Luísa - Parte 3
A cabeça de Luísa latejava. Nada do que lembrava fazia sentido. Seu coração começou a bater muito rápido.
Levou a mão até a cabeça em seguida, recebendo uma enxurrada de memórias. E quanto mais recordava, menos sentido toda aquela confusão fazia.
Luísa se recordou quem era, seu nome, sua vida passada. Ela foi uma policial contratada pelo programa de inclusão social, trabalhando como escrivã por alguns anos, mas pediu demissão e começou a trabalhar com investigação de seguros.
De repente, ela foi chamada para integrar uma equipe que investigava o desaparecimento de um trem-bala, que teve a primeira viagem manchada com um acidente que supostamente vitimou centenas de pessoas.
Ainda um pouco confusa, ela se lembrou de um acidente. Espiou para o interior do trem e, em sua mente, viu claramente notícias em jornais online, afirmando que a inauguração da linha de viagens Trem de Alta-Velocidade (TAV) foi interrompida por um terrível acidente em 2032. Diziam que o trem descarrilou, matando centenas de passageiros.
Quando a companhia de seguro que trabalhava, Nacional Seguros, lhe pediu para averiguar o caso, Luísa foi recebida pelos bombeiros que atenderam o incidente.
Eles disseram que não houve nenhum acidente, porque o trem completamente desapareceu.
Ninguém conseguiu encontrá-lo.
A sua última lembrança, investigando o túnel, foi de Luísa e um homem, um parceiro de trabalho, atravessando todo o percurso.
Luísa sentiu uma sensação fantasma lhe fazer tremer. Pois ao chegar a outra ponta do túnel, apenas recordava de si mesma deitada naquela floresta, devorada viva por aquelas plantas. Havia uma lacuna em sua mente, pois não tinha ideia como foi parar naquele lugar.
Conforme sua cabeça pendeu para o lado, a dor a deixou tonta. Toda sua vida estava sendo reposta em sua mente de uma forma tão tensa, que ela quis vomitar como se tivesse numa montanha-russa de memórias.
— Querida? — escutou a voz de mulher chamar seu nome.
Olhou com um sobressalto quando a mão da Pâmela tocou seu braço. Luísa quase gritou, deixando um som sufocado prender-se com sua respiração.
Ela pensou que estava se sentindo perto de desfalecer, olhando direto para a figura de um fantasma. Arrepiou-se por completo, observando o rosto mais velho de uma pessoa que pensou estar morta.
— V-v-você... — murmurou olhando para Pâmela.
Aquela mulher na sua frente era a sua mãe, que morreu quando tinha doze anos.
A mulher que mentiu, dizendo a ela e a sua irmã gêmea, Clarissa, que iam viajar. Colocou duas crianças inocentes em um automóvel, dirigindo em alta velocidade até um muro.
Ela estava morta.
E também Clarissa.
Apenas Luísa havia sobrevivido.
O que diabos estava acontecendo?
— Mã... e.... — Luísa murmurou.
Com o coração batucando, Luísa levou a mão até o aparelho auricular em sua orelha, lembrando-se que ficou surda devido ao acidente, que somente ela sobreviveu.
Ela continuava a mesma, apesar de avançado alguma idade. Os olhos eram azuis como de Luísa e Clarissa, o cabelo estava ralo e curto agora, mas eram uma cascata de madeixas douradas, cujas pontas alcançavam seus ombros.
Luísa não podia acreditar...
Ela... Ela havia atravessado o túnel da morte e agora estava em algum lugar no pós-vida?
O que diabos estava acontecendo?
Ergueu a mão enquanto encarava a mãe, errando o toque devido à falta de coordenação. Mas quando alcançou a pele quente dela, teve certeza de que não era um fantasma.
Pâmela tocou sua mão, chorando e sacudindo a cabeça. Ela suspirou com um alívio profundo.
— Sim, querida, está tudo bem agora — respondeu, beijando as costas de sua mão.
Luísa se esforçou para falar:
— O... que... aconteceu...? Onde... estamos? — Quis saber. — Me... — apontou para si mesma — nome?
Ela quis saber o porquê a confundiu com Clarissa.
— Você não sabe?
Sacudiu a cabeça a indagação de Henrique.
— Meu... nome... — respondeu. — Luísa. Não. Clarissa...
Pâmela e Henrique se entreolharam.
— Isso é uma pergunta? — ele disse para a médica.
A mulher não respondeu, parou algum tempo observando-a. Ela inspecionou o ferimento atrás da cabeça da moça.
— O que quer me contar, Clari? — perguntou em libras.
— N... Não sou a Clari... — apontou novamente para si mesma. — Luísa!
O rosto de Pâmela ficou meio pálido, arregalando os olhos enquanto corria o olhar por toda a compleição da moça.
Henrique hesitou por um instante antes de responder:
— Luísa não é a sua filha que morreu, Pâmela?
— Luísa!
A voz de Devis entrou pela porta de correr do trem, aberta na outra extremidade. Ele se aproximava pisando fundo no chão. Sua expressão estava mudando, mas foi difícil não perceber que esteve vermelho de raiva.
— Parece que agora está melhor — ele disse com curiosidade, indo se sentar em um banco.
Ele estava sorrindo, mas pareceu notar que o clima não estava muito animador. Virou o rosto de Luísa até Pamela.
— O que está acontecendo? — ele quis saber.
Pâmela mexeu-se como se a alma tivesse saído do corpo, então retornado. Piscou rapidamente, passando a mão debaixo do nariz. Ela estava chorando, e Luísa começando a sentir medo de toda aquela situação maluca.
Era aquilo que diziam quando uma pessoa morria e atravessava um túnel? Tinha a impressão que havia morrido do vírus do mau-súbito, morrido de repente, então, estava agora no pós-vida.
O mundo dos mortos era como uma floresta sombria? Aquilo era o inferno? Devia ter aceitado o folheto da testemunha de Jeová aquela manhã, saindo do metrô até o trabalho?
A batida na cabeça havia mesmo causado um traumatismo, agora ela havia ficado pirada e estava vendo fantasma.
— Deve se recuperar, querida — Pâmela quebrou o silêncio, examinando-a com os olhos. — Seu estado não é realmente... bom. Pode estar confundindo lembranças com sua irmã gêmea.
— Ah... não... — Luísa se esforçava para falar. — Eu... Eu sou. Luísa... haa... quem... hãa... Clarissa... Não...
Eles pareciam confusos quando Luísa levou muito tempo para completar o que queria dizer. Devis respondeu em libras:
— Disse que seu nome era Luísa, não adianta trocar. Já me acostumei.
A menina franziu para ele. Não lhe entendeu.
— É tipo amnésia? — Henrique investigou, esticando as sobrancelhas. — E afasia, eu acho.
Eles não estavam entendendo? Luísa era Luísa!
— Ela teve um trauma na região parietal, o que é uma preocupação alarmante. Não sei se perceberam, mas não estamos na Santa Casa — Pâmela suspirou com frustração. — Pela aparência do ferimento, é um milagre que você esteja de pé... Entretanto, traumas na cabeça requerem uma atenção especial.
A moça investigou a dor lancinante atrás de sua cabeça outra vez. Doía muito.
— Por quê... isso... aconteceu... c-comigo? — demorou a falar.
Houve silêncio.
— Isso pode ser duro — Pâmela respirou fundo. — Mas seu nome é Clarissa. Luísa, sua irmã, morreu em um acidente de carro há muitos anos. Deve estar misturando as coisas.
O homem assentiu, movendo-se na direção em que Devis veio.
— Vou cuidar do ferimento em sua cabeça — Pâmela se aproximou, voltando a separar materiais médicos, que Luísa lembrou-se pertencer a pequena enfermaria do trem-bala. Para emergências — leu em um folheto da companhia de viagem. Tinha agulha e linha de sutura.
Luísa ergueu a mão para falar, eles não estava entendendo! Mas foi impedida por Pâmela, que fungava, muito preocupada com a paciente.
— Agora, deite-se. Apenas descanse e pensamos no que vier à frente depois, certo? — um sorriso dobrou no canto da boca da mulher. — Eu cuidarei de você daqui em diante.
Os olhos de Pâmela vasculharam lentamente por seu rosto, viajando com curiosidade pelas roupas rasgadas que estava usando. Seu sorriso era lindo quando o inclinou para ela.
Ninguém estava acreditando em Luísa, e nem ela conseguia acreditar em toda aquela situação.
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