12| Zero Limites
Eu adoro curtir uma preguiça. Se tem uma coisa que eu não faço é levantar cedo para aproveitar o dia. Agora mesmo eu estou deitada, ao meio-dia, assistindo a uma série na Netflix, sem nem mesmo ter tirado o pijama ou escovado os dentes.
Escuto o interfone do quarto tocar repetidas vezes. Grito para Maria atender, mas aparentemente ela havia saído sem me avisar. Xingo mentalmente por ter que levantar e vou até o aparelho, atendendo-o.
— Boa tarde, senhorita Maya — a recepcionista diz. — Tem um rapaz aqui embaixo querendo falar com a senhorita.
— Hum...? — bocejo e em seguida franzo as sobrancelhas estranhando a informação. Eu nem moro aqui, como tem alguém me procurando?
— Ele se chama Seung... Seungy ... — ela gagueja tentando pronunciar o nome e eu me divirto, já sabendo de quem se tratava — Luizinho! Disse que a senhorita o conhece por Luizinho também.
— Seungyoun — eu digo e ela confirma. — Pode deixar ele subir, por favor.
— Desculpe, mas ele está pedindo que a senhorita desça até aqui.
— É que eu ainda tô de pijama... moça, apenas diga a ele para subir, porque eu não posso descer agora.
A recepcionista concorda e eu desligo o interfone, corro até o banheiro e escovo os dentes para não receber o garoto estando com um bafo de onça e volto para o quarto. Ouço uma batida tímida na porta e a abro, vendo o garoto parado ali.
— Eu não devia ter subido.
— Que isso, para de bobagem. Entra, Seung — ofereço, saindo do caminho para ele passar.
— Eu só vim te entregar isso, já estou de saída — ele me estende um objeto e vira de costas, indo embora.
Seguro seu braço e o faço virar de frente para mim. Olho para o objeto e vejo que era um álbum com o autógrafo da Ivete, do jeitinho que ele me prometeu.
— Para com isso, Seung. Que história é essa de "eu não devia ter subido"? — o puxo, fazendo o garoto entrar à força — Não somos desconhecidos.
— Esse é o problema... — ele resmunga baixo, mas ainda consigo ouvir.
— Não queria ter me conhecido? — pergunto, sem entender.
Ele encara o chão, sem responder nada e isso me deixa inquieta.
— O que foi, Seungyoun? Por que está dizendo essas coi...? — ele suspira.
— Eu gosto de você.
O que?!
— Espera... O que você disse?!
— Gosto de você, Maya — abro a boca para responder, mas ele me corta. — Por isso eu não devia estar aqui, não devia nem ter me aproximado sabendo que meu melhor amigo é apaixonado por você desde que te conheceu.
— Do que você tá falando? — questiono acusatoriamente — Chan e eu somos amigos!
— Ele me contou do beijo, Maya — agora era eu quem encarava o chão, sem coragem de olhá-lo. — Por que não admite logo que gosta dele? Vocês são perfeitos juntos.
— Seung...
— Sabe, muitas pessoas adorariam ser correspondidas no amor — ele diz num tom brincalhão, apontando para si mesmo como exemplo. — Devia aproveitar a oportunidade.
Me sinto tocada com sua fala. Acho que, na verdade, me senti tocada com a atitude do garoto. Não é fácil se declarar para alguém, ainda mais nessas circunstâncias. O que ele fez foi muito legal.
— Seung, eu realmente espero que você seja feliz — o abraço apertado, querendo confortá-lo de alguma forma. — Obrigada. Pelo autógrafo e por todo o resto, obrigada, de verdade.
Ele retribui, me abraçando forte por um longo tempo.
— Espera — ele diz, impedindo que eu me afastasse de seu corpo.
— O que foi? — me assusto quando sinto sua mão atrás de minha nuca e ele se aproximando mais de mim.
— Tem algo no seu cabel-
Antes que ele pudesse completar a frase, vejo Chan parado na porta que havia ficado entreaberta, olhando para nós dois. Sem que eu pudesse fazer nada para impedir, ele empurrou Seungyoun de perto de mim e desferiu um soco no rosto do garoto.
Olho aterrorizada para a cena, vendo que Christopher continuava avançando em Seungyoun, enquanto esse tentava resistir e segurá-lo, sem sucesso algum, já que o moreno era pelo menos três vezes mais forte que ele.
— Chan, o que é isso?! Para! — grito desesperada, tentando puxá-lo dali.
— Eu só tava... tentando... tirar algo do cabelo dela — Seung se justificava entre arfares de cansaço e dor. — Chris, para! Vamos conversar!
— Mas que merda é essa?! — Maria surge na porta com um olhar incrédulo.
— Ma, me ajuda! — a chamo e ela vem correndo em nossa direção.
Puxo Seungyoun para um lado e Maria segura Chan com os braços para trás. Ele já havia feito tudo que queria e depositado toda a sua raiva em forma de socos em seu melhor amigo, então sequer resistiu quando Maria o pegou pelos braços.
O olho com desgosto e ele abaixa a cabeça.
— Olha para mim! — dito, mas ele continua fitando o chão — O que foi? Não tem coragem de me olhar depois de ter feito algo tão desprezível?
Mesmo com o rosto abaixado percebo que ele mordia forte os lábios, como se estivesse se auto-punindo.
— Que ceninha mais ridícula, sério — Maria revira os olhos, soltando os braços do moreno.
— Seja lá qual for a razão pela qual tenha feito isso — caminho até ele e ergo seu queixo para encará-lo —, você a perdeu na hora em que colocou as mãos no seu melhor amigo. Eu tô muito decepcionada, Chan... por favor, vai embora.
Eu conseguia ver a tristeza em seu olhar. Mas, acima de tudo, eu conseguia ver o arrependimento que ele estava sentindo e minhas palavras só abriram ainda mais a ferida que havia se formado nele. Apesar disso, não me arrependi de ter dito nada.
Chan ultrapassou todos os limites.
Ele me encarou com pesar no rosto antes de abaixar a cabeça novamente e sair rapidamente pela porta, obedecendo o meu pedido.
— Seung, você tá bem? — pergunto, o levando para sentar em minha cama — Ma, pega um copo d'água pra ele, por favor.
— Tá tudo bem, não se preocupa — ele passa a mão pelo rosto e força um sorriso, mesmo estando óbvia a sua expressão de dor. — Logo vai passar.
Vou até o armário e pego o kit de primeiros socorros. Ele tinha alguns hematomas e arranhões que sangravam um pouco. Limpo os ferimentos com cuidado e dou a ele a água que Maria havia buscado.
— Obrigado — ele sorri me vendo terminar de fazer os curativos.
— Por que tá agradecendo? Só levou essa surra por minha causa — faço uma careta lembrando do momento.
— Não é culpa sua que Chan tenha tido um...? — ele hesita — Ataque de ciúmes. Ou seja lá o que for.
— Aquilo não pode ser considerado ciúme — pego o copo de sua mão e o coloco em cima da mesa de cabeceira. — Passou completamente de todos os limites.
Ele me olha e dá de ombros.
— Acho que ele pensou que eu ia te beijar.
— Mesmo que fosse — Maria se intromete, me fazendo perceber que ela ainda estava ali. —Não dá a ele o direito de te bater.
— Tenho certeza que isso nunca mais vai acontecer. Conheço Chan, ele não é esse tipo de cara — ele diz, tentando ainda defender o amigo, mesmo depois de ter levado uma surra. — Eu imagino como ele deve ter se sentido.
— Espero que ele te peça perdão, pelo menos —finalizo, sem querer ouvir as justificativas de Seungyoun sobre os motivos que levaram Chan a fazer algo tão absurdo.
Nesse momento eu só quero esquecê-lo.
[...]
Não sei como, mas consegui evitar Chan nos sete dias após o que ele fez com Seungyoun. Eu não olhava para ele durante as reuniões do Time, andava pelo prédio apenas em horários estratégicos, recusava suas frequentes ligações e não visualizava nenhuma de suas mensagens.
Não vou ser hipócrita e dizer que não estou sentindo falta dele, mas enquanto eu puder evitá-lo, vou fazer. Não posso simplesmente fingir que não estou mais chateada com sua atitude.
Por sorte, a fase seguinte do programa não exigiria nenhuma interação entre nós dois. Esse é o lado bom do Tira-Teima. Eu vou cantar sozinha.
Nessa etapa, Teló permitiu escolhermos a música que cantaremos e isso tem ocupado minha mente o dia inteiro, o que é bom, levando em conta que meus pensamentos eram todos em Chan antes disso.
As opções em minha cabeça eram muitas. Eu podia facilmente montar uma playlist inteira com as músicas que queria cantar naquele palco, mas, infelizmente, só posso escolher uma.
E tem que ser algo especial para mim.
Meus pensamentos me levam longe e me recordo de quando era criança e assisti a Vagabanda tocar na Malhação de 2004.
Me lembro daquela ter sido a primeira música pela qual me apaixonei. Na verdade, não sei se foi pela música em si ou pela dona da voz que a cantava.
Penso estar decidida.
Vou cantar Você Sempre Será, da Marjorie Estiano.
Chego no refeitório do hotel bem cedo. Cedo o suficiente para não encontrar um certo alguém ali. Pego meu café da manhã e me sento em uma mesa afastada, comendo depressa para voltar logo ao meu quarto.
Sinto meu celular vibrar insistentemente no bolso, o pego e coloco em cima da mesa, vendo o nome do garoto no visor. Viro a tela para baixo, ignorando o som que a vibração produzia contra o tampo da mesa e volto a tomar meu chocolate quente. O aparelho continua vibrando, tirando minha atenção de meu café da manhã. Ergo a cabeça, rezando para que ele parasse de tocar e, por um momento, penso estar tendo uma alucinação.
Do outro lado do refeitório estava Chan, parado com o celular na orelha, me olhando triste enquanto eu ignorava suas ligações. Ele estava longe, mas percebi seu semblante abatido, parecia estar doente.
Aquilo partiu meu coração em mil pedaços.
Depois de relutar comigo mesma, levei minha mão até o aparelho e arrastei o dedo na tela, finalmente atendendo-o. Ele pareceu em choque, tão surpreso por eu tê-lo atendido que nenhuma palavra saiu de sua boca.
— Se não vai dizer nada eu vou desligar —digo, e ele arregala os olhos.
— Não! Por favor! — ele diz apressado e eu me arrepio depois de tanto tempo sem ouvir sua voz — Maya, me escuta! Só dessa vez, por favor.
Suspiro pesado e fecho os olhos.
— Ok. Me espera no jardim.
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