Provocante

A história sobre a escolha do time se espalhou por toda a escola. Com isso, o horário de treino de sexta contou com uma plateia imensa, de pessoas que estavam ali para saber se o time iria mudar ou não – porque há anos a formação era tão boa que sempre vencia os campeonatos municipais com larga diferença de pontos. 

Acabou que o time titular e reserva do ano passado ficaram brincando de jogar até que todos os que iam fazer o teste tivessem chegado e por Júlia amar futebol – e estar curiosa como toda a escola estava – acabei indo assistir o jogo também. 

– Pra mim, Antônio! – um garoto do time dele grita.

– Chuta! – levanto a visão no momento que Antônio vai chutar para o gol. Vejo todos aqueles músculos reprimidos da perna que me chamam atenção e depois volto minha atenção para o livro, tentando cortar pensamentos sem filtro que tinham surgido em minha mente.

– Espera, espera! O que ele tá fazendo aqui? – Antônio começa a gritar no campo, chamando minha atenção para Alex, que estava entrando em campo.

Aquele grito chamou tanto a minha atenção, que eu até parei de ler para observar o que ia acontecer.

– Ele comentou contigo que ia tentar? – Júlia questiona e eu nego com a cabeça.

– Ele falou sobre isso pra mim na mesma quantidade que falou com você. – respondo Júlia, que volta a prestar atenção no que estava acontecendo em campo. 

Alex logo foi se aproximando de Antônio, junto com outros alunos novatos da nossa sala e de outras salas diferentes da nossa.

– Ele vai fazer o teste e se passar vai jogar. É isso que ele tá fazendo aqui! – o treinador responde completamente ríspido, não liga pra o alto tom de Antônio e retribui diversas vezes mais bruto.

– Mas ele não pode! – ele retruca, apontando com a mão para Alex. Antônio estava completamente incomunicável.

– Por qual motivo ele não pode Antônio? Ele é um atleta de alto rendimento, assim como outros novatos aqui e ano passado ficamos em 2° lugar, porque vocês empacaram depois do ano retrasado. Precisam de mais competição pra valorizar o lugar que ocupam. E não quero ver shows seus aqui, esse colégio não tem time feminino, justamente porque eu não gosto de gente chamando atenção! Se eu fosse você tomava cuidado com esse bracelete e calava a porra da boca! – O treinador retruca e Júlia, do meu lado, bufa baixo. Não precisa ser nenhum gênio pra perceber que o que ele falou tocou em uma ferida dela, afinal aquele mesmo homem não deixava a menina ser livre de forma alguma. 

– E aí cara, não precisa ficar assim, eu... – Alex fala, acenando e aquele sorriso que faz Antônio ferver de raiva. 

No final, começaram os testes para o time e Alex foi muito bem – melhor, até, que Antônio, já que ele estava de cabeça cheia e demonstrou isso o resto do treino inteiro, ele chutava a bola com força, muitas vezes errando e chutando pra muito longe. Acabou que, no final das contas, o time foi formado pelos dois – e por poucos pontos de diferença, Antônio ainda era o capitão do time, mas não era como se ele tivesse ficado feliz por isso e durante o jogo de teste do time, começou a dar ainda mais problemas, até ter sua atenção chamada novamente. 

– Tá jogando pra quem apanhar na lua, Antônio?! – o treinador grita.

– O que!? – Antônio grita de volta, estufando o peito e indo em direção ao treinador.

– Não me responde! Vai tomar banho pra se acalmar, sua mocinha! – o treinador rebate e Antônio sai em direção aos chuveiros. – Eu já falei que não permito time feminino aqui pra não ter que lidar com showzinho e você fica me testando? – continua gritando, até Antônio entrar no banheiro. 

– Acho que você deveria ir lá. – Júlia comenta e eu a observo. – E eu vou embora, não suporto mais o machismo desse otário desse treinador. 

– Tudo bem. – respondo a ela, indo para os chuveiros. 

Acabo deixando meu livro na arquibancada junto com a minha mochila e corro para os chuveiros, para tentar acalmar Antônio.

– Toni? – o chamo, entrando no local. Eu sei que não estávamos muito bem, mas a nossa briga não foi algo inédito na história da nossa amizade. Já tínhamos passado por coisas piores e iríamos passar por essa fase difícil também. 

– Sai daqui, Arthur. – ele responde em tom choroso, enquanto abre o armário para pegar sua toalha.

– O que foi aquilo, cara? Você não pode tentar gritar com seu treinador. – digo, chegando próximo a ele, que parece não ligar.

– Esse cara parece que veio para destruir a minha vida. Ele tá roubando meu amigo, as meninas e agora meu time. – ele rebate, se sentando no banco, enquanto abre a mochila e pega a roupa que vai vestir para ir embora.

– Antônio, ele não tá te roubando nada. Olha pra mim... – me agacho na frente dele. – Sempre vou estar aqui, não importa quantas brigas a gente tenha. Seu time também... você continua como o capitão, os outros meninos te respeitam muito e que eu saiba, sua situação com a Maria também não mudou. Está estressado demais. – tento acalmá-lo, pegando em seu pescoço e acariciando seu cabelo. Ele responde movimentando a cabeça e me olha nos olhos, aproximando nossos rostos e me dando um beijo, que me assusta a primeiro momento. Ele, então, se levanta e eu me levanto também, vendo-o ir até a porta. 

Ele a tranca e depois volta até mim, me segurando pela cintura e olhando por mais algum tempo nos meus olhos. 

– Deixa? – ele pergunta. 

– E o seu medo de me perder? 

– Não consegui dormir essa noite, por medo disso acontecer e nem tinha te beijado. – ele rebate.

– Antônio, eu nunca beijei ninguém. – digo, assustado e ele segura meu rosto, soltando um sorriso de lado. 

– Então deixa eu ser seu primeiro, te prometo que você vai se sentir muito bem. Vou ser cuidadoso. – ele sussurra pra mim e eu, no maior exemplo do quanto sou facilmente manipulável, concordo com o beijo, sentindo ele encostar nossas bocas mais uma vez. 

Antônio começou com um beijo calmo, que cada vez mais escalou para um beijo possessivo. Ele me puxava para si com uma força diferente da que sempre usava e depois de algum tempo, tirou sua camisa e se sentou no banco, permitindo que eu me sentasse em seu colo, enquanto ele esfregava seu corpo contra o meu. 

Eu sabia que se as coisas já estavam estranhas, agora ficariam ainda mais e também sabia que se eu tinha medo de perder o controle da mão manipuladora dele sobre mim, agora eu já tinha perdido. Por outro lado, contava com a ideia de que ele começaria a me dar valor não só quando estávamos sozinhos, veja só, que rapaz iludido. 

– Sua boca é bem gostosa, Arthur. – ele diz, passando o dedão por ela. – Faz muito tempo que imagino o que ela sabe fazer. 

– Comer. Apenas isso. – respondo, com o olhar semicerrado e ele começa a rir, me beijando novamente.

A boca de Antônio passeou pelo meu pescoço e voltou para a minha várias vezes, muitas vezes, ele me prendia em seus braços contra o seu corpo, e fez com que a minha mão descesse pelo seu peito e barriga, respirando fundo toda vez que eu o tocava. No entanto, depois de alguns minutos, nosso beijo "quente" teve que parar, porque ele tinha que tomar banho e ir embora antes que o time entrasse. 

– Posso ir dormir na sua casa hoje? – ele pergunta, antes que eu saia do banheiro para deixar que ele tomasse seu banho. 

– Claro. – respondo e saio dali no mesmo momento, fingindo normalidade, quando estava explodindo por dentro.  

Assim que saí dos chuveiros, percebi que alguns do time estavam se reunindo para terminar o primeiro treino. Como foi apenas um treino teste, para avaliar se as coisas iriam se encaixar bem em campo, ele foi bem mais curto. 

Durante todo o percurso até o onde estavam as minhas coisas, tive que fingir que não estava surtando completamente por dentro por ter acabado de ficar com alguém que era presença registrada na parte mais adulta da minha imaginação. Eu ficava me perguntando se tinha ido bem, se ele tinha se arrependido, ou se finalmente começaria a me dar valor em público também. 

Acontece que quando cheguei para pegar o meu livro, percebi que ele não estava ali e isso por si só já me deixou em alerta. Minha mochila estava exatamente onde deixei, por isso a abri, para ver se alguém tinha guardado meu livro, mas nada disso tinha acontecido. Na minha cabeça, já estava começando a pensar que alguém tinha visto o que aconteceu nos chuveiros e estava sofrendo algum tipo de retaliação por isso. 

– Oi senhor, é isso que procura? – diz Alex, subindo até o banco que eu estava com meu livro na mão.

– Me entrega esse livro, Binho. – falo, sentindo meu rosto queimar de vergonha.

– Vem pegar. – ele rebate, com sua cara típica de provocador. – Mas já aviso que corro rápido. – ele sorri.

– Não... – vejo ele se afastando. – Droga. – começo a correr em sua direção para tentar alcançá-lo.

Corri, tentei acompanhar o Alex, enquanto os outros do time que ainda não tinham entrado para o chuveiro assistiam e me motivavam, mas era quase impossível conseguir chegar perto dele sem perder totalmente meu fôlego. Ele corria rápido demais! Depois de perder o fôlego e ficar parado tentando me recuperar com as mãos no joelho, ele veio lá do final da quadra rindo de mim.

– Não é do tipo que faz exercícios, né? – diz tentando segurar a gargalhada.

– Me devolve... eu... por favor, meu livro, Binho. – digo, ainda ofegante.

– "O terceiro travesseiro"... – ele lê o nome do livro. – Engraçado, posso jurar que esse livro tem temática LGBT, não é?

– Não importa, me entrega.

– É por isso que ficou em pânico quando peguei? Nó somos amigos, não precisa ficar assim. – ele me entrega o livro, se aproxima de mim, mas isso me deixa levemente intimidado.

– Não se aproxima assim de mim. – peço e ele sorri, aparentemente estranhando a forma como falei. 

– Assim como? – ele começa a me olhar fixamente.

– Não sei, desse jeito. – digo, com voz trêmula.

– O que foi, Arthurzinho? – está a cada momento mais próximo, o que me faz sentir um frio na barriga. 

A voz, o cheiro, o jeito dele, tudo conseguia fazer com que eu me sentisse atraído e mesmo que eu tivesse acabado de ficar com Antônio, ainda assim o Alex conseguia me colocar em uma posição que me preocupava bastante. 

– Você tá me deixando nervoso. – falo com a voz mais trêmula do que da última vez.

– Tá, me desculpa. – Alex coloca a mão no meu ombro e muda seu tom de voz. – Aliás, eu moro duas ruas depois da sua casa sabia?

– Como sabe onde eu moro? – pergunto, curioso.

– Minha mãe veio me buscar de carro e quando estávamos passando pela sua rua, vi você entrando em casa. A menos que estava indo pra casa de outra pessoa. 

– Sem chance, era minha casa mesmo. – respondo e vejo Antônio saindo do chuveiro, pronto pra ir embora. Um medo, então, me veio e eu acabei, por reflexo, tentando me despedir rápido de Alex, dando um aceno rápido, sem terminar direito aquela conversa. 

– Amanhã, então, passo na sua casa, tá? – ele pergunta e eu fico o encarando, sem entender de onde ele tinha tirado aquilo. – A gente dá uma volta e você me conhece melhor, tudo bem? Já faz dias que estamos conversando aqui na escola e acho que podemos ser amigos, o que acha? – concordo com a cabeça, ele era o tipo de pessoa que me deixava confortável e talvez seja legal dar uma volta fora de casa. 

– Me manda mensagem quando for, pode ser? – pergunto e ele concorda com a cabeça, assistindo eu me afastar. – E tenta acalmar seu amigo, acho que ele tá com ciúmes de você. – ele pede e eu concordo com a cabeça, indo na direção de Antônio, que fuzilava Alex com o olhar. 

Fomos embora juntos e quando cheguei em casa, fui almoçar. Depois disso tirei um tempo para me concentrar nas minhas atividades e fui pra academia. Quando cheguei, minha familia já tinha chegado, então fomos conversar sobre nossos dias e depois do jantar dei boa noite aos meus pais e subi para o meu quarto, mas quando cheguei, Antônio já estava nele, então fechei a porta e pensei no que deveria dizer a ele. 

– Eu não sei se o meu beijo foi o que você esperava, sabe, porque foi meu primeiro beijo e eu ainda tenho um pouco de insegurança sobre essas coisas... – começo a tentar me justificar e ele não diz nada, apenas vem até mim e me segura pela cintura, me guiando, enquanto nossos corpos estavam colados, até minha cama, caindo por cima de mim em seguida. 

– Não fala besteira. – pede. – Era exatamente disso que eu tinha medo...

– De que? 

– Do seu beijo ser tão gostoso que fosse me fazer perder totalmente o controle dos meus pensamentos. Hoje eu só consegui pensar em você, Arthur. Fiquei contando horas e minutos pra não vir muito cedo e te assustar. – ele diz, mas mesmo assim não me sinto confortável com aquilo. Acontece que sei lá... ele era a primeira pessoa com quem eu estava me envolvendo romanticamente e como eu ainda não sabia exatamente se aquela sensação era boa ou ruim, acabei deixando passar.

– Se você estiver dizendo isso, apenas pra elevar o nível de manipulação sobre mim...

– Para com isso, você acha que eu não tenho sentimento nenhum? – ele me coloca contra a parede, me deixando ainda mais pensativo e confuso sobre o que estava acontecendo. 

– Eu já vi você fazer coisa pior, Antônio. Não se comporte como se a gente tivesse se conhecido ontem. É melhor ser sincero comigo.

– Eu tenho muito medo de perder você. 

– Eu sabia, dá licença. – peço, dando tapinhas em sua cintura, para que ele saia de cima de mim. 

– Espera. – ele pede e eu o encaro. – Eu tenho mais medo ainda de te perder sem nunca ter feito nada que eu realmente queria fazer. Se vou te perder de qualquer jeito, é melhor me arrepender pelo o que eu fiz, do que por nunca ter feito nada, não é?

– E o que você realmente queria fazer? –pergunto e ele brinca um pouco com o meu cabelo, sorrindo em seguida. 

– Beijar muito você. E outras coisas mais, porém eu sei que você provavelmente vai se sentir desconfortável, então não vou comentar sobre. – completa, olhando meu corpo e de cara entendo o que ele estava falando. – Mas saiba que quando você se sentir confortável, eu to aqui. tá bom? – concordo com a cabeça e ele começa a beijar meu pescoço, me puxando pra si. 

Eu, então, dou sinais que quero trocar de lugar e ele entende, permitindo-me trocar de lugar. Antônio acaba se sentando na cama e eu me sento no colo dele. Depois de algum tempo, enquanto nos beijamos, então, ele começa a me pressionar contra seu corpo. 

O beijo dele era exatamente como ele: violento e controlador. Antônio era forte, então ele comandava tudo o tempo inteiro – o que ele geralmente fazia, também, com a minha vida. Isso me incomodava um pouco, mas não era como se eu fosse falar alguma coisa, porque se ele estava querendo me beijar há um tempo, eu estava querendo beijar ele há muito mais. 

Fora que sentir ele duro, enquanto nosso beijo continuava, me deixava com uma sensação de poder viciante, porque eu gostava de saber que ele me desejava – mesmo com todos os perigos que essa afirmativa pode carregar. Eu realmente gostava e a cada minuto com ele, agora na situação que estávamos, eu cogitava mais já pular para o próximo passo com ele e me render aos meus arrepios de desejo. 

Acredito que eu só não tinha feito isso ainda, porque eu tinha tantas bandeiras vermelhas sobre ele e sobre a nossa "amizade" que sentia que nada de bom poderia vir dali da forma como estávamos nos envolvendo.


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