2 • Do You Wanna Come Over?

As pessoas cruzavam a grande sacada da cafeteria onde eu trabalhava pelos últimos dez meses, vivendo suas vidas, mexendo em seus celulares, conversando com seus amigos, paqueras ou pais desesperados para saber onde seus filhos tinham passado a noite e gritando pelo aparelho perguntas sobre com quem estavam ou onde estavam e o que faziam enquanto eu parecia estar preso em um maldito pesadelo.

Era sexta-feira e parecia que o relógio se recusava a bater seu ponteiro sobre o número quatro, que é o horário em que eu finalmente estaria livre de quaisquer obrigações até que a maldita segunda-feira chegasse mais uma vez para destruir qualquer vestígio de alegria e relaxamento que surgiu durante o fim de semana.

Niall estava afundado em cadernos e livros em uma mesa ao lado da porta, estudando para um teste que teria de fazer semana que vem e eu apenas passava pano sobre o balcão de atendimento, que era onde os clientes vinham retirar seus pedidos.

Não havia quase ninguém na cafeteria naquele horário, não mais que cinco pessoas em toda a loja, contando com Niall, que estava ali todo dia - enquanto eu trabalhava ele estudava, ou pelo menos fingia, pois eu sabia que por, pelo menos, metade do tempo ele estava desenhando rabiscos de roupas de super-heróis ou sei lá o quê que se passava naquela mente louca afetada por litros e mais litros de descolorante ao longo dos anos.

Eu joguei o pano molhado na pia e lavei as mãos, foi quando ouvi o sino pendurado à porta soar anunciando a chegada de mais um cliente. Terminei de enxugar as mãos e virei de frente à entrada e me deparando com Eleanor, linda como sempre. Oh, como eu invejava aquela beleza educada, ela era bonita de um jeito que não era agressivo, não era como se você a olhasse e se sentisse obrigado a acha-la bonita, era algo que você só sentia e descobria que tinha aquele pensamento sobre ela quando alguém lhe perguntasse, por ventura, algo como "O que você acha da Eleanor? " E você responderia simplesmente "Ah, eu acho ela linda." E então você se daria conta de que acha ela bonita. Isso fez sentido? Bem, espero que sim.

Sua mochila pendurada em apenas um ombro enquanto ela alcançava sua carteira verde esmeralda no bolso frontal da mochila da escola. O uniforme suado de líder de torcida que vestia acentuava seu corpo bem definido pelos exercícios, ela tinha um belo corpo e eu parecia um hétero alfa a secando daquele jeito. Nunca esperei aquilo de mim, quem eu tinha me tornado?

Admito que já passei algumas (okay, muitas) horas da minha vida stalkeando ela em todas as suas contas de rede social, principalmente quando Niall me veio com aquela bomba - eu fiquei curioso ué, não me culpe, eu sou apenas humano!

Seus posts no facebook não tratavam de nada além de militância, feminismo, luta pelos direitos dos animais e ela até mesmo era vegetariana! Como um louco carnívoro como eu teria qualquer chance de competir com ela em algo? Eu estou fodido por apenas existir, e olha que eu sou virgem! Se pelo menos nisso a vida me tivesse sido justa eu aposto que teria menos coisas do que reclamar.

Ela terminou de fazer seu pedido e Anna, a moça do caixa, me passou o papelzinho. Um frapuccino de chocolate, o clássico. Nem sei por qual motivo ainda se preocupavam em perguntar o que ela iria querer, pois desde que me lembro ela só pede esse mesmo sabor de frapuccino e, quando resolve variar, pede uma quiche de espinafre, pois enjoou do de palmito.

- Oi Harry. - Ela disse sorridente, arrumando sua mochila nas costas, foi quando vi os pompons balançando pendurados na mesma. Eles eram azuis e amarelo, como as cores do brasão de nossa escola. - Tudo bem contigo? - Ela perguntou enquanto eu puxava um dos copos tamanho grande do reservatório.

- Está tudo certo. - Joguei parte dos ingredientes no copo. - E você? Muito treino?

- Uhm, na verdade sim. A gente está se preparando para um campeonato estadual no mês que vem. - Comentou enquanto brincava com seus dedos e eu batia sua bebida com uma mão e balançava o chantilly com a outra. - E a treinadora está uma fera com a gente, morrendo de raiva e quase ficando rouca toda vez que alguém dá um passo muito para o lado ou não pousa direito. É meu pequeno inferno. - Riu divertida.

- Mas vocês chegaram às finais nacionais ano passado, ficaram em quarto lugar. - Comentei, uma sobrancelha arqueada. - Ela não deveria estar tão estressada assim.

- Sim, mas eu não a culpo. É muito estresse para uma pessoa só e... - Ela continuou falando, mas eu não consegui ouvir mais nada quando olhei para atrás de seu ombro, onde vi Niall nos encarando, suas mãos tapando sua boca com força, se esforçando muito para não dar um grito escandaloso no meio do lugar, seu rosto começando a ficar vermelho por causa do ar preso. - Entende? - Eu não tinha ouvido uma palavra sequer do que ela disse, não fazia a menor ideia do que era e esperava que ela não notasse, então apenas assenti e sorri.

- É claro, você tem toda a razão. - Tampei seu copo e o empurrei para ela, que o pegou e deu um longo gole. - Mas e aí? Planos para o fim de semana?

Ela pareceu ficar um pouco chateada, mas deu um sorrisinho. - Na verdade não, vou ficar sozinha o fim de semana todo. O Louis e os meninos do time vão viajar com a escola. Acho que você ouviu falar. O campeonato está terminando e eles já estão nas quartas de final.

- Ah, eu ouvi sim. Mas vocês não deveriam ter ido junto com eles? Sabe, para torcer? - Fingi balançar pompons imaginários e ela riu.

Deu outro gole em sua bebida, engoliu e disse. - Bem, sim, mas dessa vez a treinadora fez um trato com a escola e nos conseguiu o fim de semana de folga, sabe? Ela vai escalpelar a gente, então está nos dando pelo menos essa colher de chá. - Riu com o que disse. - Antes de arrancar nosso couro lentamente.

Eu ria do que ela falava, pois era impossível ficar em silêncio ao seu lado, ela era contagiante como a porra de uma gripe da estação! Para onde você olhasse encontraria alguém apaixonado por Eleanor, seu sorriso, suas pernas... Eu era apenas mais uma mosquinha inocente presa na teia que era sua graciosidade e sorrisos.

A sensação de estar aos pés de Eleanor Calder não era incômoda de modo algum, ela tinha a magia de fazer você se sentir no mesmo patamar que ela. Desgraçada.

Eu deveria odiá-la, não? Bem, é o que diz os mandamentos dos adolescentes do ensino médio que estão apaixonados há três anos por alguém que namora. É a ordem natural das coisas. Eu desejo Louis. Ela o tem. Eu a odeio. Como que nem quando se trata disso eu consigo seguir as leis de deus? Vou me jogar da ponte.

Okay, bem, não vou, mas sempre vale uma dramatização, certo? Crianças, não pulem de pontes, faz mal.

- Mas e você? Nenhum plano específico? - Ergueu a sobrancelha insinuativa, eu ri constrangido. - Nenhum carinha?

Neguei com a cabeça, gargalhando baixinho. - Não Eleanor, nenhum carinha. - Seu namorado serve?

- Oh, isso é uma pena. Sabe, eu acho que você seria um ótimo namorado, fofinho assim. - Corei com sua afirmação, mas não falei nada. - Bem, acho que já estou indo, certo?

- Uhm, antes de ir posso te fazer um convite? - Ela se virou novamente a mim, interessada e assentiu com os olhos. - Quer passar o fim de semana lá em casa? Sabe, já que o Louis viajou e você aparentemente não fez nenhum plano.

Ela pareceu pensar um pouco, olhando no fundo dos meus olhos enquanto passava o peso do corpo para outra porta. Mordendo a tampa de plástico do copo descartável ela analisou meu rosto e quando olhou em meus olhos novamente, ela sorriu e disse - Ótimo, eu topo. O que você ia ficar fazendo esse fim de semana se eu não fosse?

- Escrever o blog da escola, majoritariamente. E rever alguns artigos, sabe? Super louco. - Passei o pano novamente no balcão. - As coisas sempre saem do controle, sabe? Tipo eu dormindo com a cara no teclado no notebook, babando alguns papeis, tome cuidado comigo. - Ela riu verdadeiramente.

- Uma festa do pijama então?

- Amei. Mas vai ser no estilo Britney? - Ela pareceu confusa. - Ignora. ­- Rimos um do outro.

- Agora eu tenho mesmo que ir, Haz. - Já chegamos aos apelidos? Uau. - Até. - Ela me deu um meio abraço e um beijo na bochecha por cima do balcão, acenou uma última vez e foi embora.

Sabe a velocidade da luz? Bem, acho que essa é a definição da velocidade alcançada por Niall, pois em um momento ele estava com as caras nos livros, fingindo interesse naqueles assuntos e em um piscar de olhos ele estava com sua cara quase que literalmente grudada na minha, o sorriso do gato de Cheshire tomando meu campo de visão com aqueles dentes brancos e tortinhos. Seu desespero o deixava fofo.

- Que é? -Perguntei agoniado com a proximidade.

- O que foi que você falou para que ela te beijasse? - Ele sussurrava entre seus dentes, sem conseguir desfazer o sorriso.

- Ela vai lá para casa esse fim de semana. - Dei de ombros enquanto me virava para organizar as coisas que tinha usado para preparar o pedido de Eleanor.

- E?

- E o que, garoto? Está achando que eu chamei ela para o abate? - O olhei brincalhão quando fez uma cara de nojo.

- Agora eu quero vomitar. - Fez um som com a garganta como se estivesse prestes a, de fato, vomitar. - Eu não tenho imaginação suficiente para sequer pensar em você agarrando tetas, Harry.

- E você acha mesmo que eu consigo pensar nisso? - O dei uma batida no rosto com o pano que usava para enxugar alguns utensílios.

Bem, pensando bem, se fosse a Eleanor eu até acho que poderia conseguir alguma coisa, hum? Tipo, não deve ser por nada que tantos caras (e até mesmo algumas meninas da escola, inclusive ouvi falar que uma outra menina das líderes de torcida da equipe de apoio falou que já tinha sentido tesão nela, foi um barraco na escola, mas Eleanor não falou nada. Na semana seguinte teve uma festa, acho que elas tiveram alguma conversa... Apenas especulações, minhas, é claro. Sou um jornalista colegial, a fofoca e sede de conhecimento de todas as baixarias daquela escola correm por todo meu corpo, não posso evitar, sou um viciado em desavenças.)

Voltando aos meus pensamentos héteros (me desculpem por isso, as vezes passo por algumas crises de identidade, me assumir hétero para mim mesmo seria um grande choque, quero fugir de casa só de pensar.) Ela é uma garota realmente encantadora, um corpo lindo, aqueles cabelos sedosos e aqueles lábios finos coradinhos que combinam com aquela pele hidratada.

Agora eu estou perdido, não sei mais se estou sentindo tesão ou inveja.

Uhg! Tem que ter algum motivo muito bom para ela e Louis estarem juntos, eu gosto dele e ele, aparentemente, gosta dela então deve ter algo nisso que faça com que essa peste não saia da porra da minha cabeça! Eu vou explodir, alguém me segura.

Joguei o pano com violência na pia, causando um estalo que assustou Niall, que ainda me encarava esperando respostas.

- A gente só vai assistir uns filmes, comer muito e assistir mais filmes, pelo menos esse é o plano. Vai que alguém invade a casa e todo mundo morre. - Comentei aquilo como quem fala "Oh, o seu café está pronto, senhora. "

- Você é muito mórbido, alguém já te avisou? - Dei de ombros e ele revirou os olhos.

O sino da porta tocou mais uma vez e por ela passou Gemma, vestida no mesmo uniforme que Eleanor usava quando veio, sim, elas eram companheiras de equipe e eu não poderia ligar menos.

Ela carregava sua mochila da escola, carregada de livros e cadernos de rabiscos de qualquer coisa, muita maquiagem e roupas, pelo menos uns três conjuntos. Os seus pompons amarrados ao seu punho como um mega bracelete. Charmin. Ela atira tudo que carregava na outra cadeira da mesa em que Niall estava ocupando com suas tralhas de atuação de estudante exemplar.

Foi até o caixa, cumprimentando a moça com um sorriso, em casa ela não era simpática daquele jeito. Parece que é só entrar pela porta da frente que aquela sereia vira o Kraken.

- Olá, seus fedelhos. - Manda um beijinho para mim e reviro os olhos. Minha irmã é uma flor. - O que aconteceu?

- Adivinha quem vai passar o fim de semana na sua casinha? - Niall perguntou com uma voz aguda, infantil como ele.

- Harry conseguiu fazer o Louis cair de joelhos? Ou foi ele mesmo quem ajoelhou? - Eu poderia ficar mais constrangido em algum momento da minha vida?

- Você consegue invadir os sonhos das pessoas agora, Gem? - Niall perguntou em falso fascínio. Eu revirei os olhos. Vergonha é sinônimo de nada perto do que eles me fazer passar.

Será que a London Bridge fica muito longe? Google. Pesquisar.

Espero que não.

Os dois riram da minha desgraça, eu queria atirar nos dois. Morram! Okay, não morram tipo, literalmente, só por hoje já está bom.

- Eleanor Calder herself! - Niall praticamente berrou, eu revirei os olhos (de novo. Acho que daqui para amanhã fico estrábico só de raiva que me fazem passar.)

- É o que? - Ela disse animada e começou a gargalhar. - Amolou o outro lado da faca, Harry? - Revirei os olhos mais uma vez e bufei. Qual é a pena legal para fratricídio?

- A gente só vai assistir filme, eu continuo viadíssimo da Silva.

- Okay. - Será que tem arsênio em algum lugar dessa cafeteria? Acho que umas gotinhas não fazem mal, hum? Mortos não podem ficar doentes, a final de contas.

Os dois ficaram conversando, discutindo minha vida pessoal como se eu não estivesse bem ao lado desses traidores! Agora só faltava o porra do Nicholas chegar para encher meu saco, mas pra minha sorte ele tinha trabalho em grupo pra fazer e eu teria um pela saco a menos para envenenar.

Niall ria de alguma piada que Gemma fez sobre alguma vergonha que já passei por causa dela e ela ria de alguma história vergonhosa que já passei por causa de meu nervosismo que teima em aparecer toda vez que o maldito daquele tal de Louis Tomlinson resolve aparecer, e ele sempre faz isso quando eu estou com alguém que vai anotar todas as minhas reações para jogar tudo de uma vez na minha cara e fazer piada sobre isso.

Mas não ache que eu guardo rancor. Não, nem um pouco. Eu guardo fatos, e esses fatos são muito melhores e embaraçosos do que ficar vermelho e gaguejar perto do boy crush. Ah, muito melhores.

- Vai continuar mesmo, Niall? - O olhei desafiador, o vendo ficar vermelho como uma cesta cheia de maçãs. - E você, Gem, muitas histórias para contar, hum? - Ela ficou petrificada e eu os encarava cínico, vermelho de raiva e com uma pistola de chantilly nas mãos.

- O que? - Ela por pouco não gaguejou.

- Nada não, só queria deixar claro que eu também tenho muitas histórias para contar. - Olhei nos olhos dos dois, que começavam a suar frio. - Vão mesmo continuar e me dar motivo para espalhar? - Fiz uma espiral de creme chantilly sobre o café, ainda os olhando fixamente. Coloquei um biscoito no creme e sorri fofo. - Seu café, maninha.

E eles foram sentar, completamente calados.

Lambi meus dedos e voltei a lavar as coisas, a moça do caixa prendendo o riso quando a dei uma piscadela brincalhona.

Depois de tudo limpo e no lugar, sem ter ouvido mais uma palavra daqueles dois, peguei meu celular e fui checar o ninho de cobras que era meu twitter pessoal, o que eu usava para seguir meus colegas de escola e me informar dos barracos. A timeline estava entupida de fotos da última festa que alguém deu na casa de não sei quem e vários e incontáveis tweets de especulações para a grande festa de despedida do ainda maior Jader Hunter. Faltavam três semanas e as pessoas já estavam insanas.

Eu estou sentindo na minha alma que essa festa vai ser mais uma bela, longa e vergonhosa história no arquivo de meus amigos.

Lord have mercy on my soul, também traduzido como: SOCORRO.

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