Capítulo XVIII

Reunidos na sala após o jantar, a família assistia a um filme que primeiramente era visto apenas por Sarah e Tom, só depois de uns bons minutos quando acabaram de arrumar toda a cozinha após o jantar, foi que Juliette e Bia se juntaram aos dois que já estavam deitados juntos no sofá maior.

Bia na verdade nem assistiria ao filme, mas assim que viu que a película se tratava de uma adaptação de um livro de piratas que a garota ganhou da mãe, se animou em ficar na sala para assistí-lo.

Mesmo não sendo muito de seu gosto filmes sobre piratas, Juliette se dispôs a assisti-lo juntamente com os filhos e a esposa que estavam vidrados na película.

Um tempinho mais tarde, o sono e um leve enjoou se abateu na mulher. Juliette resolveu se recolher e falou para os demais  que ia subir e se deitar, pois estava começando a ficar sonolenta e levemente enjoada.

- Quer que eu prepare aquele chá que a Lu faz pra passar seus enjôos? - sugeriu Sarah olhando para a esposa com preocupação.

- Não é necessário, mas te agradeço. - ela forçou um sorriso.

Quando via Sarah reclamar dos enjoos e da constante sonolência durante os primeiros meses da gravidez, Juliette achava que a esposa exagerava um pouco já que Sarah costumava ser um poço de exagero, sem contar que era um tanto dramática. Mas agora que era a grávida, Juliette sentia na pele que Sarah não exagerava em nada. Senti sono em demasia, cansaço, felizmente os enjoos diminuíram, mas volta e meia apareciam.

- Tem certeza que não quer o chá?

- Absoluta!

Juliette se levantou do sofá em que estava sentada juntamente com Bia, deu um beijo na filha, outro no filho menor que estava deitado sobre Sarah e afagou os cabelos da esposa, pedindo para que assim que aquele filme terminasse, ela colocasse Tom na cama porque amanhã o menino ainda tinha aula. A economista assentiu e logo após ter lhe dito "boa-noite", a mulher subiu.

Já no quarto, Juliette trocou a roupa que estava, por seu conjunto macio de dormir. Foi ao banheiro, escovou os dentes e jogou água no rosto. Poucos instantes depois, a mulher já se acomodava em sua cama macia ainda sentindo aquele leve enjôo que não chegava a ser algo incômodo, mas a deixava desconfortável. Contudo, apesar disso, Juliette conseguiu pegar no sono em questão de poucos minutos.

Na sala o filme que àquela altura já estava passando da metade era assistido somente por Sarah e Bia, já que o pequeno Thomás vencido pelo sono, dormia profundamente sem que a mãe ou a irmã sequer percebessem, pois ambas estavam vidradas no filme.

Mais ou menos meia hora mais tarde, enfim, o filme chegava ao seu fim. Ao olhar para Sarah, Bia viu que o irmão dormia sobre o peito da mãe. Ela apontou o garoto e falou para Sarah sobre o estado adormecido do pequeno. Com cuidado, a mulher levantou de leve a cabeça do braço do sofá e comprovou, que realmente o filho dormia sobre ela.

- Vou levá-lo para o quarto dele.

Bem devagar, Sarah se levantou do sofá trazendo consigo Tom. E por estar em sono pesado, o garoto nem acordou com o movimento feito pela mãe.

- Eu também já vou para o meu quarto.

A garota se levantou do sofá e desligou a televisão. Subiu junto com Sarah que carregava Tom. Chegando a porta de seu quarto, Bia recebeu da mãe um beijo de "boa noite" na testa e entrou em seu cômodo enquanto Sarah seguiu para o quarto de Thomás.

Colocando o filho na cama, a mulher ajeitou as cobertas em cima do garoto e fez o que já tinha se tornar um costume seu nesses meses: beijou a testa do filho quando ele já estava adormecido.

- Boa noite, meu menino! - murmurou, deslizando de leve a mão pelos cabelos do menino.

A mulher ligou a luminária e apagou a luz do quarto antes de deixar o cômodo. Entrando na ponta do pé em seu quarto que estava a meia luz, Sarah viu que a esposa já dormia profundamente. Tentando fazer o mínimo de barulho possível para não acordar Juliette, a loira trocou de roupa e se deitou em seu lado na cama. Como o sono parecia não querer vir, Sarah virou-se bem devagar e ficou olhando para Juliette. O rosto bonito dormindo serenamente.

Ela é tão linda!

E com o avançar da gravidez sua beleza só fazia crescer aos olhos de Sarah. Havia um brilho nela, uma áurea que por vezes, Sarah se pegava admirando a esposa com discrição para que não fosse pega pela outra, mas as vezes Juliette lhe flagrava e a loira corava de vergonha ao ser pega.

Queria tanto te dizer o que eu sinto!

Por que era difícil dizer a Juliette que gostava dela? Se bem que, era mais do que somente um gostar. Havia se apaixonado pela esposa... Completa e totalmente!

E não sabia como dizer aquilo a própria, porque lhe faltava coragem para revelar seus sentimentos!

Será que essa dificuldade toda também aconteceu anos atrás, quando me apaixonei  por você a primeira vez?

Com aquele e outros questionamentos rondando sua cabeça enquanto velava o sono da esposa, Sarah acabou adormecendo algum tempo depois, agarrada a mão da esposa.

❤️❤️❤️

Acomodada na sala de espera do hospital há mais de meia hora, Juliette aguardava nervosa e já até um pouco impaciente a volta de Sarah. Sua mulher tinha sido levado por Camilla para fazer uma tomografia da cabeça. A professora só pedia silenciosamente para que nada de grave fosse detectado nesses exames.

E não será!

Ela repetia a si mesma aquelas palavras. Já basta a amnésia que veio para bagunçar e virar de ponta a cabeça a vida delas, não precisavam de outro grave problema para preocupar a todos.

Mais algum tempinho de espera e Juliette viu sua mulher e a neurologista, que por sinal não estava com uma boa expressão, retornarem de onde tinham ido fazer a tomografia.

- Vamos entrar, Juliette, para conversamos sobre o resultado.

A professora não gostou nada do tom que Camilla usou.

As três seguiram para dentro do consultório da neurologista. Assim que se acomodaram em suas cadeiras, Juliette apressou-se em perguntar a médica sobre o que tinha acusado o exame da esposa. Camilla demorou um pouquinho a revelar o problema e isso só fez com que tanto Juliette quanto Sarah ficassem apreensivas e temerosas quanto ao que ouviriam.

- Sinto muito, mas não tenho uma boa notícia a dar. - o casal trocou um breve olhar e voltou a fitar a médica que prosseguiu: - O resultado mostrou que você tem uma veia muito importante da cabeça que está entupida, Sarah. E esta têm sido a causa das dores e pontadas que vem sentindo de um tempo pra cá. Em vista disso, terá que ser submetida a uma delicada cirurgia para desentupir essa veia.

- Delicada cirurgia? Isso significa que há riscos pra mim?

- Não necessariamente. Eu disse delicada cirurgia, porque se trata de um procedimento complicado, no qual demora certo tempo para ser realizado e requer muito cuidado quando for feito. Mas não tem que se preocupar ou temer nada, pois dará tudo certo quando for fazê-la.

Apesar de ter ouvido esse final reconfortante de sua médica, Sarah não ficou totalmente convencida. Na verdade ficou bastante receosa com o fato de ter que se submeter a uma cirurgia na cabeça. Contudo, era ciente de que tinha que fazê-la, já que Camilla não ia decretar isso se não fosse realmente necessário este procedimento. Todavia, a loira não resistiu em questionar sua médica a respeito de algo.

- Camilla se, por ventura, eu me recuse a fazer essa cirurgia. O que poderia acontecer comigo e com o que venho sentindo?

A médica e Juliette olharam para Sarah sem entender porquê ela perguntou aquilo.

- Sarah, você não está pensando em se recusar a fazer a cirurgia, está?

Ainda que no fundo esta fosse um pouco a sua vontade, muito por conta do medo que algo desse errado na hora, a mulher não se recusaria a fazer o procedimento.

- Não estou, Juliette. Eu pretendo fazer a cirurgia. Só quero saber as consequências de não fazê-la. - explicou a mulher encarando a esposa. - E então doutora?

Camilla como sempre foi bem sincera e realista com sua paciente. A neurologista revelou que se Sarah se recusasse a fazer a cirurgia, muito provavelmente as dores e pontadas que ela vem sentindo na cabeça só iriam aumentar e ficarem muito mais intensas e frequentes com o passar do tempo. Além disso, futuramente, Sarah até poderia vir a ter alguma coisa mais grave. Mas assim que revelou esta última parte, Camila se arrependeu por ver despertar a preocupação no casal diante de si, principalmente em sua paciente. Sarah logo cobrou que sua médica fosse mais clara e lhe dissesse exatamente quais seriam essas "coisas mais grave" que ela viria a ter.

Camilla até tentou desconversar sobre esse assunto, para evitar mais preocupação tanto para sua paciente como a esposa dela que estava grávida. Todavia, Sarah foi incisiva e insistente ao pedir que sua médica não tentasse lhe esconder nada. A economista argumentou que era direito seu como paciente saber as coisas, fossem o que fossem.

Juliette vendo que a médica por algum motivo não queria responder aquilo, intuiu que era coisa séria e, que possivelmente, Camilla estava tentando preservar sua paciente. Sendo assim, a esposa de Sarah interviu na situação, alegando a esposa que a informação que ela queria saber não acrescentaria em nada, já que Sarah faria a cirurgia de qualquer forma. Ainda assim, a mulher teimou e bateu o pé que queria saber daquilo.

- Está bem, Sarah, é um direito seu saber. - cedeu por fim Camilla, sem mais alternativa de fuga. Ela só queria preservar sua paciente, mas se ela queria saber e usou o argumento de que era um direito dela, então Camilla não ia esconder. Até porque sempre manteve as coisas as claras com Sarah até aqui. - Mas fique ciente que não são coisas boas.

- Não importa, quero saber do mesmo jeito.

- Tudo bem... Uma das futuras consequências de não fazer a operação é você sofrer um possível AVC, além de uma possível segunda perda de memória.

Aquelas revelações caíram com uma bomba sobre as cabeças do casal, mais ainda sobre a de Juliette. Só de cogitar uma daquelas coisas acontecendo com sua mulher, ela já sentia o desespero bater.

- Então essa primeira perda de memória que eu tive, tem alguma ligação com isso que foi detectado agora nesses exames, doutora?

A pergunta feita por Sarah após se recuperar das revelações de sua médica, fizeram Juliette voltar a prestar atenção na fala da médica.

- Ainda preciso investigar com calma e detalhadamente isso. Mas posso lhe adiantar uma coisa... se isso tiver alguma ligação, então, Sarah há uma grande possibilidade de você recuperar gradativamente suas lembranças após a cirurgia.

Essas últimas palavras foram uma pequena luz no fim do túnel para o casal, principalmente para Sarah. Uma chama de esperança brotou dentro da economista só de pensar que aquela situação de amnésia poderia chegar ao fim após a cirurgia, já era motivo de alívio e alegria.

- Lembrar de tudo é o que eu mais quero.

- Mas para isso se concretizar eu primeiro preciso encontrar alguma ligação entre os casos. Caso não encontre, aí estaremos de volta a estaca zero.

- Vamos ser positivas, não é Ju?

- Isso mesmo. Sempre. - a professora sorriu, afagando o ombro da esposa.

- Ser positivas não faz mal algum, muito pelo contrário. Mas independente de ter ou não ligação, você terá que fazer a cirurgia, Sarah, okay? - Camilla encarou sua paciente que assentiu. - E como não há tanta urgência em fazê-la, marcarei o procedimento para o mês que vem. Assim terei um bom espaço de tempo para analisar e comparar esse seu exame que acabou de fazer, com os que eu mandei que fizesse na primeira vez que esteve aqui. Tentarei ver se há alguma ligação disso que têm na cabeça com a perda de memória que lhe acometeu. Tudo bem pra vocês?

O casal assentiu ao mesmo tempo para a médica que ainda prosseguiu:

- Como me relatou que essas dores e pontadas têm lhe incomodado, Sarah, vou lhe receitar um remédio pra amenizar isso que sente até que faça a cirurgia.

- Mais remédios. - reclamou se remexendo em desagrado. - Não aguento mais isso.

- Fique tranquila que este não é pra ser tomado diariamente. Você só irá tomar o medicamento quando a dor na cabeça já estiver incômoda demais. - explicou enquanto prescrevia a receita médica. Assim que acabou de escrever, Camilla estendeu o papel a Sarah que o repassou a Juliette.

A morena aproveitou a ocasião para tirar uma dúvida com a médica a respeito de algo que lhe rondava a cabeça há uns dias.

- Camilla será que poderia me tirar uma dúvida?

Tanto a médica quanto Sarah encararam a outra mulher.

- Claro, Juliette. Diga qual é sua dúvida?

- Há uns dias li um artigo médico na internet que falava sobre o fato de algumas pessoas quando recuperam a memória acabarem esquecendo tudo o que viveram, quando estavam desmemoriada. Isso é verdade? E pode vir a acontecer com a Sarah?

- Olha é verdade, sim. E pode acontecer com ela.

Mais uma vez Sara se remexeu com inquietude na cadeira.

Esquecer tudo, de novo?

Essa pergunta ecoou na cabeça da economista causando-lhe apreensão só de imaginar isso acontecendo.

De forma alguma queria esquecer os momentos que viveu até aqui e as lembranças que construiu e as que ainda construirá, caso sua memória ainda demore a voltar. Até agora tinha reaprendido tanta coisa, passado por tantas outras e vivido momentos tão especiais, dentre eles: o dia em que ouviu pela primeira vez o coração de seus filhos que Juliette carregava na barriga. Isso sem dúvida alguma era algo que não gostaria de esquecer. A emoção indescritível que sentiu e aquele som mágico que não saía de sua mente. Ela definitivamente não queria esquecer ou ter apagado da cabeça aquilo. Bem como, os outros momentos que viveu até ali com seus outros dois filhos, os quais reaprendeu a amar; e nem os momentos compartilhados com Juliette a quem Sarah sabia que amava, apesar de não ter coragem para lhe admitir os sentimentos.

Calada e temerosa Sarah só prestou atenção a sua médica, que seguiu esclarecendo a dúvida de Juliette.

- Na verdade isso varia um pouco de pessoa para pessoa. Há casos em que os pacientes que sofreram perda de memória, ao recobrar as lembranças antigas esquecerem as novas adquiridas durante a amnésia. Pra eles, é na verdade, como se a perda de memória nem tivesse ocorrido. Porém, também há casos que os pacientes não esquecem as novas lembranças adquiridas quando têm toda sua memória recuperada. Só que sinceramente é difícil estimar ou afirmar o que vai suceder com a Sarah quando ela recuperar a memória. Cada caso é um caso.

Logo após isso houve uns instantes de silêncio que logo foi quebrado por Sarah.

- Não quero esquecer nada do que vivi até agora, Camilla!

Tanto a médica quanto Juliette olharam para Sarah. Com cuidado a neurologista se dirigiu a sua paciente:

- Olha Sarah, infelizmente quanto a isso não tenho o que fazer. - confidenciou. - Mas se quiser posso lhe sugerir uma coisa que tenho certeza que vai lhe ajudar muito a saber o que lhe passou quando perdeu a memória, caso não lembre disso depois que tiver se recuperado. Por acaso lhe interessa ouvir minha sugestão?

Sarah assentiu animada e curiosa em saber a sugestão da médica. Camilla então contou a sua paciente que ela escrevesse em um caderno, como fosse um diário, tudo o que ela se lembrava que tinha lhe acontecido até agora e que também escrevesse tudo mais que fosse lhe acontecendo diariamente para que assim, quando recuperasse sua memória e não lembrasse de sequer tê-la perdido, tivesse ao menos registrado com suas próprias palavras e sua própria letra tudo o que passou, reaprendeu, sentiu e viveu durante a ausência de sua memória.

Juliette achou a sugestão muito boa e incentivou a esposa a seguir aquilo. Alegou que seria bom para Sarah caso ela fizesse, pois ocuparia um pouco seu tempo e serviria de ótima terapia para sua mente também, o que foi concordado por Camilla. Sarah analisou tal alegação da esposa e achou que de fato seria interessante fazer o que foi sugerido por Camilla. Deste modo, a economista acatou a sugestão e disse que o mais pronto possível ia pôr em prática aquilo. Tanto Camilla quanto Juliette gostaram da aprovação de Sarah. Ela se mostrou empolgada com tal fato, o que era bom já que desde que perdeu a memória a mulher não se empolgava com algo. Sempre estava se lamuriando. Se bem que de uns tempos para cá já não fazia tanto isso.

Ainda houve mais uns minutos de conversa a respeito da futura cirurgia que Sarah faria, depois foi acertado o dia da próxima consulta que ficou para daqui a vinte dias e por fim, o casal se despediu da médica.

Após saírem do hospital Juliette passou em uma farmácia para comprar logo o remédio que Camilla havia receitado para as dores que Sarah sentia vez ou outra. Em seguida, ela dirigiu para casa para deixar a esposa e apanhar suas pastas da universidade, pois logo mais teria que ir trabalhar.

Quando Sarah e Juliette chegaram em casa encontraram na sala seus filhos que ainda estavam com o uniforme da escola, já que tinham chego a poucos minutos de lá. Juliette conversou um pouco com os dois para saber como tinha sido a manhã deles e logo depois, subiu para tomar banho e se arrumar, deixando Bia e Thomás na companhia de Sarah.

Alguns instantes depois a professora desceu já pronta, almoçou com a esposa e os filhos para logo em seguida, sair voada para seu trabalho.

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