Capítulo 12
Dominic estava saindo da ducha, pegando a toalha de algodão e enrolando na cintura, enquanto caminhava para fora dos separadores. Sean estava passando espuma no maxilar e lavando a lâmina de barbear, sacudindo o excesso de água e com uma mão, puxando a pele para cima, para que ficasse esticada o suficiente, passou a lâmina pelo local onde um aglomerado de pelos ainda curtos estavam forrando o queixo. Ela olhou de novo a lâmina e repetiu o movimento.
Olhou para o amigo de lado, por mais que pelo reflexo do espelho, já lhe mostrasse atrás de seu ombro.
— Tem notícias dele? — Perguntou jogando outra toalha mais curta por cima da cabeça a fim de secar os cabelos úmidos.
Sean deu de ombros e passou a toalha no rosto, tirando o restante de espuma e se virou para o amigo, apoiando a bunda na quina da pia de cerâmica branca.
Homens entravam e saiam do banheiro vaporizado e a conversa dos outros abafava a deles, Dom se encostou ao lado dele para poder conversar mais à vontade.
— Ele não dormiu no dormitório ontem, — Respondeu limpando a lâmina na própria toalha e guardou na própria bolsa.— Você viu ele?
Dominic negou com a cabeça e soltou os ombros relaxados. Ele sabia que Will estava no quartel pois tinha visto o automóvel na garagem, forrado com a lona para afastar a chuva e a lama. A não ser que Will tivesse fugido a pé, ele não teria saído. Mas também havia sumido. Não havia aparecido nos dormitórios, nem no refeitório, nem na sala de treinamento. Por esse motivo Dominic já estava começando a ficar preocupado com o sumiço dele.
— Hoje vai começar os testes no Akouard, — Dom mudou de assunto se virando para Sean que pegava uma camisa branca em cima da pilha de roupas.— Vê se não faz a gente passar vergonha.
Sean acertou um soco no braço de Dom fazendo com que ele se afastasse sorrindo.
O pátio estava cheio de pilotos, soldados, mecânicos, superiores encarregados e ali, no meio de tantos homens, Lizandra estava parada ao lado do Major. O blazer branco com botões dourados presos em cada extremidade por um cordão dourado, nas costas presos em pregas perfeitamente alinhadas, formando babados até a altura nas coxas. A calça branca tinha um círculo de couro preto nos joelhos, bem como joelheiras. As botas pretas iam até a metade das canelas e não eram presas por cadarços e sim por fivelas de couro. As luvas brancas nas mãos não eram de renda como de costume e sim de napa, bem firmes e aquecia seus dedos como uma sauna.
Os cabelos presos em uma trança que ia até a metade das costas, estava bem presa e sem nem um fio escapando por entre as voltas. Lady Marta lhe disse que ela estava vestida como um soldado e Lizzie achou que fosse um elogio, não era.
Por mais que algumas mulheres já tivessem se atrevido a usar a peça de roupa masculina, em Ilya, calcas em mulheres não eram bem vistas e tiravam a feminilidade das damas, que após o uso da peça perdiam a razão de serem chamadas desta forma.
Ao lado esquerdo dela estava o Major Quentin Allmons, grande e impetuoso com uma postura perfeita como uma estátua. Do seu lado direito estava o senhor Clinton, um homem magro, alto como o Major, com um cabelo cacheado e pouco maior que a altura dos ombros. Usava um óculos quadriculado e um terno que parecia 5 números maior que seu tamanho real. Ele segurava uma caderneta e uma plaqueta. Atrás dele estava o avião com bico redondo com uma hélice de quatro pontas, tinha uma cabine fechada e lugar para dois pilotos, o que era diferente de um Contelation. A cauda baixa, quase tocava no chão e a altura era menor que o constelation.
Os pilotos estavam todos parados assistindo a palestra de apresentação do senhor Clinton que parecia muito nervoso ao lado da Grã-Duquesa, por esse motivo, saiu do lado do engenheiro mecânico e deixou que o Major ficasse entre os dois. Por algum motivo, Lizzie estava escutando o que o senhor Clinton falava, mas seu olhar que estava direcionado para a bancada de pilotos, estava buscando pelo homem que tem atormentado seus pensamentos a dois dias.
— Zac Hoffman, criou o avião mais potente e rápido já feito, passando do Belta, que era a maior invenção feita por Fihel, que estava sendo aclamada por longos dois anos como "A arma do futuro", então Zac criou o Constalation Z. Foi um dos primeiros caças verdadeiramente modernos — O engenheiro parou ao lado do avião branco com faixas laterais em azul e amarelo, no fundo da cauda havia o brasão dos Sky Riders plotado no ferro.— Mas o futuro chegou e com isso o projeto Akouard saiu finalmente dos papéis — Ele sorriu nervoso, Lizzie parou de olhar para os pilotos e desistiu de encontrar aquele em específico, voltou a olhar para o senhor Clinton.— Eu vos apresento o novo caça inteiramente Ilyano, Akouard.
Os pilotos e todos ali na bancada de apresentação começaram a aplaudir, o senhor Clinton ficou totalmente constrangido e sem jeito, deixando a plaqueta cair dos braços, o impulso de Lizzie fez com que ela se abaixasse e pegasse os papéis e a plaqueta no chão. Todos pararam de aplaudir e uma tensão se estabeleceu no ar. Mas uma pessoa no fundo da plateia continuou aplaudindo e chamou toda atenção em sua direção, Lizandra se ergueu entregando a plaqueta para o engenheiro desconcertado e ergueu os olhos na direção das palmas, encontrando William, impetuoso e largado, com as costas encostadas num container de ferro, o uniforme, isso era, o macacão de voo verde musgo, aberto até a cintura, deixando a parte superior pendurada no quadril, expondo a camisa branca lisa por baixo, a luz do sol refletindo no metal das dog tags presas no pescoço.
Seu coração estava martelando contra o peito de maneira tão alta que ela ficou com medo de que escutassem.
De maneira mais desajeitada ainda, o senhor Clinton tossiu e gaguejou umas primeiras palavras antes de continuar falando.
— Bem, como ia dizendo — Ele prosseguiu e Lizzie desviou o olhar para ele.— incluindo características como a fuselagem toda de metal, cabine de voo fechada e trem de aterragem retrátil, sendo alimentado por um motor V12 invertido com refrigeração líquida, o Akouard pode atingir uma velocidade de 678 km por hora, além de atingir um teto máximo de 12 mil metros de altura.
Alguns cochichos e rostos chocados, inclusive o de Lizzie. Ela imaginou como eles conseguiam voar naquela altura e não sentir nem um tipo de incômodo, não se imaginava nesse papel e não conseguia imaginar essa possibilidade.
— Bem, homens — Quentin soltou a voz alta e grave do lado de Lizandra e ela quase tombou para o lado, caindo da plataforma.— Primeiramente gostaria de agradecer a grã-duquesa Lizandra Mallmann, que nos ajudou com os fundos de patrocínio.
Houve uma breve salva de palmas para ela, que se curvou gentilmente e sorriu para os pilotos. — Bem como o informado, nosso piloto de teste escolhido é agora o novo capitão do Ranking D, Sean Thompson.
Sean subiu na asa do a visão, grande com o uniforme como todos ali, mas segurando o capacete redondo entre o quadril e o braço, ele acenou para os homens e se curvou para a duquesa, subindo até entrar completamente na cabine. Ajudantes e mecânicos checavam uma última vez o avião, enquanto outros ajudavam a prender o cinto de segurança, traçando as faixas envolta e por cima do peito de Sean. Lhe colocando o capacete na cabeça e ajudando a prender a máscara de respiração. Fecharam tudo e o Major, o senhor Clinton desceram da plataforma que dava acesso a pista de voo, Lizandra seguiu eles e fez o mesmo, descendo os quatro degraus de escada até se juntar ao restante dos pilotos.
O avião foi ligado e dois homens que seguravam lanternas amarelas na frente da pista sacudiram para o lado e para o outro, dando o sinal de decolagem.
Lizandra que estava com os olhos fixos na nave que pegava velocidade na enorme pista de voo até que começasse a levantar voo, sentiu um roçar de seu ombro em outro e virou o rosto apenas para se desculpar pelo atrito causado, quando viu os olhos castanhos brilhantes encarando a pista de voo. Ela notou, agora de perto e o vendo por outro ângulo, que haviam pequenos hematomas nos cantos dos olhos, um corte no nariz, na altura das sobrancelhas, que indicava pela vermelhidão, que havia sido recente.
— Se eu fosse a senhorita, se afastaria um pouco — Ele disse pousando o cotovelo no cento de sua barriga e fazendo uma leve pressão para que ela fosse para trás, lizzie deu apenas três passos, confusa.
Quando a nave pegou tamanha velocidade que começou a subir, deixando de arrastar as pequenas rodas no chão, uma lufada de ar quente foi na direção dela e dos outros que estavam ali, junto com terra e fumaça, mas ela pareceu protegida quando notou que o corpo de William formou uma espécie de escudo na frente dela, recebendo tudo, levou o braço na altura dos olhos para que a poeira não o atacasse.
Will se ergueu e olhou a nave pegar altura, subindo cada vez mais a um ponto que eles já não alcançava a vista.
— É incrível...— Ela escutou Will balbuciar com os olhos brilhando na direção da nave que agora dava a volta e passava por cima deles, sumindo nas nuvens.
— Acha que tem potencial, senhor Kendric? — Lizzie perguntou e ele pareceu não ter escutado a voz dela de primeira, por isso abaixou a cabeça e inclinou na sua direção.— Eu não entendo muita coisa de aviação, acho que...— O barulho dos pilotos aplaudindo e falando alto, fez com que Will não a escutasse de novo, ele se abaixou mais e quase encostou o lóbulo da orelha na boca dela, para que ela falasse.— Acha que essa nova nave tem potencial?
Ela repetiu e agora Will havia escutado cada palavra com clareza, sorriu concordando com a cabeça.
— Tem, mas...— A nave deu outra volta passando por cima de novo, William seguiu ela com o olhar e notou algo na asa esquerda que ninguém ali havia notado, por isso ficou gelado como gelo e parou de falar. Lizandra seguiu o olhar dele, mas não conseguiu entender o olhar de espanto dele.—...A asa...
— O que tem de errado? — Lizandra perguntou com a boca aberta voltando a encarar ele, olhando para cima, cobrindo a luz do sol com a sombra da mão por cima da sobrancelha.— Parece perfeita.
William arregalou os olhos e deixou Lizandra, correndo até onde o major estava acendendo um charuto.
— Precisam pedir que ele desça agora! — Gritou pegando o Major pela gola do blazer. Quentin arregalou os olhos para o piloto.— AGORA!
Berrou e Quentin se soltou das mãos dele, cuspindo pedaços do charuto no chão.
— Enlouqueceu, Kendric? — Perguntou ficando vermelho como um pimentão, lizandra se juntou ao lado dele cautelosa, ele parecia que iria explodir de raiva.— Vou mantê-lo afastado, é isso que quer? Perder o posto de capitão já não lhe foi o suficiente?
— A asa, ela vai partir — Will disse apontando para cima.— Essa asa é mais leve, a pressão vai parti-la ao meio, veja como ela está sacudindo, olhe!
Will apontou para a nave que dava outra volta pegando mais altura. Lizandra olhou para onde ele apontava mas ainda não conseguia ver diferença, mas Quentin nem ao menos moveu a cabeça para cima, ele olhava com tanta raiva na direção de William que Lizandra segurou no braço do major só por achar que a qualquer momento ele fosse se lançar em cima de Will.
Então um barulho de explosão veio de cima e por impulso, Will segurou a cabeça de Lizandra, as mãos cobrindo os ouvidos ela, fazendo a cabeça abaixar no seu ombro, ele se afastou quando destroços da asa começaram a cair. Quando escutou o barulho agudo e viu a nave girando no ar enquanto perdia altitude, Will soltou Lizandra e correu na direção de onde a nave estava caindo. Quando Lizandra tentou correr para acompanhar William, sentiu uma mão lhe agarrando pelos ombros. Ela se virou encarando os olhos escuros e preocupados. O homem com cabelos aparados tão baixos e claros, tinha o rosto perfeitamente quadriculado, os lábios fino fechado em um filete e as roupas de piloto.
— Fique aqui, Vossa graça.— Então se soltou e correu atrás de Will, acompanhando o amigo.
— Ejeta, merda — Dominic ouviu William gritar enquanto corria na pista.— Ejeta, ejeta, ejeta!
Então como se fosse uma ordem, Sean ejetou. A cadeira foi impulsionada quando a nave já estava chegando no solo. O piloto saiu voando como um foguete para cima, o paraquedas se abriu e ele começou a cair de vaga, direto no campo gramado.
William e Dominic correram tão rápido que nem mesmo os primeiros socorros chegaram primeiro.
Sean estava deitado na grama com as cordas do paraquedas em cima dele. Não aparentava estar ferido, mas estava com os olhos fechados e não se mexeu quando Will se ajoelhou do lado dele, soltando seu corpo do cinto e do paraquedas. Dom afastou as cordas e abriu o macacão, para que ele respirasse.
William sem aviso prévio lhe lançou um tapa na bochecha e Sean acordou em um sobressalto, os olhos castanhos arregalados para o amigo e um grito abafado.
— Graças a Abramov! Está vivo — Will suspirou aliviado, caindo de lado. Dominic fez o mesmo, passando a mão na testa suada.— Você quase nos matou do coração, maldito!
— Eu que quase morri! — Respondeu.
Sean gemeu tentando se sentar mas desistiu, caindo de volta. Os homens de branco e médicos de primeiro socorros se aproximavam deles.
— Você demorou para ejetar, — Dominic disse segurando a cabeça do amigo, colocando no próprio colo.— Ficou louco?
Outro gemido de Sean, ele suspirou olhando para as pernas, pelo menos estava sentindo dor nelas, seria melhor que não sentir nada, pensou.
— A alavanca ficou emperrada, eu tentei puxar até conseguir.— Respondeu.
Os homens pararam com uma maca de dois homens e colocaram Sean em cima dela, cada um pegou nas pontas e levantaram o corpo dele.
Will e Dom se levantaram e o Major parou ofegante na frente dos dois. A duquesa logo atrás, os olhos nos dele de maneira que ele sentiu uma energia atravessar seu corpo como uma descarga eletrica.
— Kendric! — O major chamou com os dentes, rosnando como um lobo raivoso.— Kendric seu maldito!
— Senhor...
— Cale a boca! — Berrou.— Cale sua maldita boca antes que eu o expulse! O que estava pensando em? Escute aqui, eu sou seu superior, se você não me respeita, não respeita a coroa e não respeita seu país e se não respeita seu país não, nunca, poderá servi-lo...
Ele apontava o dedo anelar na cara de William, quando Lizandra entrou na frente, os olhos furiosos de uma serpente pronta para lhe dar o bote, fez o Major abaixar o dedo, engolindo seco.
— O único errado aqui foi o senhor, Major — Ela disse rosnando como ele havia feito.— O capitão Kendric...
— Subtenente.— O major a corrigiu e isso a fez ficar ainda mais nervosa.
— Ele lhe avisou que havia algo de errado e o senhor não o escutou, quando um piloto que não é nem ao menos um capitão — Ela enfatizou a frase capitão e os nervos de Quentin doeram de raiva.— Consegue ver um defeito que o senhor como Major e superior, deveria ter visto primeiro?
— Vossa graça, me perdoe mas a senhora não entende nada de aviação e não tem base construtiva para tratar deste assunto.
— Então só o dinheiro de meu patrocínio lhe serve, Major Allmons?— Ela rebateu.
Quentin parou de respirar. Ela podia jurar que ele parou de respirar. A boca aberta sem emitir um único som, os olhos arregalados nervosos.
— Kendric, quero você na minha sala agora — Disse gaguejando, desceu os olhos para Lizandra ainda parada na sua frente.— Tratarei com a senhora depois.
Ele deu um passo para sair quando ela o interrompeu.
— Não, Major — Disse fazendo ele se virar.— O senhor irá tratar comigo agora ou eu mesma ponho essa companhia no chão e acredite, eu tenho tanto poder para isso como o rei.
Quentin suspirou e ficou calado por um tempo até concordar com a cabeça, dando passagem para que ela o seguisse a sua sala.
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top