Capítulo 38🌙Námarië, mellon!
Nota inicial:
Boa leitura ♥
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Eles vivem muito mais do que nós; até que finalmente morrem, ou [pelo menos] desvanecem daquele Estado.
– A comunidade secreta,
de Robert Kirk e Andrew Lang (1893)
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Aranel sentou-se na cama, ao lado do Rei Aragorn, e pegou sua mão. Ela ainda se lembrava do jovem rapaz que ela encontrou naquela tarde, as margens do Ermo.
A, então, princesa Aranel se preparava para escalar as Montanhas Sombrias quando alguém chocou-se contra ela. A elfa se equilibrou subitamente, mas o jovem rapaz caiu no chão e tirou o capuz do rosto. Seus olhos cinzentos foram até os dela e ele mordeu a boca levemente; sua barba rala, porém escura, estava molhada. Ele balançou a cabeça.
Aranel franziu as sobrancelhas com um olhar severo sobre o jovem homem, e pressionou os lábios.
— O que acha que está fazendo? — Questionou ela, zangada.
Aranel também era jovem naquela época, mas sua posição hierárquica no reino da Floresta Branca, a amadurecia a cada dia.
— Correndo! — Retrucou o rapaz.
Ela cruzou os braços. — E não olha para frente? — Nel bufou e olhou em volta, para a campina e para as montanhas. Ele não parecia estar sendo seguido. — Devo admitir que têm passos largos.
O jovem se levantou e bateu na roupa para tirar a poeira e a grama que grudou em si. Então, sorriu para ela.
— Perdoe-me — ele fechou a boca subitamente — hãn...?
A elfa ergueu o queixo. — Aranel Vellenmar. — disse, rispidamente.
— Oh, pelos grandes senhores dos dúnedain! — ele exclamou, apressando-se para fazer uma reverência quase perfeita. Ele não parecia alguém que soubesse se portar em meio a realeza. — Desculpe, bela princesa. Não foi minha intensão conturbá-la. Por favor, perdoe-me.
Aranel descruzou os braços e soltou a respiração. Ela molhou os lábios e sorriu.
— Está perdoado — disse — hã...?
— Passolargo. — ele colocou o capuz sobre os cabelos castanhos.
Nel franziu e ele soltou uma gargalhada. Passolargo não devia ter mais que quartorze anos, franzino e ágil, com olhos atentos e vigilantes. Ele era um jovem rapaz que poderia muito bem ter o futuro como um artesão ou coisa do tipo. Mas não.... como ela descobriria anos depois.
— Não está zoando com a minha cara?! — Ela questionou.
Passolargo gargalhou. — Não estou zoando com a sua cara, Sua Alteza Real. — ele disse, docemente.
Aranel balançou a cabeça e Passolargo fez mais uma reverência.
— Com sua licença, alteza — ele disse —, mas preciso terminar o treino antes que meu Mentor chegue.
Ela estalou a língua. — Ah — disse, sorridente — e quem é?
— O senhor Elrond de Valfenda. — Passolargo encheu o peito de ar. — O conhece?
— Ná! Sim! — ela assentiu.
— Não posso chegar atrasado para a hora do jantar. — Passolargo deu alguns passos para trás e fez outra reverência. — Foi um prazer conhecê-la, alteza.
Aranel sorriu. — Digo o mesmo, Ligeirinho!
Passolargo soltou uma gargalhada gostosa e alegre. — Tenn'enomentielva, aranel. Até nosso reencontro, princesa. — cumprimentou ele, despedindo-se.
Então, o jovem rapaz desapareceu entre as colinas sinuosas daquela parte do Ermo.
Tão jovem era Aragorn quando eles se conheceram. Aranel estremeceu. Aragorn, deitado na majestosa cama de carvalho e ouro, estava, agora, velho, cansado e pálido. Seus cabelos que antes eram castanhos, saudáveis e brilhosos, agora estavam brancos, finos e quebradiços. Seus olhos, porém, continuavam vigilantes, atentos e brilhavam – azuis como o céu de inverno. A longa barba dele estava cinzenta, cheia e repousava pouco abaixo do pescoço. Sua pele que antes era corada, firme e macia, agora estava cansada, enrugada e cheia de linhas de expressão. A coroa de Rei repousava em meio ao emaranhado de fios brancos, brilhando em dourado acima de sua testa. O Rei Aragorn. O Rei de Gondor e Arnor. O homem que não queria ser um governante, mas que a vida lhe mostrou seu verdadeiro caminho, e ser um Rei – ele soube – foi a melhor coisa que já lhe aconteceu. Aragorn era reverenciado por seu governo justo e rico de solidariedade. Ele era um verdadeiro Imperador, apesar de sua aversão no início de sua jornada.
A rainha Aranel se inclinou e apoiou o rosto na mão, e sorriu para o amigo. Já haviam se passado cinquenta e seis anos desde a morte de Blatter. Cinquenta e seis anos de paz na Terra-média, mas que ele fazia questão de relembrar da batalha que não presenciou – a destruição de Rubel Blatter.
Os dedos de Nel acariciavam a mão enrugada do Rei de Gondor.
— Aragorn, filho de Arathorn. — Ela recitou, estalando o sutaque do sul da Terra-média. Ele soltou uma risada baixa. — Rei de Gondor e Arnor.
Aragorn tossiu e balançou a cabeça. — Quem diria, não é?!
— Eu lhe disse! — retrucou Legolas, entrando pela porta com um sorriso lindo no canto dos lábios. O Rei Consorte da Floresta Branca sentou-se ao lado do amigo e pegou-lhe a mão também. Legolas usava um manto escuro sobre os ombros largos, e a armadura de aço prateado pouco brilhava por baixo da capa. Seus cabelos dourados estavam soltos e sobre eles repousava uma tiara de ouro.
Aragorn olhou para o amigo e molhou os lábios secos. — Mae govannen, mellon. Bom revê-lo, amigo. — cumprimentou ele, fazendo um aceno de cabeça. — E você sempre teve razão... de fato.
Legolas sorriu e olhou para a esposa. Inclinou-se na cama e beijou a testa de Aranel, carinhosamente.
— Engraçado — resmungou Aragorn. Aranel e Legolas o olharam. — Aqui, deitado, depois de todas as aventuras que vivemos. Depois de todas as guerras que travamos, depois de todos os temores que enfrentamos... — Ele engoliu a saliva e continuou —, percebo que ser justo, não é ser bom.
Aranel e Legolas se entreolharam e voltaram-se para o Rei.
Aragorn inspirou fundo. — Nós matamos muitas pessoas, inocentes ou não, enfeitiçadas ou não, orcs ou não, mas eram seres vivos. Seres que lutavam, mesmo que erroneamente, pelo que acreditavam. — Ele tossiu mais uma vez — Eram seres que respiravam e viviam na mesma terra que nós, que ansiavam pelos seus direitos, que queriam impôr sua vontade. Mesmo que suas intenções fossem as das mais cruéis, eles ainda eram seres como nós. — Os olhos de Aragorn ficaram enevoados — Eles sentiam dores, pavores e temores. Eles sangravam.
— Aragorn — Legolas suspirou — Eles queriam dominar o mundo. Matar pessoas inocentes. Tomar e destruir reinos inteiros. Exterminar toda e qualquer raça de luz.
O rei o olhou, tão sério e severo que Nel se surpreendeu.
— Queriam o que queríamos. — Ele enfatizou — Sobreviver.
— Matando todos nós? — Aranel questionou.
— Protegendo o próprio princípio. A própria ganância. — Aragorn suspirou — Foi o que sempre fizemos, não é? Proteger nosso próprio povo? Nosso próprio propósito?
Aranel engoliu em seco, compreendo as palavras de Aragorn.
Legolas, porém, se inclinou. — Está dizendo que devíamos ter recuado na guerra?
— Não. — Ele respondeu firmemente — Isso nunca. Zelamos pelo futuro dos homens, dos elfos e de todos os seres viventes nesta terra. Nosso dever é, e sempre será, protegermos uns aos outros. — então, ele molhou a boca — Estou dizendo que assim como nós, eles lutaram por aquilo que acreditaram. — Aragorn tossiu pesadamente e sugou o ar, deitando-se na cama. — Sempre achei nós melhores do que eles... — Sua voz arranhava a garganta dolorida —, mas vejo agora como somos parecidos.
Nel deixou uma risada fugir. — Não somos parecidos em nada, Aragorn.
— Acha que não? — Ele ergueu uma sobrancelha branca. — O que Vossa Majestade faz quando um ser ameaça sua família, seu povo, seu reino, tão cruelmente que poderá destruir tudo?
Ela deu de ombros, mas sentia a resposta pesar em sua boca. — Eu ponho um fim!
Os olhos do rei brilhavam. — Você arranca seu sangue. — disse-lhe, tranquilamente. — A mesma coisa que eles fariam conosco. Reponda-me agora: Vendo por esse ângulo, o quão diferentes nós somos?
Um silêncio sepulcral tomou conta do quarto. Aranel ouviu o timir de espadas, aço no aço, dos campos de treinamento na parte norte de Gondor. Ouviu o creptar do fogo nas braseiras dos ferreiros, padeiros e nos fornos na grande cozinha do castelo. Nel sentiu o aroma doce de iguarias da cidade, ouviu o som de risadas vindos da aldeia e dos campos em torno da cidade. Aquele era o reino mais próspero, poderoso e rico naquela parte da Terra-média. Um reino onde a felicidade imperava. Porém, naquele dia, as bandeiras tremulavam a meio-mastro. Seu Rei estava gravemente doente, velho, e todos sabiam que a qualquer momento, o pior poderia acontecer.
Aranel engoliu em seco aquela sensação terrível e inspirou fundo. A lareira do quarto queimava e estava um ambiente agradavelmente quente ali dentro. Ela olhou para a junção de suas mãos – as dele enrugadas, cansadas e manchadas e, diferentemente, as de Nel tão novas e suaves, coradas e macias. Eram mãos de Rainha, porém, tão diferentes das mãos dele. Ela era centenas de anos mais velha que ele, mas parecia não ter mais que vinte anos na idade dos humanos. Ali, contudo, ela viu o quanto os homens eram breves na terra, enquanto que os elfos viviam muito mais que qualquer um deles – homens, anões, hobbits, dragões.
Aragorn tossiu, tirando ela de seus pensamentos e sorriu para ela.
— Realmente — Nel tomou fôlego — você está certo.
O rei se acomodou na cama e molhou a boca. — Como eu disse — ele ponderou — nós não somos diferentes. A única concessão é que o nosso lado é o do bem, da ascensão. Tiramos o mal do mundo. Fomos justos... não fomos bons, pois precisamos tirar sangue de outros seres para termos sucesso na recuperação do Mundo.
Aranel e Legolas se olharam novamente.
O príncipe da, então, atual, Floresta Verde sorriu para o amigo humano na cama e suspirou.
— Você — ele inspirou — precisa mesmo ir?
Aragorn deu um sorriso discreto e molhou os lábios, engolindo a saliva com certa dificuldades.
— Eu acredito — disse ele — que nós, homens, falhos e ignorantes, voltamos para a companhia de Eru. E lá permaneceremos até o Final. Quando nos reencontrarmos, após o Fim, então tudo estará em seu devido lugar novamente. — Seus olhos cinzentos brilhavam. — Talvez seja um lugar bom, um Paraíso. Talvez um lugar distante e frio; talvez não seja lugar ao algum... — Então ele inclinou a cabeça na direção do elfo. —, em todo caso, só há uma maneira de descobrir...
— Se o céu é de verdade. — concluiu Nel com um sorriso triste no rosto. Sua saliva queimava entre sua língua e sua garganta.
Aragorn piscou. — Exatamente, rainha da Floresta.
Ela deu uma risada baixa e suspirou, erguendo os ombros. — Há alguma coisa que podemos fazer por você?, agora? — ela perguntou.
O rei sugou o ar e deslizou seus olhos em direção ao teto em catedral do quarto de dormir. O brilho cinzento de seus olhos pouco irradiava em torno da luz fria do dia. Um fatídico dia outonal gelado.
— Eu — ele suspirou, engolindo em seco. Seus lábios finos e pouco rosados fremiam uns nos outros. — gostaria de ouvi-los cantar — Aragorn sugou o ar. Ele estava cansado. — uma última vez.
Aranel e Legolas se olharam e suspiraram mais uma vez. Então, viraram-se para o Rei Aragorn e prepararam a voz.
A caita carelya ammelda ar moiana,
Lanta i lómë, utúlielyë tüo mettanna
A lorë sí, ar óla len i epi tuller
Entë yaitar hrestallo pella
Manen neyílyë? Mallo nier antalyassë?
Rato cenuvalyë sa ilyë caurelyar autuvar,
Varna mi inya ranqui
Man cinilyë eccaianna?
Manen i maiwi ninqui yaitar?
Arta i Eär Isil néca amarta -
Ciryar utúlier an yulu le marélya
Rómem ahyuva ve hyellë telpina,
I cala nenissë. Ilyë fëar autar.
I Estel vinta ambarenna lómëo,
Ter fuini lantala, pella enyallië ar lumë
Ava quetë: "Si utulielwë mettanna".
Hresta ninguë yáma-elyë ar inyë ata omentuvalwë
Ar elyë nauva sinomë mi inya ranqui
Man cenilyë eccaianna?
Manen i Maiwe ninqui yaitar?
Arta i Eär, Isil néca amorta -
Ciryar utúlier an yulu le márelya.
Ar ilyë ahyuva ve hyellë telpina,
I cala nenissë. Ciryar mistë autar,
Númenna.
Cada acorde, letra e sonoridade daquela canção ecoou atrás das janelas e dos corredores daquele salão. As vozes únicas de Legolas e Aranel, o timbre élfico suave e macio, quente e acolhedor, retumbavam em cada milímetro daquele grande reino. Cada pessoa, animal, inseto e cristal ouviu o cântico angelical das vozes dos elfos.
Aragorn, deitado na cama, apreciava a melodia calma e bela das vozes de seus amigos. Seu rosto era iluminado por um sorriso fácil e contente, e pouco corado, resistia aos minutos que ainda lhe restavam na terra. Suas mãos suavam enquanto seguravam as deles. Ele suspirava, deleitava-se na doce cantiga élfica.
Quando a canção teve fim, Aragorn abriu os olhos e deixou uma lágrima escorrer.
— Hantalë. Obrigado. — Ele agradeceu, calorosamente. — É bom saber que minha vida não foi em vão, e que fiz bons amigos aqui.
Nel repeliu algumas lágrimas e sugou o ar.
— Nenhum homem vive, e nem morre, em vão. — ponderou Legolas.
Aragorn o olhou. — Tens razão, meu amigo. — concordou o Rei.
Aranel via o sol se pôr àquela hora do dia. Então, olhou para o marido e comprimiu os lábios.
— Precisamos deixá-lo, querido. — disse, ternamente.
Aragorn, ouvindo aquilo, tossiu. — Ela tem razão, mellon. — disse — Vocês precisam partir. É chegada a hora da despedida.
Legolas bufou. — Detesto despedidas. — resmungou.
— É por isso que Nel fugiu de você duas vezes no passado. — Observou ele.
Aranel riu. — Muito bem lembrado.
Os três se olharam e uma lágrima escorreu pelos olhos de Aragorn. Legolas beijou a mão do amigo e Aranel se inclinou na direção dele, depositando, suavemente, um beijo em sua testa. Então, sorriu para ele.
— Námarië, mellon. — Ambos disseram juntos — Adeus, amigo.
Os olhos de Aragorn brilhavam. — Námarië, tári. Aran. — Ele fez uma reverência de cabeça. — Adeus, Rainha. Rei.
Ambos se levantaram da cama e deram-se as mãos.
Aranel andou lentamente até a porta, e Legolas a abriu. Porém, se virou uma última vez para ver um sorriso tranquilo nos lábios e no rosto cansado de Aragorn.
— Nos vemos na Eternidade, Aranel. — Ele sussurrou.
Ela sorriu e fez uma reverência. — Que assim seja, Aragorn.
Ele riu.
Legolas e Aranel se afastaram do quarto. A rainha Arwen e os quatro filhos de Aragorn, entraram para se despedirem de seu Rei.
A rainha parou na sacada daquele corredor e viu o sol descer lentamente pelo céu até o oeste. O castelo ficou em silêncio por algum tempo. Legolas se aproximou e a abraçou por trás. Seu cheiro e seus braços a envolveram.
— O que fazemos agora? — Perguntou ele.
Nesse momento, um grito de agonia e desespero de Arwen ecoou pelas paredes do castelo. Aragorn estava morto.
Engolindo o ácido de sua saliva, Aranel sugou o ar.
— Agora? — ela repetiu para si — Agora, a gente continua.
🌙
Nota final: Muito luto!!!!!! Vou dar uma paradinha nas mortes e nos desastres.... Aaahhh!!! Brincadeira! Hehehehehehehe. 👿👿👿👿👿👿👿👿
Gostaram? Cometem ai pra mim saber hahahaah
Até o próximo....
Tenn'enomentielva ....
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