11| Se divertir e não resistir

Passei todo o caminho observando a cidade se distanciar pela janela até que uma fina vegetação começasse a surgir em uma pequena estrada.
Não demorou mais que vinte minutos quando chegamos em um lugar que mais parecia uma oficina daqueles programas de carro da History que o meu pai gostava de assistir aos sábados.
De fato, era uma oficina, com inúmeros carros, ou o que restava deles, espalhados e empilhados por todo o lugar do pátio.

George e eu fomos recebidos por um homem barrigudo, cuja barba prateada chegava a bater na clavícula, seu sorriso, estampado no rosto sujo de graxa, passava a mensagem de uma saudade amigável.

— Rufos! Quanto tempo cara! — George levantou a mão encontrando a do homem em um high-five.

— Nem me fale! Quanto tempo faz? Dois anos?! — as mãos do homem encontraram a sua barba grisalha.

— Um pouco mais. — George então olhou para trás, na minha direção. — Milenna, este é Rufos, esse cara conserta carros desde a época que eu comprei o meu primeiro garotão.

— Milenna? — Os olhos do barbudo se comprimindo numa linha reta deixando as suas rugas da idade mais marcadas — Não me lembro dela.

— É minha filha. — E a confusão em sua cara se tornou surpresa. — Quero dizer, por um ano.

Filha. Palavra dita por George ali com tanto orgulho, não me parecia mais um peso nas costas.

— Adoção? — Agora seus olhos só expressavam a mais pura pena que eu só reconheci por já ter visto esse mesmo olhar em várias pessoas.

— Intercâmbio. — George expressou mais um dos seus melhores sorrisos ao homem, nunca deixando de se mostrar realizado.

— É mesmo? E de onde essa mocinha vem?

— Do Brasil. — fui eu quem respondi como uma criança respondendo sua idade e observei atentamente qualquer reação que o careca apresentasse, me surpreendendo quando seus olhos ficaram desfocados.

— Mas que irônico.

— Rufos... — George começou repreendendo o mecânico. — Você... Ele está aqui?

Me perguntei a quem ele se referia, já estava farta de pessoas surpresas, por mais legais que algumas fossem, pessoas davam trabalho para se lidar.
Observei Rufos assentir tristemente e nos chamarmos para segui-lo.

— Achei que nunca mais voltaria a mexer nesse carro. — Disse Rufos, passando por entre as sucatas.
Então não era uma pessoa, era um carro.

Fazia sentido o papo de não querer me levar e fazia mais sentido ainda estarmos em uma oficina.
O problema era que eu não tinha carteira e não sabia como ficaria a questão do intercâmbio.

— Essa belezinha vai precisar de uns belos reparos. — O mecânico quem deu a palavra novamente, indicando o Ford Mustang preto com sua lateral completamente amassada.
Não era uma simples marca, era um amassado que quase atrapalhava a identificar o carro desse ângulo e tenho absoluta certeza de que foi um acidente muito feio.
Rufos assoviou rondando o carro empoeirado.

— Consegue conserta-lo? — Perguntei ao homem.

— Vai ser difícil, mas, para o Rufos nada é impossível minha amiga. — O mecânico disse, alisando sua grande barriga.

— Bem, Milenna, seu presente de boas vindas. — George se recostou no carro.

— Espera, é meu mesmo? — perguntei ainda sem acreditar, apontando para o carro.

— Só depois que Rufos der um trato nele.

— Especificamente dois meses, bonitinha. — Rufos disse abrindo a porta do lado não amassado.

Observei o carro que em dois meses seria meu, a janela quebrada dava ampla visão para o outro lado do carro, o lado em que Rufos abriu e que era o lado do motorista.

— Era seu? — perguntei curiosa a George.

E com os olhos brilhando ele respondeu:

— Não. — Foi vago. — Estou de olho nele a alguns anos.

— Conheci o dono dele. — Rufos começou. — Ele odiaria que estivesse largado aqui nesse pátio.

— E porque está aqui, então? — perguntei.

— Digamos que ele não pôde mais cuidar do carro. — Apenas acenei com a cabeça, entendendo.

E de forma quase imperceptível, os dois homens compartilharam um sorriso companheiro. Amigos de longa data.

— Mas eu não tenho carteira. — Lembrei aos dois.

— Já conversei com a agência, eu posso te ensinar a dirigir para você conseguir uma carteira provisória.

— Sério? — perguntei e o mais velho assentiu muito confiante.

— Só se você quiser.

— Eu quero! Obrigada de verdade George. — Aceitei o abraço do homem que me denominou como filha e me abraçou com o carinho de um pai.

Mal me lembro do último abraço que meu pai havia me dado por amor. A maioria deles eram pedidos de desculpas depois dos seus gestos violentos.
Ter George e Megan era o mais próximo de ter pais que eu conseguiria.
E naquele momento eu sorri como a minha irmã sorria ao ganhar um presente de natal.
Eu podia sentir meus olhos brilharem ao olhar o carro e todo o esforço que seria para arruma-lo só para mim.

— Você nem pense em ir com essa saia de velha! — O loiro gritou do outro lado do celular.

— Luke, eu não tenho ideia do que vestir então!

— Você nunca foi em uma festa, não, garota? — O loiro me olhou julgando, mal sabendo que eu realmente nunca havia ido em uma festa de adolescentes.

— Só nas ceias de Natal. — respondi com arrependimento.

— Jesus Cristo nos abençoe!

Estávamos em ligação por vídeo a horas, tentando decidir com que roupa eu iria à festa de hoje a noite.

— Céus, Luke, pode parar de me julgar?

— Não, não posso parar de julgar essas suas breguices. — Luke alisou o gato preto deitado entre suas pernas. — Você teria um vestido?

— Tenho três. — respondi. — Um preto, outro verde e um rosa.

— Deixe-me ver o preto.

Posicionei o vestido frente ao corpo esperando que o estilista bundão julgasse.

— Nem precisa me mostrar os outros. — ele começou. — Tenho certeza que essa é a peça menos puritana que tem no seu guarda-roupa.

— Me desculpe se eu não tenho lingeries e meias arrastão. — disse irônica.

— Jonathan se interessaria mais se tivesse.

— Se eu quisesse impressiona-lo nem precisaria usar uma roupa. — menti.

— Se não estivesse pensando em impressiona-lo, não estaria tão obcecada em saber mais sobre ele.

O loiro estava se referindo as perguntas que eu faço desde a visita que fiz ao quarto do idiota motoqueiro, mas Luke não sabia do vídeo e nem que ele veio contar aos Davies sobre mim, porque isso implicaria contar do outro vídeo e isso também causaria pena, a qual eu não era digna. Eu não havia contado porque sei que não há necessidade em me expor dessa forma, porém, também precisava descobrir como o Hamilton tinha aquele maldito vídeo.
No fundo, só havia uma explicação e se ela fosse real, ele era um stalker psicopata, se não, ele só seria um babaca cuzão.

— Milenna, você só pode ter problema de audição! — Luke gritou do outro lado da tela. — Nunca escuta o que eu falo, porra.

— Perdão, centro das minhas atenções! — Fiz uma reverência forçada. — Fale de novo.

— E olha que o surdo sou eu. — reclamou ele. — falei para usar um batom vermelho, vai tirar a ingenuidade do vestido.

— Se você diz, quem sou eu para discordar.

— Aí se discordar, você sabe que eu sempre tenho razão. — o garoto passou a mão pelo cabelo se exibindo.

— Egocêntrico.

— Eu sei que você também me ama, docinho. — o garoto se levantou da cama enxotando o gato de seu colo. — Tenho que desligar para me arrumar. Alyssa vai nos buscar às nove.

— Tá bom, obrigado, Lu!

— Se não estiver pronta, vamos te deixar para trás. — o loiro desligou a ligação mandando um beijo.

Eu tinha duas horas para me arrumar, o bom é que eu não me importava com maquiagem e usaria apenas o batom vermelho a pedido de Luke, então, na verdade eu teria um bom tempo para me arrumar.

Mas decidi tomar um banho agora para no fim só ter que vestir meu vestido.
Entrei na banheira sem nem olhar para o espelho dessa vez, é mais fácil quando você não encara a realidade frente a frente.
Sem refletir muito saí da banheira assim que a água esfriou e meus dedos incharam, o que durou meia hora de acordo com o meu relógio.
O fuso horário aqui era confuso, o céu já estava escuro e para eles às nove é como se fosse às onze no Brasil, eles jantam enquanto o céu está claro, acho que nunca vou me acostumar com isso.

— Querida, posso entrar? — Meg bateu a porta me tirando dos devaneios.

— Pode sim. — respondi terminando de ajustar as alças do vestido.

A porta fez um clic e então a mais velha entrou esboçando um sorriso no rosto.

— Você está linda. — Seus olhos brilharam paralisados após me olhar dos pés à cabeça.

— Obrigada. — agradeci sem graça. — Eu não terminei ainda.

— Ah, isso! — ela exclamou. — Vim ver se precisava de ajuda.

— Bom, acho que não. — sorri sem graça, mas a mais velha secou suas mãos no quadril e de forma receosa me perguntou:

— Eu... posso pentear seus cabelos, Milly? — Suas bochechas coraram antes mesmo de perguntar.

— Ahn... — a única pessoa além de mim que já havia tocado em meus cabelos era a minha vovó. — Bem, não vejo problema.

Megan sentou-se insegura na cama e deu duas batidinhas com a mão no espaço vazio na sua frente, sem questionar me sentei virada de costas para ela lhe entregando uma escova e presilhas de cabelo.

— Eu sempre quis fazer isso... — sua voz tão baixa que só escutei pela proximidade. — Sempre quis ter uma filha mulher.

Suas mãos começaram a pentear meu cabelo com calma, suavidade transbordando em cada toque carinhoso com a escova.

— Você nunca tentou ter filhos? — perguntei esperançosa de que a mais velha respondesse.

— Já... várias vezes.

Será esse o fardo da dor dos Davies? Mas onde Jonathan entraria nessa equação?

— Só Deus sabe o quanto queríamos um filho.

— Você é infértil, Meg? — tentei soar gentil.

— Não! — A mulher se postou a responder rapidamente. — Nem eu, nem George somos inférteis. Só... é complicado.

— Entendo, não precisa me contar.

— É que às vezes me pergunto se... seríamos bons pais. — Os movimentos em meu cabelo soando cada vez mais confortáveis.

— Vocês seriam ótimos só por pensarem assim. — eu disse. — Pessoas ruins vêem razão na ruindade, e vocês a questionam.

— Você acha que estamos sendo bons para você?

— Os melhores. — confortei-a.

— Eu tive tanto medo, antes de você chegar, fiquei com medo de não estar preparada.

Senti a mulher pegar uma mecha do meu cabelo e prender com a presilha para trás, deixando uma outra mecha pequena cair na frente.

Eu não soube o que responder, senti que eles estavam tão preparados que pareciam já ter feito isso um milhão de vezes.
Na falta de como conforta-la, fiquei em silêncio esperando que ela sentisse o quão bons eles têm sido, sentindo suas mãos no meu cabelo finalizando um possível penteado.

— Terminei. — suas mãos se afastaram da minha cabeça e a falta do contato quente e confortável assolou-me quase que de imediato.

Levantei-me indo até o espelho olhando pela porta do banheiro, de longe para não me distanciar da mulher. Queria que ela visse na minha cara a gratidão, já que eu não era muito boa com palavras.

Ela havia deixado uma parte do meu cabelo escorrendo como uma cascata pelas minhas costas enquanto a outra estava presa em uma presilha, ainda deixando duas mechas na frente. Era simples, mas elegante.

— Está perfeito, Meg. — eu lhe disse com aquele mesmo brilho nos olhos de mais cedo.

— Você está linda. — Ela disse novamente como que para reafirmar. — Tem certeza que não quer que George te leve?

— Tenho sim, meus amigos vão vir me buscar daqui a pouco.

— Então tá, mas tenha juízo, mocinha.

— Juízo é meu sobrenome. — sorri ladino para ela e a mesma espremeu os olhos zombando.

E então a mais velha se retirou deixando que eu terminasse de me arrumar, após ficar rápidos segundos me admirando da porta.
Não importava o quão ruim era saber que eles tinham um segredo, eles me faziam bem, me lembravam a minha avó e no fim eu estava cumprindo a regra número 3.
Completei meu vestido simples, que chegava na canela, com um salto médio na cor, também, preto e não me esqueci de passar o batom vermelho nos lábios, sendo a única coisa colorida em mim hoje.

Mal terminei de me arrumar quando escutei a buzina do carro da Alyssa.
Desci as escadas e antes de sair dei um abraço de despedida em George e Megan, os agradecendo novamente.

— Já estávamos indo embora! — Luke reclamou quando entrei no carro.

— Boa noite para você também, Luke. — respondi vendo que já estavam todos no carro.

Alyssa vestia uma calça cargo preta que se parecia com couro e uma blusa tomara que caia, verde musgo, cuja cor fazia uma bela combinação com a sua pele escurecida. Sarah usava uma calça larga na cor laranja que combinava com sua blusa branca de mangas e gola alta, seu véu que hoje era branco acompanhava a extensão da blusa.
Luke estava muito mais diferente do que na escola, usava uma calça preta justa e um colete jeans escuro fechado e desfiado nos ombros, deixando parte do seu bíceps à mostra.

— Vocês estão bonitos. — Eu disse.

— Obrigada, Lenna. — Sah respondeu em uníssonos com Alyssa. — Gostei do vestido.

— É claro que gostaram. — Luke começou. — Fui eu quem a ajudei, nem imaginam as coisas horrendas que ela queria vestir.

— Se acha minhas roupas tão ruins, deveria me comprar novas. — rebati matando o sorriso convencido na cara do garoto.

— Sua chata. — me deu a língua. — Você também está bonita.

— Por favor, não me deixem sozinha hoje, não faço a mínima ideia do que fazer em uma festa. — Sah pediu sem soar desesperada, no fundo eu sentia o nervosismo em sua voz.

— É simples, você pode dançar, beijar, beber e transar. — o loiro respondeu comum enquanto a garota arregalou os olhos, assustada.

— Isso só se você for um idiota. — Alyssa começou, irritando Luke. — Você pode conhecer pessoas, comer e se divertir.

— Foi o que eu disse! — Luke rebateu. — Só que sendo mais realista.

— Não vamos te deixar sozinha, Sah. — Confortei-a ignorando o conflito que se iniciou entre os dois e recebendo um sorriso tenso da mesma.

A tela do meu celular brilhou quando percebi ter recebido uma mensagem de um número desconhecido.

"Espero te ver na festa hoje."

Como caralhos o idiota mesquinho conseguiu meu número?

Não seja burra Milenna, se ele conseguiu aquele vídeo, seu número é o de menos.

"Me deixe em paz, Jonathan" respondi rapidamente.

E antes de conseguir bloquear o número, chegou outra mensagem.

"Jonathan?! Sou eu, o Chase, Linda"

Merda.
É claro que seria, eu passei meu número para ele!

Talvez Luke estivesse certo e eu estava ficando obcecada demais com essa história do Hamilton. Eu preciso deixar isso de lado, preciso parar de pensar nele.

— Milenna, Você ouviu isso? — Alyssa perguntou para mim se referindo a algo que Luke disse.

— Luke é um idiota sem o que fazer. — Respondi sem nem saber o que o loiro tinha falado.

— Não sou não! — ele disse se defendendo. — Disse apenas verdades.

— Mas o que tem de mais em ser virgem? — Sarah perguntou. — Vai ver ela tá esperando a pessoa certa.

Virgem? Mas eu não era virgem. Rogério garantiu que eu não fosse, mas, eu não diria isso a eles, se quisessem acreditar que eu era virgem, tudo bem. Melhor assim.

— Não estou me guardando para ninguém se querem saber. — eu disse.

— Viu! Eu disse, ela é só chata mesmo.

— Mas não significa que eu seja virgem. — Respondi à altura e todos olharam surpresos para mim. — O quê?

— Enfim, vamos mudar de assunto! — Sarah disse, percebendo meu desconforto.

— Acham que Madeline vai deixar a gente entrar? — Luke perguntou

— Acho que sim, Chase me chamou e ele é do grupo dela não é? — respondi ao loiro, recebendo um sorriso malicioso.

— O Chase rebatedor? — Alyssa perguntou e eu acenei com a cabeça. — Ele até que é bonito.

— Dizem que ele é ruim de cama.

— Luke! Céus, eu não quero ir para cama com ninguém, entendeu?

— Milenna, esqueça aquela baboseira de regra e tenta se divertir! — ele advertiu. — Afinal, você só não pode se apaixonar, não significa que não possa transar.

— Na verdade, eu também não posso. — expliquei. — Regra número 5.

O loiro revirou os olhos e Alyssa parou o carro na frente da casa completamente movimentada, pessoas andando para todo lado no jardim e um som alto era notável.

— Chegamos. — Alyssa avisou destravando as portas, a qual eu passei alguns minutos depois.

Ajeitei o vestido me aproximando dos meus amigos que estavam entrando mais para dentro do jardim.
A porta estava fechada, mas destrancada e o loiro nem pensou em bater a campainha, apenas entrou.
Logo nos demos de cara com uma multidão de gente espalhada por dentro da casa, deixando subir uma áurea de suor e bebida.

— Ali. — Luke apontou para o sofá puxando minha mão, Sarah e Alyssa o seguindo.

O sofá vazio cabia a todos nós, mas Luke saiu alguns segundos depois para ir buscar bebidas, mesmo ele sendo o único que iria beber.

— Isso é tão estranho. — Sarah gritou no meu ouvido pelo alto som da música. — Nunca mais vou vir em uma festa.

— Não é tão ruim. — Alyssa respondeu a ela. — Vem, vamos dançar um pouco para te animar.

Então a morena puxou a de véu mais para o meio da sala, onde algumas pessoas dançavam e conversavam gritando.
Eu permaneci sentada, observando elas e pestanejando a demora do loiro.

Mãos passaram pelos meus ombros quando outra pessoa que eu não conhecia sentou na minha frente.

— E aí? — um deles, vestindo uma jaqueta do time, cumprimentou. — Está sozinha?

— Não, meus amigos estão... — procurei algum deles com os olhos e não os encontrando pela falta de luz. — Curtindo a festa.

O cara que colocou as mãos sobre meu ombro cheirou meu pescoço de forma indecente.

— Ei! — eu me afastei. — Pode parar por favor?

— Porquê? — ele perguntou no pé do meu ouvido. — Não quer se divertir como seus amigos?

Neguei com a cabeça esperando que ele se afastasse, o que não aconteceu. Estava pronta para levantar e meter um soco na fusa do idiota, quando uma voz que eu conhecia soou.

— Ei cara! Ela tá comigo. — Chase gritou amigável e o cara se afastou pedindo desculpas se sentando do lado do outro cara, na minha frente.

Chase estava com a típica jaqueta que todos do time usavam, nas cores vermelho e amarelo. Uma regata branca destacava seus músculos por baixo e estava molhada pelas gotas que caiam do seu cabelo.

— Então você veio mesmo. — o sorriso doce tomou conta do seu rosto me prendendo a imagem da sua boca.
Concordei com a cabeça, tímida.

— Você está bonita. — ele disse puxando a minha mão para que eu me levantasse.

— Obrigada! — respondi ao elogio. — Você também está... Legal. — Meus olhos analisaram-no demoradamente.

Ele sorriu brando com o comentário, olhando fixamente para mim enquanto eu retribuía seu olhar na mesma medida. Então era assim que se flertava?

Era só olhar para ele da mesma forma que ele me olhava? E ele deveria chegar perto do meu rosto da forma que estava chegando?

Nossos lábios quase se tocando, quando um dos garotos na nossa frente chamou por ele. O de pele negra com ar de autoridade, chamando minha atenção para ele também.
Não prestei atenção em mais nada, quando vi o que estava na mão do outro cara.

Um zip lock entupido de pó branco dentro.
Cocaína.

Não demorou para todo o líquido secar da minha boca, meu nariz começou a se coçar e eu sabia bem o que estava acontecendo, a festa mais barulhenta e o coração que palpitava mais forte mostrando um vazio que pedia para ser preenchido e deixava meu autocontrole abalado.

Molhei meus lábios com a língua observando o cara abrir o pacote e sacar uma nota de 2 dólares do bolso. Porra.

— Você quer uma bebida? — As mãos de Chase puxaram meu queixo para olha-lo nos olhos novamente. — Posso ir buscar para você.

Meus olhos viraram imediatamente de volta para a cena do menino cheirando a cocaína por cima da mesa, desesperadamente, assim como eu já havia feito um bocado de vezes.
Eu estava limpa, há um ano, mas não significava que meu autocontrole era bom, levei a mão até a minha garganta coçando-a e não conseguindo pensar em qualquer comentário de Chase.
Traguei o ar profundamente esperando, imaginando que fosse eu ali no lugar do garoto.
O cara levantou a cabeça para cima, sentindo a sensação que eu gostaria de estar sentindo.
Engoli em seco para evitar que eu levantasse e cheirasse o resto que ele deixou sobre o móvel e mal senti quando os lábios de Chase estavam grudados aos meus, me tirando do transe.

Suas mãos pressionando meu queixo me impedindo de fugir, mas, eu não queria fugir... eu nunca quis.

Quando sua língua tocou a minha me afastei, vendo seus olhos azuis, muito semelhantes aos de Rogério, me olharem com algum tipo de fome.
Os caras na nossa frente, o olhavam como se ele estivesse acabado de ganhar um campeonato, e não havia mais cocaína pendendo à vista.
Embora os olhos fossem iguais, ele não era nada parecido com Róger e talvez ele tenha notado meu transe, pelo menos, a ideia de que ele ajudou me agradava bastante.

— Me apressei? — ele perguntou com um sorriso tímido e apreensivo no rosto.

— Foi na hora certa. — eu lhe disse, vendo o olhar de orgulho voltar ao seu rosto.

Eu não havia mentido, ele me distraiu e impediu que eu sucumbisse à loucura.

— E então? — ele perguntou e eu franzi as sobrancelhas em dúvida. — A bebida.

— Eu não bebo. — disse uma meia verdade.

— Nunca bebeu? — Surpresa passou nas expressões dele.

— Não. — menti.

— Acho que está rolando um jogo bem legal nas mesas do fundo. — Chase começou, apontando as portas da cozinha. — Quer ir até lá?

— Pode ser. — Se isso significaria ficar longe dos amigos dele usando cocaína ali, eu toparia.

Ele me puxou pela mão no meio do bolo de pessoas espalhadas pela casa e eu respirei fundo quando chegamos no quintal.

Havia uma piscina enorme e tinha vista para a sacada de um quarto, o quintal era espaçoso e as pessoas estavam em menor número.
O jogador me guiou até uma mesa de tênis ao lado da piscina, onde acontecia uma espécie de jogo alcoólico bizarro.

— Beer Pong. — Chase abriu os braços indicando a mesa e as pessoas jogando.

— Eu disse que eu não bebo. — Alertei-o gentilmente sorrindo.

— Qual é, só uma partida! — ele insistiu com a voz doce. — Tudo tem sua primeira vez, não é?

— Escuta ela Chase, a bonitinha não bebe. — Maldita.

Foi Madeleine quem disse, do lado oposto da mesa, com a voz embaraçada pela bebida que já havia consumido.
A loira vestia um vestido vermelho justo no corpo e que chegava na metade das suas coxas, seu corpo atlético, muito mais esculpido que o meu, jogava na minha cara que se eu quisesse competir com ela já estaria perdendo.
Lembrei das palavras de Luke.

Puritana.

Eu não era puritana coisa nenhuma, não importa o quanto eu tentasse esconder, já havia sido uma vadia milhares de vezes.
E se era isso que queriam que eu fosse agora, meu pai não estaria mais aqui para contrariar.

— Eu topo.

As pessoas que escutaram isso, pararam tudo o que estavam fazendo voltando-se para mim e esperando a resposta de Madeleine.

— Você sabe que vai perder, não sabe? — A loira provocou e eu sorri doce.

Vamos ver qual vai ser a melhor cara de surpresa que ela vai saber fazer ao notar o lobo que tem por baixo dessa pele de cordeiro.
Eu ganharia só para vagabunda engolir cada palavra que disse.

— Estão prontas? — Uma menina ruiva disse após trocar os copos e enche-los com uma bebida clara em um recipiente duvidoso.

— Manda ver, Madeleine! — Um cara gritou do bolo de pessoas ao redor da mesa.

A loira, já com uma bolinha na mão, lançou-a, acertando um copo.

— Eu disse, fofinha. — Ela cantou vitória.

— Minha vez. — eu disse, após chocar a todos quando virei o líquido do copo sem nem ao menos fazer careta.

Vodca barata.

Peguei a bolinha amarela que estava na minha mão e a arremessei, acertando, por haver muitos copos juntos. A loira então bebeu rapidamente engolindo tudo.
Lançou a bola novamente, dando continuidade, essa mesma que quicou na mesa e alcançou um copo.
Todos ao redor protestaram, gritando para mim beber em seguida.

— Bebe, Bebe, Bebe! — As pessoas gritavam em uníssonos.

— Milenna, não precisa beber se não quiser. — Chase me garantiu gentil, com as mãos no meu ombro, mas, eu não aceitaria a derrota.

Peguei o primeiro copo, virando-o na garganta a baixo, sentindo a queimação gostosa do líquido descendo.

— A bonitinha tem coragem... — Madeleine provocou. — Bebe o outro.

Peguei o segundo copo, me deliciando da bebida novamente.

Peguei a bola em mãos lançando-a outra vez e errando. Merda.

A loira sorriu diante disso e não parou quando pegou a esfera amarela e lançou acertando outro copo meu, ao qual eu bebi como se fosse água novamente.

Na minha vez, errei outra bolinha, já sentindo que meus olhos embaçaram, mas, a vadia tinha mais sorte e a bola quicou na mesa novamente.

Eu disse que não chegaria em casa bêbada para Meg, e aqui estava eu, bebendo meu quinto copo cheio de vodca. Desceu limpo, a sensação de que esse estava mais cheio que os outros era desesperadora, mas eu não daria o luxo da derrota.

Na boca, quase virando... o segundo copo caiu e se derramou sobre mim, sujando-me com o líquido transparente.

Com os olhos desfocando do copo caído no chão, demorei para processar a cena, Jonathan, sem camisa, e com as narinas dilatadas olhando furiosamente para mim. O atrevido filha da puta havia desferido um tapa no meu copo?!
Eu deveria afundar um soco na sua cara!

— QUAL O SEU PROBLEMA, PORRA? — Gritei para ele, dando um soco no seu peito nu, por não conseguir chegar ao rosto, e não causando nem cócegas.

— Eu quem te pergunto. — ele disse com a risada de escárnio vindo logo em seguida. — O que pensa que está fazendo?

Agora pronto, mais essa vindo dele. Ele acha mesmo que tem algum tipo de autoridade sobre mim?

— Espera. — Chase disse como se percebesse alguma coisa. — Aquela mensagem... Ele tem te incomodado, Lenna?

— Fica na sua, idiota. — Jonathan disse exaltado, ainda me olhando no jogo de encarar que entramos.

— Deixa ela em paz, sacou? — Chase pediu, sua voz, muito mais branda agora.

— Ou o quê? — O Hamilton perguntou desviando o olhar e o corpo na direção do loiro. — Não vai ter um troféu para exibir?

O de cabelos negros nem terminou de falar quando Chase investiu em um golpe bem no seu rosto. Jonathan nem mesmo tremeu.

Sua boca sorriu diabolicamente e outro som de escárnio saiu dos seus lábios. Os olhos vidrados raivosamente no jogador, as pessoas ao redor murmurando coisas, indecifráveis, para mim que estava totalmente confusa.

— Faça isso de novo e não vai acordar para pedir desculpas. — Hamilton brandou ameaçadoramente enquanto Chase esfregava o pulso com dor.

Não tive reação, estava em choque quando o idiota de olhos ambar me puxou para algum lugar ao qual eu não via por estar muito focada na sua mão que segurava o meu braço sem violência.

Era irônico, ele, com o dobro do meu tamanho quase soltando fumaça pelas orelhas, segurava meu antebraço com delicadeza.

Estávamos na rua, do outro lado da calçada, quando ele me estendeu um capacete.

— O que você acha que vai fazer? — perguntei me afastando, percebendo o que ele havia causado.

O mesmo não respondeu de imediato, olhou para o céu e com as mãos no cabelo, respirou fundo. Raiva.
O babaca estava com muita raiva, mas, porquê?

Porque ele havia feito tudo isso? Seria pelo mesmo motivo de ele estar me perseguindo desde que cheguei?

— Vou te levar para casa dos Davies. — ele disse, mais calmo. — Não banque a teimosa agora.

— Não vou com você. — procurei o carro dos meus amigos, achando-o e apontando. — Eu vou voltar com os meus amigos.

— Vai em frente, volte lá para aquela festa. — sua voz soou dura. — Passe essa vergonha.

— Porque você tem essa mania de cuidar da vida dos outros, ein? — disse em português para que ele não entendesse.

— Porque não é com você que eu me importo. — ele respondeu no inglês arrancando de mim um olhar surpresa.

Porra. Desgraça. Caralho.

O idiota sorriu fodidamente egocêntrico para mim, como se tivesse acabado de ganhar na loteria.
Quis pegar a porra daquele sorriso e esfregar no asfalto ao nosso redor. Canalha.

Ele me estendeu o capacete novamente e eu não peguei de imediato, não iria subir na moto dele.

— Pegue logo essa merda! — o garoto suspirou fundo novamente. — Teimosa do caralho.

— Já disse que eu não vou. — afirmei novamente no mesmo tom que ele. — Posso entrar lá dentro e dizer que você me agrediu.

— Olha só que engraçado... — ele começou sorrindo novamente. — Tenho certeza que alguém deve ter gravado a pequena briga entre você e Mad.

O apelido me causou ânsia, ou pode ter sido só a bebida e o momento.

— É assim que você chama ela quando estão transando? — saiu antes que eu pudesse controlar.

— George e Meg adorariam ver um desses vídeos... sabe, Meg me contou que você viria a uma festa. — ameaça beirava o tom, ignorando minha pergunta anterior. — E eu lhe garanti que ia ficar de olho, imagina se ela acidentalmente descobre que você não cumpriu com o combinado...

— Canalha desgraçado! — Não pensei, mas só vi quando meu salto parou na cabeça dele.

Meu pé descalço e ele com um salto na mão, seria engraçado se não fosse cômico.
Estava com o outro na mão, pronta para jogar nele quando o mesmo o tomou facilmente de mim. Eu devia estar um pouco bêbada.

— Você fica uma graça tentando ser hostil. — o Hamilton provocou. — Acho que você não tem escolha, docinho.

Senti cada gota de ironia ao pronunciar o apelido, ele havia acabado de me chamar de hostil e docinho só para contradizer.

— Ao menos vista sua blusa. — pedi, sem paciência.

— Que pena! — lamentou falsamente. — Acredita que eu não sei onde ela está?

— Não é ilegal pilotar sem camisa?

— Vamos ter que descobrir. — provocou-me sorrindo mais ainda.

Aceitei o capacete estendido a mim depois que meus saltos foram devolvidos com segurança e ele subiu na moto, esperando que eu fizesse o mesmo.

— Dayse não veio com você? — perguntei tentando arrumar um jeito de evitar.

— Vou voltar para buscá-la mais tarde, não se preocupe.

Sem escolha, subi meio sem jeito na garupa da sua moto, evitando encostar na sua pele suada, mantendo-me o mais longe possível dele.
Nunca havia subido em uma moto antes, não sabia onde me segurar, apenas onde colocar meus pés.
Escutei o motor daquela coisa ronronar e ele arrancar para frente rapidamente, me fazendo inevitavelmente me arrastar pelo banco. Próximos demais.
De automático, minhas mãos encontraram sua cintura e eu evitei encostar mais que o suficiente na sua pele nua, era o bastante para que eu não sentisse que fosse cair com a alta velocidade que ele pilotava.

Ouvi a gargalhada que ele deu quando meu tronco encostou nas suas costas torneadas, o meu vestido ainda molhado de vodca se misturando no seu suor, grudando na sua pele, dando para sentir cada mínimo músculo. Babaca exibido.

Meu vestido, a essa altura, estava sendo segurado pela bunda dele para que o vento não me deixasse desnuda. A bunda dele, no meio das minhas coxas. Fodidamente próximos, porra!
A proximidade foi tudo que eu consegui pensar o caminho todo, eu com toda certeza odiava Jonathan Hamilton por essa e outras situações.

Mas, era com a vodca cheirando por todo o meu corpo que eu me preocupava, chegar em casa e encarar os Davies.
Com sorte estariam dormindo tranquilamente.

— Em casa. — o idiota disse parando a moto.

Não demorei a descer, como se ele estivesse infectado, o que aumentou o sorriso escroto na sua cara.

— Espera que eu agradeça? — perguntei baixo, a voz insegura.

— Jamais. — seus olhos foram de encontro para a casa atrás de mim. — Não estou fazendo isso por você.

— É claro que não... você não se importaria a esse ponto. — retruquei. — Babacas não tem sentimentos.

— É melhor você entrar. — sua voz cortou o assunto. — Vê se para de se meter em problemas.

— Impossível. — Pausei dramaticamente. — Meu problema não cansa de querer cuidar da minha vida.

Ele não disse mais nada, apenas abaixou a viseira do capacete, pegando o outro da minha mão e ligando a moto.
Não esperei uma despedida, quando o mesmo saiu arrancando com a coisa rua afora, um barulho pouco discreto.

Quando passei pela porta da casa, verifiquei que eu cheirava a vodca e suor com um leve toque amadeirado no fundo. Por sorte, os Davies estavam dormindo.

Acendi a luz do abajur do lado da cama e estava pronta para me despir quando um movimento chamou minha atenção.

A cadeira da mesa girou e a mulher sentada lá me fez engolir em seco, parando qualquer atividade cardíaca em meu peito.

Mãe?! — sussurrei atônita.

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EITA QUE TA TENSO KKKKK
Voltei, gatitos ❤️
Perdoem a demora!
Curtam, comentem porque eu adoro responder vocês!

Vou fazer um jogo:

Meta de 30 votos para liberar o próximo capítulo 👀

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