícia ou satisfação, me deixando preocupada por dias a finco foi uma puta sacanagem dela.

Na primeira oportunidade em que nos encontrarmos, irei reclamar disso com ela.

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Diante do grande espelho na porta do guarda roupa, eu finalizo a maquiagem e dou uma última conferida no look que estou usando: uma calça flare preta, blusa off white com pérolas no decote, blazer amarelo com as mangas erguidas até a altura dos antebraços e um Scarpin azul metalizado compunha meu visual.

Look ok!

Só gostaria que o meu ânimo também estivesse ok.

Uma última escovado no cabelo só para domar uns fios rebeldes que teimam em ficar em pé, dois borrifos de perfume e estou pronta para sair, mas sem a maior vontade, diga-se de passagem.

Caminhando até a cama apanho de cima dela a bolsa onde guardo o celular junto da carteira que já se encontra lá dentro; saio do quarto e vou rumo à sala onde encontro Camilla toda esparramada no sofá jantando enquanto assiste vidrada a nossa série preferida passar em um canal fechado da TV.

— Cami estou indo. - aviso, atraindo de imediato sua atenção para mim.

— Uau! Tá gata!

- Obrigada!

- Mas você não me parece lá muito animada para ir jantar com seu amigo. - observa minha amiga. Ela me conhece bem, tão bem quanto eu a conheço.

— E eu não estou mesmo. Só vou, porque já tinha combinado dias antes com Owen e detesto dar cano em compromissos já marcado com antecedência.

— Hum... A chave do carro está no aparador. Bom jantar!

— Valeu! - jogo um beijo para ela antes de me dirigir para pegar a chave do carro e sair do apartamento.

Dirigindo para o restaurante, eu me pego pensando para onde Sarah terá viajado. Sinto falta dela! E também certa raiva por sua falta de consideração em me avisar que viajaria. Poxa, eu sou noiva dela não mereço uma satisfação?

Ela podia mandar um simples aviso por mensagem de texto mesmo, dizendo: vou sumir por uns dias! Mas não houve da parte dela essa preocupação e tal desmazelo está me deixando chateada... de verdade!

Parada no sinal vermelho escuto o celular tocar dentro da bolsa. Com rapidez apanho o aparelho em mais outra esperança de ser Sarah, mas não é. Trata-se do Owen mesmo.

— Oi!

— Juliette já acabei de chegar aqui no seu restaurante. - ele diz e ri.

— Dez minutos e eu chego também.

— Tá bem. Vou te aguardar aqui na porta.

— Ok!

Desligo já ouvindo o carro atrás buzinar, porque o sinal tinha aberto e eu continuava parada.

— Quanta falta de paciência, eu hein?! - reclamo, vendo pelo retrovisor o Dodge escuro com vidro fumê, piscando os faróis.

Dou partida logo senão é capaz daquele imbecil impaciente passar com o carro por cima de mim.

No tempo estimado, estou estacionando do outro lado da rua onde fica o restaurante. Enquanto desligo o carro e tiro o cinto de segurança avisto na porta do restaurante Owen vestido tão informalmente quanto eu em um look all black.

Apanho minha bolsa e saio do veículo. Após acionar o alarme do carro, atravesso a rua e alcanço o Owen. Enquanto o cumprimento com um abraço seguido de dois beijos no rosto, trato de me desculpar pelo atraso. Meu amigo resmunga um "que nada" e ainda completa dizendo que meu atraso foi tão pequeno que ele não teve chance de sequer ficar cansado. Sorrimos e então, eu o convido para entrarmos no restaurante. Meu amigo concorda na hora.

A fachada simplória e iluminada do restaurante não faz muito jus a elegância e charme do ambiente lá dentro. Owen se surpreende ao adentrar no restaurante.

Noto de soslaio meu amigo olhar embasbacado para o local lotado enquanto nos encaminhamos a recepção do restaurante. O lugar com três ambientes e dois andares, têm uma pegada francesa total; possui uma decoração com antiguidades parisienses e itens colecionáveis, que criam uma atmosfera agradável e romântica típica dos bistrôs parisienses, ao menos foi isso que Camilla me disse na primeira vez que estivemos ali. Minha amiga já tinha viajado com os pais para Paris enquanto que eu ainda não, mas morria de vontade de conhecer a "cidade luz".

— E aí, o que achou do lugar?

— Maravilhoso! Tô sem palavras.

Foi exatamente assim que fiquei também ao entrar a primeira vez ali.

O gerente do local, um senhor baixinho e de cabelos grisalhos, que já tinha se tornado um velho conhecido meu por conta das inúmeras vezes que já vim aqui com Camilla, vem até meu acompanhante e eu e nos cumprimenta com seu costumeiro sorriso acolhedor. Após retribuir gentilmente ao cumprimento dele, Owen pede uma mesa para dois.

— Aqui dentro mesmo ou na área externa? - indaga o sujeito.

Owen me olha sem saber o que responder. Leio em seu olhar um pedido de sugestão quanto à resposta da pergunta lançada.

— Não tem mais mesa no terraço?

— Infelizmente não, senhorita. Todas já estão ocupadas.

Poxa que pena. Adoro o terraço. Jantar ao ar livre é sempre tão maravilhoso. Mas como não tem o terraço, opto pela área externa mesmo. O simpático homem nos leva até lá.

Apesar do termo "área externa", o local possui uma cobertura de vidro e compondo o visual ainda tem várias plantas caídas do teto, que se espalham pelo ambiente, criando um clima cool. Apesar de ali também ser super agradável e iluminado, eu ainda prefiro o terraço.

— O garçom já, já vem atendê-los. Tenham um ótimo jantar. - tendo dito isso o sujeito sai nos deixando a sós.

— Nossa esse lugar tá me lembrando agora um bistrô que fui em Paris anos atrás. - Owen comenta, admirando o restaurante.

— Camilla disse o mesmo quando estivemos aqui pela primeira vez. Tenho maior vontade de ir à Paris.

— Pois super te recomendo ir. É uma cidade maravilhosa com cada ponto turístico mais bonito que o outro.

A ideia de conhecer Paris com Sarah junto povoa minha mente. Será o sonho do sonho ir à "cidade luz" com minha noiva. Quem sabe não podemos passar a lua de mel por lá? É uma ótima sugestão que eu pretendo compartilhar com ela. E será maravilhoso caso Sarah concorde. E lembrar da minha noiva me deixa meio mal e ao mesmo tempo cheia de saudades dela.

Sarah onde você está?

O garçom aparece e nos estende o cardápio do restaurante.

O menu do Juliette não pode deixar de ser francês, já que o restaurante é de influência francesa. No cardápio somente os clássicos dos clássicos da gastronomia da França. A diversidade de coisa boa tanto para quem é vegetariano como é o meu caso, quanto quem não é como Owen, é bem variado que escolher o que comer, fica até difícil. Mas depois de alguns minutos nós já havíamos decidido sobre o que jantarmos:

De entrada para mim uma Soupe d'Oignons (sopa de cebola); como prato principal Ratatouille; e de sobremesa Tarte Tatin (torta de maçã).

Já o Owen foi de Steak Tartare de entrada; Confit de Canard (coxa de pato cozida, acompanhado de batata sautée e salada) como prato principal; e Crème brûlée de sobremesa.

Para degustar enquanto o primeiro prato que pedimos não chega, Owen pede para bebermos um Pinot Noir da linha Punto Maximo que vem da Califórnia. Frutado maduro a morangos e framboesas, cheio, base rica e suave, com textura aveludada, o Pinot Noir pela descrição tem notas de baunilha, cacau e tostado. Segundo o garçom, uma ótima escolha de meu acompanhante para bebida.

— E então qual a razão deste jantar? - interpelo quando o garçom sai e nos deixa sozinhos. Agora, devo admitir que bate a curiosidade àquele respeito.

— Quanta pressa?! - Owen sorri. - Só depois do jantar eu conto. Quero aguçar mais um pouco a sua curiosidade. - ele pisca um olho.

— Que maldade sua.

Owen ri.

Como meu amigo não quis falar por hora sobre o que nos trouxe à este jantar, nós engatamos em uma conversa que gira em torno dos últimos acontecimentos em nossas vidas. Enquanto eu vou contando as minhas pitangas para ele, o garçom traz a bebida. Uma delícia por sinal! O funcionário vai embora e eu prossigo falando. Depois é a vez do Owen relatar os fatos que ocorreram com ele. No meio do nosso papo que aquela altura já é sobre a última feira que ele esteve, chega as entradas do jantar. Uma pequena pausa na conversa para a degustação dos nossos pratos. A minha sopa de cebola está dos deuses. E segundo Owen seu Tartare está idem.

Outros assuntos vieram depois de saborearmos nossas entradas e ao longo do jantar inteiro que se segue. E diga-se de passagem o jantar foi delicioso. O prato principal e a sobremesa estavam tão divinos e deliciosos quanto a entrada.

— Fazia anos que eu não comia tão bem assim. Meu Deus!

Sorrio para o meu amigo antes de apreciar um gole do café que pedimos depois da sobremesa.

— A comida daqui é sem palavras! Vou passar a ser um freguês frequente daqui a partir de hoje.

— Bem-vindo ao clube dos amantes do restaurante Juliette Williamsburg então. - brinco e nós caímos na risada juntos.

Engraçado como o clima entre nós é tão leve e descontraído o tempo todo. Desde o primeiro papo que trocamos em Chicago e em todos os outros que vieram depois daquele a empatia entre nós só se acentuou mais. E, confesso que pensei que essa coisa boa que criamos tão rápido fosse perde-se depois que ficamos naquela minha última noite na "cidade dos ventos", quando saímos para curtir uma boate. Mas, felizmente, as coisas ficaram iguais. O que aconteceu entre nós ficou lá em Chicago e tanto Owen quanto eu não tocamos nesse assunto nenhuma vez sequer durante os encontros que já tivemos desde aquela noite.

Melhor assim!

— Bom... Já jantamos, conversamos bastante, rimos e agora é hora de falar do que de fato nos trouxe aqui. - meu amigo anuncia, apoiando os antebraço à mesa e juntando as mãos enquanto seu olhar me enquadra de maneira fixa.

Pelo visto o assunto é sério!

Com um gesto de cabeça o incentivo a dar prosseguimento à sua fala e é o que Owen faz após cinco segundos de silêncio.

— Juliette, eu quis ter esse encontro com você, porque quero te fazer uma proposta que já adianto não ser indecente e tampouco de casamento. - se apressa em dizer em tom brincalhão, que me faz sorrir imediatamente. Owen e seu bom humor!

— E se fizesse uma proposta dessas aí receberia um NÃO bem grande na cara, sabe disso, né? - rebato ainda sorrindo.

— É, eu sou bem consciente disto. - ele ri.

Talvez se não houvesse a Sarah na minha vida, eu até veria Owen com outros olhos que não os da amizade, já que de longe ele é um cara cativante e facilmente apaixonante. E tenho para mim, que também deve ser um ótimo namorado.

Mas há a minha desmazelada e cretina Srta. Gostosa, que tomou meu coração e meus olhos somente para si. Desde então, eu não consigo enxergar na minha vida mais ninguém além daquela diaba loira da minha noiva.

— Qual a sua proposta que não é indecente e nem de casamento, Owen Clark?

Ele me encara enigmático enquanto seus dedos da mão direita batem nos da mão esquerda.

Juro que eu não tenho a menor ideia de que proposta seria essa, mas confesso que aquela altura do campeonato já me corroía de curiosidade para saber logo o que ele quer me propor.

— É o seguinte, Juliette... - ele enfim se pronuncia e sem saber porquê, eu sinto um frio na barriga. - ... Há coisa de duas semanas recebi de um dos editores mais experientes da BoB, Collins Fox, seu pedido de demissão.

— Uau! - não consigo conter a minha surpresa.

Conheço aquele sujeito de nome e pelo que sai na mídia. Collins Fox é um grande nome no meio editorial pelo que sei. E, certamente, a sua saída da BoB é uma perda e tanto no casting de editores de lá.

- Pelo que sei ele trabalha na BoB há anos.

— De fato! Mas alegou que por motivos pessoais e de saúde precisará se mudar para a terra natal dele, o Texas, e com isso, não dará mais para seguir trabalhando na Bag of Books, o que é uma lástima, porque Collins é um nome e tanto.

- Nossa! Ele pra mim é um dos editores que entra fácil no meu top 5 de melhores.

- No seu e no de muitos outros do ramo editorial. - assinto com um sorriso. Collins é uma lenda. - E bom... A proposta que tenho, Juliette... É que, você assuma o cargo do Collins e seja a nova editora de ficção da BoB.

Oi?!

Ainda bem que aquela altura eu já tinha devolvido a xícara de café à mesa minutos antes de ouvir tal proposta, porque do contrário, meu senhor amado, a coitada da xícara de porcelana tinha caído da minha mão e se espatifado, provavelmente sobre a mesa mesmo, sujando de café a toalha branca e a minha roupa também.

Céus! Eu ouvi bem mesmo?!

Claro que ouviu, insolente! Tá surda é?

Grosseria!

— Você não bebeu Pinot Noir demais, bebeu? - balbucio para Owen com um sorriso nervoso.

— Não! - meu amigo nega com um sorriso brincalhão dançando em sua boca bem esculpida.

— Eu... assumindo o lugar de... Collins Fox na BoB? - a pergunta sai baixa, mas não o suficiente para que não seja ouvida por meu amigo.

— Exatamente!... Preciso de sangue jovem, inovador e arrojado para à editora. E você... Reuni tudo isso, Juliette.

— Reuno? - eu o encaro com descrença enquanto ainda vou digerindo sua proposta maluca me lançada segundos atrás.

Owen assente em resposta e noto certo ar de divertimento reluzir em seus olhos e ir se expandindo por seu rosto todo.

Bom se ele não bebeu tanto Pinot Noir quanto afirma, então fui eu quem ingeri mais do que devia da bebida e estou ouvindo coisa demais ali. Só pode!

Claro que não! Não seja idiota!

A intrometida da voz me ralha e aposto que se ela pudesse teria golpeado minha nuca com um leve tabefe também.

Teria mesmo pra deixar de ser uma insolente burra.

— Owen... Eu sou apenas uma assistente e você quer que eu assuma o posto de alguém como Collins, que têm uma bagagem enorme?

Por isso eu qualifico a proposta de maluca!

Quem aposta em uma assistente para assumir o cargo de alguém com uma experiência de anos luz à mim?

O sujeito à tua frente?!

Some da minha cabeça!

Não quero!

— Juliette... - a voz de Owen me tira do embate com a minha irritante voz da consciente  - Eu nunca te falei isso antes, mas... - meu amigo estende um de seus braços por cima da mesa e sua mão alcança a minha apertando-a de leve em um gesto de alento e confiança. - Quando nos conhecemos e conversamos de trabalho naquela noite no bar em Chicago, eu não vi em você uma simples assistente, enxerguei já uma pessoa pronta para ocupar um cargo de editora e com um potencial absurdo pra isso. - sorrio agradecida por sua opinião ao meu respeito. - E me perguntei como o pessoal da News Publications não via o mesmo e te mantinha ainda nesse cargo de assistente, quando você pode render mais que isso?... E eu quero te dar essa oportunidade de mostrar o que você pode render em um cargo de chefia, Juliette. Quero você como minha editora de ficção. O que me diz?

Jesus! O que eu digo?!

Sim, né insolente?!

Ah, meu Deus! Me deixa, intrometida!

Se eu ao menos conseguisse falar com  Owen depois da proposta feita, já era bom!

Mas só o que há da minha parte é o puro silêncio!

É como se eu tivesse desaprendido a falar. Tudo o que consigo fazer é abrir e fechar a boca como um peixe. Sair algum som ou balbuciar um A que seja, é difícil. Me encontro muda e impactada com o que ouço, tão impactada que mal respirar direito eu respiro naquela momento.

Eu, enfim, como uma editora de textos?

O cargo que eu sempre almejei e a oportunidade que sempre busquei, estão sendo me dada por Owen. E por dentro eu fico tão feliz e emocionada com aquilo! Mas a felicidade e a emoção se desfazem em milésimos de segundos e são ofuscadas pelo medo. Um medo tolo misturado com uma efêmera falta de confiança em mim mesma.

Sem mais nem menos, eu me sinto incapaz e amadora demais para um cargo de grandes responsabilidades como aquele.

Eu passarei a comandar e não ser mais comandada; tomarei decisões em vez de segui-las, pois não haverá mais Pocah. Isso, de certo modo, me assusta.

Será que estou preparada para esse passo e a responsabilidade toda que em mim será imposta?

Sinceramente, eu nunca fui de me menosprezar ou achar que não sou capaz de algo. Pelo contrário, sempre fui confiante em mim (no que se diz respeito à trabalho, vale frisar). Contudo, naquele momento, diante daquela proposta, bate a falta de confiança e o medo de não dar conta do recado, não corresponder as boas expectativas que vejo meu amigo depositar em mim.

Não quero frustrá-lo com o meu amadorismo e...

— Tic Tac... Estou esperando uma resposta, Juliette.

Sua fala me desperta e me faz ver que eu preciso dizer logo, dá uma resposta ou uma satisfação que seja ao meu amigo.

— Owen... Você me pegou desprevenida. Jamais imaginei que viria com uma proposta dessas.

— Eu sei. Mas o que me diz? Aceita?

Aceita, insolente, ou eu vou atazanar sua mente até a sua outra vida!

Respiro fundo e resolvo ignorar aquela intrometida só para variar.

— Eu... agradeço as palavras e elogios... Nossa! Fui ao céu e voltei. Mas... Não sei se estou preparada para dar conta de um cargo desses.

O medo fala por mim mais alto que minha autoconfiança, que resolve me abandonar montada em um cavalo branco.

— Não seja modesta, claro que você está. Inclusive sua chefe mesma afirmou isto.

Hã?!

Franzo a testa e abro a boca umas duas vezes sem emitir som algum (pela segunda vez ali).

Quer dizer que ele já falou disso com a Pocah antes mesmo de me fazer a proposta?

— Você falou com a minha chefe sobre essa proposta antes dessa nossa conversa?

— Sim. Eu precisava de referências suas para dar aos chefões quando sugeri seu nome. - ele já tinha sugerido meu nome ao cargo para seus superiores? Meu Deus! - E Viviane me ofereceu as melhores. Ela teceu elogios rasgados à você e sua sagacidade no trabalho. O discurso dela ao seu respeito convenceu meus superiores na mesma hora e só me fez ter mais certeza ainda de que trazer você para trabalhar na BoB é um grandíssimo acerto para a companhia. Segundo sua chefe, você está mais que preparada para "voar sozinha", Juliette.

Essa última parte de seu discurso me faz lembrar exatamente do papo de dias atrás com Pocah. Eis, aí, a explicação para o discurso da minha chefe sobre eu já estar pronta para seguir sozinha. Então, devo supor que naquela ocasião, Owen já tinha lhe contado sobre a proposta que me faria e por isso, Pocah me disse aquelas coisas todas, que no momento não entendi bem. Até cheguei a achar que minha chefe estaria fazendo aquele discurso todo, porque estava cogitando me demitir, mas quão errada eu estava. Viviane estava apenas dando o seu incentivo e aval para eu começar a seguir meu rumo sozinha. E, talvez até, já ensaiando seu provável discurso de despedida à mim caso eu aceite aquela proposta de emprego.

— Eu acredito em cada palavra e informação que a Viviane deu ao seu respeito, e principalmente, eu acredito em você, Juliette. E você também deve fazer o mesmo.

É, eu devo. E suas palavras de incentivo e confiança resgatam lá no fundo do meu ser, a minha confiança que havia me abandonado momentaneamente.

Eu sou capaz, sim, de assumir aquele posto que Owen me oferece na BoB! Os anos como assistente de uma editora excelente como Viviane tinham me credenciado para o cargo de editora. Minha chefe me ensinou tanta coisa, que todo esse ensinamento agora me servirá de bagagem. Tudo o que eu farei caso aceite a proposta de emprego na BoB não será coisa de outro mundo para mim, pois eu já fiz parecido ou visto Pocah fazer na NP.

— Eu sei que você está pronta, só tem medo. É normal. Eu também tive quando me fizeram a proposta de passar a ser editor-chefe da BoB. Na verdade deu um certo pavor, devo admitir... - ele faz uma careta e eu sorrio. - Mas as pessoas acreditavam na minha capacidade e principalmente em mim. E eu acredito em você e na sua capacidade. Tenho quase certeza de que mandará bem na BoB. Portanto, estou oficialmente te fazendo uma proposta de emprego, que espero sinceramente que você aceite. Vem trabalhar pra mim, Juliette?

Apesar dos meus temores que ainda persistem (bem menos agora do que quando ouvi pela primeira vez a proposta de Owen), eu serei uma tremenda louca se recusar uma proposta de emprego como essa. Eu sou capaz e esta é a minha chance de pôr em prática tudo o que aprendi com Pocah e começar a trilhar o meu próprio caminho sozinha como editora.

— Quando eu tenho que assumir o cargo? - digo após um longo e já duradouro silêncio, que jazia entre meu amigo-futuro-patrão e eu.

Assim que faço esse questionamento, instantaneamente vejo um sorriso gigantesco surgir em meu amigo. Ele então começa a me explicar que eu terei quinze dias para resolver minha situação na New Publications, pois este também é o prazo dado ao Collins para acertar os dele na BoB e deixar em dia todas as suas pendências. Ao final dessas duas semanas, eu já terei que me apresentar no RH da BoB com todos os meus documentos para efetuar minha contratação e no dia seguinte começar em minha nova função.

Prático assim? Parece que sim!

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