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*Melanie*

Sim, eu estou muito preocupada.

Ele já é um homem feito e não precisa de mim pra absolutamente nada, mas toda vez que vai pras patrulhas me sinto assim, com o coração apertado. Shane e Gabriel saíram de manhã e ainda não voltaram, e desde o segundo que colocaram os pés lá fora, fico repetindo a mim mesma que está tudo bem. Jajá ele chega.

Acontece que já se passou quase um dia, e isso não ajuda em nada minhas paranóias.

Sei que pode ter acontecido algum imprevisto, mas todo esse tempo? Que imprevisto demoraria tudo isso?

Afundo a cabeça no travesseiro e fecho os olhos, tentando pegar no sono pela vigésima vez nas últimas horas. Não preguei os olhos um segundo sequer essa noite.

Acho que estou louca. Não exatamente louca, mas talvez na beira da loucura. Não aguento mais essa casa, não aguento mais ficar sozinha. Quero sair, quero brincar com a Judy, quero respirar ar puro. O que me impede? Nem eu sei direito.
Não suporto o jeito que as pessoas agem comigo, depois da gravidez. Todos me tratam como se eu fosse uma boneca de porcelana, eu não posso nem ao menos ir ao quiosque sem que as pessoas comecem a me olhar diferente.

Não gosto que tornem isso uma fragilidade. Não gosto nem um pouco. Não estou doente, eu não vou quebrar ao meio nem nada do tipo.

Mas parece que é isso o que todos pensam.

Me sinto tão sozinha. Vazia.

O único momento que me sinto realmente bem é quando Shane está comigo, ele não me olha como os outros. Shane é muito protetor, extremamente protetor inclusive, mas não me trata como se eu fosse uma incapaz.

Não estou pedindo para ir lá fora, andar no meio dos mortos, apesar que seria bom ver se eu ainda consigo, mas não. Eu quero um propósito, um trabalho talvez. Todos tem funções aqui, e acho completamente injusto que eu fique o dia todo pintando coisas aleatórias quando todas as outras pessoas estão sendo úteis.

Ainda estou pensando nisso quando os primeiros raios de sol passam através do tecido branco da cortina. Já é dia, e eu nem mesmo dormi. Me sinto péssima, cansada e acabada. Provavelmente devem ter uns cinco centímetros de olheira abaixo dos meus olhos, mas eu realmente não me importo.

Minha barriga está quente, quando coloco a mão sobre ela. Faço muito isso, é como se eu me conectasse com o bebê, não sei explicar. Depois que comecei a fazer, entendi por que o Shane gosta tanto.

Queria saber o sexo. Queria ir numa consulta de verdade, num hospital de verdade, com aquele cheiro sufocante de desinfetante e antisséptico. Queria que eu e Shane pudéssemos sentar e conversar sobre nomes, queria mais tantas coisas.

Coisas que parecem impossíveis agora.

...

Estou congelando, hoje está definitivamente menos de 10°. Não vou sair de casa, então só enrolo um cobertor ao redor dos meus ombros, para ir até a cozinha.

Não sei o que aconteceu com o aquecedor, deve ter decidido por conta própria me deixar congelar o dia todo. Xingo baixinho, abrindo a geladeira para pegar algo pra comer. Sinceramente, não estou com fome, mas é necessário se eu quiser que meu filho seja saudável, aprendi isso da pior maneira.

"Benditas galinhas" sussurro, ao quebrar um ovo grande e avermelhado em um prato de vidro. Felizmente, nosso acordo com Hilltop nos dava direito a um terço das galinhas que criavam lá, e agora as nossas ficam em um espaço rodeado por táboas de madeira, perto da horta. Acabo de colocar o liquido amarelo na frigideira, quando escuto batidas na porta.

O relógio acima da lareira indica que ainda são 7:15. Meu primeiro pensamento é que tão cedo, só pode ser notícia ruim. Caminho até a porta com os dedos trêmulos, já imaginando a desgraça.

Assim que a madeira da espaço a luz do dia, alguém vem pra cima de mim e me abraça apertado. Recuo e observo os olhos de Shane, sobre mim. Meu coração está acelerado. Não sei se é por ver que ele está bem, pelo abraço, ou por seu rosto, a poucos centímetros do meu.

Seus lábios se abrem, como se fosse dizer algo, mas ele para e olha em direção a cozinha, franzindo a testa.

__ você queimou alguma coisa? __ pergunta, ainda sem olhar pra mim.

Meu Deus, o omelete.

Vou em disparada até o fogão e desligo o fogo. A parte de cima está normal, mas consigo ver que a parte de baixo não tem salvação. Como isso aconteceu em poucos segundos? Eu demorei tanto assim pra abrir a porta?

Escuto o som da risada, e quase taco um prato na cabeça dele, que se aproxima balançando a cabeça. Não ligo pra ele, sei que é idiota. O que está me irritando é que eu estava com vontade de comer isso, e agora acabaram os ovos.

__ como está ele?

Demoro uns míseros segundos pra desviar meus olhos da frigideira, e entender que ele falava do bebê.

__ bem. Com fome.

Ele sorri e traz a mão até minha barriga.

Essa situação é nada menos que estranha. Eu vivi no quarto dele por dois meses, e agora, quando estamos separados, sinto como se estivessemos mais próximos do que naquele tempo, apesar de só fazer dois dias da mudança.

Mas eu adoro isso. Adoro seu toque, o jeito como é carinhoso, a suavidade, o sorriso simples direcionado a minha barriga.

Ficamos nos encarando por alguns segundos, e eu corto o olhar. Que droga Melanie.

Preciso botar a cabeça no lugar, não posso ficar pensando essas coisas, por isso mudo de assunto.

__ por que demoraram tanto?

Ele não responde de imediato. Fita o chão, apoia as mãos na bancada. Algo está errado.

__ o que houve?

Quando seus olhos me encontram, estão diferentes. Não sei porque, mas tenho uma vontade imensa de o abraçar nesse momento. Dizer que vai ficar tudo bem, tocar seu rosto com a mão. No entanto não faço nenhuma dessas coisas.

__ nada... Só estou cansado.

Está mentindo. Qualquer um consegue ver que está triste. Oh meu Deus, odeio o ver assim.

Quero perguntar, insistir. Quero que confie em mim, quero que me deixe ajudá-lo, ser sua amiga. Mas não falo nada disso em voz alta. Faço um gesto com a cabeça e finjo voltar minha atenção para a frigideira queimada, dentro da pia. Observo enquanto ele se afasta e vai até a porta, dizendo algo sobre precisar dormir. Balanço a cabeça novamente.

O vazio retorna, quando a porta se fecha. Sinto vontade de chorar por tantos motivos diferentes que quando percebo minha blusa já está encharcada.

O que está acontecendo comigo?

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