Capítulo 1
Ano 455 depois de Barkov...
A chuva se alongava por três dias seguidos e isso era, três dias seguidos sem uma luz do sol decente pela janela ou pelo menos o calor aquecido do dia. Acsa não gostava de aniversários e gostava menos ainda do seu. O castelo real era frio e escuro naquela época do ano. Tudo lá fora estava mais cinza que o normal, a vegetação de árvores sem uma folha sequer, estava menos verde. As nuvens pesadas no céu eram de uma próxima chuva, apenas para lembrá-los de onde vinham e para onde iriam. Acsa sabia no fundo que Ilya, aquela ilha grande no meio do mar seria engolida e levada pela água mais cedo ou mais tarde.
O reflexo no espelho não era dos melhores. A penteadeira de madeira avermelhada, tinha esculturas de anjos e cavalos alados, deixando um ar delicado, assim as peças e caixas de jóias estavam abertas na sua frente, enquanto a princesa procurava uma que lhe servisse melhor, nas devidas circunstâncias, entre um colar de pérolas e um de pedras e cristais azuis, talvez melhores por realçar os azuis dos olhos, que não herdara nem do pai, muito menos da mãe.
Aos vinte e dois anos, Acsa sabia como reger um reino, falar sobre política, filosofia e se possível e necessário, governar e liderar um exercito, mas nada disso lhe era útil quando ficava mais dentro das paredes do castelo ou dentro da biblioteca, do que realmente fazendo seu papel como princesa.
Ela queria poder dizer que fosse por seu pai amá-la demais e por isso não queria que se metesse em possíveis situações de perigo lá fora, mas ela sabia que isso estava muito longe de ser verdade. A anos não tinha uma conversa com seu progenitor por mais de seis minutos. Nem mesmo aos jantares, isso, quando ele se disponha a jantar com ela. Nem nos bailes, em que ela era restrita de descer no primeiro piso do salão, apenas observando do andar de cima com a companhia de duas damas de companhias e uma criada.
Sabia também que seria exatamente assim aquele dia em específico. Seu aniversário e coincidentemente, o dia da morte de sua mãe.
Acsa se levantou com certa prontidão e agilidade, as paredes frias do castelo estavam aquecidas pelos canos de ferro com água fervente, mas o inverno parecia pior aquele ano. Ela vestiu o casaco acolchoado, revestido em pele e couro. Ela precisava pedir algo para o pai antes de descer aquelas escadas, mesmo que fosse para ficar entre a corte apenas por alguns minutos.
A porta pesada de Carvalho negro se abriu e as criadas que ficavam como cães de guarda na frente dos aposentos da princesa se alarmaram, em posições perfeitas como estátuas de mármore brilhante em seus uniformes rosados.
A mais nova delas, Lizzie, tinha pouco mais que treze anos e era a mais quieta, mas a que mais fazia companhia para a princesa. Parou em sua frente com os braços para trás, a pele morena e os cabelos tão longos que escorregava pelas costas da garota como uma cascata de rio escuro como carvão.
— Minha senhora, precisa de algo?
O olha preocupado para Acsa como se ela estivesse buscando algum ferimento ou se algo estivesse errado com as vestes, o quarto ou seja lá o que fosse.
Acsa acenou com a cabeça, dando passos para fora do corredor e sendo seguida pelas três mulheres logo atrás.
— Apenas tenho que falar com meu pai por um minuto, Lizzie — Disse segurando a barra do vestido com as mãos enluvadas em seda.— Será rápido.
Lizzie apressou mais os passos, ficando tão próxima da princesa que seus braços quase tocaram uns nos outros.
Acsa olhou para baixo, encarando os olhos esverdeados da garota.
— O rei não poderá recebê-la agora, minha senhora.
Acsa esperou que ela se explicasse com o pronunciamento repentino mas ela não o fez, então parou de andar, se virando para a garota.
— Como não?
— Ele está em uma reunião com o conselho, minha senhora.— A garota quase gaguejou se não tivesse falado rápido demais.
As damas atrás dela, pararam juntamente, em uma pequena fileira, esperando pela princesa.
— O conselho só vem daqui uns quinze dias, o que Walter faz aqui?
A garota engoliu seco dando de ombros como se elaborasse uma desculpa, ou pelo menos, pensasse no que dizer para a princesa.
— Não sei, minha senhora.— Declarou num sussurro.
Walter Kadrahan era o conselheiro do rei mais novo que já vira. Não o achava o mais inteligente do mundo, mas gostava do jeito que o rapaz falava. Filho do capitão da guarda, Walter parecia mostrar interesse nela, mas nunca trocaram muitas palavras. Tudo que sabiam um do outro era o que o rei lhe dizia sobre sua filha e ela sobre o que via das palestras que ele costumava dar.
Acsa era proibida de participar das reuniões do conselho e já chegou a ficar de castigo por ter espionado uma quando tinha dez anos, escutando por trás da porta com um copo no ouvido.
Algo estava acontecendo, pois o conselho só se reunia de vinte e vinte dias para debater as relações sociais do reino e sobre o que acontece por fora da ilha. E se eles estavam reunidos em uma tarde no dia de seu aniversário, algo que não era de bom grado estava acontecendo.
Seu lado de garota travessa com dez anos quis se morder de curiosidade, enquanto seu coração de governante quis saber o que teria acontecido ao ponto de Walter deixar o palácio para vir até o castelo para um reunião com o rei.
Ela olhou para as criadas depois começou a caminhar novamente.
— Senhora, acho que deveria voltar para os aposentos e terminar de se arrumar — Lizzie disse tentando acompanhar os passos de Acsa.— Pouco mais os convidados irão chegar e a senhora terá que recebê-los.
— Por Barkov, Lizzie, se eu ficar naquele salão por mais de vinte minutos já será algo novo — Disse.— Preciso saber o que está acontecendo.
Lizzie fez uma cara de espanto se segurando para não segurar a princesa pelos braços e arrastá-la para o quarto. Sabia que o rei ficaria furioso com ela por desobedecer às regras e ficaria mais furioso ainda por suas damas de companhia não tentarem impedir de fazer.
— Mas minha senhora, o rei...
— Fiquem aqui, vou lá sozinha — Acsa disse se virando para as damas quando chegou no corredor central. As jovens se olharam como se pensassem em como fariam, mas ela se afastou e voltou a andar.
Lizzie olhou para as colegas com uma sobrancelha arqueada e os ombros erguidos. Não seguiram ela, mas ficaram no corredor caso ouvissem algo.
Acsa se aproximou da porta com desenhos talhados na madeira brilhante e se encostou o suficiente apenas para abri-la um pouco, deixando a pequena fresta entre o feixe da fechadura, observando pelo espaço, o homem de pele negra, porte forte é muito mais alto que o rei, em suas vestes brancas. As botas estavam sujas de lama, pois o carpete azul estava com marcas dos passos que ele dava enquanto andava de um lado para o outro. O rei estava sentado na poltrona atrás da mesa que tinha o mapa de Ilya talhado. A cara cansada e os cabelos brancos eram sinal de preocupação, ela só precisava saber o motivo delas.
Encostou o ouvido para escutar qualquer que fosse os cochichos dos dois, se agachando no chão até seus joelhos tocaram o piso.
— Isso é uma ameaça gravíssima, meu rei, — Walter começou.— Teslia está levando essa briga de adolescentes longe demais.
— Acha que devo tomar alguma decisão? — Escutou a voz rouca do pai.
— Imediatamente.— Walter disse rápido.
Um breve silêncio entre ambos, alguns passos de Walter pelo cômodo. Silêncio.
— Acho que o conde Alexey está desesperado pois conseguimos estabelecer em Suzano como nossa terra — A voz do rei foi grave.— Ele está desesperado, creio que essa carta foi apenas para nos assustar...Vê como reagiríamos.
Uma risada de Walter mas ele não pareceu fazer aquele som porque achou graça do que o rei havia dito.
— Senhor, a vida de sua filha foi posta em risco nessa carta, o senhor está no dever de pedir a cabeça do conde por isso.— Acsa piscou ao ouvir o pronunciamento sobre si.
— É justamente isso que ele espera que façamos, e nós não faremos isso, Sr.Kadrahan.
— Vossa alteza eu acho que...
— Sr. Kadrahan vamos perguntar o que nossa convidada acha — O rei disse interrompendo Walter, um frio correu pela espinha dela.— Se quer ouvir a conversa, Acsa, sugiro que entre. Já lhe disse que é feio ouvir a conversa dos outros por trás da porta.
Ela engoliu seco, fechando os olhos por alguns segundo até, finalmente abrir a porta com o que sobrara de sua dignidade.
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