curativo boiola - parte 2
Por um momento o moreno pensou que deus estava lhe castigando, qualquer deus que existisse. Talvez o deus dos estudos? Bom, não importa, estava sendo castigado por qualquer entidade que existisse naquele momento.
Quando tomou consciência do que estava acontecendo, esbravejou um "só pode ser brincadeira", empurrando as mãos do Bang de sua cintura. Quem ele pensa que é para tocá-lo? Changbin quis enfiar a tiara que usava no olho dele, aqueles mesmos olhos âmbar que cintilavam, e depois arrancá-los cruelmente. Podia fazer isso agora e ninguém desconfiaria dele.
— foi mal. — ele repetiu, sua voz era levemente rouca e aveludada, seu sotaque australiano escondido por trás do coreano.
Changbin deu um passo para trás, tropeçando em seja lá o quê, novamente foi segurado por Christopher. Não é hora de dar síndrome de Lee Minho! Gritou mentalmente, segurando nos bíceps do australiano, quando este lhe puxou para perto do seu corpo. Uma cena de clichê hétero, era isso que se passava na sua cabeça. Quis morrer naquele recinto, deslizar que nem picolé derretido entre o piso e sumir. O castanho o manteve perto do seu corpo por um tempo, pouco, mas suficiente para Changbin identificar o perfume que ele usará — ele era bom em identificar cheiros —, algo forte e levemente doce: cheiro de homem que não presta.
Changbin tratou de se afastar dele outra vez, empurrando aquela bendita saia para seu devido lugar, estava ficando irritado com aquilo. Quando ergueu o olhar, Christopher estava descaradamente encarando suas pernas. Changbin estreitou os olhos e o encarou como quem dizia "vai levar pra casa?" e ele desviou o olhar tímido, suas orelhas estavam levemente vermelhas, talvez até rosadas, o moreno não conseguia ver bem no meio de toda aquela luz piscante.
Não sabia dizer que área era aquela e nem onde seus amigos estavam, ficou na pontinha do pé para tentar ver por cima da multidão, mas neste momento ser baixinho havia entrada para sua lista de ódio. Frustrado e com dor de cabeça, colocou as mãos no quadril e olhou ao redor mais uma vez, tentando ignorar a presença do bang. Meio de soslaio, Changbin encarou a fantasia do outro: ele usará uma calça justa preta e uma camisa de gola alta na mesma cor, fora a capa com capuz liso com um símbolo que o seo não conseguia identificar. O que ele era? Um bruxo emo do Harry Potter?
Deu de ombros, afinal, não se importava.
Continuou sua busca sem sair do lugar pela cabeleira lilás ou os chifres de Felix, mas nada aparecia em seu campo de visão. Estava ficando cada vez mais frustrado e irritado, irritado pelo Bang que ainda estava por perto, encostado numa parede de frente para o seo, bebendo algo num copo vermelho descartável, seus olhos como de águias mirando na figura baixa de short-saia como se ele fosse um ratinho, uma presa no meio do deserto, ou seja lá o quê, Changbin era ruim com metáforas.
Quanto mais os minutos se estendiam e nem sinal da dupla de palermas, o moreno decidiu dar o fora. Eles que se virem! Gritou, empurrando as pessoas para os lados a fim de passar. Estava ficando sem ar a cada novo passo — se aquilo pudesse se chamar de passo —, sufocado pelos corpos dos outros e sem ter ninguém para lhe puxar do meio daquilo, seus olhos estavam turvos e embaçados, tudo parecia tão apertado e sem iluminação. Iria mesmo desmaiar? É sério? No meio de um bando de gente? Teve um momento que ele deu um soco na costela de alguém sem querer para conseguir tirá-la da frente. Às vezes, nem sempre as palavras funcionam, ou os gritos.
Sentiu a mão de alguém puxar a sua e lhe arrancar do meio da muvuca de pessoas suadas e sujas. Não lembrava que a pista de dança era tão extensa, ou talvez ele nem mesmo estava conseguindo dar um passo certo. De qualquer maneira, se deixou levar pela mão que o salvou da sua morte. Mas logo reconheceu aqueles anéis, os dedos pálidos e calejados, a capa preta que arrastava sutilmente no chão e quis deixar que a multidão engolisse ele de uma vez e o levasse para os confins do submundo.
Agora fora do casarão, changbin tomava fôlego, tinha passado outra vez perto dos maconheiros que sopravam fumaça na cara dos outros, o punho do moreno coçou para quebrar cada dente dentro da boca daquele cara até seu rosto ficar irreconhecível. Christopher estava ao seu lado, a mão pousada sobre suas costas levemente inclinadas para frente delicadamente, Changbin respirava com dificuldade e manteve as mãos nos joelhos e a cabeça baixa. Parecia que ia morrer, e realmente ia se não conseguisse respirar pelos próximos cinco segundos.
— vem por aqui. — Christopher tirou a capa que usava e jogou por cima dos ombros do moreno, o guiando pelos cotovelos até uma área afastada daquele lugar barulhento. Estava mais frio, talvez já fosse madrugada, a cabeça de Changbin estava bagunçada demais e seus pés apenas seguiam o Bang, mesmo que em algum lugar do seu subconsciente sóbrio gritasse para ele parar imediatamente, e correr para longe do australiano de perfume doce. Homens com esse tipo de perfume são um perigo! Era isso que sua mente gritava, mas ele estava muito tonto para conseguir ouvir.
Christopher o guiou até umas mesas de mármore perto de um dos prédios do refeitório, indicando para o moreno se sentar nos banquinhos. O assento estava frio, as coxas de Changbin tremeram ao sentir o contato do mármore sob a pele quente, o moreno agarrou mais a capa e cobriu as pernas, se encolhendo para se proteger do frio que fizera. O australiano se sentou na sua frente, seus olhos âmbar caíram sobre a figura do moreno encolhida, ele deu um sorrisinho que Changbin não conseguia identificar, ele tinha muitos tipos de sorriso, disso o seo sabia, e odiava todos eles.
— você está melhor? — sua expressão se tornará preocupada, seus ombros se moveram para frente e ele colocou as mãos sobre o mármore liso, enroscando os dedos uns dos outros em cima da mesa. Changbin virou o rosto, olhar para ele significava ter dores de estômago, e faltava um triz pro moreno descer o murro naquele rosto perfeito. — vou entender seu silêncio como um sim.
Como dito antes, changbin era bom em ignorar as pessoas e assim continuou. Passou segundos, minutos, talvez horas? Bom, horas são muito. Mas minutos sim, e vários. Changbin se manteve de rosto virado, a capa que cobria seu corpo exalava o perfume de cafajeste do Bang, o baixinho coçou o nariz, mas até suas mãos estavam com o cheiro dele. Changbin iria enlouquecer.
— acho que a gente nunca se apresentou corretamente. — mais uma risadinha, Changbin estava pronto para cravar suas unhas pintadas de preto na cara lisa e pálida do outro. — sou Christopher Bang, ou só Chan, meus amigos me chamam assim. — Changbin poderia passar uma lista completa de quem era o Bang: aluno exemplar, queridinho de todos, cursava música e era o membro mais novo do time de futebol a se tornar capitão. Mas isso não significa que o seo fosse obcecado pelo outro, óbvio que não! Tinha amigos fofoqueiros e gostava de se manter a par de tudo, apenas isso, nada mais. — e você é?
O motivo da sua morte, era isso que queria dizer, mas se conteve. Não seria de bom tom.
— Changbin. Seo Changbin. — o encarou por meros segundos, mas o suficiente para vê-lo sorrir, e quase ter um colapso de ódio. Dentes brancos e perfeitamente alinhados, bochechas um tanto cheias e lábios rosados naturalmente, queria quebrar cada músculo facial dele. Mas como dito anteriormente, não seria de bom tom. Sua bolsa de estudos valia mais, repetia isso mentalmente, como um mantra.
Christopher estendeu a mão, para cumprimentá-lo. O moreno encarou seus dedos longos e calejados, com alguns anéis e até um pouco vermelhos, talvez machucados. Queria estar com sua maletinha de curativos agora, odiava ver machucados assim, expostos, e grudar curativos era divertido. Tudo bem que fazia aquilo só porque andava com um desastre de cabelos lilás, mas pegou gosto pela coisa e também seria médico pediatra, então andar com curativos de bichinhos fofos iria — em algum momento — se tornar algo comum.
Mexeu nos bolsinhos pequenos do short-saia, por dentro da saia, para ser mais específico, e de lá tirou um curativo azul de ursos. Porque colocou aquilo no bolso? Nem mesmo sabia, mas se iria sair com Minho, iria precisar em algum momento. Só tinha um, mas era suficiente. Changbin se esticou sobre a mesa, hesitando antes de levar suas mãos até a do Bang que estava parada no meio do caminho, em um puxão pegou a mão de dedos machucados do australiano e abriu o curativo, fixando ele em cima do machucado do dedo indicador, acima do segundo ossinho e do anel esquisito que ele usava. Recolheu suas próprias mãos e se virou de lado, puxando a capa para cobrir metade do rosto. Não era hora de se mostrar frágil ao inimigo, seo! Gritou seu subconsciente, mesmo sabendo que o ato de segundos atrás tinha sido a demonstração de empatia mais ridícula do mundo.
Agora teria um grandalhão do time de futebol lhe enchendo o saco por andar com curativos. Porque tinha que ser tão burro às vezes?
— obrigado. — sua voz tinha tanta doçura que o moreno quis vomitar. Changbin o olhou de lado, ele encarava seu dedo coberto pelo curativo boiola, e sorria.
— não me agradeça. — disse. — só não gosto de ver machucados. — mexeu os ombros, se virando mais até ficar totalmente de costas para o Bang.
— você vai ser médico, não é? Caso não for, você seria um médico foda. — changbin tentou não sorrir, e tentou muito, mas foi inevitável. Gostava de ser elogiado, e gostava mais ainda quando falavam sobre sua futura profissão.
— a sua fantasia. — virou-se cauteloso. — o que exatamente você é?
— era pra ser um mago. — Changbin apertou as sobrancelhas, as juntando.
— você sabe o que é um mago? Por que você tá mais pra bruxo emo diferentão do Harry Potter. Merlin estaria decepcionado se visse essa porcaria.
— você é cruel. — Changbin deu de ombros. — e eu não sabia o que vestir, nem planejava estar aqui hoje. Meus amigos me arrastaram para cá, dizendo que precisávamos fazer boas lembranças.
Aquela frase… Changbin piscou várias vezes até sua cabeça fazer eureca mais uma vez.
— Felix! — rangeu os dentes ao dizer o nome da cobra com quem dividia dormitório. Christopher o encarou sem entender. — aquela puta loira, nossa, eu vou matar ele! — esbravejou irritado, dando um soco inaudível na mesa lisa de mármore. — quem te obrigou a vir?
— hyunjin e jisung.
— o hwang e o han? — ele balançou a cabeça em concordância. — ah mas eu vou bater tanto na cara do Felix. — disse, dando uma risada medonha. — eu vou torcer aquele pescoço de galinha que ele tem e fazer uma canja! — nem mesmo citou o outro Lee porque sabia que Minho era lerdo demais para pensar em algo tão meticuloso. Christopher se manteve sem entender nada do que o outro bradava irritado. — acho que armaram pra gente ou foi muita coincidência seu amigo ter dito a mesma coisa que o meu. Mas eu não acredito em consciências. — seus olhos caíram em Christopher aterrizado com os fatos postos na mesa. — eu perco a minha bolsa de estudos mas não perco a oportunidade de surrar aquela cara de princesa do Yongbok, ah mas nem morto!
— você tá chateado? — seu rosto virou bruscamente para o Bang. Chateado? Com certeza não. Puto, muito puto, isso sim. Changbin estava possesso. — digo, pela gente tá aqui, agora, juntos.
Mais uma vez estreitou os olhos na direção do castanho, sem entender o que ele queria dizer. Juntos. O que aquilo significava? Changbin fez um ato de bondade e ele acha que já eram amiguinhos? Ele teria que rebolar muito a bunda pra virar no mínimo lacaio do menor.
— não tô entendendo.
— é que… — ele coçou a nuca, nervoso, talvez. — …tipo, estamos aqui, conversando. E sei lá, você é um cara legal. — elogio repentino, o moreno desconfiou, erguendo uma sobrancelha. Ele prosseguiu. — e eu sempre quis conversar com você. Seu estilo! Ele é muito foda, tipo, o jeito que você veste. Eu também gosto de preto. — aquilo era meio nítido. — se foi uma consciência ou não, acho que não me importo muito, por que isso me deu a oportunidade de conversar com você, nem que seja um pouco. — e lá estava mais um sorriso, desta vez pequeno, que crescia dos cantos, erguendo os lábios lentamente e parava no meio do caminho. Era charmoso. E parecia que ele sabia que Changbin estava facinado, porque se manteve daquele jeito por segundos, os olhos redondos e negros do menor nem mesmo estavam piscando.
Changbin estava fodido. Porque aquela dor no estômago não era dor de barriga, nem mesmo chegava perto daquilo, era como borboletas dançantes e aquilo NUNCA era um bom sinal. O moreno cresceu ao redor de livros de romance e de auto-ajuda, sabia que sua vida iria desandar como um trem fora dos trilhos. Estava perdidinho da Silva.
Changbin tossiu, coçando a orelha, tentando fazer aquela sensação de revoar sumir do seu estômago, mas não estava funcionando. Era quente e até bom, mas não, não podia gostar. Aquilo significava gostar dele, e Changbin o odiava. Odiava seu sorriso, seu cabelo castanho brilhante, seus cílios finos, seus olhos âmbar, o jeito esquisito que seus braços ficam ao se erguerem para cima, os músculos muito bem desenvolvidos que se estendiam por seus braços, dos seus ombros largos, do seu cheiro doce e forte. Odiava tudo nele! Não, não, não, aquilo era como assinar sua sentença de morte e era muito novo para morrer afogado em sentimentos. Se sentia num clichê adolescente e quis se estapear para afastar toda aquela confusão da cabeça e do seu estômago.
— Changbin?
— por favor, fica calado.
— eu fiz algo errado? Eu disse algo que te chateou?
— eu tô no meio de uma crise aqui, então você poderia calar essa sua boca antes que eu faça algo que provavelmente vou me arrepender e chorar pelo resto da noite, seria de grande ajuda. — Christopher ficou de pé, preocupado, andando até um Changbin totalmente fora da casinha e transtornado.
— é crise do que? De ansiedade? Por que olha, eu sei que é ruim, às vezes eu também tenho. Eu posso te ajudar. — ele se ajoelhou segurando nos joelhos do menor. Changbin se amaldiçoou por ter uma mente tão fértil.
— não é crise de ansiedade! — quis chutá-lo para longe. — é crise existencial! — tirou as mãos dos olhos e eles despencaram até Christopher: lábios entreabertos, olhos cintilantes, a pele sendo iluminada pelo poste ali perto e a lua no centro do céu. Estava mesmo num romance clichê hétero, queria fugir porque sabia o vinha depois daquilo.
— mas você parecia bem.
— é, eu também achava que estava. — não iria ser a donzela descabelada que beijaria o herói, aquilo não era sua praia. Voltou a tampar os olhos. — sinto que posso morrer!
Subitamente, seus lábios foram prensados sobre algo macio e quente. E ele nem mesmo precisava abrir os olhos para saber que era ele. Christopher inclinou o corpo por cima do menor, usando suas coxas como apoio, fora um simples selinho. A sentença da sua morte, seu subconsciente acrescentou, e por um segundo pensou "se tá no inferno, abraça o diabo".
Circulou o pescoço do Bang com os braços, afundando os dedos entre os fios castanhos. Christopher ficou de pé, erguendo o menor no processo com uma força sobre-humana, pousando delicadamente o moreno na mesa de mármore fria. Sentiu outro arrepio, mas não sabia se era por conta do mármore que estava sentado ou as mãos do australiano que apertavam sua cintura entre os dedos longos com tanta possessividade. Changbin deixou que Christopher ficasse no controle, mesmo que não fosse do seu feitio, era como se ele não tivesse a mesma proporção de força e nem vontade para liderar aquilo. O Bang era forte demais, intenso demais, e changbin odiava ele a cada novo arfar que saia entre o beijo que estavam tendo.
O ósculo foi separado aos poucos, numa lentidão boa, Changbin estava perdido, desorientado e fodidamente feliz. Não falavam sobre aquela sensação incrível que tinha no final dos beijos nos livros de romance que lia na recepção da psicóloga. O australiano respirava contra seus lábios, e de repente, ele sorriu. E Changbin também sorriu, porque ele sabia que dali em diante só seria ladeira abaixo.
Mas o moreno ainda odiava Christopher, o odiava muito.
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top