Capítulo 2 - A noite chuvosa
O inverno se aproximava, os dias estavam cansativos para mim. Quando chegava da escola, era como se um mamute estivesse montado sobre minhas costas.
-Cuida, banhar-falava minha mãe, enquanto lavava a louça, na pia de mármore negro.
O banheiro era grande e fétido, falo do que se localizava no meu quarto. Há séculos, meu pai pega no meu pé, diz para eu lavá-lo, mas uma força maior, que Newton esqueceu de agregar às outras três, se chama lei da constante e prazerosa habilidade em dormir. Essa supera qualquer outra lei da natureza. Quando eu morrer, em vez de ficar no caixão, vou fazer uma maratona zumbi, nem mesmo uma preguiça é tão preguiçosa quanto eu.
O jantar estava sobre a mesa. Como todas as noites, era preciso esperar o discurso de papai, para podermos comer. Sou filho único, e não é tão bom como falavam que era. Meu único irmão, chama-se Tinto, um rato gordo e preguiçoso, de cor preta, e olhos azuis, que minha mãe me deu como "presente" de aniversário de 11 anos. Para ser sincero, esse rato é tão útil, que até para dormir, precisa que alguém fique acariciando suas orelhas. Numa casa de dois andares, nem para comer barata, ele serve. Quando não está dormindo, leva o tempo significativo dele, para roer minhas antigas fotografias (não queira vê-las, pareço um filhote de morcego). Não sei o que aconteceu quando fui nascer, tenho duas teorias, a primeira, que minha mãe estava desejando comer morcego assado na grelha, ainda grávida de mim, e a outra, é que não sou filho de Johan Hans, mas sim, de um vampiro. O homem é descendente de primata, eu de morcego.
-Como sabem, o jantar...-falava o meu pai, seus olhos verdes refletindo o frango assado, a luz o seu cabelo quase completamente grisalho.- Bom, a história da trajetória do homem na cozinha, surgiu com a necessidade de...
-Garantir alimento para sua própria sobrevivência.-não consegui me conter, era a quinquagésima vez que ele narrava a mesma história.
-Não me admiro, sua falta de disciplina me surpreende-falou Johan.
-Hum...
-Não faça pirraça, seu moleque!- agora ele estava bravo. Não foi a primeira vez que esse tipo de situação aconteceu. Anteriormente, ele tentou me agredir, pelo fato de minha pessoa comer, antes de seu discursinho acabar, porém, naquele dia, tudo foi diferente, não suportei.
-A disciplina, os pais são os responsáveis por lecionar para os filhos, desde uma infância!- levantei a voz- Dela- apontei para mãe- Não cobro nada, enquanto ela estava lavando chão, para ganhar 25 reais ao dia, o senhor estava enchendo sua barriga de trinta litros, nos bares, chegando no outro dia, vomitando a casa e agredindo ela...
-Cale-se, moleque impertinente!-ordenou o marido de mãe.
-Não sei o que a senhora pensou, quando escolheu esse homem para ser o meu pai- olhei para ela.
Lá fora, se via pelas janelas, raios cortando o céu, o vento estava forte, o seu rugido causava medo. Estava muito frio, o tempo, no entanto, na sala de jantar de minha casa, estava na temperatura de um vulcão em erupção.
-Não falei para se calar?!- mais uma vez ele gritou comigo.- Um garoto que não gosta de estudar, nunca atinge nota azul no boletim, qual o seu futuro?- ele queria guerrear- Quem vai querer um vagabundo...
-Posso não ter futuro, mas no dia que alguém aparecer na minha vida, vou valorizar. Farei de minha esposa, a mais feliz de todas, e para os meus filhos, serei um exemplo, não uma decepção, como foi o seu caso.
-Por favor, vocês, parem- pediu com a voz de súplica, minha mãe.
-Não aceito desaforo no meu teto, e se for para continuar assim, escolha, querida, entre ele e eu.- ordenou Johan.
A rajada de vento tranquilizou-se, agora chovia. Na rua, via-se da cozinha, alguns carros passearem pela avenida de asfalto negro, desgastado, sendo lavados pela água que caía do céu escuro.
-Não posso-falou mãe.
-Como não pode, Kyllen? - ele perguntou, confuso. Como se não soubesse que para ela, era um caminho sem saída, escolher entre o marido e o filho.
-Amo vocês dois, não quero decidir isso- ela colocou o braço sobre a mesa de cor vinho, baixou a cabeça e caiu em lágrimas.
-Olha o que sua arrogância faz, moleque!-gritou novamente comigo, o homem que dizia ser meu pai.
-Não fiz nada seu...
-Não Zoran, por favor- pediu ainda soluçando, Kyllen. Não segurei.
-...babaca- completei sem saber o que estava falando.
-Não!- gritou minha mãe.Johan levantou-se da cadeira, com um enorme soco na mesa, fez voar pelo ar a refeição daquela noite e tentava me enforcar, com suas mãos gordas.
-Hoje vai ser o seu fim, seu moleque canalha!- se jogou sobre a mesa, fazendo ela se partir em duas, caiu sobre mim, segurou nos meus cabelos e estava armando uma grande bofetada.
-Não faça isso!- minha mãe, Kyllen, segurou no seu braço. Ele saiu de cima do meu corpo, ainda fungando como um touro, com rosto perverso.
-Mãe, me desculpe.- levantei, parei cara a cara com ela- Prefiro morar na rua, do que compartilhar o mesmo oxigênio com ele...
Uma decisão muito difícil, mas era necessária.
-adeus. - ela segurou no meu braço, porém, não olhei para trás. Ela estava soluçando, e o último desejo de um filho, é observar a lágrima escorrer pelos olhos de sua mãe. Me desvencilhei, passei por alguns cômodos até chegar na porta de entrada. Abri a porta e saí para a noite chuvosa.
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