Capítulo 8 - O Tigre Imperador de Portal

O sentimento de culpa permaneceu, o caminho que estávamos trilhando, era pela avendida Guepar, muito perigosa por conta dos inúmeros acidentes nela registrados. O rato andava abaixo, como se fosse realmente de estimação. Mesmo sabendo que aquilo não seria imaginação minha, piscava os olhos, fortemente-pensando que acordaria a qualquer hora-jurei ter escutado mãe Kyllen, mas a animação durou fugazmente.
Um caminhão azul parou no outro lado da pista, businou duas longas vezes, e o motorista acenou chamando nós. Fomos em sua direção, o homem com bigode engraçado, convidou-me a entrar. Dentro do veículo, coloquei o fingido, ao meu lado esquerdo. O caminhoneiro perguntou se o roedor era meu apalpou suas orelhas. Ofereceu biscoito com café, aceitei, dei três para Godah, que não havia falado, pois revelaria quem realmente seria, e a viagem continuou. Uma floresta verde e escura se estendia aos lados da imensa avenida. O frio se estendia pelo caminho, algo que nem se comparava com a região urbana, que o clima era quente e poluído.

-Qual o seu destino?-o motorista perguntou, com uma voz arrastada, sem desviar os olhos do volante.

-É...-o rato deu um soco de leve na minha coxa.

Não entendi o motivo de não poder falar, na verdade, nem sabia onde estávamos indo. A cidade mais próxima, se chamava Trigo do Norte, e não era na direção dela que o caminhão estava indo.
O tempo foi se fechando, nuvens escuras começaram preencherem o céu, a pista estava vazia, por incrível que pareça. Godah não olhava para mim, e a cada segundo, mais perdido ficava. O únicos sons, eram do roncar do caminhão azul, e do vento batendo nas folhas das árvores lá fora. Por mais que sentisse que estava perdido, o olhar do rato para mim, fazia-me sentir segurança.
A viagem continuou, durante ela, cochilei duas vezes e acordei atordoado, por causa das pancadas que levei na cabeça, quando os pneus do caminhão passavam sobre os buracos do asfalto. O motorista já não falava comigo, algumas vezes, ouvi cantarolando uma música bonita, mas os seus olhos permaneciam fixos na longa estrada negra. As nuvens fecharam-se no alto, e algumas gotas batiam contra o para-brisa do veículo, o qual havia tido suas duas janelas fechadas, para que as gotas de água, não entrassem. O cheiro que há muito tempo não sentia, entrou nas minhas narinas.

Mande ele parar o carro-uma voz irrompeu na minha cabeça, despertando-me do sono acordado, que estava levando minha pessoa para o além. Comdando de Godah, que olhava para mim com uma cara engraçada.

-Senhor, por favor, é...-pensei se deveria ordenar que ele parasse no meio daquele mar verde de árvores altas-Nossa viagem termina aqui-arrisquei e ele retribuiu com um olhar de desconfiança.

-Um dia muito perigoso pra sair por aí, essa tempestade que está pra chegar, menino inteligente- respondeu o motorista, apontando para o horizonte, sua voz arrastada, chegava a ser engraçada. Fiquei sem entender o motivo do "inteligente" que ele acrescentou.

-Senhor, tenho que ficar por aqui, vou para a casa de minha avó-mentira minha, todavia, era necessário.

-Sua vó mora em uma floresta que é preservada pelas comunidades ecológicas?-perguntou de modo irônico, o homem.

-É, ela é indígena e vegetariana-a vontade que senti de sorrir, foi grande, a mentira mais esfarrapada que pude inventar, simplesmente não sabia mentir, pois esse é um ato de pessoas que não sabem enfrentar as consequências que serão causadas pela verdade.

-Não posso deixar você aqui, é contra minha vontade de cidadão, de pai-disse o motorista.

-É contra sua vontade de cidadão, contudo, tenho que descer aqui, agradeço sua preocupação-um fogo começou revirar o meu estômago e o caminhão continuava em alta velocidade.

O homem me encarou por um breve momento e em seguida pisou no acelerador, agora estávamos numa velocidade imensa. Godah mais uma vez mandou um comando através de pensamentos, e mais uma vez tentei convencer o maluco motorista.

-Está ficando tarde, preciso comer alguma refeição!-falei grosseiramente, tentando passar o meu olhar mais cruel (tigrão).

-Aqui tem um pacote de batata frita, pegue-apontou para um recipiente fechado, de cor roxa.

-Não posso comer isso, tenho alergia...

-Não vai sair daqui-levantou a voz de maneira assustadora-Godah não é tão esperto quanto imagina, você já vale oito cédulas roxas, "Esperado"-acrescentou, mudando radicalmente o tom, para um bem frio e calmo.

"Oito cédulas roxas", fiquei sem entender. O que antes era uma brincadeira de aventura com um rato, agora estava sendo uma fuga ou esquiva da morte.
As grossas gotas de chuva que batiam nos vidros do caminhão, deixava quase sem ter noção de visão, quem estava em seu interior. Godah estava quieto, e o motorista parecia não se importar para o que tinha falado, continuava pisando firme no acelerador.

-Se não sairmos daqui, estaremos presos em poucos minutos, ele está nos levando para o "Buraco Sem Fim", o sinal foi ativado com monstruosa rapidez. Não podemos ficar na sua Terra por muito tempo-Godah passava uma mensagem via pensamento.

-Ele sabe quem você é...

-Não, ele não sabe, somente jogou uma mentira para colher a verdade-a voz, quando falada pelo pensamento, era mais fraca e não tinha intensidade quanto falar de boca para orelha.

Pensei em alguma estratégia, mas nada vinha ao meu cérebro limitado. Toquei no anel, tentei girá-lo e nem movimento ele fez. Talvez se o tirasse do dedo, o "sinal" sairia de mim, por isso arrisquei novamente. Levei um choque, e do anel saíram raios brancos, voando pela cabine do caminhão. O motorista arregalou os olhos e sorriu, abandonando o volante pulou na minha direção, ao mesmo tempo Godah saltou e atacou o mesmo, que agora lutava para tirar o rato de sua cabeça, pois o roedor mordia violentamente as orelhas do homem. Era desesperador, ninguém controlava o maldito volante que balançava loucamente. Quando olhei para o retrovisor do outro lado da cabine, vi uma carreta amarela tentando ultrapassagem.

-Me largue, seu rato imundo-gritava o homem, sua orelha direita estava sangrando, e Godah não descravava os dentes da mesma.

As gotas de água diminuíram sua intensidade, a turbulência permanecia na cabine, raios saíam do anel negro, entretanto, não nos atingiam. O caminhão estava diminuindo sua velocidade, quando.
Tac
Barulho de lata amassada sobressaiu-se em meio aos gritos furiosos, de piedade, que eram emitidos pelo motorista do caminhão, e em seguida o mundo começou girar, o caminhão parecia um brinquedo insano de parque de diversões. Estávamos girando, não era possível distinguir quem era o homem ou Godah, o capotamento estava muito violento e ligeiro. A escuridão tomou conta de minha visão.

"E foi assim que encontrei você, em meio das diversas pernas no shopping".

Frases aleatórias vinham, perturbando a minha mente.

"Desculpe o seu pai, ele não era assim, essa crise financeira mexeu com o seu psicológico.
Coloque o seu rato no quarto, ele está doente, mordeu uma senhora que estava dando a você um doce, e fugiu levando a gratificação com ele".

O silêncio engoliu as vozes. Quando acordei estava em um chão de areia molhada, o caminhão poucos metros ao meu lado, completamente amassado, seus vidros quebrados e a fumaça que saía de sua lataria, era muito densa. Como saí da cabine deformada, não sei, talvez deva ter sido pelo vidro, tendo em vista os ferimentos profundos que estavam no meu peito, que faziam o sangue preencher toda a minha blusa, colando-a contra o meu corpo.

-Você vai morrer, maldito rato-o homem deu uma bofetada em Godah, que saiu voando pelo ar, poucos metros à minha esquerda-Só que antes, tenho que levar o anel magnífico!-começou correr na minha direção.

Godah ao longe, se mostrava fraco, e a única maneira de agir, seria pegando a minha mochila preta, que estava alguns metros de distância. O meu corpo estava imóvel, não sentia minhas pernas e uma dor imensa se apoderava de minhas costas, como se a minha coluna vertebral, tivesse sofrido alguma lesão grave.
Em poucos instantes ele estaria levando o anel, e restava somente aceitar.

-Mentalize um pedido, pense firmemente em algum desejo e o anel realizará!-Godah invadiu a minha mente.

Por um segundo imaginei um sanduíche de presunto cheio de ovos e mortadela, o que fez o meu estômago revirar, antes tivesse uma das panquecas que minha mãe fizera para mim, salivei somente ao imaginar o sabor que elas estavam, tão quentinhas, com cobertura de mel de abelha, e um copo de café com muito leite em pó. Enfim, no momento seria muito bom a refeição, mas não poderia ser esse o desejo para esse exato momento. Desejei retomar os movimentos de meu corpo, e mais ainda, ter alguma ferramenta em mãos.
Aconteceu. O anel brilhou ofuscando os meus olhos com uma luz branca, a minha mochila colidiu comigo, e segundos depois, estava retomando posse dos meus movimentos corpóreos. No bolso direito da mochila, estava o meu punhal dourado, e o peguei. O motorista estava tentando enxergar através da luz branca, colocava a mão na frente dos olhos, mas nada acontecia, o mesmo andava às cegas, tropeçou e caiu no chão da terra molhada. A luz diminuiu sua intensidade, e um sorriso maligno saiu da boca do homem.

-O maldito rato soube lhe treinar, veremos se passará na seleção-zombou o homem de algo que não tive conhecimento, "seleção"?

Ele avançou para mim, e por um segundo um tremor veio ao meu corpo. Fiquei sem saber o que fazer.
Vulp, vulp
Ele tentava me tirar o anel, fazia esquiva, tentava desvencilhar-me daquelas mãos sujas de sangue.
Poc
Um tronco de madeira atingiu a cabeça do indivíduo, o homem ficou cambaleante e caiu no chão desacordado. Olhei de onde tinha sido lançado o tronco. Godah me olhou, à sua frente estava o buraco que foi deixado pela ausência de preenchimento da madeira lançada em minha direção e do afanador de anel.

-Ah...

Gritava caído, e o seu corpo aparentemente estava passando por um processo de desintegração. Afastei-me (ainda me tremendo) para longe e o odor que era emitido pela pele do motorista, era muito fétido.

-Vamos, não devemos esperarmos até que seja concluído o ciclo de transformação-Godah se aproximava e falava-O sinal foi ativado, aqui na Terra você estará correndo perigo, poderá ser morto em um piscar de olhos-parou e olhava (mesmo sendo miúdo) no fundo dos meus olhos.

Tínhamos andado uns cinco metros, quando...

-Hahaha, estão indo pra onde?-uma voz aguda entoou, fazendo arrepiar até os pelos que estavam começando nascerem no meu futuro projeto de bigode. Não tive coragem de virar o rosto para saber o que estava falando conosco.

Godah olhando na direção da voz, disse:

-Zoran, corra, vá para a floresta!-seu tom grave atingiu os meus tímpanos, dando-me energia para correr em disparada.

Em poucos metros de corrida, estava com o coração a mil batidas por segundo. Sempre fui sedentário, não costumava praticar exercício físico, e isso me fez sofrer bastante, quando no time de vôlei, não tinha força para atacar, nem flexibilidade para dar uma manchete precisa. Se bem que a escola pública de Broto Seco, não possuía muita estrutura para formar atletas, o mais famoso foi uma garota que se chamava Anassa, foi grande destaque em lançamento de dardo, apareceu até no Entrevista com Lola Munik (quadro referência da região Nordeste). Só que, prestes a ir para as competições nacionais, Anassa sumiu do mapa, uma grande polêmica ficou no ar durante os anos de 2000 e 2001. Dizem que foi esquartejada pelo namorado, por motivos de ciúmes, ou que teve uma doença grave, e sua família na escondida, mandou cremarem o corpo da garota. Uma pena, no Colégio Versátil, quando estudei nele, sempre tive uma queda por ela, mas...enfim, sou sedentário.
Chegando na orla da floresta, olhei para trás, não vi sinal de Godah. Adentrei. A mata estava muito fechada, parecia ser um escudo contra destruidores naturais, ou humanos.

-Quando chegar a uma cabana de índios, pare e espere por mim-tive um susto com a mensagem mental.

"Não vou parar!". Esse era o meu pensamento, mas uma dor nas costas me fazia querer tomar um descanso. Agora tinha dúvidas que ninguém poderia responder, que não fosse Godah. Continuei; caminhando estava, as árvores agora estavam dispersas, uma aqui, outra ali-lembrava um jogo de videogame-O lugar era rico em diversidades, entre as árvores mais altas estavam: pinheiros, coqueiros e ipês. Nos ouvidos os sons dos pássaros no alto, faziam do lugar, um ambiente perfeito para acampar. Parei quando escutei movimento atrás de uma samambaia. Era somente um casal de araras, então prossegui, aguçando os ouvidos para qualquer movimento além de minha visão.
Track
Um som de madeira partida veio ao meu entendimento, e recomecei a corrida rumo à cabana. Não sei quantas horas duraram, o sol já estava se pondo, e perdido fiquei. Nem mesmo mensagem mental, Godah enviava para mim.
Novamente as árvores e plantas da floresta, estavam fechadas, não deixando espaços para ultrapassá-las. Uma ou duas vezes tive que parar para do meu tênis preto, tirar alguns espinhos. Saí de casa com uma roupa estilo playboy. Minha calça  (preta e apertada), a blusa (preta e folgada, indo até os joelhos), e para completar, uma jaqueta preta e de couro, que se estendia também, até os meus joelhos (havia pegado do guarda-roupas do meu pai, para ir ao colégio, há três anos atrás).
Ao passar pelas árvores, deixava alguma com um "x", para que se caso voltasse ao mesmo lugar, saberia que já teria passado pelo mesmo. Aconteceu uma ou duas vezes, de árvores com um "x", aparecerem no meu caminho, contudo, consegui novamente voltar a trilhar a mata, de maneira a não continuar no mesmo local. Muitas samambaias estavam à frente, peguei o punhal para cortá-las, assim abrindo caminho. Saí em um lindo lugar, nele havia  gramado, percebi que estava no outro lado da floresta, ou na metade dela, já que somente muito distante, via-se algumas árvores. Caminhei um pouco, vi ao longe, uma cabana muito velha, feita de palha e de formato circular, ipês com folhas amarelas davam vida ao lugar no qual estava ela. Abri um sorriso, dei alguns passos, e...
Plock
Senti o meu corpo flutuar pela atmosfera, girei cinco vezes no ar, uma sensação muito boa até...
Back
Caí de costas no chão. Ainda com a visão do que estava ao meu redor, embaçada, vi um animal gigantesco, lembrava um gato, com pelos alvos como as nuvens, patas que eram equivalentes a duas cabeças humanas e dentes tão afiados, que furaria até mesmo o pneu de um trator. O ser era muito largo, dava impressão de ser um daqueles animais de exposição. Estava caminhando devagar, em minha direção, os seus passos faziam um tremor no chão. Iria ser engolido como um macarrão, por aquele bicho, não daria tempo nem de pedir socorro. Minha visão voltou ao normal e o medo se apoderou de mim. Na pele do pescoço do ser estava escrito em letras grossas: Tigre Imperador de Portal.

Queria gritar, porém, o rugido que veio em seguida, calou-me e fez com que voasse três metros para trás, o meu corpo de geleia molenga. Meus tímpanos tinham sido dilacerados por aquele estrondoso som, essa era a minha única certeza.
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