Capítulo 28


GREGORIO

Nunca imaginei que no auge da minha vida adulta estaria sustentando um relacionamento a distância, mas aqui estou eu encerrando uma chamada por vídeo com a minha namorada antes de ir para o trabalho, já fazem quatro meses que estamos nessa situação e cada dia que passa eu sinto mais saudades da Beatriz.

Mesmo a distância venho acompanhando a recuperação dela, a cada vez que ela consegue um marco de superação na fisioterapia é uma alegria, pois significa que ela está cada vez mais perto de voltar a operar.

Olho para o relógio redondo pendurado em uma das paredes da cozinha e percebo que se não sair agora vou me atrasar, pego minhas chaves e em um instante estou fora de casa, como não tive que dar aula no primeiro horário o Lorran foi sozinho de bicicleta mais cedo, distraído caminhando em direção ao colégio não percebi que alguém se aproximava de mim, então fui pego totalmente de surpresa quando escutei meu nome sendo falado de forma suave atrás de mim.

— Gregorio? A gente precisa conversar.

Com horror eu me virei e dei de cara com a última pessoa que eu gostaria de encontrar na vida, Cecília Nogueira estava ali parada falando comigo. Tive que levar minha mão aos olhos e esfrega-lo para ter certeza que isso não era uma miragem ou melhor uma alucinação bizarra da minha cabeça, mas quando voltei a abrir os olhos a mulher que um dia amei e que nos abandonou ainda estava lá parada olhando para mim.

— Cecilia, o que você faz aqui? — pergunto ainda embasbacado.

— Eu vim pelo meu filho Gregório e vim por você também.

— De que merda você está falando?

— Eu sinto saudades de vocês, vim para tentar recuperar a minha família.

— Você não tem nada aqui para recuperar, nós não somos a sua família. Você não está casada?

— Eu me separei e voltei, voltei para vocês.

Olho ao redor e algumas pessoas passam por nós nos olhando curiosidade, o mal de qualquer cidade pequena é a fofoca. Como todo mundo meio que se conhece, falar da vida alheia e a diversão particular de várias pessoas e como eu sou professor de uma das poucas escolas da cidade todo mundo sabe quem sou e isso torna as fofocas sobre a minha vida bem mais apetitosas e interessantes, creio que não há uma só pessoa em Alvorada que não saiba que fui abandonado por essa mulher com um bebe recém nascido e doente.

— Cecília não temos nada para conversar e eu estou atrasado para o trabalho. — Dou as costas para ela, mas antes que eu possa me afastar cecília fala:

— Eu vim para ficar gregório e eu quero ver o meu filho.

Não respondi nem me virei, apenas voltei a caminhar, os pensamentos a mil na minha cabeça pensando em como a volta dessa mulher poderia afetar a minha vida e a do meu filho.

====

Minha manhã não rendeu nada no trabalho, hoje eu estava com a cabeça em outro lugar e agora a lembrança da Cecília que nunca me incomodou está como um fantasma rondando minha mente. Termino de preparar o almoço e grito o Lorran para que desça, não falei nada com meu filho sobre o inesperado retorno da mãe, preciso pensar melhor no que vou fazer antes de envolver meu filho nessa história.

Saio para o quintal para jogar o lixo da cozinha na lata grande e ao voltar passo o olho na casa da dona Matilde e estranho o fato da luz de fora ainda estar acesa, normalmente pela noite ela a deixa acesa, mas logo quando acorda a luz é apagada. Volto para dentro e pego meu celular e desconecto da caixa de som e desligo o pagode que estava escutando. Rapidamente busco o número da dona Matilde e ligo para ela.

— Papai — Lorran vem gritando, mas se cala quando percebe que eu estou no telefone, aponto para ele as panelas no fogão.

A ligação se encerra depois de chamar várias vezes e não ser atendida, por algum motivo um sentimento ruim toma conta de mim e então pego as chaves da casa vizinha e vou até lá.

Abro o portãozinho que divide as casas e assim que entro no quintal escuto a Yang, a gatinha da Beatriz miando loucamente pelo lado de dentro da porta da cozinha. Procuro no molho a chave equivalente, porque para falar a verdade eu nunca precisei utilizá-la. Quando finalmente a porta é aberta a Yang sai lá de dentro e eu me abaixo para pegar a gatinha que parece assustada.

— Dona Matilde — grito e não obtenho respostas.

Sei que não deveria estar preocupado, pois a senhorinha é bastante ativa e quase não para em casa, mas o sentimento ruim apertando meu peito não me abandona e se tem uma coisa que aprendi nessa vida é dar ouvidos aos meus instintos.

Passo pela cozinha e nada parece fora do lugar, na sala a mesma coisa subo as escadas chamando pelo nome da dona Matilde e nenhuma resposta quando passo na porta de um dos quartos meu coração erra uma batida, dona Matilde está jogada no chão ainda vestida com um pijama de flanela, entro no quarto e pego em seu pulso respirando mais aliviado por ela ter batimentos mesmo que fraco assim como a sua respiração.

Pego o celular e ligo para a emergência e eles me orientam a não movimentá-la e é isso que eu faço. Desço as escadas correndo e vou até em casa pegar a minha carteira com os meus documentos. Encontro o Lorran ainda sentado na mesa da cozinha almoçando.

— Filho terminando aí quero que você pegue a sua mochila e vá para a casa do Alex, vou ligar para a tia Vitória ou para o Luiz e dizer que você vai passar a tarde lá com seu amigo.

— Ta bom, o que está acontecendo? — Ele pergunta assustado ao notar minha afobação.

— A dona Matilde não tá legal, vou levá-la até o hospital. — Assim que termino de falar escuto o barulho característico da ambulância e volto para a casa vizinha, abrindo o portão e dando passagem para os socorristas fazerem o seu trabalho.

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— Estava com saudades, mas não queria te encontrar nessa situação — falo com a Beatriz enquanto limpo mais uma das inúmeras lágrimas que derramou desde o momento que chegou junto com o restante da família.

— Eu não acredito que ela enfartou estando sozinha em casa, se não fosse por você ela poderia estar... estar...

— Xiu, não precisa falar nada a Dona Matilde é forte e vai viver muitos anos ainda. Você não quer ir em casa comer alguma coisa?

— Não, quero ficar aqui para quando ela acordar.

— Beatriz você chegou de madrugada, cansada da viagem, já é quase meio dia e você não tomou nem um café hoje.

— Eu já não posso operá-la por que minha mão está inútil, então quero ficar aqui para monitorar a vovo.

— Primeiro não fala que sua mão tá inútil, já conversamos sobre isso — repreendo e ela faz biquinho — para terminar sei que para você é difícil, mas em nada você vai poder ajudar se cair desmaiada por falta de comer alguma coisa.

— Escuta seu namorado filha — o senhor vitório fala se aproximando. — a Matilde vai ficar bem, os médicos já te falaram tudo e você leu os prontuários, sabe que ela está estável e agora só está descansando, assim que ela acordar eu aviso.

Percebo que ela não quer, mas acaba cedendo e então saio com ela do pequeno hospital da cidade e vamos no meu carro até em casa, mas antes passamos em um restaurante e compramos nosso almoço.

— Não vou poder ficar com você hoje pela tarde, tenho que trabalhar.

— Não tem problema – fala chateada — vou ficar com a minha família, eu não acredito que nós estamos passando por mais uma coisa ruim. — Ela fala antes de sair do carro, que eu estacionei na frente do portão.

— Sinto muito por vocês, gosto muito da sua avó e ver ela doente está doendo em mim também. — Dou um beijo nela antes de pegar a chave para abrir o portão.

— Mas nos..

— Ai meu deus não acredito — escuto a voz da Cecília próximo a nós e meu sangue congela.

Com toda a situação que passamos desde ontem eu não contei a Beatriz que a Cecília estava de volta à cidade, para falar a verdade até tinha me esquecido dela, pois a saúde da dona Matilde tomou conta de todos os meus pensamentos.

— É você beatrizoca cara de orca? — gratuitamente a Cecília ofende e sinto a Beatriz ficar rígida ao meu lado. — Espera um pouco vocês estão juntos? Só pode ser uma piada, você baixou muito o nível não é Gregório?

— Ai quer saber vai pro inferno vagabunda — Beatriz vociferou ao meu lado antes de abrir o portão e entrar para minha casa, deixando a mim e a Cecília plantados na calçada.

— Que merda você pensa que está fazendo falando assim com ela?

— Vai me dizer que você está mesmo com aquela gorda?

— Chega Cecília, cala a boca. Não ouse tentar ofender a Beatriz. E para de me procurar se eu ver você rondando a minha casa ou perto do meu filho eu juro que chamarei a polícia.

— E você vai dizer o que? Ele também é o meu filho e eu vim para ficar com ele você não vai poder me impedir de ficar com o Lorran.

— Papai? O que ela está fazendo aqui? — Lorran pergunta chegando de bicicleta.

Era tudo que faltava para piorar ainda mais a situação. 

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