ℑ𝔱𝔢𝔪 1: 𝔲𝔪 𝔬𝔟𝔧𝔢𝔱𝔬 𝔡𝔢 𝔬𝔟𝔰𝔢𝔰𝔰ã𝔬 (𝔬 𝔭𝔯𝔢𝔡𝔞𝔡𝔬𝔯)



TW: Cenas explícitas de violência e conteúdo sexual


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Das anotações de Sade Lovelace Dunne - Caso Nó do Diabo.

Identificação : 1508-2284-0815

Localizado em: 19 de fevereiro de 1985 no quarto da vítima supracitada.

Oficial Responsável: Giannina Dominique Florez.

Os acontecimentos narrados aconteceram entre as datas de

Agosto de 1984 a Fevereiro de 1985.


28 de agosto de 1984.

O professor.


A mancha de sangue menstrual penetrou nas fibras do velho jeans herdado como uma nódoa imanente de mágoa, profanando a peça. Há quase um mês esfregava a marca venosa que insistia em permanecer. Pela janela do banheiro, as luzes néon do letreiro decadente, oriundas de uma boate com ares de puteiro, lançavam uma pálida iluminação no espelho manchado de creme dental, nas paredes desbotadas de azulejos e na banheira de ferro fundido, onde a mancha continuava a verter seu líquido escuro até o ralo.

Todo o ambiente ainda exalava o mesmo odor de mofo que tinha desde que foi adquirido; assim como a sala, onde o salitre corroía incansavelmente o papel de parede antigo, revelando-se por entre as delicadas flores silvestres que mal escondiam o trabalho negligente do inquilino - uma profusão católica de anjos mórbidos, olhos fixos no alto, envoltos em asas maiores do que seus corpos rechonchudos, rostos rosados e lábios pintados.

O antigo edifício Truman Capote era uma estrutura de ossos putrefatos, desmoronando como a carne de um organismo vivo em decomposição; seus pulmões mecânicos permitiam a inalação e exalação da fumaça tóxica dos automóveis, das usinas e de todos os produtos da evolução nociva dos cidadãos de Carnival Kane, assim como o coração que pulsava dentro daquelas paredes ocas, um sinal tênue e vago das presenças humanas que coabitaram nas celas ao lado e que há muito guardavam segredos. Estruturas decadentes e intrinsecamente ligadas à nossa própria natureza autodestrutiva e à luta travada contra o tempo, mas seus olhos sábios, distantes de qualquer escárnio à sensatez, voltavam-se para a juventude e o esplendor do prédio vizinho.

Do outro lado da rua, um edifício inaugurado há pouco mais de uma década erguia-se majestosamente, uma visão moderna que parecia avançar em saltos audaciosos de um século para o outro além do seu tempo. Aquela construção, com sua arquitetura elegante e janelas reluzentes, simbolizava status e prosperidade. Seus residentes eram jovens bem-sucedidos, envolvidos em carreiras promissoras, em busca de um futuro brilhante. Rostos meticulosamente maquiados e roupas de grife eram um lembrete constante de como a vida poderia ser diferente, de como um lugar naquela torre de vidro poderia transformar tudo.

Acendi um cigarro, deixando-o pendurado entre meus lábios enquanto deslizava as alças do sutiã por debaixo da camiseta. Era o vigésimo sétimo dia da minha fútil tentativa de renunciar à nicotina e à observação obsessiva, uma sequência de dias que quase me levou à beira da loucura. Apertei o botão e ouvi o clique familiar da secretária eletrônica.

FITA #1: Mensagem de voz gravada na secretária eletrônica.

28 de Agosto, às 20h34.

Taehyung Kim [1958-1985], Investigador do Departamento de Crimes da Carnival Kane.

[Bip] Você tem um recado.

[Voz masculina]: Ei, Sadie safadinha [risinho], já terminou seu expediente na redação ou ainda está por lá? Estava pensando em passar na sua casa depois do meu trabalho na delegacia [risos], ou será que estou atrapalhando a noite da Joy? Talvez precisemos criar um calendário para saber quais sextas-feiras você está disponível pra mim, você entende? Ou podemos reviver aquela noite no... [silêncio momentâneo, outra voz masculina ao fundo da gravação]. Preciso desligar agora, está bem? Passo aí por volta das onze. Tenho algo especial para você, gostosa.

[Bip.]

A mensagem dançou em minha mente enquanto decifrava o seu real significado, meus olhos atentos observavam a fachada do prédio ao lado, para onde as janelas do meu estúdio estavam direcionadas.

Taehyung era chefe do departamento de investigação de Carnival Kane. A ética duvidosa de seu comportamento corrupto foi a minha porta de entrada, queria apenas uma fonte confiável e consegui um amante. Detesto essa palavra.

Kim irradiava um ar boêmio, enigmático e urbano, uma encarnação ainda em vida, com o mesmo ar meticuloso, triste e estranhamente atraente de Serge Gainsbourg. Um Alain Delon de romances policiais empoeirados de banca; exibindo as mesmas eras de beleza que se ramificavam com o avançar da idade. Um desses baudelaires de olhos negros que até então só tinha visto na TV.

Sua presença exalava um misto de sensualidade desgrenhada e um típico mistério sedutor, como se carregasse consigo os segredos ocultos dentro das fendas da pele. Era preciso mais do que uma interpretação óbvia para ler Taehyung nas entrelinhas . Seus olhos profundos, que pareciam ter testemunhado e pertencido ao registro de experiências, revelavam uma alma atormentada e alguns desejos frenéticos, expurgados somente às escuras. Na maioria das vezes, sobre a mesa de jantar do meu pequeno apartamento, em investidas tão vigorosas que o roçar permanente do meu corpo contra a madeira esfolavam a pele recobrindo o osso ilíaco enquanto ele metia fundo.

Mas não era a única na lista semanal de fodas casuais de Taehyung, e não era segredo que ele vagueava pelos lares de donas de casa entediadas no bairro vizinho, passando o pau nas esposas solitárias de seus colegas de trabalho. Os jogos tentadores começavam nos churrascos dominicais, durante as noites de pôquer regadas a cerveja nas quintas-feiras. Com seus dedos correndo, acidentalmente, por dentro dos aventais das jovens senhoras Nelson, Milano, Park ou Palomino, algumas mulheres tristes que mantinham estoques de cocaína na gaveta de talheres da cozinha para suportar o dia, com seus maridos bêbados bem ao lado, incapazes de enxergá-las, ou com a desculpa de buscar uma cerveja gelada na cozinha e que terminava com intenções dúbias e mãos deslizando, perigosamente, pela cintura de uma mulher casada.

Um flerte perpétuo com o perigoso e o proibido, o que de alguma forma fazia com que Taehyung fosse um tipo irresistivelmente atraente.

Cumprimentava os colegas do departamento com os dedos ainda impregnados com aroma de bucetas alheias; costumava enfiá-los nas canecas de café dos respectivos maridos ou cuspir a saliva acumulada de chupadas de despedida em seus leites mornos. Era uma maneira de puni-los, ele dizia, dependendo do grau de solidão das esposas feridas.

Me contava em detalhes todo o trajeto de seu esquema perigoso, a rota traçada do seu Mustang Mach vermelho e do brilho no olhar das garotas condenadas a maridos vulgares quando o viam cruzar a rua, era sua compensação de felicidade depois de um dia exaustivo de trabalho; lidando com corpos putrefatos abandonados em lugares inóspitos e crimes hediondos na DP.

Já a minha, era ser fodida deliciosamente. E de quebra, ter uma pauta quente e em primeira mão na segunda-feira, dependendo do desenrolar do no fim de semana, até mais de uma se ele estivesse de bom humor.

Era pouco depois das nove da noite de sexta-feira. A vida no Edifício G. Talese, localizado na rua Norman Mailer, seguia sua rotina tranquila. Da minha janela, eu podia observar alguns acontecimentos em diferentes andares. No décimo primeiro andar, uma jovem de cachos volumosos permanecia sentada na cama, na mesma posição há horas: pernas cruzadas, abraçada a um travesseiro. Seus olhos estavam fixos em uma tela iluminada que eu presumia ser uma televisão, sem que ela piscasse sequer uma vez. Quando os pais saíam para o trabalho, o namorado mais velho, um rapaz de cabelo oleoso e uma motocicleta barulhenta, surgia ao redor do prédio. Seus rostos se iluminavam de paixão e, em seguida, descia para se encontrá-lo no hall, entregando-se a beijos ansiosos. De vez em quando, no reflexo do espelho gigante preso à porta do armário do seu quarto decorado com temas submarinos, eu conseguia vislumbrar as tatuagens que o rapaz escondia sob a camiseta do Deep Purple. Ele ficava ali, com o olhar fixo no chão, como se observasse um ponto imóvel que parecia revelar uma nuance do Paraíso. Seus lábios pendiam abertos, os olhos esforçando-se para permanecerem intactos, na tentativa de não perderem o próximo momento, a próxima cena que se revelava ainda mais imersiva. Mas eram apenas adolescentes, fazendo o que os adolescentes fazem quando têm a oportunidade.

No nono andar, as vizinhas, duas mulheres religiosas, dedicavam a maior parte do dia a orações e práticas devotas. Pela semelhança nos olhos, boca e sobrancelhas finas e arqueadas, eu deduzia que fossem irmãs.

De um dos quartos, eu tinha uma visão completa apenas de uma delas, posicionada diante de uma penteadeira adornada com relíquias religiosas. Ela meticulosamente trancava a porta e, cautelosamente, deslizava até se encontrar mais uma vez com seu reflexo, como se estivesse desvendando uma máscara costumeiramente usada. Então, com destreza, traçava seus lábios com o vermelho carmesim. Por vezes, ousadamente, despir-se-ia perante o espelho, aplicando o batom em suas aréolas rubras. Absorta, contemplava-se por longos momentos, ora radiante de felicidade, ora envolta em lágrimas, enxugando os lábios com aflição. E então, ajoelhava-se, pelo menos era minha dedução, vestia roupas masculinas, colocava um chapéu e se admirava com mais alívio.

Através da minha perspectiva, onde meus olhos percorriam livremente o interior de seu apartamento, entre a mobília minimalista, os armários organizados, os discos empilhados próximos à porta e a estante de livros que cercava o cômodo como paredes de páginas e capas rígidas, eu era apenas um espectro vagando pela rotina de um homem misterioso que vivia no prédio em frente. O professor, como gostava de chamá-lo. Uma alcunha de literatura gótica.

Há sempre uma aura de mistério cercando um professor.

Talvez esse fosse o motivo da obsessão de minhas colegas de classe pelos professores do liceu, na adolescência. Algo que sempre passou despercebido para mim, incapaz de me afetar na mesma dimensão com aqueles homens que só lembraram a ausência do meu pai, e preencher a minha vida com mais tempo para ausência parecia estupidez. Até aquele homem perturbadoramente perfeito do outro lado da rua aparecer.

Ajustando os botões frontais da camisa social branca diante do espelho, folheando as páginas de um calhamaço; semana passada estava lendo Anna Karenina, consegui identificar com a ajuda de um binóculo e na manhã seguinte, adquiri a mesma edição para entender melhor sua linha de interesse. Havia algo quase insólito até mesmo na forma como os tecidos revestiam o corpo, lutando para esconder algo mais urgente, menos sutil do que a obra completa, uma lentidão hipnótica em cada gesto que era similar a uma dança clássica.

Ele costumava trazer uma companhia todas as sextas-feiras, ao final de um exaustivo expediente. Arrastava sua pasta para dentro do apartamento acompanhado de uma companhia interessante, às vezes mais de uma, dependendo de sua ânsia insaciável.

[Notas de O. Didion: no manuscrito original, a palavra "ânsia" está grifada em um pequeno mapa mental com alguns comentários, como por exemplo, uma curiosidade de Sade sobre o professor, que costumava trazer homens e mulheres para o apartamento, o desenrolar da euforia sexual se dava de uma forma curiosa, elucidada por Dunne: embora estivessem envolvidos ao mesmo tempo com uma única finalidade, todos pareciam tê-lo como peça central de devoção.]

Havia algo quase maquiavélico em sua bela boca, no movimento hipnótico de seus lábios ao pronunciar palavras que ressoavam no vazio. Era uma criatura de aparência fria, oco de emoções mais profundas, embora exalasse algum tipo de atração sinistra e sedutora. Seus olhos vagando em círculos curiosos sobre o tráfego lá embaixo, parecendo uma entidade inanimada, uma criatura de mármore.

Mas esse comportamento era momentâneo até as sextas-feiras regadas a sexo. A garota de hoje era uma universitária, percebi pelas iniciais da universidade estampadas em sua jaqueta cafona de fraternidade. Devia ter cerca de vinte e três anos, cabelos escuros e volumosos, pele negra e usava óculos de grau de um jeito charmoso. Seus dedos percorriam as lombadas dos livros na biblioteca dele, enquanto O Professor observava seus movimentos, quase em transe, exibindo edições que se destacavam no topo da prateleira.

Ela era tímida, eu deduzi, afastava-se dando um ou dois passos seguros a cada vez que ele tocava seus ombros, parecia uma contradança na direção de um intuito claro. Num ato de nervosismo, seus dedos desalinhados percorreram repetidamente os próprios cabelos, tocando os cachos. Ela sabia que ele estava prestes a devorá-la, mas agia com um recato dissimulado, afastando-se ligeiramente. Tocava seu próprio cabelo em um frenesi desordenado, evidenciando a inquietação. Ele, por outro lado, incapaz de esperar, serpenteava ao redor de seu corpo antes de fisgá-la pela nuca, seu nariz deslizando suavemente contra a pele da jovem. Com mãos ávidas abrindo os botões da camisa que ela vestia, mergulhando as mãos por debaixo do sutiã rendado até encontrar a maciez de seus seios. Meus olhos estavam tão vitrificados naquela cena que ardiam. Minhas contagens obsessivas recomeçaram.

1, 2, 3, 4...

Minha vulva se dilatou como uma respiração profunda, inspirei e então respirei outra vez, mais aliviada, repetindo seus movimentos como espelhos de reflexo mundano. Dedos tocando os seios e a mão livre deslizando até a buceta vergonhosamente molhada, meu corpo transfigurado e sob a posse da criatura do lado de fora; suas milhares de mãos poderiam atravessar os tijolos, ou concreto, o vidro compensado de minha janela e me tocar sem dificuldade alguma. Era capaz de sentir seu gosto à medida que a saliva preenchia a boca, as papilas gustativas de sua língua recobrindo minha sensibilidade em uma coreografia erótica e movimentos precisos, o pré-gozo imaginário na ponta da língua prescrevendo as limitações da noite. A mão dele se ergueu como uma sombra noturna, envolvendo o delicado pescoço da jovem, um abraço fatal entre os dedos. E repeti a ação impiedosa, como uma lâmina afiada, ceifando o oxigênio. O ar se fragmentou em suspiros silenciados, enquanto o mundo se encolhia, incapaz de respirar em meio ao tesão funesto que rondava a sala.

Ela sabia que estava prestes a ser devorada por ele, mas habilmente realizava uma manobra sutil de desvio de atenção, caminhando até a única taça de vinho servida por cima da mesa de trabalho, dando um gole generoso.

Os olhos curiosos enveredando para fora da janela, na movimentada avenida graças ao puteiro de luzes vermelhas no fim da rua que ficava distante da visão do prédio moderno, mas ao alcance dos olhos do Truman Capote.

Despertei do meu transe masturbatório somente quando Taehyung bateu à porta.

A vibração entorpecida do corpo foi interrompida enquanto caminhava para atender a sequência desesperada de batidas contra a madeira. Pensando bem agora, a ideia de Kim me pegar assistindo aos meus rituais de obsessão pareceu mais invasiva do que tê-lo enveredando pelas minhas pernas no fim da noite. A chance mínima de tê-lo em minha mente, seu acesso irrestrito aos seus pensamentos foi mais impactante e ameaçadora do que meu modo precário de surrupiar informações premiadas de um funcionário público corrupto e com atestado de morte assinado, consequentemente, sabia onde estava me enfiando.

— Já vai, você pode esperar? — Abri a porta ainda com as luzes apagadas e vi a silhueta bonita de Taehyung de pé, o braço apoiado contra a guarnição de madeira. Emergiu para dentro, sob a luz do abajur, me erguendo pela cintura com ajuda do antebraço. O tecido rugoso da jaqueta repuxando os pelos finos do corpo. Me beijou com o gosto de sempre. Café quente e nicotina.

— Trouxe cervejas pra gente. — declarou ele, caminhando até a cozinha para tirar a jaqueta. — Ta aí! — A pasta de arquivos amarela foi arremessada por cima da mesa de jantar junto ao saco de papel úmido.

— O que é isso?

— Sua matéria de capa na segunda-feira, lindinha — Taehyung removeu a jaqueta, reproduzindo o velho costume, a pistola reluziu no coldre ao lado de seu coração, e removeu a arma para colocá-la por cima do balcão - Lembra do garoto desaparecido há dois meses? Se tiver estômago fraco, melhor não olhar essas fotos agora.

Desvio os olhos até a pasta, abrindo arquivo.

O garoto havia sido encontrado na costa de Roseville, as mesmas marcas similares no pescoço, nos lábios e, assim como no caso de New Orleans, sem o coração. A cabeça pendia como um instrumento oco, a ausência dos globos oculares causavam uma espécie de despersonificação, como uma máscara sintética acoplada a um rosto humano. Pela descrição do laudo, tinha pouco mais de vinte e quatro anos.

— Quando ele foi encontrado?

— Há alguns dias, o Nokes conseguiu essa. — Olhei para Taehyung e só então percebi o corte em sua sobrancelha, o sangue ressequido que parecia ter sido limpo às pressas, o cabelo úmido (parecia ter sido penteado com ajuda dos dedos molhados) estava repuxado para trás, e algumas mechas despencavam diante dos olhos — A Joy não vem hoje?

Sorri. Havia um resto de humanidade em Taehyung quando se tratava dos casos. Ao menos um traço de empatia. Essa merda faz com que a gente perca um pouco esse sentimento. Mas ele não falava sobre o que acontecia.

— Não, por quê? Não consegue sem ela?

— Não ferra, Sadie. Você é minha. E só um pouquinho da Joy. Mas foi gostoso assistir ela te beijar daquele jeito — Espalmou a mão contra a minha a minha bunda, me puxando para perto.

— Não sou sua, nem dela, nem de ninguém... — Seus lábios tocaram minha barriga. — A Joy fode melhor que eu, é isso que está dizendo?

— A Joy não faz metade das perguntas estúpidas que você faz quando vem até aqui, geralmente ela tá ocupada me chupando, entende? Então, bom, talvez sim.

Pareceu uma espécie de confronto pessoal, uma ameaça a sua virilidade frágil, como a da maioria dos homens parecia ser. Um comentário simples tornava-se uma verdade absoluta, uma necessidade de provar-se o tempo todo. E fracassar em cada singela tentativa.

A distância de sua transição durou alguns microssegundos, a expressão de confronto deu ar ao lado sedutor à lá Delon, com suas mãos enveredando em peças de roupa pela metade, cobrindo parcialidades do corpo de formas provocativas. Uma camiseta fina que ainda permitia que seu hálito tocasse meus seios, assim como uma calcinha minúscula que não oferecia risco às suas mãos ansiosas.

Nos encaminhei até o sofá, onde poderia assistir a rotina trivial do meu vizinho sedutor sem ser notada. Com as luzes da sala apagadas, nenhuma alma vivente era capaz de nos ver ali, sob a luz colorida da televisão ainda ligada.

Dancei até o sofá, enquanto Taehyung livrou-se do par de botas e de uma camiseta puída que usava por baixo de todas as roupas.

A peça foi deslizada pelas coxas e os olhos de Kim se iluminaram como quem ganha um presente de Natal em pleno 4 de Julho. Ele nunca foi do tipo sucinto, e aquele também não era um pedido meu. Não funcionava às custas de cuidado, mas rangia somente com voracidade aplicada. Seus olhos cuidadosamente me observaram antes do beijo doce em meus grandes lábios, deslizando a língua dentro de mim devagar, fazendo os anjos por trás do salitre alçaram voo; a sensação estranha me atravessou de imediato.

— Você já tá tão molhada...

— Cala a boca e só me come! Isso, assim. — Minhas pernas tremeram — Assim.

Recobrei a consciência depois da onda de prazer, procurando O Professor do outro lado dos muros, asfaltos, corpos e destinos que nos separavam.

Um instante de observação foi interrompido pelo seu olhar através da janela, enquanto seu corpo esmagava os seios da garota bonita contra um vidro livre de cortinas, o regime se intensificou feito um jogo silencioso, nas entrelinhas, era como se existisse uma mensagem em seu mimetismo forçado.

Queria que fosse você, então vou te deixar observar o que sou capaz de fazer com sua cabeça enquanto não chego até o seu corpo.

Claro, era impossível que ele conseguisse me ver com as luzes apagadas. Era impossível, não era? Mas seus olhos estavam fixos dentro da minha sala, percorrendo meu corpo, assistindo Taehyung me devorar.

Fechei os olhos, concentrada na sensação pulsante entre as coxas, as mãos de Kim correram para cima, tocando meus seios por dentro da camiseta do Eagles. A língua correndo livre em minha buceta, lambidas molhadas a ponto do ardor correr pela linha de minha bunda até minha espinha dorsal. Seus dedos afastaram as laterais da minha carne e a profundidade me fez emergir de olhos bem abertos.

Havia uma terceira pessoa conosco na sala.

 Olhe para mim, Sade Dunne. Estou aqui. Eu sinto seu cheiro. Eu sinto seu gosto. Eu sei quando você me chama, Sade Dunne. Eu venho quando você me quer, Sade Dunne. Desde o início dos tempos até o fim dos dias da sua alma...

Levitei como um truque de mágica houdiniano.

Mais de uma boca sugava o sumo dos meus ossos, o calor de minha carne, e sentia o hálito frio unida ao calor da boca de Kim, o ritmo diferente das línguas molhadas percorrendo minha genitália, a sucção intensa de meu clitóris compartilhada com outros lábios, que tocavam os de Taehyung enquanto me assistia. Em um segundo, éramos três. A imagem horrenda do sangue gotejando em sua boca, compartilhada com a língua de Kim feito um cálice sagrado, o sorriso de escárnio era apenas lembrete de sua ausência de bondade.

Era uma criatura demoníaca devorando minha pele.

O pensamento intrusivo me fez repelir Taehyung em gritos e chutes no ar, correndo até o canto da sala para acender as luzes. Os móveis emergiram e tomaram forma na ausência da escuridão, todos em seus devidos lugares, algumas peças de roupas largadas ao lado do sofá, a expressão assustada de Taehyung ajoelhado, como quem teve sua oração interrompida, nada fora do habitual. Nada que deveria me preocupar.

Não havia mais ninguém ali além de nós dois. Do outro lado da rua, a luz do apartamento misterioso permanecia acesa, o professor caminhava de um cômodo até o outro, folheando um livro.

— Que porra foi essa? — A respiração ofegante de Taehyung também me apavorou.

— Eu juro, tinha mais alguém aqui, tinha a porra de um cara aqui. Aqui, com a gente.

Meus olhos se moveram até a TV silenciada, a garota sorridente da foto exibida pela repórter parecia familiar. Reconheci pela jaqueta de fraternidade da mulher que há poucos minutos estava nua no prédio ao lado. A chamada indicava abaixo do número de contato, as letras em caixa alta, os dados em vermelho: Jennifer Junipero, vinte e quatro anos, aluna do curso de direito da Universidade do Leste da Califórnia.

Ao lado da imagem, uma mãe chorosa e preocupada mostrava itens do quarto da filha como lembretes de existência.

Meu estômago retorceu.

Aquela garota estava desaparecida há um mês.



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N/A:

Eu avisei, eu avisei, tá? Hahaha.

Obrigada a todos que esperaram por atualizações, vem mais por aí (quando? quando Deus permitir!)

Acho que Maligno tá sendo bem experimental para mim, mas tô gostando de escrever esses personagens corrompidos e de índole duvidosa, me contem, sobre o que vocês estão mais curiosos?

E claro, a Joy, a famosa Joy, ela vai aparecer aqui em um capítulo só dela, não se preocupem!

Se tiverem teorias, já quero saber, e vou repostar as melhores!

Com amor, Condessa Sofia Vlad. 🦇

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