|Capítulo 19|




Gritos distantes pararam Beatrice e Joe. O cowboy agiu tão rápido que a garota nem mesmo percebeu quando seu corpo já estava em equilíbrio sobre suas pernas. Joe caminhava em sua  frente em passos largos e apressados.

- O que você está fazendo?- conseguiu falar, após respirar fundo e começar a segui-lo.

- Estão nos chamando, não escutou?- respondeu, indiferente.

Beatrice correu e colocou seu corpo frente ao dele.

- Quer falar direito comigo?- ela exigiu, colocando um dedo no peitoral dele. O cowboy acompanhou o movimento das mãos dela, da forma como seus cabelos ondulavam ao vento, como suas sobrancelhas se franziam e como seus olhos brilhavam. Não conseguiu não prender sua atenção nos lábios dela, novamente.

E ela claramente percebeu, soltando um sorriso.

- Nós precisamos...

- Um do outro.- Beatrice respondeu mais que rapidamente.- Essa é a terminação da sua frase.- E ela se aproximou de novo, erguendo seu corpo para beijá-lo. O cowboy foi forte ao recuar, embora parecesse que cada átomo de seu corpo lutasse contra sua vontade.

- Nós precisamos ir, estão nos chamando.- disse.- "essa é a terminação da frase".- repetiu, adentrando as árvores com milhares de pontinhos vermelhos.

Beatrice o seguiu, estupefata. Logo avistou, sobre um cavalo, o autor dos chamados. Era Declan.

- Ah, aí estão vocês.- Ele sorriu ao vê-los, mas logo percebeu que nenhum dos dois estava de bom humor.- Peter está te procurando. Ele disse que vai voltar na cidade hoje, e perguntou se já quer voltar com ele.

- Ela quer.- afirmou Joe.- Leve-a até a casa, por favor. Preciso resolver algumas coisas ainda aqui fora.

A garota respirou fundo.

- Eu posso voltar sozinha.- grunhiu.

- Beatrice, isso não é uma opção.- A frase de ordem vinda de Joe fez com que as pernas dela cambaleassem. Declan não sabia se deveria interferir não discussão que era claramente pessoal. Quando Bea se deu por vencida e aceitou subir no cavalo atrás de Declan, Joe forçou um sorriso.- Ótimo. Até outro dia.

E eles se foram.

Mas Beatrice não era nada previsível.

Se Joe esperava que ela fosse embora sem que o assunto que se iniciou nas macieiras tivessem um fim, ele estava muito enganado.

Bea disse ao pai que queria passar mais uma noite na fazenda Pejari.

- Não consigo entender.- falara Peter, antes de pegar as chaves do carro.

- Eu não terminei de conhecer toda a fazenda. Tem umas coisas...pendentes.- dissera ela.

Peter sorriu.

- Pendentes?- sua indignação era forçada. Ele conhecia bem a filha que tinha, e imaginava, por alto, que o fato de que ela iria ficar envolvia Joe. Quase com toda a certeza do mundo.

- É.- Bea não se explicou.

- Certo. Eu volto então daqui, talvez umas três horas. Fique à vontade.- concluiu Peter, se dirigindo até a porta.- Ah, já que você vai ficar e não está fazendo nada, pode lavar a louça de hoje, não pode?- Ele sabia que ela se sentiria ofendida e humilhada, mas Peter também sabia que falhara em algumas coisas na educação de Bea. Talvez dezesseis anos fosse tarde demais para tentar consertá-la, mas ele ainda tentaria. Afinal, era uma louça. Isso não ia mata-la, mesmo que fosse o que ela e a mãe acreditava. Quando Bea abriu a boca para argumentar, Peter continuou.- Que bom que você dá conta. Obrigado querida.- e saiu.

Beatrice bufou.

Olhou para a pia cheia de louças. Nunca havia feito isso na vida, mas não deveria ser tão difícil. A raiva que a consumia para poder cobrar explicações de Joe em breve superava todos seus traumas de patricinha.

Ela prendeu os cabelos em um coque e encarou mais uma vez a pia. Separou os utensílios de cozinha em copos, pratos, vasilhas, panelas e talheres.

- O que minha mãe diria me vendo fazer isso?- decidiu começar pelos copos.

Conseguiu fazer de seu castigo uma terapia. Enquanto ela lavava calmamente, pensou em muitas coisas sobre sua vida, e agora, enquanto enxaguava as vasilhas, ela cantava a música "sunflower".

- Pensei que tivesse ido embora.- Ela parou sua cantoria quando escutou a voz dele. Não esperava que seus pelos se eriçassem, e então endireitou a postura.

- Eu poderia ter ido, se não fosse o que você queria. Eu não cumpro ordens suas.- falou.

Joe colocou o chapéu sobre o balcão.

- Precisa de ajuda?

- Eu não sou tão incapaz, Joe. Obrigada.

Ainda sim, ele se prontificou em secar as louças. Por alguns longos segundos, ele a encarou.

- Você deve ter um motivo muito grande pra ter ficado. Está lavando louça, tem consciência disso?

A Coleman revirou os olhos.

- Algumas de suas impressões de mim são tão...fúteis.- Bea sabia que as impressões dele estavam certas. Ele não disse nada.

- Você quer falar sobre hoje?

Beatrice não esperava. Pensou que ele fosse fazer de tudo para fugir do assunto mas, no entanto, ele o iniciou.

Ela soltou a louça na pia e se virou para ele, com os braços cruzados.

- Por que você fugiu?

- Eu não fugi. Estavam nos chamando.

- Você não gostou?

Joe não esperava por essa. Abriu a boca e fechou.

- É claro que eu gostei! Eu precisava dizer?

Bea segurou um sorriso. Não, não precisava. O corpo dele já havia entregado os pontos.

- No entanto, você conseguiu estragar tudo.

- Nós dois sabemos que aquilo não devia ter acontecido.

- O quê?- Ela aumentou um pouco seu tom de voz. Depois, quando viu a reação dele, ela o baixou.- Como assim?

- Bea...- ele não se dava bem com as palavras quando estava nervoso.- Olhe pra nós dois. Você é a filha do meu patrão. Isso não devia ter acontecido.

- E o que isso tem a ver? – ela realmente parecia não entender.

- Eu sou mais velho que você.

- sete anos. Já beijei caras mais velhos que isso.- Ela falou como se não fosse nada. Joe arregalou os olhos. Talvez uma raiva tenha começado a crescer dentro dele nesse momento.

- Além de ser minha futura patroa, você ainda é uma patricinha de Columbus e eu apenas um cowboy. Isso nunca daria certo.

- Eu já disse que não vou trabalhar com a Pejari! E, que coisa, desde quando essas diferenças importam? Por acaso eu te pedi em casamento? Foi um beijo, Joe, um beijo! O que as mulheres precisam pra poder ficar com você? Uma carteirinha?

Joe deu de ombros, indignado com ela.

- Elas precisam de humanidade e um pouco de decência. Conhece?

- Tá me chamando de indecente?

- Você é uma marrenta, isso sim.

- E você é um bruto! – ele virou as costas e começou a andar em direção a porta.- Não, melhor, você é um covarde!

Joe parou de caminhar.

- Você me chamou de covarde?- aquilo pareceu realmente ofensivo. Bea engoliu em seco, mas ela estava mais ansiosa do que com medo.

- Sim. É nítido pra mim. Você está pensando no meu pai, e tem medo dele. Tem medo do que as pessoas vão falar também. – Ela cruzou os braços.- E nada me faz perder mais o interesse em algo do que o medo. Não sei se percebeu, Joe, mas eu não tenho medo de nada.

- Eu não tenho medo do seu pai. – Foi a única coisa que ele disse em meio as agressões verbais.

- Você tem sim. Você morre de medo dele, é por isso que me deu as costas mesmo querendo ficar. Ou então, você tem medo de ser verdadeiro demais, não é, Joe?- Ela se aproximou do cowboy.- Tem medo de me mostrar de novo o quanto você deseja isso, tanto como eu naquele bei....

Joe tapou a boca da garota quando escutou algo. Atrás dele, Marian adentrou a casa, mas ao perceber o clima tenso, ela se desculpou e saiu.

- Você já me deixou muito desnorteado desde que coloquei meus olhos em você pela primeira vez, Beatrice. Essa é a verdade. – Ele respirou fundo. – Mas eu não vou mais cair nesse seu joguinho...

- O meu jogo é só um, Joe. Que você está morrendo de medo de entrar, mas você quer, e vai entrar.- Ela sorriu, olhando sobre o ombro.- Nós dois sabemos que você pode rodar, rodar e fugir, que o que tem que ser vai ser. E quando você se cansar de perder tempo, vai parar bem aqui...- Ela mostrou sua palma direita.- Na minha mão.

Joe respirou fundo, e apertou com força a borda do balcão.

- Você é a pessoa mais arrogante e estúpida que eu já conheci. – E, com isso, ele saiu da cozinha, deixando Beatrice sozinha com seus pensamentos.

Após essa conversa nada pacífica, Bea retornou aos afazeres domésticos e Joe decidiu trabalhar pesado para livrar sua cabeça.

Algumas horas se passaram.

❀ •  ✄ • ❀

A noite já assombrava os morros mais distantes, e o astro rei, do lado oposto, deixava alguns raios laranjas escaparem entre as paisagens e beneficiava a visão daqueles que admiravam o pôr do sol.

Joe era um desses.

Estava sentado frente ao rio, onde as águas calmas corriam tranquilamente. Observava como o sol ia embora rápido. E depois seus pensamentos voltavam a ela, e ele sofria internamente de novo. Odiava o dia de hoje.

- Disse que eu sou a pessoa mais arrogante e estúpida que conheceu na vida. – O cowboy não esperava aquela presença, não no momento em que ele estava pensando justamente nisso. Ele também não sabia o quanto Beatrice ponderou em ir até ali. O quanto o observou de longe.- Mas tenho certeza que se você pensar direito, conheceu piores.

Joe esperou um pouco, e não a olhou. Continuou a observar o pôr do sol. Se perdesse um segundo, teria que esperar vinte e quatro horas para ver o espetáculo novamente.

- Desculpe.- pediu.- Eu não devia ter dito aquilo.

- Por que não devia? É o que você pensa. E tudo bem, estou acostumada, a coroa de ser insuportável é pesada, mas eu aguento.

Joe sorriu.

- Ainda sim, tenho certeza que não era o que eu queria dizer. Acontece que você é imprevisível, Bea.- seu tom de voz era calmo.- Você é inevitável. E isso me apavora. Eu nunca sei o que vai sair de você, e isso sim me assusta. Eu gosto de estar no controle. E você também. E somos muito orgulhosos...

Beatrice sorriu, e Joe se forçou a deixar de admirar o que assistia para vê-la sorrir. Outro espetáculo. Que sorte a dele.

- Não é engraçado, desculpa. – Ela se aproximou dele.- No que estava pensando antes de eu chegar?

Ele se demorou na resposta.

- Se vale a pena mesmo abrir mão do que eu quero pelo controle. Pela razão.- Ele se questionou. E então a admirou, por mais alguns segundos.- Eu não ganho nada resistindo a você.

Os olhos de Bea brilharam. Era isso que ela precisava escutar. Era isso que ela esperava desde o início. Vencer. Vencer algo que os dois sabiam que já estava vencido há tempos.

- E o que pretende fazer com essa informação, cowboy?

Joe virou seu corpo completamente para encará-la.

- Beatrice...Ninguém precisou me dizer mas eu sei exatamente como você é. E sei que no momento que você se cansar de mim, isso nunca vai acontecer de novo. Eu espero, do fundo do meu coração, que sua péssima personalidade não me permita me apaixonar por você. – Ele pareceu verdadeiro. Seus olhos verdes brilhavam com o reflexo do sol refletido na água que corria tão perto dos dois.- Eu não me perdoaria.

Beatrice sorriu de canto e se aproximou dele, jogando os cabelos para trás. Se ela teria dito algo, nunca saberemos. Joe não perdeu mais nenhum segundo, e puxou o queixo dela para si. Eles se beijaram, tentando manter o controle para que as coisas não se apavorassem como da última vez. O beijo era contido e eles aproveitavam entre sorrisos.

Só pararam quando um farol de carro iluminou seus rostos, e perceberam então que o céu já estava estrelado. Quanto tempo teriam ficado aos beijos?

Beatrice se levantou e Joe o fez em seguida, diante do carro de Dominic.

Não esperavam que Peter Coleman também fosse descer dele.

A garota tentou captar a reação de Joe ao vê-lo, mas, inesperadamente, ele não pareceu sem jeito ou envergonhado. Cumprimentou os dois homens com um "boa noite."

Dominic esperava que Peter dissesse algo sobre o que acabaram de ver. Mas Peter, para a surpresa de todos, não o fez.

- Dom!- Bea quebrou o clima correndo até Dominic.- Quanto tempo! Como vão as coisas?

- Oi baixinha.- respondeu o advogado e amigo de infância, abraçando Bea.- Você por aqui? Isso é novo.

- Joe, seu irmão disse algo sobre os preparativos da festa? Ele ficou encarregado de me passar as negociações finais...

- Espera aí...- pediu Bea, interrompendo.- que festa?

Os três se entreolharam.

- Vamos fazer um arraial.- explicou Peter brevemente.

- Venha, eu vou te explicar como funciona. – Dominic segurou as pequenas mãos de Bea, deixando Joe e Peter a sós.

Publicado em:22/09/17
Atualizado em: 23/01/2023

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top