QUATRO

Não era tão ruim quanto pensava. Um pouco pior que antes, um pouco melhor do que em sua imaginação. Ok, sua imaginação sempre tinha algo de hiperbólica, aumentando os problemas a níveis estratosféricos, ela tinha de admitir tal fato. De todo, estava quase contente com o cargo que adquirira após a licença de Júlia. E Pedro não era assim tão enfadonho e bipolar quanto pensara. Bem, apenas um pouco, ou mais que pouco, mas ainda assim, era ligeiramente divertido. Não que fosse realmente um modelo de diversão ou que fosse de fato extrovertido. Às vezes parecia um pouco forçada a atenção que dispensava às pessoas e o jeito de ser "legal" com todos. Enfim, estava conseguindo suportá-lo, afinal, a vista não era de todo ruim, ele era até bem bonito de se ver.

Com a crescente aceitação de seu emprego, sua família estava menos preocupada com a ovelha negra. Parecia até que ela estava gostando de sua função, embora ela gostasse mais do lanche da cantina do que do emprego em si. Aprendeu rápido sobre o que deveria ou não fazer, e estava tendo poucos momentos de explosão ou rebeldia, o que já era um avanço. Porém, não deixava de ter a impressão que Pedro sempre a observava. E não era só impressão.

Ele sabia que não deveria ficar a olhando o tempo todo, e ainda assim, o fazia. Alice era tão extrovertida e natural, que não conseguia parar de admirá-la. Não do tipo perfeita, longe disso. Nem mesmo seu rosto era realmente perfeito, mas seu jeito intenso, solto e livre, parecia prendê-lo em linhas invisíveis. Trabalhar ao seu lado por quase oito horas por dia era pior que pensara. Era quase um martírio. Pelo menos ela parecia estar aceitando seu cargo com maior facilidade que outrora, o que já era um bom começo. Tentava não pensar nela com tanta frequência, mas era impossível, o pensamento parecia voar em sua direção, mesmo sem ser convidado. Até Robert, o cara mais distraído da empresa já tinha percebido seu interesse em Alice.

— Gostando da nova funcionária, chefe? — Robert brincou, e era tão ruim em sarcasmo quanto em matemática. E o "chefe", como sempre, conseguiu ignorar o comentário de mal gosto, continuando em seu caminho sem o responder. Claro que seu silêncio era uma resposta, pois, como é de conhecimento comum, quem cala, consente.

E assim eram seus dias, preenchidos de compromissos relacionados com a empresa e em observar a maluca Alice surtar com dois ou três clientes importantes por sua arrogância. Também surtaria se pudesse, mas não tinha esse direito e se sua amável secretária continuasse com tal comportamento ele provavelmente faliria.

Uma nota mental sobre Alice: ela era apaixonada em crianças. Tinha percebido isso no dia que Cláudia, a cozinheira, tinha levado seu neto, Fabrício para a empresa, pois sua filha tinha viajado. O menino de cinco anos ficara a maior parte do tempo ao lado de Alice, e ainda assim, estava comportado. Ela tinha um jeito estranho de fazer as crianças ficarem quietas, dando-lhes trabalho, e elas amavam isso. Crianças não eram exatamente um exemplo de pessoas normais e sãs, ele sabia disso. A maior parte do tempo, elas queriam ser adultas, e na outra parte restante, se contentavam em brincar de serem adultas. Algo irônico, de fato. Voltando à análise mental sobre sua "melhor" funcionária, ela conseguira manter a atenção do garoto, que segundo a avó, era hiperativo, e em nenhum momento o menino fez algo que prejudicasse o trabalho dela. Mas quando Fabrício foi obrigado a voltar para perto da avó, fez escândalo, e não parou nenhum minuto até o fim do expediente.

Enquanto fazia suas inúmeras análises sobre Alice, virou-se para o lugar onde ela estava e a viu olhando fixamente para um caderno, atônita. Ao descer os olhos para o maço de papeis, viu algo que fez seu coração parar:

Droga! Havia sido descoberto!

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