15°| A rosa branca e a piscina

   A rosa me pegou desprevenida.

   Quer dizer, o que raios Peter estava querendo fazer com aquilo? Qual era o significado? Era uma demonstração de que gostava de mim, ou então, apenas uma rosa qualquer? A única resposta que eu tinha era: Peter está acabando com o meu psicológico.

   Eu guardei a rosa dentro da mochila, mesmo sabendo que as chances de ser esmagada, despedaçada e murchar eram grandes. Mas eu ainda a teria. Porque era minha. Não de Nanda. Apenas minha.

   Olhei pela janela uma última vez para me certificar se Peter estava lá. Ele não estava. Peguei minha mochila, passei uma de suas alças por cima do ombro e saí do quarto no mesmo instante em que as gêmeas e Diana saíram do quarto de Claire. Blair parou de andar assim que me viu, o que fez sua irmã esbarrar nela com a parada repentina. Elas olharam para mim com um olhar confuso e deslumbrado. Elas estavam lindas. Ambas usavam vestidos rosa bem parecidos e as mechas da frente de seus cabelos estavam postas para trás e presas com um grampo. Diana era a única que se destacava entre elas, com um vestido verde que percorria seu corpo até os pés e que possuía um corte sensual nas laterais.

   _ O que está fazendo? - perguntaram as irmãs juntas, o que era bem irritante.

   _ Estou indo para o baile - respondi sorridente - Assim como vocês. - apontei para as três. Blair deu um riso sarcástico e então pendeu a cabeça para trás antes de berrar pela mãe. Catrina berrou de volta, perguntando o que ela queria dessa vez. Blair berrou novamente.

   _ O que você... - Catrina veio andando pelo corredor, mas agiu da mesma maneira que as meninas e cessou os passos - O que está fazendo?

   _ Ela está pensando que vai pro baile. - Claire respondeu por mim em tom sádico - Que fofa!

   _ Eu não estou pensando - rebati - Eu vou pro baile.

   _ Com a permissão de quem? - Catrina se intrometeu. Ela se aproximou e se posicionou ao lado das meninas, Diana automáticamente se encolheu com a proximidade da minha madrasta, mas ela possuía um sorriso zombeteiro nos lábios.

   _ De ninguém...

   _ Então você não vai. - ela me interrompeu, fazendo Blair e Claire baterem as mãos, comemorando - Você já passou o dia inteiro fora e não cumpriu suas obrigações.

   _ Eu faço quando voltar. - menti. Eu já estaria bem longe da megera e sua Mansão do Terror.

   _ Não - ela se contrapôs firme. Pela primeira vez, não tive medo - Você não vai e ponto final... Ou quer ir pro seu "cantinho"?

   _ Você não me assusta mais, Catrina - anunciei em um ímpeto de coragem. Droga Elle, cala a boca! Você vai por tudo a perder! - Eu sou mais forte, mais jovem, mais poderosa. Eu não sou mais aquela garotinha assustada que se escondia debaixo da cama. Eu não sou mais a garota frágil que obedecia uma mulher nojenta como você! Eu não sou mais sua empregada ou das Monstrinhas mimadas. Pela primeira vez na vida, eu não sou seu fantoche. - senti um alívio percorrer meu corpo em êxtase. O rosto de Catarina se transfigurou de maneira assustadora, demonstrando todo seu ódio e me fazendo perceber o quão estúpida eu fui. Ela colocou os dedos entre os fios do meu cabelo e me arrastou em direção ao seu quarto. Blair e Claire nos seguiram, ansiando por um pouco de diversão.

   Catrina pegou sua garrafa de vinho aberta em cima do criado-mudo e derramou em cima do meu vestido. Abri a boca surpresa, fazendo com que ela jogasse um pouco dentro dela também. O gosto era horrível, até porque eu nunca gostei de vinho. Como se não fosse o suficiente, Catrina retira da gaveta uma tesoura, o que me aterrorizou ainda mais.

   _ Me solta, Catrina! - gritei. Tentando me livrar das suas garras de bruxa.

   _ Mãe, o que você está fazendo? - murmurou Blair com medo, mas não recebeu resposta.

   Catrina puxou a bainha do meu vestido e começou a rasgar o tecido da saia. As lágrimas invadiram meu rosto enquanto eu gritava desesperada para que ela parasse, mas não havia jeito. O vestido estava manchado e aos trapos.

   _ É tudo sua culpa, Vadia Kartiney! - desdenhou. Catrina puxou o ranho de sua garganta e cuspiu na minha cara. Imediatamente levei o tecido do vestido no rosto, retirando tudo com uma imensa vontade de vomitar. Blair e Claire não estavam mais com medo, eu podia ouvir as gargalhadas abafadas enquanto caçoavam de mim para Diana, que escolheu ficar no corredor. Minhas lágrimas não paravam de escorrer pela minha bochecha e isso estava dando gosto pra Catrina.

   _ A casa está um lixo - anunciou desamarrando seu roupão e mostrando seu vestido cor de esmeralda apertado e curto que salientavam sua gordura abdominal. Meu estômago embrulhou mais ainda ao pensar que ela o usaria com Kyle. - Aproveite que você desistiu de ir ao baile e arrume-a. Irei à um encontro com Kyle e as meninas vão ao baile. Não nos espere acordada!

   Catrina me empurrou pro lado e passou desfilando em direção à saída. Desabei no chão, chorando igual criança olhando para meu vestido arruinado. Eu ainda tremia, mas não sabia se era alguma sequela do medo ou a fúria que emanava em mim. Meu desejo era congelar aquele rosto pálido dela. Congelar as gêmeas. Congelar essa droga de vida que eu tenho!

   Assim que ouvi o barulho da porta da frente se fechar, me arrastei até meu quarto e mandei mensagem para Nanda, avisando que não iria mais. Me joguei na cama, ainda sentindo algumas lágrimas escorrerem em direção ao travesseiro. Eu só queria acordar e ver que tudo não passou de um sonho maluco. Mas era bem real. Depois de alguns minutos encolhida na cama, eu escuto batidas na porta. Me levanto da cama em um pulo e limpo os resquícios de lágrimas, pensando ser Catrina. Mas era apenas uma Nanda sorridente e Peter. O sorriso de Nanda morreu ao me ver.

   _ O que houve? - ela perguntou entrando no quarto, em suas mãos um lindo buquê. Um buquê de rosas brancas. Minha vontade de chorar se intensificou ao olhar para Peter e ver que a rosa que ele me dera realmente não significava nada para ele.

   _ Olha isso - resmunguei chorosa enquanto lhe mostrava o vestido - Eu estou destruída! - confessei. Uma lágrima teimosa deslizou em minha bochecha, permitindo que outras fizessem o mesmo. Nanda me abraçou e murmurou um "vai ficar tudo bem" e talvez realmente ficasse, se não fosse pelo rumo que minha vida tomou. Eu sentia que as coisas nunca mais ficariam bem. Era a minha única certeza.

   _ Venha cá! - ela pediu se desfazendo do abraço e ficando em pé, de frente para mim. Em seus olhos havia um brilho maquiavélico e um sorriso sapeca crescia em seus lábios. Eu sabia que significava que Nanda ia me obrigar a fazer algo que não era pra ser feito. Ela saltou até a porta e indicou com a mão para que eu a seguisse, sumindo de vista logo em seguida. Olhei receosa para Peter e meu estômago borbulhou de raiva, porque Peter estava radiante no terno preto e isso fazia com que odiá-lo se tornasse cada vez mais difícil. Me levantei e fui pelo mesmo caminho que Nanda, mas antes fui detida pela mão de Peter que agarrou meu braço com cuidado.

   _ Gostou da rosa? - ele perguntou sorrindo esperançoso.

   _ Sim, o buquê que deu a Nanda é lindo! - me fiz de demente. Se Peter queria jogar, então iríamos jogar.

   _ Buquê? - repetiu confuso. Ele balançou a cabeça em discordância - Não, não o buquê! Estou falando da rosa que deixei na árvore...

   _ Não sei do que está falando.

   _ Mas... - Peter engoliu suas palavras, me fazendo erguer as sobrancelhas enquanto esperava o resto da frase - Deixa pra lá. - murmurou por fim, soltando meu braço.

   Gritei por Nanda, sua voz soou abafada vindo do quarto de Claire. Corri até lá esbaforida. Nanda mexia no guarda-roupa da gêmea mais velha.

   _ O que você está fazendo? - gritei alarmada a observando enquanto pegava alguns dos vestidos e depositava na cama.

   _ Compras de graça - ela deu de ombros retirando mais um vestido - Pronto! - bateu palmas olhando para as roupas em cima da cama. Todas possuíam o mesmo padrão: tons de rosa com saias bufantes. - Escolha um!

   Passei o dedo por cada peça, até finalmente parar na mais graciosa. O rosa era puxado para um tom mais claro e menos enjoativo, com flores se estendendo por todo seu tronco e pela barra da saia. Não é tão bonito quanto o meu azul, mas é o substituto perfeito. E Claire me devia isso. Nanda saiu do quarto e voltou saltitante com um par de sapatos de Blair.

   _ Nanda...

   _ Você não tem mais com o que se preocupar - ela me interrompeu, como se lesse meus pensamentos - São os seus sapatinhos de cristal, Cinderela.

   Mordi o lábio para impedir que um sorriso se formasse, mas meu corpo involuntariamente abraçou Nanda.

   _ Obrigada. - sussurrei antes de pegar os sapatos de suas mãos e correr para o banheiro com meu novo vestido em mãos.

   O baile ia acontecer no campo, onde ocorre os jogos de futebol, mas pela previsão de chuva ele foi transferido para a quadra de basquete. Embora a falta de espaço e a decoração arrumada de última hora, eu nunca havia visto nada mais encantador. Havia luzes amarelas por todos os cantos, um tapete vermelho se estendia até o início da pista de dança, duas árvores de galhos quase nus se esgueirava na direção da entrada, formando um arco por onde as pessoas passavam.

   _ Isso é incrível! - sussurrei admirada. Nanda assentiu sorrindo e enlaçou seus braços nos de Peter.

   Ultrapassamos as árvores e nos misturamos junto com os outros alunos. A música que tocava era contagiante e fazia com que eu balançasse a cabeça de acordo com o ritmo.

   _ Elle? - virei-me em direção a voz. Thomas Campbell sorria timidamente com as mãos dentro do bolso do terno preto.

   _ Oi. - retribui com um sorriso débil, sentindo as bochechas pinicarem.

   Nanda e Peter passaram por mim e foram em direção ao palco, onde uma banda da escola tocava. Mas não sem antes Nanda sussurrar em meu ouvido: "Até meia-noite".

   _ Você está linda. - Thomas me elogiou.

   _ O-Obrigada... - gaguejei. Os olhos escuros de Thomas me analisavam e faziam meu coração bater depressa dentro do meu peito. Principalmente quando a música acabou e outra a substituiu. Uma lenta.

   _ Quer dançar? - ele perguntou estendendo a mão em minha direção.

   _ Eu adoraria.

   Ele nos guiou para o meio da quadra, onde alguns casais dançavam. Enlacei meus braços em seu pescoço e Thomas começou a nos guiar. O cheiro do seu perfume fazia cócegas no meu nariz. Estar ali com ele me fez perceber todas as coisas que perdi. Eu nunca fui a festas ou à sorveteria com os meus amigos, nunca fui aos shows e em toda a minha vida só beijei dois meninos: Dallas Kingston, da sétima série e Jonas Jones, mais conhecido como JJ, da cafeteria. E agora eu só tinha trinta minutos restantes como uma adolescente normal e não a "Princesa Elleanor, herdeira do trono de Deesh". Antes que eu pudesse pensar duas vezes nas minhas ações, minhas mãos se pressionaram contra a nuca de Tom e o trouxe para mais perto de mim e então eu pude selar nosso lábios em um beijo desesperado. No primeiro momento, Thomas havia paralisado, mas não demorou muito para que ele correspondesse e começasse a passear com as mãos nas minhas costas. Nos separamos por falta de ar, mas não desgrudamos nossas testas.

   _ Nossa Kartiney - ele diz ofegante - Por essa eu não esperava!

   _ Eu também não. - murmurei rindo envergonhada. Parecia que eu estava com uma máscara facial feita de lava, de tanto que meu rosto queimava. Surpreendentemente, Thomas pressionou minha cintura contra si e me beijou novamente. De um jeito mágico e inesquecível.

   Quando nosso lábios se separaram, foi como um impacto. Como se eu houvesse acabado de sair de um sonho para cair na dura realidade. Ele segurou minha mão com carinho e nos guiou por entre a multidão em direção a porta que dava à piscina. Tom pescou a chave do bolso e a abriu, dando espaço para que eu pudesse passar. Entrei receosa. Afinal, eu não sabia como ele tinha a chave ou mesmo se era permitido ficar ali. Como se lesse meus pensamentos, ele disse:

   _ Não se preocupe. Eu sou líder da equipe de natação, por isso tenho a chave. - sorriu singelamente - E eu ia passar aqui para treinar um pouco para a competição da semana que vem, de qualquer modo.

   _ Treinar? - ergui a sobrancelha de maneira despretensiosa. Tom pendeu a cabeça para o lado e estreitou os olhos, o que o deixou ainda mais fofo - Você pode me ensinar a nadar? - perguntei. Meu coração batia em ritmo acelerado, ansioso pelo o que eu estava prestes a fazer. Thomas sorriu de lado e uma convinha funda apareceu na sua bochecha esquerda. Eu queria apertá-lo até que sua cabeça explodisse!

   _ Bom... - ele ponderou - Acho que alguma das meninas não vai se importar em te emprestar uma rou...

   Antes que Thomas terminasse a fala, minhas mãos já estavam abrindo o zíper do vestido. Minhas pernas estavam bambas e eu tentei a todo custo não olhar para Tom durante o processo. O vestido caiu aos meus pés e dessa vez eu não estava apavorada. Era um sentimento diferente, novo e do qual eu não conseguia descrever. Era um sentimento bom. Retirei os saltos e abracei meu corpo, tendo a certeza de que meu rosto estava tão vermelho quanto um tomate maduro. Me virei, me preparei e corri em direção a água. O choque térmico preencheu meu corpo e me causou uma sensação de êxtase. A adrenalina pulsava em minhas veias. Nadei até a superfície e sorri ao ver Thomas retirando a camisa, seguida dos sapatos e das calças. Ele deu alguns passos para trás e tomou impulso antes de correr e se jogar na água. Ele nadou até mim por baixo d'água e segurou em minha cintura antes de emergir.

   _ Você é uma garota surpreendente, Elleanor Kartiney. - ele disse antes de me beijar pela terceira vez naquela noite.

   Thomas e eu passamos o resto da noite na piscina. Meus dedos já haviam enrugado e a água já não estava mais fria. Eu estava amando conhecer cada detalhe de Thomas, decorar cada história e sentir o gosto de seus lábios. Ele era tão encantador que me fez esquecer completamente que atrás daquela porta havia um baile acontecendo. E pela primeira vez desde que descobri ser princesa, eu lembrei o que é gargalhar e se sentir feliz. Livre.

   _ Eu nunca havia notado o quanto gostava de você até aquela sua apresentação de história. - Tom revelou. Nós havíamos apoiado nossos braços na borda da piscina e Thomas brincava com meus dedos - Quando você começou a chorar, a minha vontade era levantar da cadeira, te abraçar e te guardar dentro de um potinho, para que nada e nem ninguém te causasse dor. Foi aí que percebi, mas nunca tive coragem de chegar perto. O máximo o que cheguei perto de você foi a bolinha de papel.

   _ Era você! - exclamei surpresa, ele riu diante da minha reação. "Eu acredito em você", era ele o tempo todo.

   _ Eu sempre acreditei em você, Elle. - comentou - Até cheguei a falar com o professor sobre isso no final da aula, mas ele estava ocupado demais pensando no dinheiro que perderia com isso. Sinto muito, de verdade.

   _ Tommy, isso é... - minhas palavras morreram quando Nanda e Peter entraram abruptamente na área de natação. Seus olhares intercalavam entre mim, Thomas e as roupas jogadas no chão. Nanda colocou as mãos sobre a boca e deu um grito abafado. A expressão de Peter era indecifrável, mas apenas por alguns segundos. Pois seu punho se fechou e ele avançou na minha direção.

   _ O que está acontecendo aqui?!

   _ Diversão - respondi sincera - Você deveria experimentar, talvez assim você pare de ser tão babaca!

   Me arrependi da fala assim que ela saiu da minha boca. Eu não sabia o porquê de eu ter falado aquilo, ou o porquê de ter saído em um tom maldoso. O rosto de Peter se contorceu em um careta e ele deu meia volta, ficando ao lado de Nanda e sussurrando algo em seu ouvido, antes de sair pela porta da qual entrou.

   _ É meia-noite, Elleanor. - Nanda avisou e então seguiu Peter.

   Era meia-noite. A magia havia acabado.

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