Capítulo 6


Andrea estava tomando seu café. Ele, que acordara cedo naquele dia, estava animado e disposto para mais um dia de trabalho. Havia acabado de pagar o carro no qual usava como táxi. Era a primeira vez que realizava corridas na região portuária de Livorno. Um de seus amigos taxistas, Marzio, havia comentado que apesar de não ser um porto turístico, muitos encarregados de empresas estrangeiras vinham junto nos navios cargueiros e faziam viagens para Florença ou para a estação de trem de Livorno, onde resolviam coisas que iam de distribuição dos produtos a negócios no consulado. Andrea se interessou. Ele poderia ganhar mais dinheiro com distancias longas ou várias corridas para um mesmo ponto. Contudo, o que Andrea não sabia e nem imaginaria era que um casal e uma criança que entraram no seu carro com destino a estação de Livorno, o fariam levar um tiro na cabeça.

Porto de Livorno - 10:30 a.m

- Acho que aqui está limpo, vamos - Bill olhou de um lado a outro, certificou-se que ninguém os seguia, e foi rumo ao ponto de taxi próximo as docas. Eles não estariam seguros enquanto não chegassem em Florença. O plano inicial era ir para estação de trens em Livorno e embarcar às 11:15. Eles teriam suporte quando chegassem em Florença. Porém, como já poderia se esperar, nada saiu como o planejado.

- *Quel taxi è vuoto? - - Perguntou Bill a um homem de cabelos ralos, que terminava de tomar um café.

- Si, qual è la destinazione?

- Stazione de Livorno.

- Possono entrare i Signori. - O homem gentil abriu a porta para os passageiros. Ele notara que a senhorita que acompanhava o senhor de baixa estatura aparentava estar assustada. O taxista achou estranho, mas nada comentou.

Lauren estava aflita. Ela imaginava que encontraria com Thomas, mas ele não apareceu. Ela temia que algo de ruim tivesse acontecido com ele. Bill, ao notar o desconforto de Lauren, segurou a sua mão. Ela sorriu sem mostrar os dentes.

- Sono americani? Se solo, posso parlare inglese - disse Andrea iniciando uma conversa.

- Se non ti dispiace... - respondeu Bill. Ele percebera que Lauren parecia confusa com a conversa, então para que ela se sentisse mais segura, optou por manter a conversa em inglês.

- A mocinha ai não deve entender o italiano não é mesmo? - disse Andréa ao olhar para Lauren pelo retrovisor. Lauren concordou com a cabeça. Dora estava sonolenta. - É a primeira vez que vem para Itália?

- Eu já estive em Roma há alguns anos - comentou Bill.

- É- É a minha primeira vez. - disse Lauren

- Espero que aproveitem o passeio. Nós temos lugares belíssimos. - Andrea falava com orgulho - estão indo para algum lugar especifico? Posso indicar alguns pontos turísticos dependendo para onde forem.

- Viemos visitar uns parentes em Prato... - comentou Bill demonstrando não querer continuar o assunto. Andrea era um homem esperto. Ele achara aquilo tudo muito estranho. Primeiro, ele pegara esses passageiros em um porto comercial e não turístico. Geralmente não se viam crianças a bordo de navios cargueiros e a senhorita que acompanhava o homem baixo parecia preocupada com alguma coisa. Andrea havia pegado o que ele chamava de "passageiros problema". Ele sabia que vez ou outra, imigrantes tentava entrar ilegalmente no país. Seria esse o caso? E se fossem criminosos? Estaria ele em perigo?

- Estamos chegando na estação - disse Andrea que naquele momento já suava frio.

Assim como Andrea, Bill também era um homem esperto. Ele notara a mudança do tom de voz do taxista e na forma como as mãos dele seguravam o volante. Bill percebeu que o motorista não era qualquer um. Ele precisava ter cautela. Chegando na estação, e quando já iam descer, Bill notara que a disposição dos guardas do lugar estava anormal. Ele então deduziu que o inimigo os aguardava no trem. Andrea estava feliz de deixar os passageiros na estação. O taxista não queria trair problemas pra si. Contudo, Bill resolvera mudar de planos.

- Qual o seu nome senhor? - Perguntou Bill

- Andrea...

- Senhor Andrea, eu te pago mil euros para que nos leve até Florença. - Andrea se espantou. Ele demoraria quase um mês para ganhar uma quantia daquela. Porém, aquilo era ainda mais suspeito. Geralmente, em carros como o de Andrea, havia um botão de pânico, para avisar a polícia caso ocorresse alguma coisa durante as corridas. Andrea pensou em aciona-lo. Bill, prevendo tal ação, segurou o braço de Andrea no impulso.

- Por favor, não faça isso. Não somos criminosos. Só queremos chegar em Florença - Andrea olhou com temor para Bill, mas no fundo sentiu que o estrangeiro não estava mentindo, pelo menos naquilo.

- Vocês não iam para Prado? - Andrea questionou

- Senhor Andrea... por favor, nos leve até Florença. - Bill percebera que olhares indiscretos estavam sobre eles. Eles não podiam esperar mais. Lauren parecia ainda mais aflita.

- Por favor senhor - Lauren disse em suplica. Ela segurava firme Dora em seus braços. A essa altura ela entendia que já não era mais seguro ir de trem. Andrea se sensibilizou com a criança. Ele imaginou que a mulher era a mãe.

- Tudo bem, vamos.

- Obrigado.

"Espero não me arrepender por isso" - pensou Andrea.

II

Dado a hora da saída do trem rumo a Florença, os agentes da AEG já estavam apostos. Alguns estavam infiltrados como funcionários da plataforma e outros como passageiros. As características dos alvos foram passadas por uma das comandantes da AEG da Itália, Elea Cercato.

- È tutto pronto mia signora, attendiamo ordini.**

- Molto bene, appena li vedo, ho fermato il treno.

- Sì, mia signora, come desideri

Elea arrancou um pedaço da unha do dedo anelar. Ela estava nervosa. Há duas semanas ela recebeu ordens de um dos diretores da organização para que capturassem Lauren McFarty Wolmix e sua filha e que mate-se qualquer um que tentasse impedir tal captura. Elea estava com tudo pronto; descobrira que Lauren chegaria pelo porto de Livorno e mandou agentes por toda a área. Contudo, somente um dos dez sobreviveu. Os outros nove foram encontrados mortos minutos depois da ligação de seu infiltrado na alfandega.

"Maledetto Marti"

Se Elea não obtivesse sucesso, a próxima pessoa a levar uma bala na cabeça seria ela. Era uma questão de matar ou morrer.

"Não posso deixar essa chance escapar de jeito nenhum!"

Passados vinte minutos após a saída do trem, Elea recebeu uma ligação.

- Signora ... non li abbiamo trovati***

- Che cosa? puoi solo scherzare

- Loro .. non sono da nessuna parte

- Adesso! Guarda a destra

- Signora ...

- Che cazzo! Voi incompetenti. - Elea estava furiosa. Como assim não estavam no trem? Pelo que ela sabia, Lauren ainda era uma pessoa "comum". Não deveria ter percebido a ação dos agentes. Tomel não fora visto aos arredores da estação e Geovane jurava não saber de nada. Teria mais alguém a ajudando? Já haviam se passado mais de uma hora desde que o navio em que ela supostamente havia vindo tinha chegado ao porto.

- Se ela não está no trem... deve ter arrumado um carro. Já são 11:50, neste horário já deve estar chegando em Florença. Droga. Preciso saber em qual carro ela está, antes que entre em contato com a U.R.G.M. Elea tornou a pegar o telefone.

- Marcelo, quero que descubra quais taxistas saíram do porto de Livorno hoje por volta das 10:30 da manhã. Quero nomes, placa dos carros, tudo o que puder conseguir! Rápido, não temos muito tempo.

Elea suava frio. Ela desligou o telefone ruidosamente. Seu chefe logo entraria em contato para saber sobre o andamento do plano. Se ele descobrisse que ela não sabia da localização do alvo, estaria perdida. Não muito tempo depois, um dos subordinados de Elea entrou apressando em sua sala.

- Encontramos o alvo! Estão nos arredores de Florença, o taxista em questão se chama Andrea Bernardi, tem 48 anos e mora em Prado. A placa do carro é 000XXX e foi visto por último em Frienze Scandicci

- No pedágio... entendido. Quero o pessoal espalhado por Peretola, Quaracchi, Osmannoro, Parco dele Cascine e Bellosguardo. Reforcem a segurança na ponte de Santa Trinita e nas principais travessias no rio Arno! Soltem o alerta para os nossos aliados próximos a catedral de Santa Maria del Fiore. Fiquem atentos, eles podem ter preparado armadilhas no local. Quero que procuram por Geovane, assim que o encontrar tragam-no aqui. Por hora é só. Não deixem que escapem!

- Sim senhora! - quando o subordinado de Elea ia saindo, lembrou-se que tinha mais um recado para dar - s-senhora, havia outro homem no carro segundo os informantes. Logo vão enviar uma foto das câmeras de segurança do pedágio.

- Ótimo, se é só isso, vá logo! - o homem franzino saiu da sala rapidamente delegando ordens. Alguns instantes depois as imagens estavam no computador de Elea, quando ela ampliou pode ver com clareza: o homem que acompanhava Lauren era ninguém mesmo que um ex agente da AEG, Bill Fraken. Os olhos de Elea brilharam. Ela, que até então pensava estar com má sorte, se sentiu a pessoa mais sortuda do mundo. Se capturasse ou matasse Bill sua recompensa e prestigio seriam exorbitantes. A caçada por Lauren havia dobrado os pontos. Elea não contaria a ninguém sobre a informação extra que havia conseguido.

- Em alguns minutos estarei no cargo de superintendente! - Elea estava excitada.

III

Autoestrada de Sole, nos arredores de Manccione - 11:30 da manhã

- Senhor, realmente não vai dizer ao menos o seu nome? - Andrea ainda estava tenso. Já haviam se passado mais de uma hora desde que saíram de Livorno com destino a Florença. Os passageiros permaneciam calados. Bill fizera duas ou três ligações durante o percurso. Vez ou outra a criança balbuciava algo, mas estava sonolenta demais para completar uma frase. Durante o caminho, ele pensou diversas vezes deixá-los a própria sorte no meio da estrada e simplesmente esquece-los, porém o maior problema era a criança. Andrea também era pai de uma menina. Maria deveria ter mais ou menos a idade da menina que viajava junto com o casal. Se fosse somente os dois adultos ele nem aceitaria essa corrida para inicio de conversa.

- É melhor o senhor não saber - Bill falou de forma firme.

- Eu não sou burro senhor, se me permite dizer. Sei que estou correndo riscos carregando vocês três. Ao menos me deixe saber com o que estou lidando. Sabe, eu tenho uma filha igual a vocês... ela se chama Maria, olhem, essa aqui é ela - Andrea tirou do porta luvas uma foto três por quatro. Nela uma menina sorridente aparecia. Lauren olhou com carinho para foto. A menina devia ter a mesma idade de Dora. Lauren sentiu um aperto no peito. - eu estou fazendo corridas extras para dar uma vida melhor para ela. Eu sou de Prado, lugar que o senhor disse que iria visitar... eu não preciso saber os detalhes, é só que...

- Estamos sendo perseguidos! - Lauren falou no impulso. Tinha simpatizado com o homem. Bill a repreendeu com os olhos.

- Pela polícia? - aquela altura Andrea não iria entrega-los, apesar de que no começo desejou parar no primeiro posto da policia rodoviária em que passaram.

- Não, eu também não sei direito... só sei que querem fazer mau a minha filha, e isso eu não posso permitir - a voz de Lauren saia tremula. O tom sofrido da jovem, trouxe pesar em Andrea, ele imaginou que a senhorita de olhos fundos já tinha passado por coisas terríveis.

- Entendo. Para ser sincero não acho que vocês sejam criminosos. Por que não entram em contato com a polícia? Eles podem ajudar e...

- Não podem - Bill falara de forma firme outra vez - eu sei que estou pedindo muito ao dizer para confiar em estranhos como nós, mas tudo o que precisamos agora é chegar a Florença o mais rápido possível. Eu tenho um plano. Provavelmente eles estarão nos esperando em todos as entradas da cidade. Uma hora dessas já devem ter notado que não estamos no trem, então consequentemente, logo irão procurar por todos os táxis que estavam no porto essa manhã. No pedágio logo a frente tem câmeras de segurança, creio que nossa imagem vai aparecer. Mas isso é bom. Como vão estar desesperados em nos capturar, vão focar neste carro. Após a travessia do pedágio, tem uma hospedaria chamada Viuzzo del dogaiello, vamos fazer a troca de veículos lá. Não se preocupe Andréa, já informei meus aliados, eles estão com o modelo idêntico ao seu carro, vão somente pegar a placa. Assim que nos deixar em Florença você pode pagá-lo de volta.

- Não sei não senhor - Andréa ficou ainda mais tenso - isso é realmente necessário?

- É imprescindível! Isso nos dará mais algum tempo. Chegando lá três de nossos aliados vão assumir nosso papel. Isso é o máximo que consigo fazer em pouco tempo.

- Tu-Tudo bem. - Andréa apertou as mãos no volante.

Como previsto, ao chegarem no hotel, dois homens e uma mulher com uma boneca de brinquedo estavam a espera.

- Obrigada pela ajuda William - disse Bill antes de partir

- Estou te devendo meu amigo. Vamos tentar atrasa-los. Mande meus comprimentos a Kate por mim.

- Pode deixar - Ambos se despediram e partiram rumo a Florença.

Enquanto isso, a informação sobre eles já havia chegado a Elea que ordera uma perseguição. Ela aguardava ansiosamente noticias sobre Lauren. De súbito um homem alto de farta barba e cabelos negros cumpridos entrou na sala.

- Você queria me ver Elea?

- Geovane seu maledetto! O que você tinha na cabeça hein? Você quer me ferrar!

- Não estou entendendo... - Geovane era um homem misterioso. Nunca transparecia o que realmente sentia e na maioria das vezes não dava para saber se falava sério ou não. Isso deixa os nervos de Elea a flor da pele.

- Não se faça de idiota! Por sua culpa não capturamos Lauren no porto.

- Ora, não venha me culpar pela sua incompetência, Elea! Não lembro de ter interferido nesse caso.

- Tuo figlio di puttana!¹ Heleno me contou que você permitiu que ela saísse do porto. Além do mais, por que nove homens nossos morreram? Você deveria estar fazendo a segurança do local não é verdade?!

- Você está muito exaltada Elea! Está naqueles dias? - Geovane pegou uma maça que esta sob a mesa de Elea e deu uma mordida - Não tenho culpa se seus capachos são molengas, é que eu sabia só liberei um carregador comum. Acha mesmo que eu perderia a chance de prender a cobaia mais cobiçada da organização antes de você?

- Eu não...

- Agora, se você não consegui prende-la... - Geovane deu outra mordida na maçã - será um prazer "dar cabo" de você - ele sorriu de forma maliciosa

- Morra!

- Boa sorte Elea! Estarei torcendo pelo seu sucesso. - Dessa vez Elea entendeu o tom de deboche.

Geovane saiu da sala sorrindo. Pegou o telefone e fez uma ligação.

- William é o Geovane. Sim... isso, então eles realmente trocaram de carro. Entendi, mande nosso melhor homem para intercepta-los na ponte allá Vittoria. Adoro brincar de gato e rato. Isso, pode matar Bill, só preciso da mulher e a criança viva. Entendido. - Geovane desligou o telefone - Vou matar dois coelhos com uma cajadada só. Geovane deu mais uma mordida na maça que segurava e a jogou fora. Logo, logo o fogo se alastraria aos arredores de Florença, e ele queria estar lá para ver tudo de camarote.


//////////////////////////////////////////////////////////

Glossário

*- Esse táxi está vago?

- Sim, qual o destino?

- Estação de Livorno.

- Podem entrar senhores.


** - Eles são americanos? Se quiser, eu posso falar inglês - Se você não for incomodar ...


***- Está tudo pronto minha senhora, esperamos as ordens.

- Muito bem, assim que os avistarem, parei o trem.

- Sim, minha senhora, como desejar


- ****Senhora... não os encontramos

- O que? você só pode estar de brincadeira

- Eles... não estão em lugar nenhum

- Ora! olhem direito

- Mas que merda! Seus incompetentes


¹ Seu filho da puta

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top