Capítulo VI
Mikaela Evans⭐
Saímos os três da sala de pesquisa e encontramos Sarah a caminho do estacionamento. Após nossa breve conversa ficou ainda mais claro para mim que entre eles havia mais do que o coleguismo profissional. Ela denotava respeito e admiração pelo Capitão Hawkeye e nutria um misto de ciúmes e prudência pelo agente Foxie.
O rapaz a olhava e sorria. Será que ela não percebia ou era do tipo que não assumia um relacionamento e nem deixava livre? Seja o que for, eu entendia. O cuidado dos irmãos comigo parecia prematuro e devia incomodá-la.
O agente mais novo mal disfarçava seu interesse romântico pela jovem que com muito esforço resistiu às suas investidas e entrou no próprio carro, um possante Jeep Cherokee azul noturno e deu a partida. Brian seguiu o veículo pela avenida até que a moça tomou uma direção diferente da nossa e só depois acelerou o SUV que nos levava para casa.
- Porque não a acompanhou, Foxie?
Ethan perguntou quando já estávamos dentro do nosso carro.
- Ela foi para a casa do pai e ele não me quer rondando sua filha.
- Uma hora ele vai baixar a guarda.
- Se fosse só isso - Brian virou-se para mim que estava no banco traseiro - Sarah é filha do Santoro.
Não me senti no direito de perguntar qual o motivo da oposição ao rapaz e apesar de ser novidade o parentesco entre a agente e o comandante, permaneci calada. Além de estar cansada, sentia o incômodo de forçar minha mente a lembrar do rosto do Faizel, algo que tentei esquecer nos últimos tempos.
O resto do caminho ficamos em silêncio, Brian dirigiu em alta velocidade e em poucos minutos chegamos de volta ao condomínio.
Quando entramos na casa, os deixei na sala e fui para o quarto. Sentia o início de uma dor de cabeça e precisava ficar sozinha por alguns instantes.
Após leves batidas, o rosto sorridente do Brian apareceu na porta entreaberta.
- Posso entrar?
- Claro.
- Estou indo embora, mas deixei uma lasanha no forno.
- Como você ainda consegue pensar em comida? - perguntei espantada.
- Eu sei que o Cap fica mais calmo de barriga cheia e você precisa comer também.
O rapaz tinha um sorriso afetuoso e era impossível não sorrir de volta.
- Não vai ficar para o jantar?
- Tenho outros planos.
Foxie passou o resto do corpo pela porta entreaberta e entrou no quarto, vindo até onde eu estava.
- Você ficou mal ao lembrar do Faizel.
- Nem precisou ser muito sagaz para perceber, né?
- Deu pra sentir que foi bastante desagradável lembrar dele.
- É como pensar em um bicho pençonhento pronto para te atacar.
- Foca no resultado da missão. Se conseguirmos uma identificação positiva, pegamos esse fdp por você e pelo Ethan.
- Vou fazer tudo que estiver ao meu alcance. Mas se não der certo...
- O Ethan e eu vamos encontrar outro modo de te livrar disso. Confia.
Suspirei sentido o peso de uma decisão que parecia acertada, mas se tornava cada vez mais difícil eu me livrar daquela situação.
- Vamos cuidar de você, Mikah.
- Eu agradeço pelo que estão fazendo.
- Você vai ficar legal?
- Vou sim. E vocês?
- Esse é o nosso trabalho.
- E a Sarah?
- É uma história complicada. Outra hora te conto.
Sem que eu esperasse, Brian beijou o topo da minha cabeça como se eu fosse sua irmã menor e me arrancou outro sorriso.
- Fui. Vê se come e faz o Ethan comer também.
Algum tempo depois e após tomar um banho, vencida pela fome que poderia ser o motivo do latejar nas minhas têmporas, decidi sair em busca da lasanha.
A porta do quarto do Ethan estava fechada, então fui direto para a cozinha.
Olhei para o forno e a massa parecia bem apetitosa. Liguei o timer para requentar a travessa e abri o armário à procura de pratos e copos. Me deparei com uma garrafa de vinho tinto, então troquei os copos por taças. Arrumei a mesa colocando os talheres e guardanapos sobre um jogo americano. Não custava fazer uma delicadeza já que seria hóspede por algum tempo, mesmo que não tenha sido eu a cozinhar o jantar.
Andei até o corredor e parei na frente do quarto do Capitão tentando ouvir algo, mas não percebi nenhum movimento. Imaginei se ele já dormia e fiquei na dúvida se devia chamá-lo. Ameacei umas três vezes, antes de me decidir e finalmente bater na madeira. A porta se abriu abruptamente.
- Você ainda está aqui, Brian?!!
Dei alguns passos para trás, surpreendida pela visão. Ethan estava vestindo a camisa e antes que cobrisse todo o tórax, deu para vislumbrar seu abdômen esculpido. Tentei não olhar e gaguejei, entregando minha perturbação.
- Des...desculpe.
- Tudo bem? Precisa de alguma coisa?
Perguntou e passou a mão no cabelo para arrumá-lo.
- Na verdade vim te chamar para jantar. - respondi com um sorriso tímido - o Brian deixou uma lasanha...
O silêncio que se seguiu foi constrangedor. Ele parecia estudar as consequências de um simples jantar a dois.
- Parece bem apetitosa e você precisa comer. - insisti.
Ele deu um passo para fora do quarto, encurtando o espaço entre nós.
- É uma boa ideia.
Caminhamos até sala e eu segui para a cozinha. Ethan olhou a arrumação da mesa e viu a garrafa ainda fechada.
- Encontrei esse vinho e acho que super combina.
- É um bom vinho para acompanhar.
Ele abriu e encheu as taças, enquanto eu retirava do forno a travessa, trazendo-a para a mesa com luvas.
- Quer ajuda?
- Eu sirvo, me dá seu prato.
Cortei um pedaço para servi-lo e outro para mim. O cheiro do queijo derretido se espalhou, abrindo nosso apetite.
- Obrigado.
- Eu usei todo meu talento para aquecer. - brinquei.
- Tenho certeza que você tem muitos outros talentos.
Levei um pedaço da lasanha à boca e mastiguei, fingindo que não havia entendido a observação. Nada impedia de ser apenas um comentário inocente, somente minha imaginação me fazia pensar ao contrário.
- Saber esquentar uma marmita pode fazer toda diferença quando você está em um lugar e não fala uma palavra da língua local.
- Aconteceu com você?
- Minha primeira viagem não teve nem um pouco de glamour. Morei em uma quitinete com mais sete meninas, tão inexperientes quanto eu.
- Como foi parar nessa situação?
Ethan recostou na cadeira com a taça na mão. Estava realmente interessado, então continuei.
- Era um empresário de modelos tirano, com oito promessas de sucesso. Muitas desistiram, nunca sequer haviam saído de casa e se viram sozinhas num país distante, sem entender o idioma e com muito frio.
- Obviamente você não desistiu.
- Eu tinha muita determinação. Nunca desisto fácil.
Ele deu um sorriso charmoso e eu levei a taça à minha boca, sorvendo um gole do vinho maravilhoso.
- Eu tinha uma meta a conquistar. Não queria depender de ninguém.
- E seus pais?
- Eles faleceram muito cedo.
- Você tem mais algum familiar?
- Não, ninguém. - respondi rápido.
Sempre atento às minhas reações, ele me olhava direto nos olhos e eu às vezes desviava os meus por me sentir profundamente avaliada e não era somente o meu exterior. Ethan me observava como um predador que analisa sua presa antes de atacar.
- Você tem sorte de ter o Brian.
Mudei o foco da conversa para evitar mais perguntas sobre mim.
- Eu sei.
- Ele fala de você como um herói no qual ele se espelha.
- É muita responsabilidade inspirar alguém.
- Ele não tá errado. Você não é do tipo que decepciona.
Eu brincava com o vinho no fundo da taça para não encará-lo. Ethan apoiou os braços na mesa e se inclinou na minha direção, tentando desvendar minha expressão.
- Você acha isso?
- Tenho certeza. Voce não deixa a desejar em nada.
As orbes celestes não desviavam de mim e senti o rubor tomar a minha face, felizmente poderia culpar o vinho por isso e por minhas palavras dúbias também.
- E esse codinome, Hawkeye? "Olhar de Falcão".
- Me chamavam assim durante meu treinamento nas Forças Especiais.
- Você não erra o alvo.
- Não costumo errar até porque normalmente, vidas dependem do meu acerto.
- Você não desiste mesmo quando parece impossível. Como agora com Kassian e Faizel.
- Verdade. Não vou desistir até pegar o Baraki. Ele me deve uma.
- Vingança não é o melhor dos motivos, pelo menos não sempre.
- Ele não só me feriu como a vários que estavam comigo e continua matando inocentes. É mais do que vingança, é justiça.
Ele levantou a taça e o líquido vermelho como sangue refletiu em seus olhos.
- E você? Quais foram os seus motivos para entregar o seu marido?
Aquele olhar inquisitivo estava de volta sobre mim e como uma presa assustada, tentei fugir.
- Está tarde.
Me levantei abruptamente, decidida a por um fim naquela conversa. Na intenção de desfazer a mesa do jantar, peguei a travessa e esbarrei na taça que ainda continha um pouco de vinho. O líquido derramou, salpicando a frente da camisa branca que ele vestia. Ethan se ergueu rápido da cadeira e ficamos frente a frente. Sem pensar, peguei o guardanapo para secar seu tórax.
- Que desastre, desculpa. - falei ao ver a coloração rosada que se espalhou pela camisa.
- Não tem problema, foi acidente.
- Vinho mancha, melhor tirar antes que seque.
Ele continuou de pé, olhando para mim.
- Tem que pôr na água logo ou vai virar um tie-dye.
Ele esboçou um sorriso, mas continuou indeciso.
- Capitão, algum problema em me dar a camisa?
- Não...
Finalmente a retirou pela cabeça e em seguida os braços. Estiquei a mão e ele me entregou.
- Prometo te dar uma nova, mas você fica muito bem sem ela.
Ele ficou calado, enquanto meus olhos desciam pelo seu corpo. Não pude evitar, Ethan era uma obra de arte de músculos esculpidos, o peito largo e o abdômen definido.
Então ele se afastou com passos largos, cruzando a sala e sumindo no corredor. Enquanto eu fiquei lá, sozinha com um sorriso bobo nos lábios. Me virei quando consegui tomar posse do meu corpo novamente e abri a torneira de água quente deixando cair sobre a roupa.
Após ter tudo organizado, voltei para o meu quarto. A luz escapava por debaixo da porta do dele, mas o silêncio era total. Me deitei, esperando que o cansaço me fizesse dormir rápido e profundamente.
As lembranças vieram como um pesadelo. Acordei sobressaltada e com a boca seca pelo terror de reviver cenas do meu passado. Fui até o banheiro e lavei o rosto, mas precisava de água para aplacar a minha sede. Andei até a cozinha sem acender nenhuma lâmpada, deixando a luz da geladeira iluminar o ambiente. Somente quando me virei para retornar, vi Ethan parado com os braços cruzados na sala. O copo quase escapou da minha mão e me engasguei com a água.
- Meodeos... você... quase me... matou...
Tentei falar e recuperar o fôlego, o que não deu muito certo. Ele se aproximou em meu socorro.
- Desculpe, não queria te assustar.
- Eu tive um pesadelo... e acordei...
- Shiiii... - fez sinal para que eu me calasse - Se acalme. Pesadelo. Insônia. Sei como é.
Me apoiei na pia e de repente seu corpo enorme estava na minha frente, tão próximo que eu podia sentir seu perfume e sua respiração sobre mim. Meu coração estava prestes a sair do meu peito que subia e descia sem controle. Minha face ardia pela expectativa do seu toque e a sensação se espalhou velozmente pelo meu corpo.
Sua mão subiu para o meu rosto e retirou gotas dágua que escorreram pelo meu queixo e respingaram pelo pescoço. Ethan olhava fixamente para minha boca e acariciou meu lábio com o polegar. Ainda havia um resquício do corte, resultado do tapa desferido por Kassian em seu momento de ira. Um estranho tremor percorreu meu corpo quando ele se deteve olhando para aquilo. Me senti envergonhada como se eu fosse culpada por ser agredida por um canalha como meu ex marido. Como me deixei envolver por alguém tão diferente do Ethan que se colocou em minha defesa sem pensar nas consequências para si próprio? Não sei.
Então, me afastei e contornei o seu corpo, saindo da cozinha sem dizer nada. Estava confusa e tomei uma decisão da qual me arrependi, assim que entrei no meu quarto e fechei a porta, onde fiquei encostada por alguns minutos até ouvir seus passos no corredor. Silêncio. Minha mão na maçaneta. Dúvida. Passos. Uma porta se fechando.
Eu estava perdendo o controle das minhas emoções como uma adolescente.
- Mikaela... O que você tá fazendo? - me censurei.
Eu no fundo contava com que Kassian fosse morto durante a invasão. Esperava por sua resistência a qualquer ordem que recebesse. Só não contava com a atitude heróica do Hawkeye. Poucas pessoas se colocam na frente de alguém prestes a levar um tiro e foi o que ele fez, sem nem mesmo me conhecer. Sua atitude inesperada para evitar que eu fosse ferida ou morta, mostrou que ele seria meu salva vidas se algo mais desse errado.
Kassian desconfiar que eu o havia traído me colocava no topo da sua lista de vítimas. Ao contrário para o Capitão, eu seria sua prioridade. Ele era rígido em suas decisões, seguia estritamente seu código de honra e seu senso de justiça o cegava muitas vezes. Já que ele próprio deu a chance do árabe ser solto, sentia-se impelido a evitar mais danos e que nesse cenário, eu fosse a vítima. Ethan era o único meio de me manter segura e longe do meu marido assassino.
Só consegui dormir quando já estava amanhecendo. Acordei tarde e a casa estava vazia. Olhei o quarto do Ethan e vi a cama perfeitamente arrumada.
Na cozinha, encontrei um bilhete pregado na geladeira.
"Dormiu demais? Tudo bem, eu te perdôo por não me dar bom dia, porém perdeu minha companhia na refeição mais importante, depois do almoço e do jantar kkkkkk
PS: A geladeira tá cheia e o armário também. Não coma tudo. Foxie ;)"
- Droga, Ethan. - murmurei frustrada.
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