| Capítulo 18|
Beatrice não demorou ao escolher suas roupas. Colocou quatro peças em uma mochila pequena e jogou nas costas, como se fosse fazer uma viagem de escoteira. Peter sorriu com a cena, vestido como sempre, sem mudar nada em seu típico traje. Pela primeira vez, Bea se questionou se algum dia veria seu pai usando calças jeans apertadas, camisas de flanela e botinas. A imagem pareceu bizarra em sua cabeça, já que Peter Coleman nunca se apresentou como menos do que um executivo.
No carro, o silêncio predominou por alguns minutos, até que o pai decidiu ligar o som. Começou a soar uma melodia de Frankie Valli.
- But if you feel like I feel
Please, let me know that is real...- Peter cantava mais para si, e então olhou para a filha.-You're just too good to be true...Can't take my eyes off you.- Ele acariciou o rosto dela levemente com o polegar direito, admirando secretamente a beleza de sua menina. Como amava Beatrice.
Os dois se entreolharam antes do refrão e então cantaram juntos: " I love you, baby
And if it's quite all right
I need you, baby
To warm the lonely nights
I love you, baby
Trust in me when I say!"
Os dois sorriram. Beatrice colocou os pés encostando no para-brisa do carro. Percebeu que estavam saindo de Columbus quando as casas começaram a se resumir em pequenos barracos distantes e não agrupados. Conseguia enxergar ao longe pequenas montanhas, mas seu pensamento ficou perdido em algumas lembranças que a música de Frankie Valli lhe proporcionou.
- Toda vez que escutávamos essa música quando eu era pequena, você me dizia que dançava com a mamãe.- começou, trazendo a atenção de Peter para a conversa. Ele engoliu em seco, e de alguma forma seu sorriso se desfez.- Vocês dançavam no sótão da casa do vovô Haster, assim que Arthur nasceu.- Ela pensou um pouco nas palavras.- Por que você não disse dessa vez?
Peter se demorou.
- Todas as histórias que vivi com a sua mãe, você já sabe.- e ele não explicou muito. Pareceu não gostar do assunto quando seus dedos tocaram o volume do som e depois, hesitante, Peter trocou a música.
Bea se lembrou o quanto era urgente conversar com Arthur sobre esse assunto que a assombrava há meses. Ela e o irmão tinham que fazer algo para impulsionar o casamento de Peter e Judith. Pensava em algo como uma segunda lua de mel, no Caribe. Traria de volta toda a paixão que eles tinham, e talvez o clima em casa até melhorasse. Se fosse para realmente acreditar na paixão entre duas pessoas, sua melhor opção seria confiar na história de seus pais. Quase vinte anos de casados. Se o amor realmente existe e tudo suporta, ela adoraria apostar suas fichas de cupido em ver seus pais felizes novamente.
A paisagem verdejante atraia sua atenção. Não costumava fazer viagens de carro e, sempre que via as planícies verdes e amarelas, estava dentro de um avião, nas nuvens. Os eucaliptos pareciam não ter fim.
- Eu devia ter baixado um episódio da minha série na Netflix.- comentou, colocando um dos fones de ouvido.
Peter sorriu.
- Estamos quase chegando. Não leva mais do que vinte minutos. A fazenda em que vamos ficar é a Sede dos negócios, não poderia ser muito longe de Columbus. - Explicou seu pai.- A maioria dos moradores conseguem fazer esse trajeto todo dia, entre a fazenda e a cidade.
Bea refletiu a palavra moradores.
Como ainda não havia se atentado ao fato de que veria Joe de novo?
Ela se empolgou, demonstrando a ansiedade nos músculos que não estavam mais relaxados. Era tão divertido pensar em estar com Joe de novo que Bea não pôde esconder um sorriso.
Os dois chegaram à fazenda por volta das cinco da tarde.
Beatrice pisou na terra satisfeita por ter colocado botas, embora se preocupasse em como as limparia depois. Fechou a porta do carro e sentiu o cheiro fresco. O vento soprou em seu rosto como se desse boas vindas, e ela puxou todo o ar dos pulmões. Conseguiu sorrir. Estar ali não parecia o fim do mundo, como Judith sempre a convencera.
Peter a conduziu até a casa que se destacava no centro. Bea nunca havia visto nada parecido.
Ao adentrar a casa, Beatrice não conseguiu dizer uma única palavra. As paredes e os móveis rústicos em tom madeira a deixava sem reação. Era totalmente diferente de toda a delicadeza da cobertura Coleman, repleta de vidros, cristais e finas camadas de branco. O ambiente da casa Pejari parecia quente, as luzes amarelas despendidas no teto de madeira davam essa impressão. Bea caminhou até a escada onde galhos entrelaçados conduziam os degraus para o alto.
- Uau.- expressou, e Peter sorriu, colocando as chaves sobre o balcão da cozinha.- Então esse é seu refúgio?
- A casa é sua.- O pai tirou da geladeira uma jarra com água e serviu dois copos.- Encontre um quarto livre lá em cima para você dormir essa noite, tem muitos. Nós nos vemos no jantar.- garantiu.
- Espera aí. - Bea pediu, dando o primeiro passo na escada.- Você não vai me apresentar a fazenda?
Peter contraiu o lábio inferior.
- Eu disse que precisava trabalhar, filha.- sua voz estava mais baixa. Ele se sentiu culpado.- Mas, hã...podemos fazer isso depois do jantar se você preferir...
- Não.- Bea interrompeu, erguendo as mãos.- Tudo que eu não preciso é ter que andar no mato durante a noite.- assim que disse, ela se arrependeu, percebendo o quão rude fora com seu pai.- Vou subir.
Peter assentiu, abaixando a cabeça e olhando através da janela da cozinha, os campos.
Não foi difícil para Bea encontrar um quarto vazio. Ela havia gostado da visão que aquele lhe proporcionava, conseguindo ver melhor o rio estreito que cortava a paisagem.
Jogou a pequena mochila em uma poltrona e se deitou preguiçosamente na cama. Poderia considerar aquilo um retiro espiritual?
Não foi difícil também descobrir a senha do WiFi, se tratando de Peter. Logo, sem perceber, Beatrice perdera quatro horas em uma de suas séries favoritas.
Tomou banho e achou que era o momento certo de vestir seu conjunto de moletom. A noite na fazenda, a temperatura parecia cair dois graus comparado ao centro de Columbus, onde morava.
Ela desceu as escadas e encontrou três pessoas preparando o jantar. Uma delas era Peter.
- Não sabia que cozinhava.- declarou, se encostando no balcão e terminando de pentear os cabelos molhados com os dedos.
Peter tampou uma das panelas.
- Aqui está ela.- disse aos outros.- Declan, Marian, essa é Beatrice.- eles a cumprimentaram com um aperto de mão.- filha, esses são os gêmeos Harlow.
- Você gosta de peixe?- perguntou a mulher loira de beleza desconcertante, tirando de um forno uma forma, onde o aroma invadiu todos ali presentes.
- Sou vegetariana.- ela lançou um olhar repreensivo para o pai.- Não se esqueceu, não é?
- Não.- Mas suas mãos pareceram desesperadas para encontrar algo no armário ao lado. Bea bufou e se sentou de costas para o pai. Foi então que o viu.
- Jordan?- cumprimentou.- Como vai?
Ele não moveu um músculo na poltrona em que se encontrava, com pouca luz, apenas inclinou a cabeça o suficiente para olhar Beatrice nos olhos.
- Vou bem, e você?
Ela assentiu com a cabeça, sem perceber que varria a sala com os olhos em busca de outra pessoa. O assunto entre Peter, Marian e Declan continuava, mas Bea não tinha nenhum interesse nele. Não conseguiu segurar mais do que dez minutos.
- E seu irmão? Não o vi hoje.- ela lançou. Jordan pareceu indiferente.
- Está na cidade.
- Ah.- e a sua noite pareceu ter acabado ali.
O jantar estava bom, e Peter se saíra muito bem ao improvisar um rápido quiche vegetariano para sua filha. Bea parecia incrivelmente satisfeita.
A noite se tornou um pouco mais complicada. Bea não conseguiu pregar os olhos, por mais que tentasse. O vento que batia violentamente na janela, o cantarolar dos grilos, o mugir das vacas e o cacarejar das galinhas se tornou uma ópera insuportável para seus ouvidos. Ela tentou por algum tempo dormir ouvindo música, mas a ideia se foi rapidamente.
Seus pensamentos a inquietaram por longas horas. Se colocou de pé as cinco da manhã, assim que percebeu que em breve o sol iluminaria o quarto.
Beatrice caminhou até a cozinha, se arrastando, sentindo-se confusa e com sono. Teria sido melhor se tivesse ficado para a festa de Brian?
A resposta estava em sua frente.
Não. Não seria melhor.
- Bom dia.- Beatrice falou, quase sorridente, ao encontrar na cozinha a figura de um homem que reconheceria de longe, mesmo com sono ou no escuro. Ele se virou para olhá-la. Tinha nas mãos um copo de leite que aparentemente estava muito quente.
- Bo...bom dia?- A voz de Joe falhou e sua expressão era impagável. Ele pigarreou.- bom dia.- disse firme.- Não sabia que você estava aqui.
- Cheguei ontem. E você dormiu fora.- observou.
- Na verdade não.- ele bebericou o leite.- Mas quando cheguei todos já estavam dormindo. Aceita?- ele perguntou, pegando um copo. Bea assentiu e ele a serviu.
- Por que está acordado tão cedo?
Joe sorriu.
- Esse é o horário que nós estamos de pé por aqui. Tem muito a se fazer na fazenda.
- Você consegue um tempo para me apresentar a fazenda, hoje?- Beatrice esperava que sua expressão fosse tão boa que Joe não poderia negar. Ele não a encarou por muito tempo.
- Tá. Mais tarde você me procura? Eu te mostro as coisas.- E ele saiu, parecendo apressado.
Bea sorriu e apertou o copo de leite entre os dedos.
Quando terminou, conseguiu quatro horas de sono tranquilas. Era como se seu corpo estivesse apenas a espera de Joe, durante toda a noite, para acalmar suas ânsias.
Ela se levantou disposta. Optou por vestir uma calça preta e a mesma bota marrom de ontem. Escolheu um cropped vermelho para compor o look e teve dúvidas sobre usar ou não uma jaqueta jeans. Ela escolheu que sim.
Saiu para encarar a fazenda pela primeira vez. Se arriscou a andar a procura de Joe, mas se irritou nos primeiros minutos quando uma galinha pareceu surtar e o seu bater de asas sujou a calça de Bea. Ela nem mesmo havia se aproximado dos ovos daquela galinha. Estava furiosa.
Encontrou Joe, talvez, cinco minutos depois. Ele se destacava em cima de um cavalo negro e tocava as vacas para dentro de um cercado. Quando terminou esse serviço, viu Beatrice encostada em uma porteira, bufando. Ele riu assim que entendeu o que tinha acontecido, observando a calça de Bea cheia de terra e os cabelos com algumas gramíneas.
- Pelo visto, você já foi bem recebida.
- Haha. Por onde vamos começar?
Joe avaliou a paisagem por alguns segundos. Desceu do cavalo e depositou um beijo carinhoso nele, acariciando a crina.
- Suba.- Ele disse a ela. Bea o olhou e riu.
- Tá brincando comigo?
- Não. Você é muito molenga, não vai conseguir percorrer toda a fazenda a pé.
Ela ponderou a ideia e cruzou os braços.
- Eu nunca cavalguei, Joe. Vou morrer aí em cima.
Ele não segurou a risada.
- Ok, vou buscar um cavalo mais calmo pra você. Pode ser?
- Você não está entendendo.- Bea jogou os cabelos castanhos por trás dos ombros.- Eu não vou subir.
- Não confia em mim?- Joe estendeu a mão. Ela não conseguiu dizer não. Deu um passo à frente mas então parou.
- Só se você vier comigo.
O cowboy respirou fundo.
- É claro que vou contigo. Vou guiar o cavalo.
Ela sorriu.
- Você vai em cima, comigo.
O silêncio se estendeu. Podia se escutar as máquinas Pejari trabalhando nas lavouras. O cavalo parecia impaciente com a demora.
Joe observou como Beatrice gostava de dar ordens, e se não estivesse se acostumando com a filha do patrão, estaria discutindo com ela agora mesmo. Ele respirou fundo e cedeu. Começou a montar.
- Não, não.- A garota correu até ele.- Eu vou na frente. Você não vai me deixar cair, entendeu?
Joe quase bufou. Seus olhos verdes penetraram os dela.
- Sim senhora.- ironizou, estendendo a mão.- sobe logo antes que eu desista.
Os dois não tiveram mais problemas. Joe estava na traseira do cavalo, mas se limitava a conduzir o animal sem invadir o espaço de sua turista, logo a frente. Bea, pelo contrário, não se importava em, de vez em quando, sentir o corpo do outro encostando no seu. O perfume que já estava em sua mente ainda era o mesmo. A voz de Joe soava como uma canção bem próxima de seu ouvido, e Bea se perguntou em como não havia vivido nada parecido antes. Ele falava sobre os negócios, a colheita, os produtos. Vez ou outra, Beatrice comentava sobre, mas preferia ser a ouvinte. Viu as incríveis máquinas Pejari trabalharem pela primeira vez. Eram gigantes e precisas. Ela ficou de fato encantada.
- Em pensar que esse império inteiro pertence a Peter.- comentou Bea, enquanto Joe descia do cavalo, em frente ao imenso vale de macieiras. Quando viu a dificuldade de Bea ao descer, pediu permissão para ajuda-la, e então a puxou pela cintura, colocando em segurança no chão.
- E pertence a você.- o cowboy afirmou.- Você vai herdar todo esse paraíso.
Bea pensou um pouco. O vento soprou seus cabelos para perto de Joe, que também pôde avaliar melhor o perfume dela. Ele decidiu que gostou daquele momento mais do que merecia.
- Hã...acho que não. Não tenho interesse em cuidar da Pejari. Nem Arthur, acredito eu.
Joe pareceu incrédulo.
- Arthur vai ser um grande jogador. E você? O que vai fazer no futuro?
Nunca perguntaram isso diretamente a ela.
- Vou modelar.-Ela não tinha certeza.- Como minha mãe.- tentou convencer a si mesma.
- E o que farão com a Pejari?
Bea se permitiu sentar sob uma macieira, ainda encarando o horizonte. Joe fez o mesmo.
- É pra isso que vocês estão aqui. Você, Jordan, os gêmeos Harlow. Pessoas de confiança do Peter. A esperança dele.- ela parecia verdadeiramente convicta daquilo.
Joe não disse nada. Bea alcançou uma das maçãs avermelhadas que estavam sobre ela. Mordeu e ofereceu para ele, que recusou.
Após alguns minutos de conversa alternada com o silêncio ,Beatrice se levantou.
- Você conhece este lugar desde criança, então?
- Como a palma da minha mão.- confirmou Joe.
- Portanto...- ela puxou o ar e depois sorriu.- Venha me pegar!
Beatrice disparou a correr entre as macieiras, e Joe se levantou para olhá-la, incrédulo que fariam aquilo. Estava desacreditado na proposta da Coleman. Mas ela falava sério. Conseguiu vê-la correndo ao longe.
- Você entende que vai perder, não é?- Ele gritou, andando lentamente entre as árvores.
Joe a viu correr e acelerou o passo. Foram três vezes que Bea foi pega, mas ela decidiu que dessa vez, daria um perdido no cowboy.
Enquanto Joe avançava entre as árvores, ela regredia no caminho. Tinha certeza que seria hilário comemorar sua vitória sobre ele.
Após alguns minutos de silêncio, ela se encostou em um tronco, ofegante.
Se assustou quando Joe apareceu atrás dela gritando "te peguei!"
Ele até tentou evitar a queda mas, com o susto, Bea foi ao chão. Por tentar ajudá-la, Joe também caiu com ela.
Quando viram a situação, os dois começaram a gargalhar.
O homem conseguiu não machucá-la, e mesmo com o corpo sobre o dela, ele segurava o peso do corpo com os cotovelos apoiados no chão. Quando pararam de rir, perceberam o quão próximos estavam um do outro.
Joe sentiu o hálito fresco dela em seu rosto, e Beatrice conseguiu sentir o coração dele batendo em seu peito. Estavam muito próximos e Bea sabia que não teria outra oportunidade para beijá-lo. Precisava tê-lo agora mesmo.
Joe tomou a iniciativa de se levantar, e ,pela corrente que pendia em seu pescoço, Beatrice o puxou para si.
Seus lábios se tocaram, e o corpo de Joe correspondeu ao ato mais que imediatamente. O beijo se tornou em poucos segundos selvagem e caloroso, e Joe precisou trocar as posições, não aguentando mais segurar seu peso para não machucá-la, e pôs Beatrice em cima, na posição de conduta. O beijo foi tomando cada vez mais intensidade, e Bea não controlava mais suas mãos que passeavam pelos cabelos do cowboy, enquanto ele puxava a cintura dela. Beatrice entendeu, ao perder o fôlego e precisar se soltar contra a sua vontade, que seu desejo ardente foi cessado de maneira melhor do que ela esperava. Tudo parecia fazer sentido. Ela não queria que esse momento acabasse. Nunca.
Quando se afastaram, Bea sorriu, mas Joe não o fez. Ela se inclinou para beijá-lo novamente. Os olhos de Joe pareciam hesitar, mas sua boca já estava muito perto dela de novo. Seu corpo não o obedecia.
Até que escutaram o chamado ao longe.
Publicado em:21/09/2017
Atualizado em: 23/01/2023
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