Surpresa
"Não corrigir nossas falhas é o mesmo que cometer novos erros".
Confúcio
Conforme as aulas passaram, Miguel foi se dando conta do papel de idiota que fizera. Sophia estava certa, não tinha o direito de reclamar, não eram mais namorados. No entanto, controlar o ciúme que ainda sentia pela Almeida não era fácil, não queria que mais ninguém, além dele, olhasse para as curvas tentadoras da Almeida.
— Miguel!
— Que foi seu idiota? – resmungou guardando seu material, após o tocarem o alarme anunciando o intervalo.
André ignorou a atitude hostil.
— Faça as pazes com a Soph.
— Cuide da sua vida – pronunciou entre dentes.
— Você que sabe... – André suspirou com falso ar inocente. – Acontece que a Sophia tá muito fofa hoje... Sabe como são os caras, né?
Miguel fuzilou o amigo com o olhar, mas André não pareceu incomodado, riu e apontou na direção da Almeida. Olhou para o ponto indicado, Sophia estava em pé, concentrada em recolher seu material, e, atrás delas, três garotos estavam babando, olhando para o corpo de Sophia sem o menor pudor.
Quando ela se virou os rapazes a cercaram e Sophia ficou imediatamente vermelha. Levantou-se irado, caminhando apressado até a ex, podendo, poucos segundos depois, ouvir claramente o que a deixava envergonhada.
— Agora que você e o Rodrigues terminaram, que tal sair comigo hoje à noite?
— Não! Saia comigo, sou melhor que o Silas e o Rodrigues.
— Uma moça bonita precisa de toda atenção, nesse caso sou a melhor escolha.
Sophia não sabia o que dizer. Lógico que não pretendia sair com nenhum deles, não gostava nenhum pouco da forma que a olhavam, principalmente porque nenhum a olhava nos olhos e sim para seu corpo, principalmente o vale de seus seios.
— A deixem respirar, bando de abutres oportunistas.
As palavras gélidas e o olhar de poucos amigos fizeram os rapazes se afastarem e a fez respirar aliviada, embora o olhar que ele lhe endereçou fosse ainda mais hostil do que dera aos colegas.
*S2*
Molhou o rosto para retirar um pouco da maquiagem que Yasmin aplicara com todo cuidado – e excesso – em sua pele acetinada, o que não adiantou muito já que eram a prova d'água, mas foi o suficiente para sentir-se leve. Secou com papel toalha e fitou seu reflexo no enorme espelho do banheiro do colégio. Como a colega conseguia aguentar a sensação pesada e pegajosa que tanto pó, brilho e gloss produziam? Não se sentira ela mesma com aqueles produtos, tampouco estava à vontade com o uniforme.
Ajeitou a blusa, tentando fechar mais um botão, mas o que conseguiu foi que outro se abrisse. Tivera de aguentar a vontade de aceitar o casaco de Miguel, e só não o fez por causa do tom rude que ele utilizara ao oferecer e as recomendações de Yasmin.
"Não importa o que ele diga, a menos que suplique de joelhos que volte a namora-lo, faça exatamente o contrário."
Leonardo dissera que era bobagem, que pessoas como Miguel jamais cairiam no truque que Yasmin elaborara, mas, até o momento, a Ortiz parecia entender mais do assunto que o Moreira.
Miguel não só voltara a falar com ela, mesmo que para dar ordens malcriadas, como também estava ao seu lado no intervalo. Tudo bem que André também estava com eles e Miguel não abrira a boca desde que saíram da última aula, mas era um começo promissor.
Pegou a pequena bolsa de ombro e retirou os produtos para reaplicar o gloss, passando bem menos do que antes, não tinha a destreza da Ortiz e não gostava da sensação que tanta maquiagem lhe dava.
Deu uma última olhada em seu visual artificial demais para seu gosto e virou, ficando cara a cara com sua inimiga mais persistente. Estranhou vê-la, pois ela não tinha aparecido em nenhuma das aulas naquele dia, e estranhou ainda mais que não estivesse usando o uniforme do colégio.
— É hoje que acertaremos nossas contas, Almeida.
Ignorando a hostilidade na voz da ruiva, Sophia tentou sair do banheiro, mas Leona se colocou a sua frente. Desviou. Leona seguiu seu movimento, barrando-a novamente.
— Vou ter de estudar em um internato por sua causa – disse Leona com raiva.
Reparando nos punhos fechados da ruiva, Sophia recuou alguns passos.
— Não te fiz nada, foi o contrário – recordou a Almeida. — Por favor, me deixe passar e perdoarei tudo o que me fez – pediu, procurando acalmar a ex-colega, mas Leona não lhe deu ouvidos e avançou em sua direção.
*S2*
Na primeira vez que decidia voltar a ficar perto de Sophia — para protegê-la dos franguinhos que tinha como colegas—, aparecia uma garota de seu odiado fã clube para avisar que Leona entrara no banheiro feminino logo depois da Almeida, e as duas estavam discutindo. Correu, imaginando qual seria a nova loucura da ruiva, mas o que viu o deixou paralisado de surpresa.
Leona estava no chão, gemendo com as mãos nas costelas e Sophia estava em pé, apoiada na pia, a blusa aberta até pouco abaixo dos peitos e os olhos arregalados, fixos na figura caída a sua frente. Estava tão chocada quanto ele.
— O que houve? – André perguntou, entrando logo atrás do Rodrigues.
— E-ela queria me agredir... E-então me defendi...
— Essa selvagem me bateu – gritou Leona sento levantada pela garota que chamara Miguel.
— A Sophia bateu em você?! – Miguel duvidava que uma pessoa delicada como Sophia pudesse machucar uma mosca.
— Tá de brincadeira, né? – disse André, também duvidando da ruiva.
— Só me defendi – repetiu Sophia com mais firmeza. – Foi só um golpe com as palmas abertas que aprendi nas minhas aulas de ninjutsu moderno – explicou querendo fechar a blusa que Leona abrira ao agarra-la pela roupa, mas alguns botões tinham sumido.
— Um golpe? Foram vários tapas, nem tive tempo de me proteger dessa bruta... Ai!
Sem conseguir visualizar Sophia batendo, ou se defendendo de um agressor, Miguel analisou a ex. Fora a blusa, que a Almeida segurava pra manter fechada, nada denunciava que ela tivesse lutado com alguém. O cabelo sequer estava bagunçado.
— Ninjutsu moderno?
Ela assentiu.
— Meu pai me inscreveu após saber o que houve no colégio. – Voltou-se para Leona, que continuava encurvada de dor. Talvez, no susto, tivesse exagerado. – Me desculpe, não queria machuca-la...
Leona a encarou com ódio, mas Sophia não teve como voltar a pedir perdão, Miguel bloqueou sua visão da ruiva e a forçou a vestir o blazer dele. Embora ela não tenha feito nada para impedi-lo, precisava mesmo de algo para cobrir a blusa sem os primeiros botões e, sendo maior que ela, o blazer cobria a falta de pano da saia. Além disso, era gostoso sentir o cheiro dele que emanava do vestuário.
— O-obrigada...!
— Não peça desculpas quando a errada não for você – censurou antes de beija-la na testa. Um beijo casto, mas que foi o suficiente para que ela sentisse as pernas moles e procurasse apoio nele.
O sinal tocou estridente, o que fez Sophia arregalar os olhos ao dar-se conta do absurdo da situação. Miguel e André estavam dentro do banheiro feminino, Leona andava até a porta, amparada por uma garota que não conhecia, e ela estava agarrada ao ex e sem vontade alguma de larga-lo.
— Vamos! – comandou Miguel indo em direção à saída, envolvendo o corpo dela em um abraço apertado.
Somente alguns alunos presenciaram eles saindo do banheiro, o que era um alívio. Dificilmente a diretora saberia do ocorrido, pelo menos Sophia desejava que não soubesse. Seria vergonhoso ser taxada de violenta quando sequer tivera vontade de agredir a ruiva.
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