Um | Olívia

— Eu... Estou... Perdidamente apaixonada por você, Léo!

Em agosto de 2010, eu finalmente coloquei meus sentimentos em voz alta. Podia sentir que meu rosto estava vermelho, e eu não conseguia olhar para ele. Se olhasse para aquele rosto, naquele segundo, eu tinha certeza que algo ruim ia acontecer.

Conhecia Léo Petri desde a pré-escola. Crescemos juntos. E não havia nada que não soubesse dele. Ele era charmoso, mesmo com dezesseis anos. Era manhoso; tinha aqueles lindos olhos de pestanas cheias que eu mesma invejava. Adorava como penteava seus cabelos rebeldes, cada novo dia de um jeito diferente; e amava o tom escuro de sua pele. Léo era o tipo de garoto que você podia contemplar a vida inteira e ainda assim não se cansaria de amá-lo.

Mas, mesmo que eu estivesse tão séria naquele segundo, sabia que Léo Petri não considerou minhas palavras.

Ele simplesmente caiu em uma curta gargalhada. Ria como se eu acabasse de contar a piada mais engraçada do mundo.

— Como é? — perguntou depois de tomar um pouco de fôlego.

Dei um meio sorriso, virando o rosto para o lado. Era embaraçoso dizer seus sentimentos mais profundo para um idiota formado.

— Esquece... — murmurei, decepcionada. — Estou tirando uma com sua cara...

Meu coração estava ferido. Sentia como se algo dentro do meu peito havia esfarelado como pó. Eu me ergui da cadeira onde estava sentada, retirei o copo vazio de Léo de cima da mesa e o coloquei debaixo da torneira.

— Que susto — Léo disse, suspirando, enquanto estava com a boca cheia do hambúrguer que eu havia preparado para nosso almoço. — Você é minha melhor amiga, Lívia. Seria estranho sair com você quando eu conheço todas as suas calcinhas de baixo.

— Idiota, o que isso tem a ver? — ri, enquanto me segurava para não chorar.

— Você tem umas calcinhas bonitinhas, mas... — ele sorriu, se levantando e me agarrando por trás enquanto deixou um prato cheio de molho na pia. — Ainda é um bebê para mim. — Ele levantou a minha camiseta do uniforme da escola, e depois abaixou um pouco a minha saia. — São roupas de baixo de ursinhos e moranguinhos. Que infantil...

Eu senti todo o meu ar fugir dos meus pulmões. Era mais difícil do que parecia. Será que ele não percebia que eu não estava de brincadeira? Que minha confissão não era uma piada? Meu coração batia descontrolado por ele, me sentia estranha quando estava perto dele?

O empurrei e depois ri, segurando as lágrimas.

— Só porque dormiu com a Paola, não quer dizer que você já é um adulto — respondi um pouco azeda. — Paola fica com todo mundo, isso não é nenhuma conquista, você só é mais um na coleção de vadiagem dela. Você perdeu sua virgindade à toa.

Senti que ele se ofendeu. Léo torceu os lábios me olhando furioso.

— Ah, como se eu me importasse com isso — ele respondeu, colocando um bico de irritação na boca. — Nós meninos não nos importamos com essa história de "a primeira vez é importante". O que importa é pegar quantas mulheres for preciso. Eu comecei num nível superior agora — e ele riu. — Você e Anna podem dizer qualquer lorota que eu ainda assim não vou parar por aqui. Apenas me assista, Mourabelli! Estamos na idade do descobrimento, e estou descobrindo muita coisa. Me veja nisso, Mourabelli!

— Ver você pegar uma doença. Acho que a idade do descobrimento será quando você tiver trinta e descobri que pegou gonorreia. Sim, irei te assistir — eu ri. — Você é realmente um idiota, Léo.

Ele ficou mais irritado.

— E daí? Nem sabe nada!

— Sei sim, Léo. Que quero ir para minha casa — inspirei, irritada. — Aliás, faz o que você quiser. Eu já cansei de você. Não aguento mais te falar para fazer uma coisa, quando você vai e faz o contrário do que eu disse. A vida é sua, não é da minha conta com quem você pega uma doença venérea.

Ele ficou mudo. Tinha sido a primeira vez que desisti de cuidar dele. Desde a morte de seus pais, três anos atrás, tinha uma compaixão e um instinto materno para ele. Gostava de cozinhar, ajeitar sua gravata quando estava errada. Às vezes até lavava suas roupas. E mais ainda, lhe dava conselhos para as aventuras excêntricas que se metia (certas vezes eu também fazia parte delas). Mas agora, depois de saber que nada do que eu fiz era o suficiente... Só queria desistir de ser a idiota. Se não sentia nada por mim, nada do que eu já fiz tinha mais importância.

Naquele segundo, eu só queria ficar sozinha, longe daquele idiota.

— Aonde você vai? — Léo perguntou depois que larguei toda a louça na pia. — Não tem ninguém aqui, vamos jogar videogame!

— Jogue sozinho! — respondi, pegando meu casaco do uniforme da escola. — Acho que vou no Palácio Hotel tomar uns coquetéis.

— Vou com você — ele se ofereceu. Notei que estava com medo de minha reação. — Ou a gente pode beber a vodka do Leandro, hoje ele nem vem para casa.

Virei meus olhos para Léo.. Nosso caso com a bebida era algo muito sério. Não que meus pais soubessem que eu bebia até cair, e quando descobrissem eu estaria frita. Também não conheciam o meu lado de usar substâncias ilícitas. Pelo menos, eu achava que eles não sabiam. Minha mãe uma vez me pôs de castigo, mas foi por eu ter passado a noite na casa de Léo e Anna sem a avisar, porque eu fiquei bêbada demais para me mexer até o telefone. Meus pais confiavam em mim? Naquela pessoa que me tornei para conseguir fazer parte da turma de Léo?

Talvez estivesse na hora de eles me conhecer de verdade.

— Vou dar um tempo na bebida — respondi, suspirando.

Então sem dizer mais uma palavra, saí pela porta da frente. Sem olhar para trás.

Eu tinha dezesseis anos. Eu fazia coisas que uma menina de boa família, como a minha, não deveria fazer. Tudo porque queria que Léo me achasse legal. Ele era o tipo que passava mais tempo bêbado do que sóbrio. Não sei o porquê, mas ele ficou daquela maneira depois de sua paranoia pelo nosso vizinho, Natan Evans. Ele não dizia o motivo, e eu preferia acreditar que ele achava que havia um charme nisso. Eu nunca o entendi. Olhando pelo "depois de levar um fora", sem dúvidas Léo Petri não passava de um idiota.

Estava triste. Eu mal conseguia saber onde estava indo. Inconscientemente, eu estava no metrô, olhando a paisagem da cinzenta cidade de São Paulo. Não percebi que meus pés me levavam automaticamente pelas baldeações. Eu tinha aulas de informática na zona norte, talvez por isso estava dentro do metrô... me sentia chocada demais para ter certeza....

Suspirei, secando as lágrimas nos olhos. Como Léo poderia ser tão idiota? Por que rir quando uma garota estava confessando seu amor? Não sabia se era insensível, ou por ter crescido comigo, me tratava como apenas uma irmã. Chegava a ser patético aquele sentimento.

— Hmm! — alguém gemeu ao meu lado.

Virei abruptamente meu rosto, e enxerguei um rapaz. Ele era meu dobro de tamanho. Usava um cachecol xadrez que combinava com o uniforme da mesma escola que eu frequentava.

Realmente não o tinha visto nem por um segundo ali, ao meu lado. Acho que ele me seguiu.

— Natan! — disse um pouco surpresa. — Não te vi aí.

Natan Evans não era um dos garotos do meu círculo duvidoso de amigos duvidosos. Na verdade, era aquele garoto que todos tiravam sarro. Seu apelido era Senhor UFO. Esse menino havia se mudado para minha vizinhança três anos atrás, e logo se tornou um dos alvos preferido de Léo. Natan era a definição completa do que era bullying. Mas ele nunca parecia preocupado com isso.

— Interessante como é a única que não me confunde com Daniel — ele observou, mas não olhou para mim. Estava concentrado na sua edição do livro "Histórias Que O Governo Não Conta". Era um amante das conspirações. Fascinado com mistérios que inspiravam teorias das conspirações esquisitas, e seu interesse ia além, porque acreditava em OVNIs e religiões estranhas.

Eu também achava que Natan era um esquisitão, mas sempre estava por perto. Aquele garoto, quando nem mesmo podia me abrir para minha melhor amiga, Anna, aparecia do nada e me consolava.

Ficamos em silêncio por um segundo, então, eu perguntei depois de um suspiro:

— Acha que fiz errado? Dizer meus sentimentos para o Léo?

Como se fosse um velho sábio, Natan pensou por um segundo para responder.

— Errado? — disse. — Não. Se não dizer o que sente, você nunca vai chegar a uma resposta. Só acho que você está dizendo o sentimento que tem para pessoa errada, por isso recebeu uma resposta que não desejava ouvir. Petri é um idiota.

Abaixei a cabeça, filtrando as palavras dele. Natan nunca se referia a Léo pelo primeiro nome. Talvez fosse algum costume do país dele, Natan era estrangeiro.

— Eu o amo — disse, aflita, sentindo as lágrimas voltarem para meus olhos. — Desde que me conheço por gente, eu amo o Léo.

— Como é engraçado... Está cada dia mais claro que amores não correspondidos são o nosso caminho.

Ele também sempre falava como se tivesse uns cinquenta anos há mais do que eu. Por causa disso, deixei um sorrisinho escapar.

— O que quer dizer? — perguntei, limpando os olhos com as pontas dos dedos.

— Que eu gosto de você, Olívia — ele me olhou pela primeira vez.

Eu congelei. Demorei alguns momentos para conseguir entender as palavras que havia me dito. Nenhum cara em toda a minha vida havia dito nada daquele tipo para mim.

— O quê? — indaguei, descrente. — Para de brincadeira...! 

— Não é brincadeira. É apenas um círculo. Você cuida de Petri e eu estou sempre cuidado de você. Todas as vezes que aquele insensível te machucou, fui eu que te ajudei, dizendo palavras que te faz sorrir.

Ele deu de ombros.

— Mas... — Era impossível um garoto tão bonito gostar de mim, justo de mim. Léo não era incrivelmente o gostosão do bairro, e me rejeitou? Como eu poderia acreditar naquilo? — Eu não sou bonita. Não como Anna. Anna é espetacular e todos querem ficar com ela. Já comigo a coisa é diferente. Até hoje o único que beijei foi Léo... Não há nada em mim que seja bom ou bonito. Meus cabelos estão sempre nesse coque, e eu não tenho muito estilo quando uso o uniforme... Não como Anna faz. Ninguém nunca se interessou em nada por mim. Emmeus sonhos malucos que parece que pulei para fora de meu corpo, Léo até riquando toco no assunto. Ninguém dá a mínima para os meus sorrisos sinceros ouem qualquer coisa que eu diga ou faça.

Natan suspirou profundamente.

— Aprecio mulheres lindas por uma variedade de motivos — ele respondeu espiando para mim. — Você é bonita, Olívia. De um jeito diferente de Ximenes. Não se compare a ela. Ximenes sem dúvidas é bonita, mas você... Para mim, é cem vezes mais bonita do que qualquer mulher que tenha conhecido em minha longa vida. E se me contar seus sonhos malucos e sorrir paramim com sinceridade, eu vou apreciar com todo o meu coração.

Meu coração começou a golpear contra meu peito, forte. Aquelas eram palavras poderosas. O poder nelas me fez afoguear nas regiões de minhas bochechas.

— Oh... Mas...

Subitamente senti, então, seus lábios se pressionaram nos meus. Fiquei surpresa.

Eu não conseguia respirar. Sentia apenas algo diferente de tudo que me lembrava. Não era a mesma sensação que eu tinha quando estava com Léo. Minha mente estava vazia. Não era doce, não era carinhoso. Era apenas vazio.

— Natan... — eu disse o afastando. — Eu... Eu amo Léo. Não é um sentimento que vai mudar tão fácil assim.

Desta vez ele sorriu com um rápido clarão de seu charme que fez todo o vazio dentro de meu coração desaparecer.

— Não é que eu não saiba disso, querida — esclareceu, olhando para mim nos olhos. — Você é uma larvinha que aos poucos está se transformando em uma bela borboleta. Léo Petri não consegue enxergar isso nem se a verdade estivesse a meio milímetro dele. E mesmo que eu tenha visto suas lindas asas, você ainda prefere se arrastar no chão por um idiota feito ele.

Eu não tinha ideia do que ele quis dizer.

— Se você me der uma chance, Olívia, se virar minha namorada farei com que suas lindas asas estejam abertas sempre. Para que você possa voar graciosamente para onde quiser. Para onde todos notem quão linda você é.

O meu estômago se agitou. No fim, Natan era mais maduro que Léo. Por mais que estivesse aderindo ao momento, recordei das mãos de Léo sobre meu abdômen e seus lábios tão próximos dos meus, o cheiro de sua pele banhada em seu perfume masculino: meu coração continuou golpeando descontrolado em meu peito.

— Sinto muito, Natan — respondi me erguendo. — Você é um cara legal. Eu gosto de você. Mas...

— Saia comigo — ele me interrompeu também se levantando, segurando na mesma barra de ferro que eu segurava. — Vamos, pelo menos, uma vez. Mesmo que você me rejeite depois, se for por apenas um dia... Acho que consigo fazer você virar minha namorada.

— Você é meio convencido — analisei, sorrindo.

— Vou te mostrar um divertimento muito diferente de bebidas e drogas — ele também sorriu. — Petri está te levando para um mundo sem volta. Se ficar comigo, você nem vai pisar nos gramados desse mundo. Eu posso te provar.

Franzi a testa. Olhei para ele por um tempo. Natan era mesmo muito diferente.

— Certo — cedi, depois de alguns segundos em silêncio. — Amanhã. Estarei livre.

Ele sorriu confiantemente.

— Me encontre nos portões da escola — combinou, aliviado. — Vou te levar no cinema. Está passando um ótimo filme. Você vai gostar.

Não consegui responder nada. Ir ao cinema para mim sempre foi diferente. Algo como irritar alguém enquanto jogava pipoca na cabeça dele. Ou beber demais e depois ficar correndo pelos cantos do corredor ou se arrastando pelo chão fazendo as pessoas levantarem as pernas pelo susto que levavam. Ligar o celular e fazer uma ligação para Anna que estava ao meu lado enquanto falávamos bem alto. Nunca fiquei assistindo um filme no cinema, porque éramos retirados da sala por lanterninhas ou pessoas que se irritavam conosco. De repente me parecia mágica se ele me fizesse assistir um filme até o fim.

"Estação: Vila Mariana", disse a voz quase robótica do maquinista. Anunciando a chegada do trem na plataforma.

— Então... — disse ansiosa. — Te vejo amanhã, Natan. Fico por aqui.

— Até amanhã. Ficaremos um bom tempo fora. Avise seus pais. Não quero ter problemas com eles — em seguida me deu um beijo na bochecha.

Assenti, e eu saí do trem. Estava um pouco embriagada pelo que aconteceu.

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