🔮 Prólogo

 
Clã dos Ciganos de Andaluzia:
 
O clã de ciganos da Andaluzia era um grupo de nômades, divididos em clãs que eram espalhados por todo o mundo. Embora os ciganos estivessem longe de constituir um povo, e fossem nômades por natureza, aquele clã em especial havia  feito acampamento permanente naquela região, e viviam ali há anos, por esse motivo, eram conhecidos como o clã de Andaluzia. A comunidade deles era na floresta, perto do lago, suas casas eram tendas e carroças pequenas , coloridas e alegres. 
 
Dentro do clã, aqueles ciganos seguiam a cultura de seus povos  com fervor. As mulheres e homens que podiam engravidar eram restritos à esfera doméstica, porém realizavam trabalhos como costuras, rendeiras e artistas. Também se dedicavam à leitura das mãos e de baralho para predizer o futuro.
 
Os valores como a fidelidade à família e ao clã, e os casamentos entre si era outra tradição dos ciganos. Suas habilidades, assim como suas roupas coloridas eram a cultura e sobrevivência deles, que com o passar dos anos. Apesar das resistências e dificuldades que um mundo moderno trazia, sobrevivia. 
 
Raio de Luar/Tayrone, era um curioso cigano de quatro anos, ele ainda não sabia, mas seu destino já estava traçado pela sua cultura, mesmo antes do seu nascimento. E não havia nada que o pequeno garoto pudesse fazer para mudar seu futuro. 
 
— É impressão minha ou a senhora parece contrariada quanto ao casamento de Tayrone? — perguntou curiosa Constância, mãe do pequeno cigano. 
 
Amapola, avó do pequeno cigano, fitava nora, e ao mesmo tempo, o  pequeno cigano que estava brincando próximo de ambas, e que nem mesmo tinha noção do teor da conversa delas. 
 
— O Raio de Luar não será um homem que aceite que decidam seu destino, ele será forte o suficiente para decidir por conta própria. — Afirmou Amapola. 
 
Constância fez uma expressão brava, como se sua sogra tivesse dizendo a pior das loucuras.
 
— Onde já se viu!  Raio de Luar e cigano! É como tal, ele vai seguir a  tradição, assim como eu seguir, assim como todos. 
 
Amapola suspirou triste, era comum na sua cultura os casamentos arranjando, era comum a cerimônia acontecer com eles jovens. Ela mesma casou com 15 anos, e assim como ela, seu neto fora prometido assim que nasceu a um clã vizinho, era uma aliança que traria união entre as duas comunidades. 
 
A causa era nobre, se não fosse o fato dela, como a boa cartomante que era, ter visto o futuro do seu querido neto nas cartas de seu baralho. Constância e seu filho Manolo ainda não sabiam, mas Raio de Luar não iria seguir o destino traçado por seus pais. Ele tinha seu próprio destino.
 
— Manolo já acertou tudo, o Raio de Luar vai casar-se com Bóris assim que alcançar seus 19 anos. Boris, que já tem 15 anos , exigiu que o ritual do lenço seja feito na ocasião. Para atestar a virgindade do noivo. Embora, ele não tenha que preocupar-se  com isso, assegurei que eu mesma iria cuidar da pureza do meu filho. 
 
Aquele ritual era normal entre os clãs  ciganos,  nesse ritual  do lenço era comum recorrer a uma das mulheres mais idosas e respeitadas da tribo para fazer o teste do lenço ou do lençol, uma exibição da mancha de sangue provocada pelo rompimento da primeira relação sexual.
 
— Se já está tudo encaminhado, não há nada a ser dito, só esperar o tempo passar. — Avisou Amapola pensativa, e ao mesmo tempo preocupada pelo futuro.
 
Constância sorriu triunfante, ela era uma bela cigana morena, estava toda enfeitada com sua rosa no cabelo solto ao vento, saia vermelha rodadas e fartas e blusa na mesma cor. Ela nem mesmo respondeu sua sogra, saiu em busca de seus afazeres, para uma mãe cigana, sabe que o destino de seu filho estava encaminhado, era  o motivo de orgulho. 
 
Amapola fitou seu neto e tentou descobrir uma saída que pudesse salvar seu pequeno do  futuro. Foi então que ela lembrou-se da leitura de mão, Raio de Luar ainda era novinho, ele tinha muito tempo para aprender tudo que precisava para ler mãos, assim como na carta lhe mostram uma vez, o destino do seu neto, estava na leitura da sua mão. 
 
E mesmo que ele tivesse quebrado uma tradição do seu povo, ela sabia que tudo valia pena, pelo futuro e felicidade do neto.

Anos mais tarde, clã de ciganos da Andaluzia. 
 
— EU. NÃO. VOU. ME. CASAR!— Raio de Luar, estava com seus 19 anos recém completos.  
 
Infelizmente, pensava o jovem e belo cigano, a maioria dos jovens festejam essa data com sua família e amigos, ou como no caso de sua cultura, com muita música, dança ao redor da fogueira e comida. Mas para Raio de Luar não foi assim, o presente que ele recebeu de seus pais foi um casamento, com um homem muito anos mais velho que ele, e que Raio de Luar nem mesmo conhecia.
 
Ele não era tolo, sabia da sua cultura, passou sua vida vendo seus primos e amigos sendo submetidos a casamento arranjados. Durante sua vida, ele aprendeu a respeitar tudo que sua tradição vivia, ele era capaz de viver tudo, menos ser capaz de  viver em uma casamento arranjado. 
 
 No seio da comunidade cigana, a idade é um posto. Como são os mais velhos que transmitem o conhecimento e a sabedoria, são respeitados pela sua experiência de vida. Em muitas das disputas e litígios entre membros do povo cigano, é habitual recorrerem a uma pessoa mais velha para dirimir o conflito. Assim ele optou por correr até sua avó, Amapola era sua pessoa preferida no mundo, ela que lhe ensinou tudo. Principalmente a ler o futuro das pessoas na palma da mão. 
 
Amapola assim que fitou seu belo neto na entrada da sua tenda, ela suspirou triste e revelou: 
 
— Você já sabe? 
 
Ele correu para os braços de sua avó, que o envolveu de bom grado na sua proteção e esperou que seu menino chorasse.  Minutos depois, já calmo, Raio de Luar comentou com pensar: 
 
—  Eu não entendo, somos tão livres quanto às coisas mundanas e ao mesmo tempo, não temos essa liberdade para escolher nosso futuro. Eu não quero me casar com um homem que nem mesmo sei quem é. 
 
Amapola fazia um carinho no cabelo do neto, os anos foram generosos para ele, Raio de Luar se transformara em um lindo jovem, moreno, não era muito alto, seu corpo era marcante, assim como seus olhos que eram muito expressivo e parecia que continha uma multidão de palavras, o corpo dele era cheio de tatuagem, e assim como restante do clã, ele vestia-se com roupas coloridas e usava brincos. Seu neto era lindo. Puro e especial. 
 
— Mas quem disse que você não tem essa liberdade, meu pequeno? 
 
Raio de Luar franziu o cenho confuso , por vezes, sua avó o confundia com algumas palavras. 
 
— Eu sinto que devo fazer algo, mas não sei o que é. —  revelou Raio de Luar.
 
Sua avó beijou  sua cabeça e murmurou: 
 
— Não atormente sua bela cabecinha com esses pensamentos , hoje é noite de celebrar, e seu aniversário, está na transição que ainda não é uma adulto, mas também não é mais um adolescente. É um jovem lindo. E tem todo tempo do mundo 
 
Raio de Luar sorriu com os olhos tristes, como ele queria que sua avó tivesse razão, que ele tivesse mesmo todo tempo do mundo, assim ele podia escolher seu destino. 
 
— Confia no destino?  — perguntou sua avó enigmática.
 
Raio de Luar afirmou com um gesto de cabeça. 
 
— Então não se preocupe , ele vai se encarregar de pôr tudo em seu devido lugar. — Afirmou Amapola. 
 
Raio de Luar sorriu feliz , se tinha uma coisa que ele confiava era na sua avó, sorrindo, ele correu para roda de música em celebração aos seus 19 anos. O que a vida lhe reservava ele não sabia,  mas naquela noite,  ele queria dançar e celebrar até se esquecer do seu futuro. 


 
Infelizmente, para o Raio de Luar, seus pais não esqueceram da história do casamento, pior, após seu aniversário, eles arrumaram tudo para a celebração, até mesmo a data. Com o passar das semanas, ele teve de lidar com o  fato de que  ia mesmo se  casar com um completo estranho. 
 
Ele estava numa tenda, seu pai, assim como seus primos e outros membros do clã o preparava para ocasião de seu casamento, a felicidade de todos, de certo modo, o feria, como era possível que  eles estivessem tão felizes vendo a dor que seus olhos transmitiam?  Em um determinado momento, seus olhos tristes  foram até a entrada da tenda,  onde estava Amapola parada. Ele notou que sua avó parecia querer dizer algo para ele. 
 
Fitou sua imagem no espelho, se não estivesse tão triste, poderia até sentir-se lindo, naquela noite ele trajava sua vestimenta cigana nas cores vermelha, um lenço negro perdia sua cintura e na cabeça um lenço vermelho completava a vestimenta. Era a roupa do seu casamento, com um homem que não fez nem mesmo um esforço para tentar conhecê-lo antes da cerimônia. 
 
Ele passou perto do local da festa e notou que todos estavam felizes, todos, — menos ele — Os ciganos conversavam em romani, também chamado romanês.Trata-se de uma língua ágrafa (não escrita) e ensinada de forma oral, que era do seu povo. Aquela felicidade, de certa forma , o deixava deprimido, ele resolveu caminhar até o lago, seu noivo ainda não havia chegado, pelo visto, ele nem fazia um esforço para tentar conhecê-lo antes da cerimônia. 
 
O vento frio castigava aquela noite. O amargor assentou na garganta do belo cigano. Não estava pronto para assumir um casamento.  Não estava pronto para deixar seu destino nas mãos de um desconhecido. Então, o que fazer ? 
 
Talvez devesse deixar  sua comunidade por um tempo. Era o seu lar, mas ele realmente merecia ser feliz. Seus pais poderiam lhe odiar pela vergonha que iriam passar,  Todos o olharia ou julgaria,  com pena deles, por ser pais de um filho  ingrato. Será que um dia eles o aceitariam de volta?  Aquele era seu lar, mas será que ele teria forças para fugir? 
 
— Faça o que seu coração mandar meu filho, vá até seu destino.
 
A voz de sua avó rompeu o silêncio da noite. 
 
— Vovó…?
 
Amapola interrompeu o neto, aproximou-se dele e entregou um saco com os pertences do jovem. 
 
— Não temos muito tempo, em breve seus pais vem atrás de você, então, se você quiser ir, a hora é agora! 
 
— Como você sabia ?
 
 Raio de Luar há dias vinha tendo essa ideia na sua mente. Ele tentou de todas as formas tentar dissuadir seus pais a desistir da ideia do casamento. Embora,  ele não soubesse se seria audacioso o suficiente para tão façanha. Mas com a ajuda da sua avó , tudo ficou diferente. 
 
— Eu sempre soube meu pequeno, vi esse momento na minha carta, por isso te ensinei a ler mãos, isso que vai te sustentar e te leva até seu destino. Agora, você não tem muito tempo, se quer mesmo fugir?  Esse é o momento certo.  
 
Olhos do pequeno cigano se encheram de lágrimas pela emoção do momento, sua avó o estava dando tudo que ele sempre quis, uma oportunidade de ter seu próprio destino. 
 
Raio de Luar pensou na decepção que seus pais sentiram,  mas tudo que ele queria na vida era ser livre e feliz. Deu um abraço forte na sua avó, se o destino assim quisesse,  um dia ele se encontraria novamente. Pegando sua pequena bolsa, ele seguiu seu caminho naquela noite escura, ele estava indo de caminho ao desconhecido, mas com a certeza que estava segurando sua liberdade na palma da sua mãos. 






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