23. Sweet dreams

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Sweet dreams are made of this (...)

Doces sonhos são feitos disso

Everybody is looking for something

Todo mundo está a procura de algo

Some of them want to use you

Alguns deles querem te usar

Some of them wanna get used by you

Alguns deles querem ser usados por você

Some of them want to abuse you

Alguns deles querem abusar de você

Some of them want to be abuse

Alguns deles querem ser abusados


MARILYN MANSON

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A atmosfera estava tão pesada que era difícil respirar. Eu precisava me concentrar nessa simples tarefa como algo realmente complicado. Depois que a escuridão se tornou mais branda, meus olhos começavam a entender o que acontecia.

Ao vê-la manipulando uma seringa na minha bolsa de soro, o desespero se fez presente. Tentei levantar, mas percebi que meus braços estavam amarrados. Jeni me olhou com ironia e sorriu.

- Você achou que eu aceitaria isso? Um filho seu e Jack? Você realmente pensou que eu aceitaria?

Sem nenhuma possibilidade de fuga, decidi gritar por alguém, mas para o meu desespero, minha voz não saiu.

A mulher gargalhava como eu jamais vira antes. O terror aumentou ainda mais quando alguém abriu a porta e se portou ao seu lado. Sua energia era tão carregada dos mesmos sentimentos podres de Jeni, que o mal estar veio na mesma hora. Eles se portavam como cúmplices. Seu rosto era coberto por uma máscara branca, não me deixando reconhecê-lo por completo. Aquele homem tinha uma postura conhecida que me fez lembrar alguém. Alguém que eu sempre pensara estar ao meu lado. Alguém que eu achara conhecer muito bem. Não sei explicar como, mas eu sabia que ele havia me traído com aquela mulher. Ele virou-se para minha mãe e sem dizer nada ela apenas afirmou com a cabeça. Então minha agonia aumentou quando aquele demônio colocou suas mãos sobre meu corpo. Ele passeava por todo o comprimento e antes de chegar na minha vagina eu percebi que iria vomitar. Não conseguia gritar, nem chorar, e agora, não conseguia respirar. Jeni continuava entretida com sua seringa e sorrindo pra mim falou:

- Não é disso que você gosta, Amy? Ele vai fazer tudo o que você gosta.

Quando olhei para as mãos que agora apertavam meus seios, tive certeza que não era Jack quem estava ali.

- Amy? Amy acorda, amiga! Acorda!

Aos poucos aquele quarto escuro foi se transformando todo na voz de Sanne.

Coloquei o braço em cima do rosto até me acostumar com a claridade do dia. Foi quando senti aquela dor no centro do meu ventre, fazendo-me encolher como um feto. Minhas pernas ficaram meladas com a quantidade de sangue que eu perdia.

Antes de desmaiar, eu já sabia que estava perdendo o meu bebê.

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____________***____________

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2 dias depois...

Eu ainda sentia muita dor. Dor física, pois o procedimento de curetagem é muito invasivo; e dor espiritual, pois havia perdido um serzinho que já amava de todo coração. Eu não me alimentava desde aquela fatídica manhã e não tirava da cabeça que aquele pesadelo que eu tivera, tinha relação com a minha desgraça. Eu não sabia de Jeni há mais de duas semanas e poderia matá-la se a visse na minha frente. Na verdade, eu ando pensando muito nisso. Se eu tiver qualquer oportunidade com aquela vagabunda, eu vou acabar com sua vida.

- Você precisa comer, amiga. Qualquer coisa! Uma vagem se for o caso, mas você precisa ingerir qualquer coisa!

Olhando para aqueles olhos azuis a minha frente, cheios de angústia e preocupação, desejei nunca me separar daquela loira. Em poucos meses neste país, já me sentia ligada a Sanne para sempre. Não tenho irmãos, então não sei bem como é esse tipo de amor, mas acredito que seja algo parecido com o que sinto por ela.

E por conta desse sentimento de amor e gratidão, aceitei comer duas vagens e tomar o suco de mirtilo. Sua satisfação era tão grande que me fez sorrir.

- Você parece uma palhaça rindo desse jeito - implico.

- Eu adoro quando você fala assim. Sei que está melhorando - ela sorri e me dá um beijo na testa - Você vai ficar boa, Amy! Ó! E quando a Academia começar a turnê mundial, nós vamos pegar tantos gatos que vamos dançar assadas todos os dias a noite - fala eufórica.

Dessa vez ela consegue me arrancar uma leve gargalhada.

- Amiga... se eu estou sentida com essa perda - diz colocando a mão na minha barriga - Eu imagino como você deve estar se sentindo, mas você é nova e terá tantas oportunidades e experiências na sua vida... Que isso sirva apenas para te deixar mais forte e decidida com seus objetivos. Eu não conheço ninguém mais determinado que você. Você foi a todos os ensaios desde o primeiro dia de aula. Enquanto passava mal vomitando no banheiro, tomava sua aguinha com limão e voltava para o matadouro, aturava o chato do Yuri, seu temperamento explosivo, seus TOCS,... Sem contar o dilema com Jack e sua mãe louca! Você é uma guerreira, Amy! E eu tenho muito orgulho dessa minha amiga!

A essa altura, eu já estava chorando litros. Acho que precisava ouvir um pouco disso pra perceber que eu PRECISO reagir. Agora minha luta é por mim mesma. Pela minha liberdade e pela minha felicidade.

- Você é tão especial... Obrigada por estar a cada segundo ao meu lado - digo entre lágrimas.

Nos abraçamos e somos interrompidas por batidas na porta.

- Não quero ver ninguém. Por favor, Sanne! Ninguém! - digo enquanto pego alguns lenços de papel na mesinha ao lado.

Seco meu nariz, rosto e não desvio os olhos de Sanne, que vai até à porta, coloca a cabeça para fora e a fecha em menos de 5 segundos. Quando se vira pra mim, está com a cara do gatinho do Shrek.

- É ele de novo...

- Qual deles?

- Kevin.

- Se eu tivesse uma arma aqui, com toda certeza o deixaria entrar - já começo a sentir o ódio brotar dentro de mim.

- Amy, ele só quer explicar o que houve, afinal, você não se lembra.

- Não me lembro dos detalhes, mas por causa desse idiota que queria me comer eu acabei caindo daquela maldita escada.

A primeira noite que passei no hospital contei tudo a Sanne. Ficamos horas conversando sobre o que havia acontecido comigo desde o dia que Jack foi me ver na Academia. Contei do meu plano contra Yuri, sobre a gravação e sobre o que havia prometido à Kevin. Sanne não demonstrou nenhuma desaprovação com tudo que lhe disse, o que para mim foi um alívio. No entanto, eu não sabia explicar exatamente o que houve para que eu caísse da escada. Minha última lembrança era de tentar pegar o celular no bolso de Kevin e quando dei por mim, já estava no chão sentindo muita dor. Yuri me levou para o hospital em seu carro. Detalhe: já era 7:00 da noite e o hospital mais próximo ficava a 20 minutos depois da estrada principal.

Sanne era uma alma boa e Kevin sabia dobrá-la direitinho.

- Amy... 5 minutos. É só o que ele precisa. 5 minutos.

- Então, deixa ele entrar. Vamos ver o que esse mentiroso tem a me dizer.

Assim que Kevin apareceu na minha frente o pesadelo que tive há dois dias atrás veio como um déjà vu.

O garoto estava com sua cara de bom moço, como de costume, segurava um ramalhete de rosas e seus olhos eram um misto de preocupação e ansiedade. Essa foi a primeira vez que consegui enxergar duas faces em Kevin. Encarando seu medo facilmente penetrável, as imagens do momento que caí da escada foram se formando como se eu assistisse um filme. E então, tudo fez sentido. Era ele no meu meu sonho. Kevin era o homem da máscara que me traía com Jeni. Não sei como, mas de alguma forma existia ali uma ligação.

Senti meu peito sendo esmagado pelo ódio e instintivamente levantei o lençol que cobria metade do corpo, coloquei as pernas para o lado e me preparava para levantar. Sanne tentou intervir, mas fui mais rápida. Me joguei pra cima do traidor empurrando-o contra a parede. Segurei seu cachecol batendo sua cabeça com minha ação inesperada.

- Seu filho da puta. Você me puxou. VOCÊ ME PUXOU PARA A ESCADA!

Kevin não respirava. O maldito se condenava com seu silêncio e seus olhos aflitos.

A adrenalina foi tamanha que por segundos achei que fosse desmaiar, mas antes disso, senti mãos grandes me segurar pelas costas e me colocar em seus braços. Deitei a cabeça em seu ombro e todo sentimento bom tomou conta de mim ao sentir aquele perfume delirante.

Jack me colocou na cama com cuidado e beijou o canto da minha boca.

- Você não devia ter se levantado - disse em meio ao caos que Sanne fazia enquanto batia em Kevin.

- Você fez isso mesmo? Seu desgraçado, você empurrou a Amy?

Enquanto minha amiga esbravejava e afligia golpes contra o bastardo, Kevin tentava se defender segurando as mãos da garota e negando todas as acusações com veemência.

- Vocês estão loucas! Eu não fiz nada disso! Foi um acidente! Eu juro!

Jack se virou calmamente, pediu licença para Sanne e deu um soco com bastante força em Kevin. Assim. Sem dizer nada. O garoto caiu no chão com a mão no nariz que sangrava a todo vapor. Encolhido e gemendo de dor, Kevin dizia coisas incompreensíveis, provavelmente se defendendo.

Jack tinha o semblante de ódio mortal; o sangue fervia em seu rosto, lábios trincados e punhos serrados olhando sua presa ao chão. Mais um golpe foi desferido contra o estômago do garoto, num chute sólido e vigoroso, fazendo Jack soltar um grunhido e Kevin um grito de dor.

- Nunca gostei de você. Sempre soube que não tinha caráter. Agora você vai levantar e me dizer exatamente o que aconteceu, entendeu bem?

Jack pegou o rapaz pelo colarinho e o levantou sem zelo algum. Sentou-o em uma cadeira ao lado oposto do quarto, virado de costas para a porta.

- E pare de gritar feito um bichinha!

Kevin cessou um pouco os gemidos de dor, olhando com terror para Jack. Eu assistia a tudo e tentava entender o porquê de Kevin trair minha confiança daquela forma.

- Vamos lá. Agora você vai me contar porque empurrou Amy. O que você queria com isso, heim, seu filho da puta? Uma chance pra ficar com ela? - Jack abaixou seu tronco ficando com sua cabeça na mesma altura do garoto.

- Eu não sei do que vocês estão falando! Eu juro que...

Jack interrompeu sua defesa com uma cabeçada em cima da mão que Kevin tinha sobre o nariz, certamente quebrado. O garoto gemeu de dor novamente com as duas mãos ensanguentadas sobre o rosto. Sanne estava ao meu lado e vibrava a cada golpe, xingando seu ex-peguete com vários palavrões em holandês.

- Você está mentindo. Eu me lembrei de tudo, seu desgraçado. Quando fui pegar o celular no seu bolso, você se virou e puxou meu braço. Foi um movimento rápido e perspicaz, mas eu sei o que vi. Só não entendo o porque você faria isso. Porquê queria que eu perdesse meu filho? - pergunto com lágrimas nos olhos.

- Responde pra ela. Porque fez isso? RESPONDE, PORRA! - Jack ameaça outro golpe, mas Kevin grita o impedindo.

- Não! Por favor! Foi ela! Sua mãe me pediu!

- Como é que é? Você tá maluco, moleque? Do que você está falando? - pergunta Jack demonstrando toda a incredulidade de todos nós.

- Me perdoa, Amy! Eu estou arrependido. Ela me enganou também. Aquela mulher é louca! - diz Kevin com a boca cheia de sangue.

- Peraí Kevin! Do que você está falando? Explica essa história direito, porra! Qual a sua relação com aquela bruxa velha? - pergunta Sanne sem paciência, e eu sentindo muita fraqueza.

- COMEÇA A FALAR LOGO ANTES QUE EU QUEBRE MAIS ALGUMA COISA AI! - Jack esbraveja batendo com força a mão na mesa.

Kevin se vira pra mim e relata uma história realmente estarrecedora.

- Sua mão sabia que eu era louco por você. Sempre soube. E sabia também, não sei como, que eu não havia conseguido a bolsa para medicina, como eu dissera à você. Me perdoa, eu não queria ficar por baixo.

- Continua - reclama Jack.

- No seu aniversário, depois do nosso beijo, ela me levou para uma sala e me propôs ser... seu... amante. Em troca, ela pagaria minha faculdade. Eu fiquei meio confuso na hora, pois não acreditava que uma mulher como a Jeni quisesse alguma coisa comigo, mas confesso que isso fez bem para o meu ego. Bem... nós... ficamos algumas vezes antes de eu vir pra cá e depois que ela perdeu o bebê ela enlouqueceu.

- Ela o quê?

Nesse momento, Jack senta e olha para Kevin com espanto.

- Ela perdeu o bebê há mais de um mês. Jeni disse que você largaria ela e ficaria com Amy. Então ela me fez enxergar que a única chance que eu tinha com Amy, era se perdesse a criança.

Eu não conseguia acreditar no que ouvia. Parecia surreal demais. Estava com as mãos na boca engolindo cada palavra que ele dizia como espinhos. As lágrimas corriam livremente e o ódio era descomunal.

- Seu desgraçado! Como você pôde fazer isso com um ser inocente! Seu monstro! Assassino!

Sanne me abraçou e chorou junto comigo. A dor era grande demais. Eu não podia suportar aquilo. Jack se levantou e veio até mim. Sentou na cama e me puxou para seus braços. Eu apenas me deixei levar, como se fosse uma onda me embalando. Chorava no seu peito e era impossível não pensar que, se ele não tivesse me rejeitado daquela forma, poderíamos estar juntos; eu, ele e nosso bebê.

- Porque você fez isso com a gente, Jack? Porque me abandonou daquela forma? - perguntei em meio as lágrimas. Eu precisava entender porque ele escolheu Jeni a mim.

- Me perdoa, meu amor. Eu achei que estava fazendo o melhor pra você. Jamais imaginaria que estivesse grávida! Eu estava amarrado a Jeni para sempre, pensei que você pudesse refazer a sua vida e tentar ser feliz, já que eu jamais seria enquanto Jeni estivesse presente. Nós estamos separados, Amy. Nunca mais tive nada com ela. Mas desde que sumiu, fiquei preocupado pela criança, não por ela.

Ele beija minha cabeça e meu rosto repetidas vezes e me abraça muito forte. Percebi o quanto sentia falta daquele abraço, daquele corpo envolta do meu. Eu amava Jack. Amava muito. No entanto, a mágoa que sentia dele era na mesma proporção. Não sei se isso seria fácil de esquecer.

Jack me ajeita na cama e vai até Kevin novamente. Levanta o moleque pela gola e ele se encolhe assustado.

- Cadê ela?

- Eu... eu não sei.

- Você tem certeza que vai continuar mentindo? - Jack ergue o rapaz apenas segurando sua roupa e o pressiona na parede com força.

- Eu juro! Ela não me disse! Só sei que está aqui! Ela está na cidade, na casa de uma tia - responde medroso.

- Tia? Ela não tem nenhum parente! - me espanto.

- Parece que não a conhecemos tão bem, Amy.

Jack pega o telefone, mexe no aparelho e entrega para Kevin.

- Liga pra ela. Marque um encontro pra daqui a uma hora.

O rapaz obedece prontamente, marcando com facilidade o encontro. Percebo o quanto Jack está tentando se controlar e sinto um calorzinho no peito ao vê-lo lutar por justiça.

- Ela vai estar nesse endereço - Kevin anota em um papel em cima da mesa, sujando tudo de sangue.

Jack vem até mim e me beija nos lábios. É um selinho. Apenas um selinho capaz de mexer com todo o meu corpo e coração.

- O que você vai fazer? - pergunto temendo algo contra ele.

- Quando olhar na cara dela eu decido, mas uma coisa é certa. Ela vai sofrer. Vai sofrer muito.


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