Capítulo 52 - Leãozinho
Oi, Xuxus! Como vocês estão?
Mas um capítulo atrasadinho, espero que gostem. Pra compensar o atraso este capítulo está grandão.
Como já falei anteriormente, vocês merecem o melhor e por isso eu precisava fazer um texto de qualidade. Peço mil desculpas pela demora, estou precisando de um clone pra dar conta de tudo. (^_^)
Boa leitura!!!
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"Gosto muito de você, leãozinho. [...]Para desentristecer o meu coração tão só basta eu encontrar você no caminho. Um filhote de leão, raio da manhã. Arrastando o meu olhar como um ímã."
O Leãozinho – Caetano Veloso
Nicholas
Eu suava com os exercícios intensos. Esses fisioterapeutas pareciam me cobrar mais do que eu poderia dar. Minha sobrinha atrapalhou tanto enchendo os profissionais de perguntas e querendo fazer os exercícios comigo que o pai a tirou daqui um pouco.
A maior parte dos exercícios consistiam em fortalecer meus braços, pois, segundo os médicos e fisioterapeutas, eu ainda poderia desenvolver um pouco mais de movimento. A verdade era que eu não conseguia elevar os braços mais que alguns centímetros; eu até mexia o antebraço com o cotovelo apoiado, os braços eram outra história. Limitava-me a apenas puxá-los com os ombros, esses eram os únicos movimentos possíveis. Eu não acreditava em recuperação alguma.
Eu estava tentando, pela oitava vez, levantar o pedaço de fruta e levá-lo até a boca, inutilmente, com o garfo encaixado na órtese sem nenhum sucesso e isso já estava me deixando enraivado. Eu deixo o braço cair bruscamente os poucos centímetros que levantei com tanto esforço.
− Preciso de uma pausa. – Declarei após o susto que eles tiveram com o impacto do meu braço na ponta da mesinha de jardim do terraço, aquilo deve ter doído porque ganhei um arranhão no meu braço onde a órtese não cobria.
− Meu deus, Nicholas. Você se cortou! – A fisioterapeuta constatou pegando meu braço e analisando-o, eu não me importava nem um pouco com machucados, já tinha sido ferido até a alma e aprendi a conviver com a dor.
− Tira logo isso! – Falo ríspido me referindo ao garfo, eu precisava respirar um pouco sem esse casal em cima de mim mandando-me fazer força. Já tinha passado por um alongamento intenso por todo o corpo e agora eu "treinava" os braços.
Felizmente ela atende meu pedido mesmo que a contragosto e encaixa minha mão no guia da cadeira motorizada – pelo menos essa cadeira eu podia controlar. Afasto-me para o parapeito de vidro, que me separava da queda livre de vinte e cinco andares e a morte certa. Tentado por essa ideia me aproximo o máximo que consigo, colocando a cadeira meio de lado; o parapeito de vidro batia na cintura de uma pessoa de pé e quase da altura da minha cabeça já que eu estava sempre sentado. A noite já estava próxima e podiam-se ver algumas tímidas estrelas no céu.
Uma cena me chama a atenção: uma certa juba vermelha balança com as risadas daquela que estava sendo a minha calma. Lívia está sentada no banco do jardim de costas para onde eu estava e ninguém menos que meu irmão Gabriel estava fazendo-a rir. Sinto uma pontada de inveja e uma dor aguda me transpassa o coração; eu nunca a fiz sorrir assim, acho que não existe outro caminho a não ser o Dignitas.
Tenho vontade de chorar, além de ter me traído a confiança, a Lívia tem vida e alegria ao lado de outras pessoas, além disso, tinha o meu infortúnio. Reprimo a vontade na mesma hora quando vejo o casal fisioterápico me encarando com curiosidade. Guio a cadeira para junto deles, em silêncio.
− Que tal alguns exercícios na piscina para relaxar um pouco? – Apenas concordo com o homem maneando a cabeça. Celso me olha de soslaio parecendo perceber minha repentina mudança de humor. Ele finge voltar a ler o livro que estava lendo, mas sei que está constantemente me observando; ele não me olha só como paciente, sou um amigo de quem ele cuida.
Fico um tempo encarando o chão pensando em tudo e em nada ao mesmo tempo. Antes que eu diga ou faça algo minha linda e sapeca sobrinha irrompe no terraço correndo em minha direção se jogando em meu colo.
− Tio, a Lív tá lá em baixo. Vamos até lá? – Seus olhinhos brilham de satisfação. Parece que eu não era o único apaixonado pela Lívia. O que foi que eu acabei de dizer mesmo? Devem ser as dores e remédios afetando a minha capacidade de pensar claramente.
− Sua entregona!!! – Meu irmão ralha com a filha. – Não era pra ter dito nada, Anna!
− Pelo menos alguém aqui não fica escondendo as coisas do irmão moribundo, não é? – Falo entredentes em respeito a minha sobrinha, erguendo a sobrancelha em desafio. Entretanto minha verdadeira vontade era de socar sua cara. Onde já se viu ficar de papinho com a amizade dolorida do próprio irmão?
− Eu não estou escondendo nada, seu imbecil! Foi apenas coincidência. –Ele contra-argumenta. – Você nem parece está num dia bom, seu reclamão!
− Quando você ia me contar? No dia de São Nunca? – Reclamo. Volto minha atenção para a mini Giulia e falo tranquilamente. – Minha flor, nesse momento o tio vai tomar banho de piscina com todas essas pessoas tirando o seu pai, porque ele é muito chato e traidor. Tudo bem? Agora vá lá e faça o que você sabe fazer de melhor: torre a paciência do seu pai por mim!
Ela me dá um beijo na bochecha e sorri feliz. Quando menos espero recebo outro beijo na outra bochecha; Giulia me dá um abraço e desajeitado trazendo alívio pra o meu irmão abusado, pois a mãe chegou pra puxar as rédeas da filha traquina.
− Oi cunhada! – Sorrio fraco.
− Oi Nick, vou levar a Anna para você ter um pouco de paz! – Ela fala com seu sotaque forte.
− Aproveita e leva o rabugento do seu marido também! – Ela apenas revira os olhos e sai.
− Ei, maninho, não começa ou eu te jogo naquela piscina com roupa e tudo. – Ele brinca e aproveito para dar uma alfinetada pegando o gancho da conversa.
− Seria uma boa ideia tendo em vista que vou submergir e provavelmente me afogar. O melhor de tudo é que vou poupar um bom dinheiro e não precisarei fazer uma viagem cansativa. – Meu objetivo foi alcançado com êxito, pois suas feições mudam para uma expressão de tristeza e dor.
− Hey, Nick. – Ele se abaixa a minha frente para falar comigo, exatamente como faz com a filha e talvez até com qualquer criança. – Por que você não tira essa ideia da cabeça?
− A verdade, irmão, é que concordei com essa cirurgia porque espero morrer nela. Sei que é arriscada,mas isso só me dá mais vontade de tentar. Esse risco me fascina! Quem sabe não obtenho minha tão sonhada liberdade?
− A sua prisão está aqui! – Ele toca minha testa com o indicador,olhando em meus olhos. – A liberdade só depende de você! Você quem está se aprisionando, se apegando ao passado, a sua antiga vida e a coisas que você não pode mais fazer. Se decidisse por trabalhar com as possibilidades talvez sua vida fosse mais leve.
Solto uma gargalhada nada sutil e muito amarga. Eu convivia com dores todos os dias, o cansaço me abatia quase sempre e é um cansaço inexplicável porque eu não executo tarefa alguma. Sem falar que não posso sair de casa sem a companhia de um adulto com força o suficiente para me colocar numa cadeira de rodas, não posso comer sozinho, tomar banho sozinho, me trocar sozinho. Sem mencionar as inúmeras entradas que dei no hospital com infecção disso e daquilo. Definitivamente não estávamos falando da mesma pessoa.
− Só pode estar de brincadeira comigo. Você é mesmo o melhor irmão do mundo. Está me fazendo rir em meio ao caos! – Ironizo.
− A verdade Nicholas, é que a essa altura do campeonato, mais de 23 anos depois, eu não vou mais conseguir viver sem essa sua chatice, arrogância, prepotência, esse seu jeito contido para falar palavrões. Simplesmente não dá pra ignorar que você esteve aqui. – Ele conclui com os olhos marejados e me sentia muito ingrato por 'desperdiçar' esse amor familiar do qual eu era cercado. De fato suas palavras me tocaram.
Depois que meu irmão finaliza seu discurso sentimentalista não perco a oportunidade de alfinetá-lo, esses pequenos momentos de senso de humor me desviavam um pouco dos costumeiros dias tenebrosos – aqueles nos quais eu estou imensamente infeliz e com dores insuportáveis.
− Depois de toda essa declaração de amor agora é a hora em que você me beija, não é?
– O que? – Ele me olha sem entender e eu sorrio de sua cara de confusão. – Ah, sim. Entendi! Cheio de gracinhas, não é, senhor "sou educado ao extremo"? Pra não frustrar suas expectativas eu beijo sim.
Ele põe a mão por trás da minha nuca e puxa levemente para depositando um beijo entre meus cabelos que estão um pouco maiores que o habitual.
– Ai! – Exclamo sendo pego de surpresa por uma fisgada de dor no meu pescoço. Ele me estuda com um olhar analítico e sério, buscando algum indicativo da minha reclamação repentina. Eu resolvo não deixar isso abalar nossa pequena brincadeira e continuo a provocação. – Você está definitivamente decidido a me matar, hein?
Os toques do Gabriel, membros da família e demais pessoas próximas a mim eram sempre muito sutis, eles me pegavam ou me tocavam como se eu fosse feito de vidro e pudesse quebrar a qualquer momento. Portando eu deveria estar com o pescoço muito dolorido para ter essa dor repentina. Acredito que isso se deu aos exaustivos exercícios que estava fazendo durante toda a tarde e só pausei agora.
– Celso, providencie um massagista para o Nick. – Ele fala se voltando para meu cuidador e retorna sua atenção para mim continuando: – Você quer descansar um pouco?
– Vou para a piscina, daqui a pouco os fisioterapeutas terminam essa sessão de tortura e vou poder ir descansar de uma vez. Eu posso sobreviver a essa noite. – O casal de fisioterapeutas sorri da minha observação dramática.
– Vem, vou te preparar para entrar na piscina e quando você acabar vai desfrutar de uma massagem relaxante. – Reviro os olhos perante o tédio iminente. Sigo-o até a plataforma móvel que nos levará ao segundo andar e, consequentemente, ao meu quarto. Eu precisava de todo um procedimento para poder entrar na piscina, pois "acidentes" acontecem.
Posiciono a cadeira motorizada ao lado da cama, meu irmão pega-me colocando sobre a mesma e começa os preparativos para o procedimento de esvaziar a minha bexiga. Com paciência e agilidade ele higieniza as mãos e a glande para introduzir a sonda de alívio. O cateter é responsável por retirar toda a urina e evitar os possíveis vazamentos e contaminar a água da piscina.
Uma vez feito todo o processo ele me veste com uma sunga e um short curto me transferindo para a cadeira de rodas. Acompanha-me até a área da piscina no terceiro andar.
− Eu já estou indo pra casa, Nick. Sabe que pode me ligar pra o que precisar, não é? – Apenas aceno. Ele vai em direção à saída enquanto o casal se aproxima para iniciar os exercícios na piscina. Gabriel parece se lembrar de algo, pois dá meia volta. – Eu havia esquecido que te falar. A menina vem para seu aniversário, então trate de se comportar e seja legal com ela.
Ele não espera uma resposta apenas se vira e dessa vez não volta.
Eu estava analisando meus trajes para a festa que minha mãe preparou para "os mais íntimos", eu sabia que esperaria pelo menos umas trinta e cinco pessoas aglomeradas no nosso amplo apartamento. A semana havia passado tão rápido que quando menos percebi havia chegando o meu temido aniversário.
A roupa que eu usava não deixava a desejar: um blazer Ermenegildo Zegna chumbo escuro muito elegante por sinal, uma camisa branca social e calças jeans também escura. Eu nunca usava jeans por ser um tecido quente e nada macio para minha pele sensível, mas esta era uma ocasião especial, segundo minha mãe. Pra acompanhar o traje, sapatos pretos sociais simples. Sempre fui preocupado com minha aparência, mas apesar de nada disso importar mais eu me pegava analisando meus trajes por hábito.
Gabriel entra no quarto e me observa, nossos olhares se encontram pelo espelho e eu desvio o olhar. O traje poderia ser elegante, porém o modelo não ajudava muito ainda mais quando necessitava de uma cadeira de rodas para se locomover. Eu estava nervoso, já poderia sentir os olhares de pena sobre mim fazendo-me sentir pior ainda.
Eu estava considerando a possibilidade de não sair desse quarto hoje. Estava com medo da pena disfarçada de compaixão e também da indiferença disfarçada falta de jeito. Minha cabeça estava latejando cada vez mais forte, a sensação de desconforto – minha velha amiga – já começava a correr pelo meu corpo. Eu sabia que teria apenas familiares e conhecidos, mas a insegurança era tanta que estava se manifestando através de sintomas físicos.
− Não vai descer? – Ele questiona. – Estão todos esperando.
− Não estou me sentindo bem. – Dei a desculpa universal.
− Então acredito que você queira subir para o terraço. – Ele insiste. – Sabe? Ficar um pouco sozinho, clarear as ideias.
− Eu não estou a fim de sair do quarto, Gabriel.
− Tá legal, vou avisar pra moça que você não está disponível. – Ele dá as costas teatralmente.
− O que? A Lívia está aqui? – Ele apenas afirma com a cabeça. Meu coração estava dividido entre continuar a ter contato com ela ou dispensá-la tendo em vista que ela não foi honesta comigo. – Eu vou lá falar com ela.
− É assim que se fala maninho! – Ele comemora e coloca uma rosa vermelha em meu colo. – Olha você falou a um tempo atrás que ela gostava de rosa então comprei pra você entregar e pedir desculpas.
− Primeiro: não vou pedir desculpas por que não fiz nada. Segundo: o aniversário é meu, então o presente deveria ser para mim, não? – Falei propositalmente arrogante.
− Chega de gracinha e vamos logo.
Ele sobe comigo e eu a vejo próximo a beirada de vidro: no mesmo local que eu estava quando a observava alguns dias atrás. Estava com um vestido azul marinho com pequenas pedras salteadas pela saia que batia no joelho, deixando suas belas e brancas pernas torneadas a mostra – em outra época eu teria vontade de ficar com ela, falar-lhe o quanto é bonita; porém estou em outra realidade agora. Acho que em meu íntimo a perdoei assim que bati os olhos nela.
Estava com a juba vermelha livre a não ser por pequenas presilhas enfeitando o topo da cabeça. Estava linda! Cantarolava uma canção – se não estivesse cantando não seria a Lívia – tão baixo que captei apenas uma frase:
Você sabe que ninguém tem chance, baby!
https://youtu.be/Hq4rDMYJVJA
Essa é a música que a Lívia estava cantando no terraço.
Antes que ela pudesse perceber o zumbido produzido pelo motor da minha cadeira ou, desligada como era perceber apenas a minha presença no terraço tomo um grande susto e vejo que ela também se assustou com o grito feminino vindo da sala a dois andares abaixo de nós.
− SAI DAQUI, SEU ASSASSINO!!!
Ela vem em minha direção quase que correndo por entre as diversas mesas que estavam espalhadas por ali onde aconteceria de fato a reunião ou festa quando percebe os meus braços e pernas tremendo e derrubando a rosa no chão que foi pisoteada por ela enquanto vinha apressada. Meu susto causou os espasmos e com isso percebi que mesmo eu querendo afastá-la acabava aproximando-a mais de mim.
− Shhhhhh! Calma, fica tranquilo Nick. – Ela pede alisando meus braços e aproximando sua boca da minha de tão perto que ela estava. Meu coração que acabava de se acalmar recuperado do susto começou a ficar acelerado novamente: ela iria me beijar.
Tão rápido quanto foi nossa aproximação também foi o afastamento, pois ouvimos outra voz alterada.
− NUNCA MAIS TOQUE NO NOME DO HENRY!!!
Eu e a Lívia trocamos os olhares e não havia dúvidas de que teríamos que descer pra descobrir o que estava acontecendo. O meu elevador era um pouco lento mais chegamos a tempo de ver a mãe da Lívia dar um tapa em um rapaz como uma leoa feroz. Vendo a Sandra dessa maneira, e recordando quando o senhor Theodoro bateu no Fábio e também quando a Lívia bateu na Camile só pude concluir que filha de leões, leãozinho é.
E que leãozinho era essa minha vizinha do décimo andar!
− Sai daqui, Robin. – A Sandra sentenciou apontando o indicador para a porta da minha sala que a voz mais calma.
Essa festa estava mais interessante do que eu imaginava que seria. Preciso lembrar-me de agradecê-las depois por desviar o foco de mim. Ou deveria agradecer a esse tal Robin?
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Quero ler as teorias! Não esqueçam de deixar sua estrelinha.
Até o próximo capítulo.
Abraços!!!
#gratidãosempre
Capítulo publicado e revisado dia: 21/03/2021
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