32. A vez em que uma loba dourada desafiou seus inimigos
Estávamos todos reunidos no topo de uma colina. Eleonora e o círculo de bruxos tinham acabado de concluir o feitiço de evocação das Cortinas do Esquecimento, que faria os humanos comuns abandonarem Esmeraldina e deixaria a cidade isolada durante a guerra que se aproximava. Naquela ocasião, eu pensei que, pelo menos por alguns instantes, as coisas estavam indo bem, dentro do previsto, até que um ruído alto de motores surpreendeu a todos nós e me mostrou que, muito provavelmente, eu havia me enganado mais uma vez.
Fred, alarmado, apontou para um ponto mais adiante, às minhas costas, e, quando me virei, percebi que o garoto de fato tinha motivos para reagir daquela forma. Havia mesmo alguma coisa enorme se movendo, vinda daquele rumo. Não demorou muito e logo conseguimos enxergar com clareza uma imagem que nos deixou atordoados. Avançando em meio ao terreno descampado, próximo à base da colina, dezenas de jipes e caminhões se aproximavam, cercados por uma quantidade considerável de homens e mulheres montados a cavalo.
Ao redor deles, porém, estava o motivo principal do nosso espanto. Centenas e mais centenas de lobos de grande porte, em sua forma animal, corriam, incansáveis, acompanhando os veículos e se movimentando em direção à cidade. Foi apenas quando eu vi os lobos que a minha ficha caiu e eu finalmente entendi o que estava acontecendo: aquele era o exército da Caçada Voraz. E ele havia vindo até ali para dar início à guerra contra os vampiros.
Diante de tal situação, nos demos conta de que estávamos encurralados, no alto da colina, e não havia para onde correr. O espaço era aberto, sem árvores para ocultar nossa presença, e não importava para onde fôssemos, certamente os lobos do exército da Caçada Voraz nos alcançariam facilmente.
— O que a gente faz agora? — perguntei, preocupada.
— Acho melhor não sairmos do lugar — argumentou Eleonora. — Não estamos fazendo nada de errado, não há porque nos escondermos deles.
— Vocês bruxos podem não ter feito nada de errado, mas não se esqueçam que eu e a vampira estamos aqui — minha mãe mencionou. — Devo lembrar que foram esses mesmos lobos que mandaram uma mensagem pra toda a comunidade sobrenatural de Esmeraldina, ameaçando quem se envolvesse com nós duas ou nos ajudasse?
— Eu posso dar um jeito nisso — a irmã de Poliana replicou, pensativa. — Vou lançar um feitiço para ocultar a presença de vocês duas, basta ficarem em silêncio que os lobos nunca saberão que vocês estão aqui. O encantamento não dura muito tempo, mas acho que será o bastante pra gente conseguir se livrar deles.
— Já que é assim, esconda a Maia também, por favor — minha mãe pediu. — Eles vão estranhar caso a vejam aqui, sozinha, sem mim. Podem querer pegá-la para fazer um interrogatório. É melhor que ela também desapareça.
— Certo, sem problemas. Recomendo vocês darem as mãos, para não se separarem depois do encantamento. Mirum Ablatione! — declamou Eleonora, estendendo o cajado sobre nossas cabeças.
Em instantes, senti meu corpo formigar e notei que tanto eu quanto minha mãe e Tatianna estávamos rapidamente ficando invisíveis. Agarrei as mãos das duas depressa, antes que elas sumissem de vez diante dos meus olhos e eu não soubesse mais onde elas estavam.
— Fiquem em silêncio, não se esqueçam — a sacerdotisa frisou. — Se vocês emitirem qualquer som que denuncie onde estão, o feitiço será desfeito na mesma hora.
Sem dizer nenhuma palavra, eu e as outras duas mulheres procuradas pela Caçada Voraz nos afastamos um pouco do grupo, para evitar que alguém trombasse conosco por acidente. Logo em seguida, percebemos que uma pequena parte da tropa de lobos havia se afastado dos demais e estava se movendo em nossa direção. Assim que eles chegaram mais perto, me surpreendi ao notar que era Navalha em pessoa quem ali estava, montado em um cavalo preto, acompanhado de perto por Lavínia e mais alguns lobos de elite que eu não conhecia. Aquela era a primeira vez em muito tempo que eu revia o responsável pela ruína da minha família, e as náuseas que eu imediatamente senti me mostraram que aquele encontro repentino já havia começado a me afetar negativamente.
— Cumprimentem Navalha, o Rei dos Lobos! — disse a assassina do meu pai, em tom enérgico. O restante do nosso grupo ficou paralisado, sem saber como reagir, até que Poliana respondeu, sem se intimidar.
— Vocês esperam que a gente faça o quê, exatamente? — minha colega questionou, em tom de desdém. — Se ajoelhar e chamar esse homem de majestade? Eu não sou uma loba, caso não tenham percebido, então ele não é o meu rei.
— Um "boa noite" já estava de bom tamanho — Navalha respondeu, com o mesmo sorriso irritante de sempre no rosto. — Mas gosto da sua atitude, garota. Fala o que pensa. Prefiro mil vezes alguém sem travas na língua do que uma pessoa dissimulada, que esconde seus reais sentimentos.
— Isso foi uma tentativa de elogio? — Poliana retrucou. — Não que eu me importe com a sua opinião, de qualquer forma...
Lavínia revirou os olhos e interrompeu a conversa entre os dois.
— Vamos logo ao que interessa, por favor — a loira mencionou, impaciente. — Vocês, bruxos, podem explicar exatamente o que estão fazendo aqui? Que feitiço foi esse que vocês acabaram de lançar sobre a região?
— Apenas tomamos algumas providências para proteger os humanos comuns e o Véu, ao saber dessa guerra que se aproxima — Eleonora explicou. — Esse feitiço fará a cidade ser evacuada, evitando que inocentes acabem se machucando.
— É uma ótima iniciativa, devo dizer — Navalha comentou, satisfeito. — Assim meus soldados não precisam ficar se segurando e podem partir com tudo para cima dos morcegos quando a hora certa chegar.
— Nós esperamos que vocês consigam resolver esse conflito entre as espécies de vocês sem levar nossa cidade à ruína — Eleonora mencionou. — Se meu apelo servir de alguma coisa, peço que tentem direcionar essa batalha para longe da área urbana, por favor. Esmeraldina pode ser uma cidade pequena, mas é o lar de muita gente. Pessoas que ficariam completamente desamparadas caso suas casas fossem destruídas.
— Ela também é o lar dos lobos, não se esqueça disso, bruxa — retrucou Navalha, amargo. — Estamos lutando para proteger o que é nosso por direito. Esmeraldina é um território valiosíssimo e nossos inimigos sabem disso, por isso precisamos proteger essas terras com unhas e dentes. Os invasores estão do lado de lá, dos morcegos, não do nosso. Nós sempre estivemos aqui, antes de todos vocês. Até mesmo antes que os bruxos. Tenham isso em mente quando resolverem se relacionar conosco — ele continuou, em tom ameaçador. — Nosso foco hoje são os vampiros, mas isso não quer dizer que no futuro nosso alvo não possa ser outro.
— Isso é uma ameaça? — Eleonora indagou, séria.
— Você parece ser inteligente, tenho certeza de que encontrará a resposta para essa pergunta sozinha — Navalha respondeu, debochado, piscando um dos olhos para a sacerdotisa. — Agora, vejamos quem mais está aqui... — ele continuou, inspecionando nosso grupo. — Vejo o Pajé e a líder das panteras... Que grupo interessante vocês reuniram, não é mesmo? Fico me perguntando o que mais vocês andam aprontando por aí, todos juntos... Fiquei sabendo que vocês até fizeram uma reuniãozinha particular no círculo dos bruxos um dia desses... Vocês não querem dividir alguma informação comigo? Existe algo mais que eu deveria saber?
— Você é inteligente, tenho certeza de que encontrará a resposta para essa pergunta sozinho — Poliana revidou, imitando o jeito de falar de Navalha, irônica.
— Acho bom enrolar essa sua língua, garota atrevida! — Lavínia advertiu, visivelmente irritada com Poliana. — Não se esqueça com quem você está falando! Nosso rei tem sido muito paciente com os bruxos, mas saiba que basta um passo em falso para vocês caírem em ruína e provarem o mesmo destino dos nossos inimigos. Você não se lembra do que aconteceu com aquele lobo traidor, o Augusto? Você e sua irmã estavam lá na fazenda naquele dia, não estavam?
Imediatamente congelei ao ouvir o nome do meu pai ser trazido à conversa. Aquilo não podia estar acontecendo. Eles não tinham o direito de sair por aí manchando a reputação dele. Alguém precisava fazer algo para impedi-los.
— Inclusive, até hoje não entendi muito bem como vocês e o vampiro conseguiram escapar de mim naquele dia... — Navalha mencionou, pensativo. — Estavam todos paralisados, na minha frente, e, num piscar de olhos, desapareceram no ar... Fiquei me perguntando se foi obra do garoto cernuno ou se foi algum poder misterioso daquele príncipe morcego... Afinal, os bruxos não teriam sido capazes de me trair dessa forma, diante dos meus próprios olhos, não é mesmo?
— Não faço ideia do que você está falando — Eleonora desconversou, finalmente entregando um pouco de nervosismo em seu tom de voz.
— Talvez eu possa te ajudar a lembrar — ofereceu Lavínia, se aproximando ainda mais do grupo e puxando Poliana pelo braço, de surpresa, sem que a garota pudesse se defender ou revidar. — Nosso rei congelou todos vocês, então o lobo traidor Augusto se recusou a jurar lealdade e eu o peguei por trás, desse jeito — ela continuou, imobilizando minha colega e segurando-a pelo pescoço. — Daí foi só pegar uma navalha, cortar o pescoço daquele infeliz e mandá-lo para o quinto dos infernos... — completou a loba, tirando um canivete do bolso e o aproximando da garganta de Poliana.
Eu não podia aguentar mais. Não tinha como eu assistir aquilo calada, sem tomar nenhuma atitude. O Lobo do Sol dentro do meu peito clamava por justiça.
— Larga ela, sua assassina!!! — eu gritei, me aproximando das duas e revelando minha localização. O efeito do feitiço sobre mim desapareceu de imediato, tal qual Eleonora tinha me advertido que aconteceria, e todos puderam me enxergar com clareza.
— Ora, ora, ora, vejam só o que temos aqui! — Navalha comentou, batendo palmas de empolgação. — Vocês não se cansam de me surpreender? A lobinha dourada finalmente resolveu sair da toca? Isso é o que eu chamo de entrada triunfal!
— Larga ela, eu já disse! — repeti. — A Poliana e os outros bruxos não têm nada a ver com os assuntos dos lobos, deixem eles fora disso!
— E se eu me recusar, você vai fazer o quê, exatamente? — Lavínia quis saber, em tom de deboche.
— Vamos resolver isso em um combate — declarei, decidida. — Um contra um. Eu e você, Lavínia. Um duelo justo, sem truques e sem interferências externas.
Assim que eu disse aquilo, Bárbara e Inara rapidamente se aproximaram de mim.
— Amiga, não faz isso, é muito arriscado! — Inara apelou, preocupada.
— Ela tem razão, Maia — Bárbara completou, segurando a minha mão. — A gente ainda precisa de você. Eu ainda preciso de você...
— Eu sinto muito, mas não consigo mais ficar de mãos atadas — me justifiquei. — Eu já esperei demais. Preciso fazer justiça, meu pai não pode ter morrido em vão, sem que nada aconteça com esses assassinos...
— Se meu rei permitir, eu aceito o seu desafio! — Lavínia gritou de onde estava, confiante. — Faz tempo que espero pelo momento de acertar as contas com você, sua caipira atrevida! Pode vir pra cima! Ou vai amarelar??
— Eu não me oponho — Navalha declarou, visivelmente satisfeito. — Pode mostrar a ela em que nível estão os lobos do Conselho dos Sete, Lavínia. Eu te dou carta branca.
Sem perder mais tempo, afastei-me das minhas amigas e despi-me de minhas roupas depressa, jogando-as ao chão. Logo assumi a forma de Lobo do Sol e pude ouvir os comentários espantados dos bruxos que nos acompanhavam, que muito provavelmente sequer sabiam que uma loba rara como eu vivia por ali.
Com um sorriso de satisfação, Lavínia empurrou Poliana na direção de Eleonora e também despiu-se de suas roupas lentamente, fazendo questão de exibir seus seios avantajados e seu físico esculpido para o grupo que nos observava, sem demonstrar o mínimo de desconforto ou pudor. Assim que ficou completamente nua, minha adversária finalmente fez sua transformação e assumiu a forma de lobisomem que eu já conhecia e que ela utilizara na fazenda, quando enfrentamos o Devorador de Sonhos.
— A luta só acaba quando alguém for derrotado ou se render, sem interferências externas — explicou Navalha. — Podem começar!
Mal ele disse aquilo e eu já avancei rumo à loba parda diante de mim. Lavínia era muito rápida, mas, mesmo sem conseguir atingi-la, continuei minhas investidas, tentando manter meu ritmo e não desanimar. Conforme os minutos foram passando, porém, fui sentindo meus membros ficando mais e mais pesados e minha energia se esvaindo, até ser surpreendida com uma voz dentro da minha própria cabeça.
— O que foi? Já se cansou?
Para meu espanto, percebi que fora Lavínia quem dissera aquilo, em alto e bom tom, provavelmente fazendo uso de algum tipo de conexão mental.
— Como você entrou na minha cabeça? — perguntei, espantada, em pensamento. — Como conseguiu se conectar comigo?
— Esse é apenas mais um dos meus segredinhos — ela respondeu, rindo. — Você não faz nem ideia das coisas que a minha relíquia de poder me permite fazer! Mas, por mais divertido que tudo isso seja, vou ter que acabar logo com esse joguinho. O rei tem compromissos e não posso atrasá-lo com algo tão insignificante quanto você...
— Não me subestime, sua desgraçada! — protestei. — Essa luta ainda não acabou! Ainda sou capaz de te vencer!
— Pobrezinha! — ela debochou, mais uma vez. — Essa luta acabou antes mesmo de começar! E o resultado final não irá mudar, não importa o quanto você esperneie. Agora me faça um favor e vá para o chão.
Assim que ela pronunciou aquelas palavras dentro da minha cabeça, perdi completamente o controle sobre meu corpo de loba e desabei no chão de terra. De alguma forma, a magia da relíquia de Lavínia estava agindo sobre mim mais uma vez e eu não conseguia fazer nada para revidar. E o pior, dessa vez eu sequer podia atribuir minha derrota à ação da coleira de prata, já que não havia nada que me atrapalhasse utilizar minha magia animal em sua totalidade.
A loba odiosa se aproximou de mim e me encheu de socos e pontapés, sem piedade. Bárbara e Inara tentaram vir até onde eu estava e me ajudar, mas os lobos que acompanhavam Navalha impediram que elas se aproximassem de onde a luta acontecia. Depois de me espancar sem hesitação por uns dez minutos ininterruptos, que mais pareceram horas, Lavínia enfim se deu por satisfeita.
— Espero que você finalmente tenha entendido a diferença que existe entre mim e você, seu lixo — ela declarou, ainda dentro da minha cabeça, e cuspiu no meu rosto, se afastando de onde eu estava caída.
— Esse duelo acabou e eu venci — ela disse em voz alta, assim que retornou à sua forma humana. — Posso executar a perdedora, meu rei?
— Não precisa — respondeu Navalha. — Muito obrigado, Lavínia. Eu continuo daqui — completou ele, enquanto se aproximava de mim.
Em instantes, vi o líder da Caçada Voraz se ajoelhar ao meu lado e erguer minha cabeça ensanguentada de loba, me segurando pela nuca.
— Era para você estar morta agora — ele me informou, frio. — Se eu não tivesse interferido, a Lavínia teria te matado num piscar de olhos, igual fez com o seu pai. Então, a partir de hoje, não se esqueça que a sua vida me pertence. Você só vai continuar vivendo porque eu assim quis e assim permiti.
Mesmo na forma de lobo, senti as lágrimas inundarem meus olhos ao ser submetida a tamanha humilhação, diante da minha mãe, dos meus amigos e dos demais aliados que nos acompanhavam. Eu não conseguia raciocinar e só queria que aquele pesadelo acabasse.
— Agora, como prova da minha misericórdia, eis o que nós vamos fazer — Navalha prosseguiu. — Você é uma loba talentosa, Maia, tem um dom raríssimo, que seria muito útil para a Caçada Voraz. Por isso eu vou te dar duas opções. Se você jurar lealdade a mim, eu perdoo os seus crimes e te dou uma posição no meu exército. A gente deixa todos esses desentendimentos no passado e recomeçamos do zero. Essa é a opção número um.
Automaticamente me retraí ao ouvir aquela proposta descabida e sem escrúpulos.
— Porém, se você não conseguir deixar o orgulho de lado e se submeter a mim, há a opção número dois — ele continuou a dizer, ao perceber o meu desconforto. — Você deve ir embora de Esmeraldina e não voltar pra cá nunca mais. Saia daqui como exilada e esqueça que a comunidade de lobos existe. Te dou minha palavra que nem eu nem nenhum dos meus súditos irá encostar em um fio de cabelo seu sequer. Mas não ouse dar uma de esperta e tentar me prejudicar outra vez — ele frisou, em tom ameaçador. — Se você não aproveitar essa chance que eu estou te dando, na próxima ocasião em que nos encontrarmos, você não vai sair com vida. Pense bem nisso, esse é o seu último aviso.
Assim que concluiu aquelas palavras, Navalha se levantou e se dirigiu ao meu grupo de aliados.
— Todos vocês são testemunhas do que aconteceu aqui hoje — ele declarou, em voz alta. — Eu escolhi não tirar a vida dessa garota. Eu poderia matar esse grupo inteiro agora mesmo se eu quisesse, mas vou estender o meu voto de boa vontade a vocês também. Estejam todos bem avisados: cuidem dos seus próprios assuntos e não fiquem no meu caminho, e ninguém irá se machucar. Ousem se voltar contra mim e irão se arrepender amargamente — concluiu ele, dando as costas para o grupo. — Vamos embora, Lavínia, ainda temos muitas coisas para resolver — Navalha disse por fim, se dirigindo à sua aliada.
A loira se vestiu e seguiu Navalha em silêncio. Logo o grupo de lobos se afastou de nós e se reuniu com o restante do exército, retomando sua movimentação rumo à Esmeraldina.
***
— Você perdeu completamente o juízo? — minha mãe gritou em minha direção, no escritório da pousada, enquanto Inara e Bárbara cuidavam dos meus ferimentos. — O que você estava pensando, Maia? Mesmo que você vencesse, o que você pensou que aconteceria depois? Você achou mesmo que ia dar conta de todos aqueles outros lobos sozinha?
— Eu não consegui ficar ouvindo eles usarem o nome do meu pai sem fazer nada! — retruquei. — Eu precisava fazer alguma coisa!
— Ah, mas que justificativa maravilhosa essa sua! — ela revidou, sarcástica. — Não importa que você quase tenha morrido, o importante é preservar a intocável reputação do seu papaizinho!
— Isso é o certo a se fazer! Você ia querer o mesmo no lugar do papai, eu tenho certeza! — protestei, indignada.
— Maia, caia na real! O seu pai está morto! Morto, minha filha! Falem bem ou mal dele, isso não vai mudar nada, nem trazer ele de volta pra nós! Eu sei que você viveu a sua vida inteira tentando ser um compasso da moral e da justiça por conta desses seus poderes, mas já passou da hora de você entender que a gente vive num mundo injusto e nem sempre vai dar pra fazer a coisa certa o tempo todo! Vai ter momentos em que a gente vai precisar engolir o orgulho, abaixar a cabeça e seguir em frente, com o rabo no meio das pernas! Não são os mais fortes que sobrevivem, mas sim os mais espertos. E, sinto muito dizer isso, mas hoje você não foi nada inteligente!
— Pelo menos eu fiz alguma coisa!!! — gritei, sentindo as lágrimas escorrerem pelo meu rosto outra vez. — Melhor do que ficar escondida nas sombras, como uma covarde, igual você! Você me viu ser espancada e sequer tentou me ajudar, mãe! O papai nunca faria isso!
— Eu não sou seu pai, Maia, e acho que já passou da hora de você entender isso — ela respondeu, fria. — Pode pensar o que quiser de mim, mas eu assumo as consequências pelos meus atos. Você deveria seguir o meu exemplo e começar a fazer a mesma coisa. Se você passou vergonha hoje e quase morreu, foi porque não soube reconhecer que ainda não está pronta. Foi tudo culpa dessa sua presunção e síndrome de super heroína. Me deixe fora disso, por favor, e não venha me culpar por eu não ter ido resolver a bagunça que você mesma fez. Você não é mais um bebê e eu não sou sua babá. Se quer mesmo vingar a morte do seu pai e se livrar da Caçada Voraz de uma vez por todas, comece a agir como uma adulta!
Antes que eu pudesse dizer mais alguma coisa, minha mãe deu as costas para mim e saiu do escritório, batendo a porta com força. Inara estava prestes a abrir a boca e me consolar, mas eu fui mais rápida.
— Meninas, já tá bom, podem ir... Eu preciso ficar um pouco sozinha, por favor. Obrigada por me ajudarem com os curativos...
Inara assentiu e saiu em silêncio, sem discutir. Bárbara demorou um pouco mais, me deu um beijo na testa e sussurrou no meu ouvido.
— Se precisar de mim, sabe onde me encontrar.
Assim que a pantera deixou o escritório, acreditei finalmente estar sozinha, mas logo vi uma sombra se mover em um dos cantos e tomar forma diante dos meus olhos.
— Desculpa aparecer assim do nada — disse Tatianna, vindo em minha direção. — Eu cheguei bem na hora que você e sua mãe estavam discutindo e achei que não seria de bom tom interromper...
— Então você ouviu tudo aquilo? — perguntei, envergonhada.
— Acho que a pousada inteira ouviu, pra ser sincera. Vocês duas estavam praticamente gritando...
— Desculpa — eu disse, sem saber exatamente pelo quê eu estava me desculpando.
— Eu sei que nós não somos próximas e você não pediu a minha opinião — mencionou Tatianna, com cuidado, — mas ela não está completamente errada, sabe? Você precisa de um plano, precisa ficar mais forte, aí sim você ataca com tudo e acaba com eles. Esse tipo de coisa não pode ser feita no calor do momento.
— Você vai acreditar se eu disser que sei de tudo isso? — admiti, frustrada. — Mas, naquela hora, não sei o que deu em mim! Eu não consegui me controlar! E olha só o que essa minha impulsividade me causou!
— Não se cobre tanto — aconselhou a vampira. — Eu posso te ajudar, se você quiser. Podemos treinar juntas. Eu tenho séculos de experiência em combate, isso pode servir de alguma coisa. Chame a Inara e a Bárbara e quem mais quiser participar. Quanto mais forte nosso grupo for, melhor.
— Essa é uma ótima ideia — respondi, finalmente um pouco mais animada. — Prometo organizar tudo e te avisar. Obrigada, Tatianna!
— Por nada! — ela respondeu, sorrindo.
Antes que pudéssemos continuar a conversa, fomos interrompidas pelo som de um celular vibrando. Tatianna tirou um aparelho modesto do bolso, um celular antigo que Poliana havia emprestado para ela, e checou suas mensagens.
— Puta merda! — ela disse, espantada.
— O que houve? — indaguei, curiosa.
— Eu entrei em contato com o senhor Alphaeos, o braço direito e conselheiro do Vampiro Rei, pra informar que eu tinha escapado da Caçada Voraz e estava bem. Ele me disse pra ficar por aqui e aguardar novas instruções...
— Certo, e o que tem de surpreendente nisso?
— As instruções acabaram de chegar — Tatianna revelou, sobressaltada. — Eu não precisarei mais ir embora daqui, porque o príncipe Leocaster finalmente despertou e o exército dos vampiros logo chegará em Esmeraldina.
— Espera — interrompi. — Então isso quer dizer que...
— Isso quer dizer que a guerra finalmente vai começar, Maia.
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Vai começar! Vai começar! Vai começar! Ansiosos pra essa guerra? Quem sairá vitorioso dessa? Lobos ou vampiros? 🐺❌🦇
O que acharam do ato de misericórdia de Navalha em relação à Maia? Aceitariam a oferta de se juntar à Caçada Voraz se estivessem no lugar dela? 👀
E o sermão da Helena? Ela agiu correto ao dizer tudo aquilo para a filha? 🤐
Semana que vem temos mais emoções, prometo! Enquanto o capítulo novo não chega, não se esqueçam dos votos e comentários de sempre, por favor! Muito obrigado! 💖🥰😍
Próximo capítulo: A vez em que um jovem lobo regressou ao seu país
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