Capítulo VII
No instante em que desceu do carro em frente a sua casa, com o ânimo um pouco mais renovado depois do encontro com Vitória que foi só risos e assuntos leves após cada uma ter desabafado sobre seus problemas, Juliette viu a van escolar também estacionar e dela descer Bia e Thomás. Os dois vieram em sua direção cabisbaixos e sem a tão costumeira alegria de sempre.
- Oi, meus amores!
Ela abraçou e beijou cada um deles.
- Como foram na escola? - indagou enquanto seguiam para a porta de entrada da casa. Sempre fazia questão de saber dos dois como tinha sido o dia deles e Sarah quando chegava do trabalho, tinha por hábito fazer a mesma coisa antes de perder a memória.
Sem um pingo de ânimo, os dois irmãos se revezaram em contar sobre como tinha sido a manhã na escola ao entrarem em casa. Enquanto Beatriz teve uma prova a qual acha que não se saiu bem por não conseguir se concentrar direito, Thomás fez trabalhos de pintura.
Chegaram à cozinha e Lumena terminava de pôr a mesa do almoço. Juliette mandou os filhos subirem e lavarem as mãos para almoçar. Assim que eles deixaram-na sozinha com Lumena, a mulher questionou a outra sobre a esposa. Lu contou que Sarah tomou banho, desceu para tomar seu café no mais absoluto silêncio, depois que acabou de comer se retirou e voltou para o quarto de hóspedes onde passou a manhã enclausurada.
- Fui duas vezes lá no quarto. A primeira pra levar um lanche a ela que de primeira recusou, mas depois de eu insistir aceitou. E na segunda vez, fui para saber se estava precisando de algo, o que ela negou.
- O que achou dela?
- Sinceramente? - Juliette assentiu. - A dona Sarah está diferente do habitual. Mais quieta, séria e claramente se mostrou desconfortável enquanto tomava café. Não disse uma palavra sequer durante a refeição toda, o que foi bem estranho porque ela é sempre tão falante a mesa.
- Falante até demais. - esboçou um meio sorriso ao se recordar das inúmeras tagarelices da esposa durante as refeições. - Vou lá, chamá-la para almoçar conosco.
Juliette subiu e no caminho encontrou com os filhos. Lhes disse para irem para a cozinha que ia só chamar a outra mãe deles para almoçarem.
- Sarah! - deu duas batidas na porta antes de girar a maçaneta. - Oi! - cumprimentou-a com um sorriso, caminhando até parar próxima a cama onde a esposa estava sentada.
- Oi! - Sarah ficou mais aliviada e até mesmo mais contente de ver que Juliette já estava em casa.
- Como você está?
- Ainda desmemoriada!
Aquele sensação de vazio era a pior e mais angustiante possível. Sem contar o fato de se sentir uma estranha naquela casa e nada a vontade ali com aquelas pessoas desconhecidas.
- Nós vamos a um médico buscar respostas e tratamento para essa amnésia, Sarah.
- E será que encontraremos essas coisas?
- Eu tenho fé que sim. Você também deveria ter.
No fundo ela não tinha sequer confiança, quanto mais fé de encontrar possíveis respostas e tratamento para o seu caso, ao contrário da esposa.
- Bom, eu vim te chamar pra almoçar.
- Eu não posso almoçar sozinha aqui no quarto?
Ela pensou em dizer que até preferia fazer sua refeição ali, mas achou por bem não externar isso e acabar magoando a mulher a sua frente.
- Sarah... - Juliette se sentou próximo aos pés da esposa. Suas mãos coçaram para puxa-los para descansar sobre suas coxas e massagea-los como vire-mexe cansou de ouvir Sarah lhe pedir. Ela amava suas massagens nos pés, principalmente depois de passar um dia inteiro se mantendo sobre saltos altos no trabalho. - Você se isolar da gente, não vai ajudar em nada a se familiarizar conosco, pelo contrário. Vem, almoçar com a gente... Por favor.
A outra suspirou.
- Tudo bem, eu vou. - resolveu ceder ao apelo da esposa, mesmo não sendo muito do seu agrado.
Durante a refeição o silêncio predominou. Vire-mexe Sarah olhava discretamente para os filhos e em alguma vezes os flagrou olhando para ela com certa tristeza estampada no rosto, principalmente o menino. Aquilo ali lhe deixou muito mais desconfortável. Estava fazendo mal a família que ela sequer lembrava.
Assim que acabou de comer, a loira pediu licença e subiu para o único lugar que se sentia segura naquela casa, o quarto de hóspedes.
- Acho que a única vez que presenciei um almoço tão silencioso quanto este em todo esses dez anos que estou aqui, foi no dia seguinte ao falecimento da dona Abadia. - Lumena comentou quando só restaram Juliette e ela na cozinha.
❤️❤️❤️
Era por volta das seis e pouco da tarde, quando Juliette escutou a campainha soar. Suspeitando quem fosse, a mulher pediu ao filho que lhe fazia companhia na sala, para subir e ficar lá com a irmã no quarto dela, porque ia conversar com os amigos do trabalho da mamãe. Sem fazer contestações o garotinho subiu as escadas enquanto Juliette foi atender a porta. Ao abri-la se separou com todos que havia dito a Gilberto que queria ali. Cumprimentou cada um dos melhores amigos da esposa, que acabaram tornando-se seus melhores amigos também, enquanto ia dando passagem a eles para entrarem na casa.
- Mulher do céu! Tu me deixou demais preocupado e curioso com o telefonema de ontem.
- O Gil não foi o único a ter ficado com esses sentimentos não Juliette! Todos nós aqui estamos bem curiosos e preocupados. - Fiuk endossou, apontando para o restante do grupo.
- Ainda mais depois que a gente saiu da reunião de mês...
- Que diga-se de passagem a nossa ilustre Deusa do financeiro, sua esposa, devia ter comandado, mas não deu as caras e coube ao Gil fazer isso. - Carla comentou interrompendo Kerline.
- Exatamente.
- E soubemos pela rádio fofoca que você esteve lá empresa reunida com o Dilson antes de passar no RH e sair da empresa segurando uma caixa.
- Meu Deus! Quem disse pra vocês isso?
- A encarregada da limpeza. - revelou Carla.
- O que foi que houve Juliette?
- A Sarah foi demitida?
- Por que?
- Cadê ela?
- Ela não vai participar dessa conversa?
Cada um dos amigos foi disparando uma pergunta quase por cima da outra, bombardeando Juliette de tal maneira que ela mal teve tempo de digerir direito cada um dos questionamentos.
- Calma, meu povo!... Antes de responder qualquer uma dessas perguntas que fizeram. Eu vou buscar um café, que a Lu deixou pronto pra gente antes dela ir embora.
- Eu vou com você e te ajudo a trazer o café, Ju. - Carla se voluntariou já levantando do sofá.
As duas mulheres seguiram para a cozinha sob olhares atentos dos demais que ficaram na sala.
- O assunto é sério, não é Juliette? - Carla não resistiu em indagar enquanto ajeitava sobre as duas bandejas as xícaras que a outra mulher ia lhe passando.
- Muito, Carla.
Em silêncio elas terminaram de ajeitar as xícaras com café e retornaram a sala.
- Tá, Juliette... cadê a Sarah? - Caio, que trabalha no setor de marketing da empresa, dessa vez foi o primeiro a perguntar após todos estarem devidamente munidos de suas xícaras de café.
- Ela está no quarto. E não vai participar dessa conversa antes que alguém refaça essa pergunta.
- O que houve, Ju? - Gil era o mais aflito, como se já estivesse pressentindo àquela altura a gravidade da situação.
Juliette respirou fundo antes de por fim soltar-lhes a notícia bomba.
- A Sarah perdeu a memória!!
A expressão de choque que viu estampar o rosto de cada um dos amigos pelos quais seus foram passando, foi notória e não podia ser diferente diante da gravidade da situação. Por longos segundos, a sala mergulhou em um silêncio absoluto, até que acabou por fim sendo quebrado por Gilberto.
- Como assim isso aconteceu, Juliette do céu? - a voz do supervisor saiu embargada ao se pronunciar.
Da mesma forma que explicou logo mais cedo a Dílson no escritório, Juliette fez agora com o quinteto ali com ela. Conforme ia contando o que até agora para ela ainda era um fato ainda inexplicável, a morena via a consternação dos amigos de trabalho da esposa ao saberem do ocorrido. Todos sem exceção se encontravam profundamente tristes e estarrecidos com o fato. Também pudera, quem não ficaria assim com uma notícia dessas?
Após acabar de relatar o que houve, Juliette se calou, esperando para ouvir o que o pessoal tinha a dizer sobre tal acontecimento. E outra vez foi Gilberto quem tomou a dianteira e se pronunciou.
- Meus Deus, Juliette! Como alguém perde a memória dessa maneira tão repentinamente assim?
Aquele era o X da questão, que até o momento ela não conseguia desvendar.
- Eu lembro que antes de ontem, durante o trabalho, a Sarah parecia perfeitamente bem, não é pessoal?
O supervisor lançou um olhar aos demais companheiros de trabalho, que confirmaram com a cabeça o que ele acabava de perguntar.
- Ela também estava bem quando chegou em casa, Gil. Conversou comigo sobre o dia dela. Depois nós jantarmos com as crianças. Inclusive durante a refeição, Sarah nos contou que tinha conseguido arranjar suas férias pra dali a cinco dias. Estava tudo perfeito!... Aí, quando foi de manhã... Ela já acordou não se lembrando de nada!... E desde então um pesadelo se instaurou dentro da minha casa, na minha família.
Ela fez uma longa pausa para respirar e os outros que só ouviam o relato dela calados, se condoeram pela amiga.
- Eu olho nos olhos da Sarah e só vejo o vazio!... Não há um resquício sequer daquele imenso amor que ela sentia por mim e por nossos filhos. Isso me dói tanto, vocês não fazem idéia.
Foi difícil para os demais não irem às lágrimas também junto com Juliette. Fiuk que estava ao lado da morena e que havia criado mais amizade com ela assim como Carla, ao ver Juliette tão vulnerável e aos prantos, não pensou duas vezes em passar o braço pelos ombros da morena e trazê-la para junto de si, abraçando-a como forma de consolá-la e lhe passar força, além de acalmá-la também.
Quem ia imaginar que uma coisa dessas fosse possível de acontecer. Uma pessoa vai dormir bem e acorda sem lembrar absolutamente de nada da sua vida?
Após alguns instantes de silêncio e com Juliette mais calma, Caio quis saber da esposa da amiga como estava sendo o comportamento dela em casa, com a própria Juliette e com os filhos.
- Distante. Frio. Ela se isola da gente. Almoçou hoje conosco sem dizer uma palavra e depois que acabou, subiu para o quarto de hóspede, onde passa o tempo todo lá.
Todos se entreolharam achando estranho o fato de Sarah estar ficando no quarto de hóspedes, porém ninguém ousou questionar ou fazer qualquer comentário a esse respeito.
- Fora isso, ela está bem fisicamente?
- Sim, Kerline.
- Você tem que levá-la a um médico, Ju, pra saber o por quê aconteceu isso com a Sarah.
- É o que pretendo fazer, Carla. Só não sei qual médico procurar ainda.
Tudo era ainda tão recente, que ela sequer tinha parado para pensar direito qual médico poderia ajudar nesse caso e quem sabe até, explicar isso que aconteceu com sua esposa, se caso houvesse uma explicação plausível para tal acontecimento também.
- Mas minha amiga Vitória ficou de ver algum médico com os antigos contatos dela.
- A gente também podia ver alguns outros se você aceitar.
- Claro toda ajuda é bem vinda, Carla.
- Gil, você podia falar com aquele seu amigo João. Ele não é médico?
- Médico legista, Caio. - Gil disse com uma careta.
- Mas ele deve conhecer ou ter algum médico de gente viva, que possa te indicar pra Juliette levar a Sarah, moço.
- Tá. Vou ligar hoje mesmo pra ele.
Caio se levantou de onde estava e foi até Juliette se agachando em frente a ela, depois segurou suas mãos.
- Juliette pode contar com a gente no que for preciso, viu? Você não está sozinha nisso, não é pessoal?
- Com certeza, Caio! Vai dar tudo certo, Ju, acredita! - Fiuk foi o primeiro a se pronunciar e logo em seguida deu um beijo demorado no rosto da amiga.
- Fiuk cria vergonha nessa cara e pára com essas confianças pra cima da Juliette. Olha, se a Sarah visse um negócio desse, você estaria lascado, amigo. - Gil comentou em tom de brincadeira, causando alguns risos entre o grupo.
- Pára, Gil. Tô no maior respeito aqui.
- Nós tamo vendo o teu respeito, moço. - provocou Caio rindo.
Eles adoravam pegar no pé do mais novo do grupo, alegando que ele tinha uma queda pela esposa de Sarah, o que Fiuk negava veementemente.
- Minha gente, parem de maldar o coitado. Ele não fez nada demais, oxe. - sorrindo, Juliette saiu em defesa do amigo.
- Agora falando sério... - foi Carla quem se pronunciou. - Como o Caio muito bem falou, estamos aqui com você, Ju. - apertou de forma fraca a mão da outra mulher, demonstrando apoio.
- Seja para o que for. - Kerline reforçou as palavras já ditas.
- Sarah costuma dizer que nós... - Gilberto sinalizou o grupo de amigos. - Somos mais que só uma equipe do financeiro, mais que um grupo de amigos... que somos na verdade parte da família dela. Então agora é hora dessa família ajudá-la como algumas vezes ela já nos ajudou quando precisamos.
Foi impossível para Juliette não se emocionar diante daquelas demonstrações de apoio, amizade e carinho dos amigos para com Sarah e ela. Ambas tinham amigos de ouro.
O grupo ainda ficou sabendo por Juliette como foi a reação dos filhos quando souberam do ocorrido com Sarah e também como eles estavam tentando lidar com essa nova situação da mãe.
Em meio a conversa alguém levantou a questão de como ficariam as coisas no escritório caso as memórias da loira não retornassem ao fim de suas férias e em como todos eles poderiam ajudar Sarah a se lembrar das coisas antes disso. Por hora ninguém soube as respostas para aqueles questionamentos, mas todos concordaram que iam descobrir uma forma de ajudar a trazer de volta as memórias perdidas de Sarah o quanto antes.
Os amigos ainda permaneceu por mais um tempo na casa. Falaram com os sobrinhos que desceram ao pedido de Juliette para que cumprimentasse os tios. E quando o grupo decidiu que era hora de ir, eles pediram a Juliette para checar mais uma vez se Sarah já havia acordado porque queriam vê-la. Havia a esperança neles de que, quem sabe em uma remota possibilidade, haver um lampejo de lembrança e Sarah se recordar de algum deles. Juliette não quis comentar, mas achava pouco provável que isso acontecesse, posto que já havia mostrado a esposa fotos do pessoal, e na ocasião Sarah não se lembrou de nenhum dos amigos. Mas mesmo assim resolveu acatar o pedido dos amigos, vai que numa dessas ao vê-los "ao vivo", a loira se recorde de algum. Era uma esperança e não custava nada tentar.
A mulher subiu pela segunda vez para ir chamar a esposa, porém ao entrar no quarto de hóspedes encontrou Sarah ainda dormindo. Aquele fato chamou sua atenção, pois notou que desde quando acordou desmemoriada, Sarah vinha dormindo bem mais do que antes.
Será que isso tinha alguma relação com seu atual estado? Perguntaria ao médico assim que fosse a um com a esposa.
Saindo do quarto, Juliette retornou à sala.
- Ela ainda está dormindo, gente.
- Poxa que pena! Queria vê-la!
- Todos nós queríamos, Gil. Mas oportunidades não faltarão.
- Eu sei que não, Ker.
- Podíamos marcar um almoço no próximo domingo para vermos a Sarah e ela nos ver.
- Boa ideia, Carlinha.
- Pode ser na minha casa. Minha mãe e minhas irmãs estão vindo me visitar, e elas vão adorar ver a Sarah. O que acha Ju? - Gil olhou para a morena.
- Pode ser.
- Então a gente vai combinando ao longo da semana como vai ser esse almoço.
- Sim!
- Agora acho melhor nós irmos, pessoal. - Caio anunciou, batendo com as mãos nas coxas e pondo-se de pé.
Os demais o imitaram ao se colocarem de pé. Um por um foram se despedindo de Juliette com um abraço enquanto lhe dirigiram novas palavras de apoio e força. Primeiro foi Fiuk, em seguida Carla e Kerline. Logo após o trio foi a vez de Caio.
- Tenta ficar calma. Sei que é difícil, mas tenta. E tenha fé que tudo vai se resolver o mais rápido possível, se Deus quiser. Logo aquela cabeça dura da sua esposa recupera a memória. - falou Caio enquanto trocava um abraço demorado com Juliette.
- Obrigada, Caio! - ela agradeceu e logo em seguida eles desfizeram o abraço.
Gilberto o último que restou, também abraçou Juliette e lhe sussurrou:
- Força, amiga. Qualquer coisa me liga que venho na mesma hora. E hoje mesmo falo com o meu amigo João. Se ele me der um nome, amanhã mesmo antes de ir para o escritório passo aqui e te trago, está bem?
- Sim, Gil... E obrigada! - eles se afastaram e Juliette fez questão de externar aos demais seu agradecimento pelas palavras de força e a ajuda que estavam dispostos a dar com relação ao problema de Sarah.
Assim que o pessoal foi embora, Juliette fechou a porta e encostou-se nela de olhos fechados. Ouvir todas aquelas palavras de conforto dos amigos lhe deu uma carga de força extra.
Sentia como se um peso tivesse saído de cima de seus ombros ao dividir aquela situação toda com os amigos. Ela e Sarah eram pessoas sortudas por terem amigos tão especiais, verdadeiros e prestativos quanto o quinteto que saiu dali, sem contar também com Vitória.
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Os quatro moradores da casa jantavam no mais absoluto silêncio há minutos e isso já incomodava bastante Juliette que era habituada a ter a tagarelice da esposa juntamente com as dos filhos, tomando conta da refeição. Por isso, partiu dela a iniciativa de quebrar aquele silêncio incômodo ao comentar com Sarah sobre as visitas que recebeu mais cedo em casa.
- Sarah nossos amigos que trabalham com você no escritório estiveram aqui mais cedo. Eles queriam ter te visto, só que você estava dormindo e não tive coragem de chamá-la.
A loira não esboçou qualquer reação, tampouco fez algum comentário a respeito. Juliette resolveu ignorar o pouco caso que Sarah fez daquela informação que lhe deu e não chamar a atenção dela, pois estavam na companhia dos filhos.
- Eu contei a eles sobre o que aconteceu com você. - revelou.
- Por que fez isso?
Sarah levantou a cabeça na hora e encarou a esposa com uma expressão séria, pois não tinha gostado nenhum pouco dela ter espalhado para aos "outros" sobre seu estado.
- Eles mereciam saber. Além de seus amigos trabalham com você. Iam achar estranho que de uma hora para a outra você deixou de ir ao trabalho, sendo que suas férias seriam só em alguns dias. - ela explicou com paciência.
- Só que eu não quero que ninguém saiba o que me aconteceu. - disse em tom alterado. - Não quero que fiquem me olhando com cara de pena. Pensando: "olha lá... a pobre desmemoriada!"
O tom debochado com o qual ela finalizou a fala, fez Juliette lançar um olhar para os filhos que com caras um tanto assustadas encaravam Sarah. Para não falar besteira na frente deles, a morena perguntou se os dois já tinham terminado. Ao ter a confirmação deles, Juliette pediu a Bia que subisse com Thomás para ambos escovarem os dentes e aguardarem-na em seus quartos, que já ia lá com eles.
Não querendo ficar sozinho no seu quarto, Thomás pediu a mãe se podia ficar no quarto da irmã. Juliette consentiu e assim que os dois saíram da cozinha, deixando as duas mães sozinhas, o olhar de Juliette se fixou em Sarah de uma forma raivosa que até então a loira não tinha visto.
- De onde tirou essa merda de ideia que todos sentem pena desse seu estado Sarah? Por acaso em algum momento demonstramos pena de você? - disparou sem papas na língua e nenhum pouco de paciência.
Se Sarah antes de perder a memória era de medir as palavras até mesmo quando estava com raiva ou discutindo com a esposa, Juliette já era o oposto. Apesar do jeito tranquilo, a morena quando se irritava e perdia a paciência, transformava-se em outra.
E ela estava com total razão de sentir raiva e perder a paciência com a esposa. Sarah encasquetou com isso de pena.
Um tanto pega de surpresa com aquela intempestiva reação raivosa da esposa, a qual até então não havia visto nela, Sarah apenas murmurou um "não" e baixou os olhos para a mesa feito uma criança que acabava de ser repreendida por um adulto.
- Então pode me explicar o por quê diabos acha isso, hein?
- Vocês me tratam cheio de dedos e me olham com pesar. - rebateu em tom baixo ao erguer os olhos para encontrar uma Juliette de expressão fechada, tão diferente da amorosa e doce que ela se habituou a ver na outra desde que despertou ontem.
- Você está imaginando coisas, Sarah! Vendo o que não há!... Te tratamos muito bem. Ao contrário de você que nos ignora e vive presa só naquele bendito quarto.
O distanciamento que ela vinha mantendo da família machucava Juliette. Se Sarah continuasse com aquele comportamento ficaria difícil de ajudá-la, já que ela não dava abertura alguma de aproximação para a família.
- Você não faz o mínimo esforço para interagir conosco, para nos conhecer. Sequer dar atenção aos nossos filhos ou troca uma palavra com eles. Bia e Thomás sentem sua falta. Eu também, droga! - desabafou, cobrindo o rosto com as mãos. Os olhos já lagrimejavam e um nó na garganta se formou. Mas ela não pretendia chorar, não ali e nem na frente de Sarah. - Perdi o resto do apetite que ainda tinha. - anunciou antes de se levantar da cadeira e começar a recolher as louças do jantar para lavar e guardar.
Sarah permaneceu em silêncio observando a esposa, sem saber o que dizer diante daquela reação toda da mulher. Tinha irritado-a, mas não foi intencional, só que pelo visto a irritou e muito.
- Quer que... eu te ajude... secando as louças? - se voluntariou com hesitação após ficar um par de segundos em silêncio e ver a esposa se dirigir a pia e começar a lavar a louça.
- Não precisa. - Juliette foi fria e seca na resposta. - Pode voltar lá para o seu novo quarto, Sarah. Não é lá que você se sente melhor, longe de nós? Então vá pra lá ficar enclausurada.
A loira engoliu a seco. Para onde havia ido a Juliette pacífica e de fala carinhosa que conhecia desde ontem?
- Não é isso, Juliette. Me desculpe, olha...
- Chega de desculpas, Sarah, mais que merda!
Mais irritada ainda Juliette esbravejou, jogando dentro da pia os talheres que lavava e virando-se para olhar para a esposa.
- Eu não aguento mais toda hora você me pedindo desculpa por isso, por aquilo. Chega!... Vai para o seu quarto. Agora quem está pedindo pra ficar sozinha sou eu. Então saí, por favor! - apontou para a saída da cozinha.
- Tudo bem, eu já vou. Não queria te aborrecer.
- Mas você conseguiu irritar!
Sentindo-se a pior pessoa por estar fazendo mal a alguém que só queria lhe ajudar, Sarah que já havia terminado sua refeição, levantou-se da cadeira e foi embora da cozinha cabisbaixa, deixando Juliette sozinha no cômodo.
A mulher caminhou até a cadeira antes ocupada pela esposa e sentou-se nela, segurando-se para não ir às lágrimas mais outra vez.
Por mais esforço e paciência que tivesse, foi difícil não deixar vir a raiva e perder as estribeiras de ver que Sarah parecia não estar nem aí para ela e os filhos, e insistir em um sentimento de pena da partes deles que não existia. Aquilo tudo, aquela situação toda veio só tirar Juliette dos eixos e abalar seus ânimos, algo difícil de se conseguir com facilidade.
Entrando em seu quarto e se acomodando a ponta da cama, Sarah remoeu cada coisa que Juliette tinha acabado de despejar de forma raivosa em cima dela. Não era sua culpa se não conseguia agir diferente do jeito distante que imponha com a família. Eles simplesmente eram desconhecidos para ela e não sabia como se aproximar, como falar ou agir com eles. Se sentia uma estranha ali com aquela mulher e aquelas crianças! Mesmo que digam que aquela é sua casa, sua família, para Sarah, a esposa e os filhos são meros ESTRANHOS. Mas pombas, eles não são!... Eles são sua FAMÍLIA!
- Eu queria lembrar de vocês... Eu queria muito! - resmungou, enterrando o rosto nas mãos.
Após acabar de arrumar a cozinha, porque não gostava de deixar tudo sujo para Lumena quando chegasse ali de manhã, Juliette subiu ao quarto de Beatriz.
- Já escovaram os dentes? - sentou-se ao lado dos dois que estavam deitados na cama de Bia. A adolescente segurava um livro o qual Juliette não conseguiu ver qual era.
- Sim! - responderam em coro.
- Cadê a mamãe?
- No quarto de hóspedes, filha!
- Vocês brigaram?
- A gente se desentendeu, sim, mas já nos resolvemos, amor. - mentiu quanto ao final, o que detestava fazer, diga-se de passagem. - O que estão lendo aí? - deitou ao lado dos filhos.
- Uma lagarta muito comilona! - revelou Bia.
- Você adora esse livro, não é? - ela encarou Thomás que assentiu coçando os olhos coloridos. Era questão de mais um tempinho para o garotinho dormir.
Sob o olhar atento de Juliette e o sonolento de Thomás, Bia retomou a leitura do livro que o irmão havia trago de seu quarto para ela ler a ele. Foram necessário poucos minutos de leitura e Thomás já tinha pego no sono. Juliette o levou para o quarto dele. Deu um beijo em sua testa e saiu do cômodo. Retornou ao quarto da filha mais velha apenas para lhe dar um beijo de boa noite e seguiu para seu próprio quarto. Tomou um banho relaxante, se enxugou e vestiu uma camisola cor de vinho com um lindo detalhe em renda no busto. A peça era a preferida de Sarah.
“Adoro quando você veste essa camisola. Ela te deixa ainda mais linda e sexy do que você já é, amor.”
Quase sempre após essas suas palavras pronunciadas em um tom rouco, a peça de roupa não demorava mais que alguns segundos em seu corpo, porque as duas mulheres acabavam fazendo amor logo depois.
Juliette se deitou na cama e suspirou ao recordar de tal fato. Por enquanto só lhe restavam lembranças de momentos como esses com a sua Sarah.
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