Capítulo 23 - O primeiro suspeito

Só por hoje não quero mais te ver
Só por hoje não vou tomar minha dose de você
Cansei de chorar feridas que não se fecham
Não se curam (não)
E essa abstinência uma hora vai passar
(Na sua estante — Pitty)

🍂

Do que é que você está falando, senhorita Simons? — a ansiedade visível em Scott.

— Ela te disso algo, Hannah? — indaguei, também entrando em um estado de aflição eminente.

Anthony apenas observava tudo com atenção. Um fio vermelho de sangue escorria no canto inferior de sua boca, por conta do soco que levara de scott, enquanto ele tentada, sem sucesso, estancá-lo.

— Bem, ela não, mas outra pessoa sim — a pequena moça começou a sua narrativa — Henry ficou extremamente confiante depois do que ocorreu entre os senhores e Sarah, aqui no escritório. Bem, por ela ter desistido dos dois, especificamente.

— Henry? — Scott uniu as sobrancelhas em dúvida — O auxiliar de Montgomery? Esse Henry?

Hannah assentiu.

— E o que esse cara tem haver com Sarah? — foi a vez de Anthony perguntar — Pelo que sei, eles são apenas amigos.

A mulher suspirou pesadamente, como se precisasse se livrar de um fardo que carregava consigo a muito tempo.

— Henry sempre foi apaixonado por Sarah — confessou ela — Isso desde que ela entrou na empresa, mas nunca teve coragem para se declarar, sentia-se inferior a ela.

Como Sarah nunca foi capaz de notar esse interesse? Talvez eu seja uma pessoa bastante perceptiva quando o assunto são homens, mas cá entre nós, se você trabalha ao lado de alguém todos os dias, fica fácil saber quando o sentimento vai além da amizade. Não é?

— Mas independente disso — Scott me fez despertar do pensamento inapropriado para a situação — Porque você acha que Henry é o culpado pelo desaparecimento de Sarah?

— Ele já anda estranho à algum tempo — Hannah foi até a mesa do colega e em seguida voltou com alguns papéis em mãos — Vejam! Ele desenha ela, escreve poemas bastante melodramáticos e ontem, antes do almoço, ele me confidenciou que havia tomado coragem e diria a ela como se sente.

Os rascunhos eram feitos de uma maneira bem simples, mas mesmo assim conseguiam capturar a essência de Sarah. Seu sorriso sempre tão espontâneo, o olhar vívido e intenso, seu cabelo longo e loiro caindo feito cascata sobre os ombros delicados e femininos. Eram ótimos e bastante detalhados, embora feitos com materiais rudimentares.

Os textos eram bastante confusos, falavam basicamente sobre o sentimento de rejeição que ela o fazia passar, sobre como ele gostaria de ter coragem para falar que não desejava ser apenas seu amigo e o quanto sua própria aparência, pouco atrativa, lhe fazia perder o ânimo.

Dava pra notar, em cada página vista, o quanto aquele homem sofria por reprimir o que sentia de fato por Sarah e nos fazia ver que a teoria de Hannah não era absurda e sim bastante viável.

— E cadê o Henry? — perguntei, devolvendo os papéis para as mãos de Hannah.

— Ele não veio trabalhar hoje. Henry não é de faltar, sempre foi um funcionário exemplar, chega cedo e nem que esteja doente deixa de vir ao escritório — ela os pegou, abraçando contra seu próprio corpo e a culpa que sentia por ter escondido aquilo tudo de Sarah era notória — Isso que é o mais estranho e que me faz ter a desconfiança de que Sarah pode estar com ele.

— Pode me fornecer o endereço dele, senhorita Simons? — Anthony pediu.

— Claro! — Hannah nos deu as costas e seguiu até sua mesa, pegando um bloco de notas e passando o endereço para o papel.

Me voltei para Anthony e pleiteei — Posso ir com você?

Ele assentiu.

— Também irei! — anunciou Scott com determinação e o olhar de quem jamais seria convencido do contrário.

— Ah, mas não vai mesmo — bradou o outro homem ao meu lado — Eu sou policial.

— E eu sou o namorado!

— Isso é o que você diz!

— Da próxima vez eu filmo, se te faz sentir melhor ver com os próprios olhos.

— Chega! — vociferei — Será que dá para os merdas aí calarem a boca, pararem de se alfinetar como duas putas e pensarem no bem da Sarah, só por um momento?

O silêncio se fez presente, meus berros pareciam ter surtido efeito e eles agora me olhavam com cara de cachorro que caiu da mudança. Emma Mckay sabe como emudecer os homens, até mesmo sem estar nua.

— Agora escutem — prossegui — Anthony e eu vamos atrás do Henry e você Scott, fica aqui e nos mantém informados caso a Sarah apareça.

O homem de rosto contorcido e olhar contrariado, acabou por aceitar meu acordo. No fundo ele sabia que Anthony seria bem mais útil no caso de Henry se recusar a nos receber, ou caso houvesse algum tipo de problema que requeresse ajuda policial.

Saí do escritório ao lado de Anthony e entrei em sua viatura, deixando meu carro no estacionamento. Era preferível que chegássemos juntos ao local, ao invés dele ser o primeiro, já que eu conhecia Henry e poderia deixar o diálogo um pouco mais informal.

Já na estrada, o silêncio incômodo prevalecia dentro do carro e eu confesso que odeio não ter o que dizer — O que houve com vocês? — arrisquei perguntar, apenas para quebrar o gelo — Sarah saiu de casa decida, era você quem ela queria, então o que foi que deu errado?

Ele puxou o ar profundamente, suspirando de maneira cansada — Minha ex mulher estava em meu apartamento e estragou tudo, mas eu juro, Emma — suas mãos envolveram o volante com uma força surreal que eu pude ouvir os estalos de suas juntas — Judith armou tudo, pra parecer que havíamos dormindo juntos, mas estávamos apenas conversando sobre assuntos relacionados ao trabalho.

— Anthony, você ama minha irmã?

Ele pensou por um momento — Sarah é uma mulher incrível, linda e dedicada a família, da maneira que sempre imaginei.

— Não foi isso que perguntei — seus olhos não eram capazes de mentir e nesse momento eles dançavam sobre mim — Olha, eu não quero me meter na vida dela, mas Scott, embora tenha sido um grande imbecil em alguns momentos, a ama e faria o que fosse preciso para vê-la bem.

— Eu também faria qualquer coisa pela Sarah — estacionou em frente ao local que o GPS nos indicava, retirando o cinto e virando-se no assento para olhar para mim — Mas quando disse isso a ela, não houve reciprocidade. Entende? Prefiro não rotular mais o que sinto, só quero achá-la e deixar que faça sua escolha.

Havia verdade em suas palavras e embora eu fosse team Scott até o fim, Anthony me parecia ser um bom homem e se dependesse de seus defensores, Sarah logo seria encontrada.

Descemos do carro e caminhamos sobre um extenso gramado, passando por um jardim repleto de roseiras e chegando até a entrada da residência. Era um local de extremo bom gosto, a fachada da casa tinha um ar retrô bem bonito e as janelas abertas nos indicavam que havia alguém alí.

Tocamos a campainha e aguardamos impacientes do lado de fora. Quando a porta finalmente se abriu, fomos recepcionados por um Henry bastante abatido, vestindo roupas amassadas, a barba por fazer e os cabelo desgrenhado de alguém que acabara de acordar. Seu olhar surpreso nos deu a impressão de que ele não fazia ideia do que queríamos em sua casa.

— Posso ajudar?

— Podemos entrar pra conversar um segundo, Henry? — falei, tentando soar o mais amistosa possível.

Ele nos deu espaço para adentrarmos e trancou a porta atrás de si. Nós indicou um sofá estilo vintage, dois lugares, em linho azul, se acomodando em uma poltrona no mesmo conceito, à nossa frente.

A casa era grande, toda mobiliada no estilo arcaico e de extremo bom gosto. Nas paredes haviam placas e quatros que remetiam ao passado e a harmonia entre os móveis e a decoração era quase que impecável.

— Henry, queremos saber onde está a Sarah — Anthony quebrou o silêncio e  acabou com minha análise crítica ao local — Sabemos o que sente por ela, então é melhor começar a falar.

Péssima escolha de palavras. Anthony jogou o homem, bastante assustado ainda mais para a defensiva e se eu não fizesse algo para amenizar aquele interrogatório policial, talvez não obtivéssemos nenhuma resposta.

— Fique calmo, Henry — toquei levemente em sua perna — O que o policial Anthony quis dizer é que Hannah nos contou sobre seus sentimentos por Sarah e embora eu saiba bem o quão constrangedora pode ser essa situação, preciso que me diga se sabe onde ela pode estar.

Onde ela pode estar? — ele repetiu minhas palavras, como se tentasse assimilá-las — O que aconteceu com ela?

— Ela sumiu — Anthony voltou a falar, agora mais calmo e entendendo onde eu queria chegar com toda minha falácia — Desde ontem à noite e a senhorita Simons nos deu o seu endereço, disse que talvez você pudesse saber de algo.

Seus olhos vermelhos já pediam permissão para chorar e Henry não estava conseguindo controlar a ânsia de esconder o que sentia.

— Ela me disse não! — exclamou ele — Eu me declarei, disse que a amava, que não podia mais ser apenas o amigo que ouvia e dava conselhos, mas ela disse não.

— E quando foi isso? — indaguei.

— Ontem. Eu a vi entrar na sala do senhor King depois do expediente e fiquei aguardando no estacionamento — explicou-se — Eu estava quase desistindo quando ela saiu. Me aproximei e disse tudo o que estava me corroendo durante tanto tempo.

Notei os punhos de Anthony se fecharem e uma veia pulsando em seu pescoço. Ele estava em estado de fúria e eu não podia permitir que perdesse o controle, não antes de saber como aquele história terminava.

— E depois? — troquei um olhar cúmplice com o policial amigo e o fiz manter-se calado.

— Ela me disse que éramos amigos, que não podia ser minha, pois seu coração já tinha um dono — uma lágrima rolou por sua face e ele não à impediu — O maldito King. Tem todas as mulheres que deseja, enquanto eu vou morrer sozinho nessa droga de casa velha.

Eu podia sentir o sofrimento que o afligia, a dor de um coração partido é, muitas vezes, esmagadora. Não sei como, nem o porquê, mas podia sentir sinceridade no que Henry dizia e compadecida, apenas deixei que Anthony tomasse a decisão final quanto a ele.

Quando desviei o olhar de Henry para Anthony, notei que o semblante derrotado era praticamente o mesmo. Os dois sabiam que haviam perdido a mulher que amavam e a cena era aterradora.

O que minha irmã tem que enfeitiça tanto os homens? Ela é linda, isso é inegável, mas não faz questão nenhuma de ser sensual, de chamar a atenção deles, ela simplesmente é o que é e embora o que estou dizendo possa soar invejoso de minha parte, eu a admiro muito. É notada e amada sem fazer esforço algum.

— Depois que se declarou e ela o rejeitou, o que aconteceu? — Anthony indagou.

— Ela disse que precisava ir, liberar Emma e cuidar da filha — esclareceu — Nos despedimos, ela pegou o carro e saiu.

— Porque não foi trabalhar?

Henry esboçou um certo aborrecimento diante da pergunta e respondeu em tom ríspido — Não está vendo meu estado? Pareço alguém apto para trabalhar?

— Ei, veja como fala — o policial levantou-se, indignado com a forma áspera que fora tratado.

Também me ergui do sofá, parando de pé ao lado de Anthony.

— Desculpe, policial — Henry pôs as mãos sobre o rosto e arrasado, soluçava em meio a um choro descontrolado — Eu sou fraco, não tenho ninguém e o amor, mesmo platônico por Sarah era o que me mantinha de pé, agora tudo está em ruínas.

Olhei para Anthony e entendemos que estávamos lidando com uma pessoa completamente desequilibrada, que podia muito bem estar nos enganando e escondendo Sarah em algum quarto escuro daquela enorme casa, mas diante do que víamos, não seria a melhorar hora para revistar a casa e sem um mandato, era provável que ele nem nos permitisse fazer.

Deixamos a casa com a certeza de que Henry era um suspeito em potencial, mas não podíamos nos ater apenas a isso, a busca continuaria e eu não desistiria até encontrar minha irmã.

Voltamos para o prédio onde ficava localizado o escritório de Scott para que eu pudesse pegar meu carro e deixá-lo à par de tudo que havíamos descoberto. Anthony decidiu me esperar no andar térreo dessa vez.

Já passava das duas horas da tarde e eu precisava muito almoçar, mas ao invés de ir até algum restaurante como fazia habitualmente, me despedi de Scott, em seguida de Anthony e decidi ir para casa de Sarah. Minha intuição dizia que lá eu encontraria algo que pudesse me levar a uma pista.

Enquanto dirigia em alta velocidade, ultrapassando carros e motos com uma agilidade típica minha, lembrei-me de Sarah e de todas as broncas que levava dela por correr demais no trânsito. Sorri sem nem ao menos notar e diminuí a velocidade gradativamente, obedecendo as leis e pedindo a Deus que ela estivesse bem.

Deixei o carro em frente a casa e logo que me aproximei da varanda, reparei que sobre o capacho havia um telefone celular. Me aproximei e abaixei para pegá-lo, no mesmo instante em que o aparelho tocou:

Temi atender, pois sabia que haviam grandes chances de ser o algoz de Sarah, mas a coragem era maior que o medo — Alô!

Pude ouvir alguns ruídos baixos interferindo na linha e em seguida uma voz modificada eletronicamente se fez presente do outro lado:

— Pare de procurar! A Sarah é minha, está com seu verdadeiro amor e não vai mais voltar.

Em seguida a ligação caiu.

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top