ódio?
O dia de Nishimura foi refrescante e tranquilo, teve aulas boas durante a parte da tarde, e ainda saiu para comer com seus amigos e ir a um karaokê. Destrancou a porta meio bambo, no entanto, devido às poucas taças de álcool que acabou tomando.
Porém, depois de uma colher voar pelo seu lado ao dar um passo para dentro, duvidou se haviam sido poucas mesmo.
─── Jay..? ── chamou, receoso. A porta frontal ficava bem para o balcão da cozinha.
A passos rápidos e pesados, o americano foi buscar a colher de madeira que atirou de alguns
bons metros de distância.
─── Oi, Niki ── resmungou, nem olhando nos olhos do colega.
─── Você sabe que quase me acertou, né? ── continuou, fechando a porta.
─── Ah, é? Foi mal ── desculpou-se de forma seca. ─── É que essa merda de macarronada não tá dando certo e eu tô no meu limite.
─── Deixe para outro dia então.
─── E deixar ela me vencer?! ── retrucou, indignado, ao balançar a colher de pau na mão. ─── Nana-nina-não.
Niki levantou as mãos ao lado da cabeça, e deu um passo para trás.
─── Ok, ok, mas porque você está tão estressado mesmo?
─── Estressado? ── riu, nasalado. ─── Estou ótimo ── Jay não parava de balançar a colher, e não era exatamente algo reconfortante de se assistir.
Não levou nem três segundos.
─── Aconteceu alguma coisa entre você e o Jungwon?
Jay sorriu, cruzou os braços, e depois riu-se como se não houvesse amanhã, até fechar a cara em um instante.
─── Nada.
─── Você é um péssimo ator para quem gosta de teatro.
Não resistiu por muito mais tempo, segundos depois já estava detalhando tudo o que havia
acontecido nos últimos dias, da questão da caneca a todo o rolo com o professor de música. Niki estava fascinado e sem palavras enquanto escutava seu amigo jogar todas as informações como se fosse um rap na sua cara.
─── Peraí, peraí, calma que meu raciocínio não vai tão rápido ── acalmou-o. ─── Então você admite que está a fim do Jungwon? ── um sorriso cresceu em seus lábios.
Jay fez cara feia.
─── Você ainda está aí?
─── Sim, é verdade, parabéns para mim que tenho uma queda por gente que não gosta de mim ── resmungou, cruzando os braços. ─── O que foi?
Niki estava mordendo o lábio na tentativa de conter um sorriso enorme.
─── Nada. ── riu baixinho. ─── Então qual é o próximo passo?
─── Arranjar um novo emprego do outro lado da cidade.
─── Jay, não. Você disse que ele anda te provocando! Quem não está interessado nunca faz isso, só são secos.
O olhar de Jay subiu um pouco, e Nishimura percebeu que aquilo era sinal para continuar:
─── Ele está esperando o seu próximo passo, certeza que ele fica pensando nisso. Se você quer dar a volta por cima, tem que pegar pesado nos flertes e não perder a segurança ── aconselhou com confiança, ficando orgulhoso do próprio discurso ao acabar.
─── Hum, talvez você esteja certo. Então como você acha que eu posso prosseguir?
E foi naquele momento em que percebeu que o sorrisinho inocente do seu colega de quarto era só fachada.
⏳
Jungwon estava em uma crise existencial desde a última vez que conversou com Jay. "Não pense que será fácil me impressionar..." Na moral, de onde tirou isso? Nunca falava esse tipo de coisa quando não estava seriamente embriagado. Porém, essa foi a menor das suas preocupações, uma vez que tinha soado bem foda no momento. O que andava o perturbando de verdade eram os cantos de sua boca subindo toda vez que lembrava-se que o que Jay sentia por ele já estava bem longe do ódio.
O escalador de poltrona gostava dele. Hehe. Que merda. Jay é muito lindo. Que? Não ─ os pensamentos de Jungwon já deixaram de ser inteligíveis há muito tempo.
Jungwon bateu o nariz na porta. Que dor. Poucos segundos depois, uma das professoras abriu-a com uma expressão preocupada.
─── Você está bem?! ── exclamou, já erguendo as mãos até o rosto do garoto. Jungwon habilmente desviou-se.
─── Tô bem ── respondeu abafado, por ter a mão esquerda cobrindo seu nariz. Em seguida, levantou um sinal positivo com a outra. ─── Um café e tudo resolvido.
A mulher deixou-o passar, mas ainda seguiu-o com os olhos por mais alguns segundos antes de voltar a sentar no sofazinho da sala dos professores. Incapaz de pegar um copo com só uma mão, Jungwon dolorosamente soltou a mão esquerda do rosto e pegou a sua caneca. Os olhos holográficos do Troy Bolton o encararam tão profundamente que quase desistiu do expresso que tanto queria tomar.
─── Bom dia ── anunciou a voz já bem familiar aos ouvidos do garoto com um possível nariz quebrado.
─── Sra. Nam, voltasse das viagem? Como foi Jeju?
Jungwon sentiu-se mal, nem tinha reparado que uma das professoras estava faltando. Seu dia já estava começando mal e o nervosismo estava brincando com seus pensamentos como se fosse um jogo de palavras.
─── Foi ótimo, obrigada por perguntar. E o seu cabelo, adorei ele dessa cor!
A cabeça de Jungwon virou mais rápido do que a da menina do exorcista, e o contato visual foi imediato. Jay de cabelo platinado, que gostoso. Quer dizer, cai bem nele. Voltou o rosto para o café tão rápido quanto antes.
Jay riu. Estava tirando confiança não sabe de onde, mas ver Jungwon atrapalhado assim com certeza ajudava na sua postura. E o cabelo? Comprou a tinta às 3 da manhã em uma loja de conveniência depois de passar horas trabalhando em um projeto da faculdade, pois nada melhor do que estragar o próprio cabelo para lidar com problemas. Pelo menos ficou bom.
Aproximou-se mais do colega, para então pegar a própria caneca.
─── Bom dia.
Quase como automaticamente, Jungwon soltou uma risadinha sarcástica e logo depois, uma veia saltou da cabeça de Jay.
─── Dia' ── respondeu simplesmente, virando de costas para ir se sentar.
No entanto, Jay não estava satisfeito. Pousou seu copo da bancada, e puxou Jungwon para mais perto; bem mais perto. Surpreso, tentou afastar-se, mas não podia fazer movimentos bruscos por causa de sua xícara de café.
─── Vai ser seco comigo?
─── Eu sempre sou seco contigo. Agora me solta ── resmungou.
─── Achei que a gente tinha tido um momento. Você que me pediu para mostrar que estou sério.
Jungwon encarou de relance o sofá. O ângulo em que a professora estava era quase completamente de costas para os dois, e ela parecia continuar completamente focada no jornal. O que Jay pensava que estava fazendo quando não estão sozinhos? Bem, não era em soltar Jungwon, uma vez que sua mão apenas apertou o abraço.
─── E a professora? ── suspirou. ─── Quer ser despedido?
Nem lembrava-se mais que estavam acompanhados, mas não era aquilo que o faria parar, pelo contrário: puxou-o para mais perto, colocou a mão livre sobre os dedos de Jungwon que seguravam a caneca, e deixou um beijo fraco sobre o pescoço pálido de seu colega de trabalho.
Jungwon sentiu um arrepio correr por seu corpo, misturado com a ansiedade que lhe dava em estar grudado em Jay em um momento em que poderiam ser pegos a qualquer momento.
─── Filho da puta ── suspirou. ─── Se eu for demitido por sua causa...
Jay não soltava-o, e continuou com o caminho de beijos até a orelha, quando pode escutar o sofá antigo rugir ao perder o peso que estava sobre si. Soltou-se imediatamente, virando-se de volta para o seu café que já estava pronto.
─── Vou indo, meninos, tenho uma aula agora. Tenham um bom dia ── desejou a Sra. Nam antes de deixar a sala.
Com o coração em um ritmo engraçado, Jungwon demorou alguns segundos para acalmar-se, mas assim que o fez, saiu a passadas rápidas da sala. Poderia ser atacado de novo se estivesse ali dentro e não poderia correr aquele risco. E o problema não era porque não havia gostado. Era justamente o oposto. Gostou tanto quanto da última vez.
⏳
A rotina era simples naquela manhã, somente supervisionar as turmas no parquinho e eventualmente brincar com elas quando pedissem. Esse, normalmente, não era o tipo de trabalho que agradava muito Jungwon ─ o campinho tinha insetos e mosquitos parecem gostar muito de seu braço ─ mas naquela manhã, estava sendo seu maior aliado: era o ambiente perfeito para evitar Jay.
Não que não fosse natural os dois se evitarem, era quase como sua natureza, mas agora que as coisas haviam se tornado uma guerra ─ em um sentido bem diferente do qual costumava ser ─, Jungwon não tinha a menor ideia do que fazer a não ser... Fugir. Isso fez Jay desesperar-se um pouco. Por mais que Niki tenha falado com tanta certeza que não era unilateral, ainda não conseguia convencer-se por completo. Será que havia ido longe demais? Jungwon não gostava dessas coisas? Ele pareceu gostar no momento, apesar das palavras agressivas. Sinceramente, ser xingado era bem melhor do que o silêncio constrangedor.
Jungwon pensava da mesma forma, preferiria pelo menos uma briga ao invés daquele clima desagradável, por mais que fosse a pessoa a estar causando aquele momento. No entanto, não conseguiria manter aquele silêncio por muito tempo; ainda trabalhavam juntos, e já faziam alguns minutos que precisava resolver algo e não estava tendo muito sucesso...
─── Jay. ── o chamado cortou seus pensamentos. ─── O Woo, você viu ele? ── perguntou, meio sem graça.
─── Hm? O do topete? Não está jogando bola com os outros meninos? ── respondeu no mesmo tom constrangido, olhando na direção dos meninos.
─── Já procurei em todo canto, e ele precisa tomar remédio... ── continuou, mas de repente, seus olhos arregalaram. ─── Puta merda Jay, e se a gente perdeu a criança?! ── a mudança pro desespero foi tão rápida que até assustou seu colega.
─── Calma, talvez ele tenha fugido para dentro, vamos procurar.
─── E o remédio?! E se demorarmos e o menino cair morto?!
Jay segurou a risada.
─── É remédio de alergia, fica tranquilo ele não vai morrer ── instintivamente colocou as mãos sobre os braços de Jungwon para acalmá-lo, mas rapidamente retirou suas mãos. Houve uma troca de olhares tímida por alguns segundos. ─── Vamos lá. Vou avisar as crianças para ficarem lá dentro enquanto procuramos.
─── Ok... Mas se não achamos a culpa é dividida, né?
─── A gente vai achar essa criança, Jungwon. Ele não pode ter ido longe.
As buscas começaram com a separação dos dois, assim cobrindo a maior parte da área coberta da creche, que de pequena não tinha nada; tinham tantas turmas de crianças que a coisa mais comum de acontecer era confusão de salas mesmo como adultos. Imagina uma criança de cinco anos? Poderia estar até tomando chá na sala de espera da diretoria, especialmente se falando de Wooyoung, aquele pirralho era barra pesada. Já mordeu o calcanhar de Jungwon uma vez.
Vinte minutos depois buscando por cada canto daquela escolinha, os dois assistentes de professores cruzaram caminho, mas nenhum deles havia sequer visto uma pista de onde estava o moleque fujão.
─── É isso, estamos fudidos ── condenou Jungwon. ─── Perder uma criança dá cadeia?
─── Só demissão eu acredito, mas para de ser tão negativo! ── soltou um peteleco na testa de Jungwon. ─── Pensa melhor, o que uma criança poderia estar fazendo se não brincando?
─── Não sei, na idade dele eu só brincava e comia. Nada mais me interessava.
─── Já olhou na cantina?
─── Sim, e ele não está lá. Mas faz sentido, esse lugar só vende vegetais, nenhuma pipoquinha ou chocolate, é uma tristeza ── resmungou, mas a cabeça de Jay pareceu iluminar-se com aquela informação.
─── Acho que eu sei onde ele está.
⏳
Sentado sobre a calçada e com a boca toda suja, Wooyoung estava deliciando-se com um sorvete de chocolate que comprou do senhor que vendia na frente da escola. Ele encarou seu Tio Won e Tio Jay ao perceber que estavam aproximando-se, mas a única coisa que fez foi abrir um sorriso sapeca.
─── Woo, você quase me fez ter um ataque cardíaco aos 19 por causa da sua gula seu safado ── repreendeu Jungwon, mas já abaixando-se para dar um abraço na criança. ─── É tão bom te ver respirando.
─── Que dramático... ── murmurou Jay.
─── Você que estava calmo demais, seu insensível.
─── Enfim ── concluiu Jay, abaixando-se também para falar com o menino. ─── Wooyoung, você não pode mais fazer isso.
─── Mas... Eu não queria cenoura... ── retrucou, olhando para baixo. ─── Tio Won, você também disse um dia que deveriam nos dar doces para comer.
Jungwon olhou para o biquinho da criança, depois para a cara rabugenta de Jay, depois pensou um pouquinho.
─── É, eu concordo com a criança. Ele faz o protesto dele.
Wooyoung começou a rir.
─── Jungwon! Nem sei como você conseguiu esse emprego, sinceramente ── bufou, desacreditado que aquele era o mesmo cara que achava que ia para a cadeia por ter perdido o menino.
─── Com um sorriso lindo e simpatia, coisa que você pelo jeito não tem.
─── Você se acha o bonzão, não é?
─── E eu acho que você também, não é à toa que se apaixonou.
Em meio ao silêncio sufocante que seguiu a discussão, Wooyoung lentamente tentou dar outra lambida em seu sorvete, mas sem tirar os olhos por um segundo da novela que estava assistindo ─ costuma só ver aquelas coisas de relance quando sua mãe colocava seus dramas na televisão. Jungwon engoliu em seco. Pela primeira vez depois de tantas brigas, achou que havia ido longe demais. Nunca havia visto uma expressão tão constrangida no rosto de Jay; ele realmente não estava mentindo, tinha um sentimento real naquilo. Poderia não ser a coisa mais significativa do mundo, mas era real.
─── Vamos voltar ── Jay finalizou, enfim pegando na mão de Wooyoung para levá-lo de volta.
Sem saber como continuar, Jungwon apenas seguiu atrás.
⏳
Só estava piorando. Por que sentia-se tão mal? Não era como se tivesse acabado com a vida dele, mas o arrependimento que estava sentindo com certeza se equiparava. Desde quando ligava para o que ele pensava de qualquer forma?
Talvez desde que percebeu que gostava muito da ideia de que Jay gostava dele, ou talvez desde que percebeu o quão bonito ele ficava quando rolava os olhos. "Sinceramente, o que tem de errado comigo?", foi seu último pensamento antes de caminhar de cara em outra porta, a qual, pelo menos, era vidro dessa vez.
─── Puta merda.
Um barulhinho de risada veio mais de trás. Já estava no final do expediente, e só precisavam organizar alguns trabalhos de artes a pedido de uma professora, ou seja, estavam à sós. O silêncio desconfortável continuava, por mais que Jay iniciasse algumas conversas curtas relacionadas ao trabalho.
─── É culpa sua ── soltou Jungwon.
Jay encarou-o, virando a cabeça lentamente, mas sem levantar-se da mesa infantil em que estava.
─── Culpa minha? Tudo bem que você me culpa por muita coisa, mas isso já é ridículo.
─── É culpa sua só porque você faz a minha cabeça hiperventilar e assim não dá para focar em nada ── continuou, mesmo tendo plena noção que não faziam sentido suas palavras. Apenas não queria ficar quieto. ─── Por que você não retrucou antes? Você sempre retruca.
A cabeça de Jay voltou para os trabalhos de artes.
─── Não se tem argumentos contra fatos.
─── Mas que merda em?! Como tu saiu de me fazer cara de nojo para me beijar no meio da sala dos professores?! ── exclamou, indignado. Jay estava honestamente surpreso com aquilo.
─── Achei que você tinha gostado de saber, mais um motivo para a implicância que temos. Você pareceu gostar quando me prendeu na parede e...
─── Deu! Eu só fiz aquilo porque parecia muito absurdo no momento e uma resposta como aquela parecia combinar.
O clima pareceu ficar ainda mais tenso.
─── Uau. E eu que achei que tinha uma chance, tadinho de mim ── ironizou, mas o fundo de verdade era perceptível.
─── Mas eu sempre sou horrível com você, honestamente...
─── Jungwon ── interrompeu, voltando com o contato visual. ─── A gente briga, sim, mas você realmente sentia que nossas brigas eram reais? Talvez nos primeiros dias fossem realmente feias, mas você realmente ainda me odeia?
Não havia pensado direito sobre aquilo. Odiava Jay, ou só gostava de brigar com ele? A carinha rabugenta dele e todas as possibilidades de xingamento que poderia criar realmente eram algo que colocava um sorriso no rosto de Jungwon. Adorava retrucar tudo o que ele fazia, ou resmungar quando ele se achava para as crianças e professores... Mas odiar? Será que esse era o sentimento certo?
Ao encará-lo, encolhido naquela mesinha com os olhos esbugalhados encarando em sua direção, definitivamente não era aquilo que sentia. E também não foi aquilo que sentiu quando provocou-o no dia anterior, ou quando recebeu os beijos no pescoço.
─── Caralho. Eu gosto de você.
─── O que?
─── Você me ouviu, porra. Eu gosto de você, puta merda eu gosto de você.
Jay nem teve tempo de reagir aquilo, Jungwon saiu da sala como um foguete, e não voltou mais naquele dia.
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