Capítulo Seis: Sequestrado por um Opala Cereja

Tony estava sentando na poltrona de couro que ficava no escritório do pai. Os pés calçados de meias sobre a mesa de mogno.

Howard odiaria vê-lo fumando no aposento. O pai sempre odiou cigarros, e só faltou matar Tony quando o pegou fumando. Ele sorriu ao se lembrar do esporro que levou.

Se tornou um ritual ouvir os diários do pai, ele fazia isso uma vez por semana. Tony as economizava porque não queria que acabassem. Ele até mesmo ouvia a mesma fita várias vezes.

Tony apertou o botão do toca fitas e a voz do pai entrou em seus ouvidos.

"Dia 8 de agosto, 1984.

Hoje fui ao hospital visitar o garoto. Pude conhecer Peter. Ele realmente se parece muito com Richard.

É incrível como ele aparenta estar simplesmente dormindo, se não fosse por aquele monte de acessos e o tubo de oxigênio, eu diria que é apenas um jovem descansando e que ele poderia acordar a qualquer momento.

Eu mesmo pedi para meus pesquisadores irem em busca de tratamentos alternativos e experimentais. Um deles achou um suplemento criado por um tal de Steve Rogers que parece funcionar muito bem. Creio que sim, quero que o garoto sinta minimamente os impactos quando acordar. Sim, ele vai acordar. Acredito muito nisso.

Não sei se acredito em céu, mas se ele existir, quero chegar lá e encontrar Richard e dizer que o garoto está bem e em boas mãos, fiz o meu melhor.

Peter parece ser um garoto bom, vi isso pela sua face. Tony não quis ir ao hospital comigo, hoje é um daqueles dias em que ele está emburrado.

Espero que quando Peter acordar, ele e Tony se conheçam e se deem bem, espero que os dois sejam amigos. Eu gostaria de ver minha amizade com Richard refletida neles. Acho que os dois poderiam se dar bem, assim como nós dois nos dávamos."

Tony pausou a fita e refletiu.

Será que até após a morte o velho interferiria em sua vida?

*~*

Peter estava no refeitório na companhia de MJ, Ned havia faltado nesse dia por estar com intoxicação. Ele deve ter inventado alguma gororoba na aula de culinária que o fez mal.

-Você precisa parar de encarar ela. -Falou Peter.

Michelle que parecia estar sonhando acordada piscou os olhos.

-Hã?

-Para de encarar a Pepper, à essa altura ela com certeza sabe que você tem uma queda por ela.

A garota pegou uma mini cenoura a a atirou contra Peter que se defendeu.

-Não tenho queda por ninguém. -MJ falou enquanto cutucava a comida.

-É perceptível, MJ. Você não para de olhar para ela.

-Tanto faz, eu não teria chances mesmo. -Ela deu de ombros. -Eu não teria chance nenhuma.

-Acho que você não tem chance porque a Pepper não parece curtir meninas, mas se ela curtisse, você com certeza teria chance!

-Até parece.

-É sério Michelle, você é linda. Eu me apaixonaria por você se eu gostasse de meninas.

-Não precisa mentir, Parker. -disse Michelle sorrindo. -Agora me diga você. O que tanto olha para a mesa dos senhores perfeitinhos?

Peter enrubesceu.

-Eu não olho. -falou tentando disfarçar.

-Você com certeza está de olho em algum dos meninos. Quem é? Odinson, Maximoff, Barton? O Stark com certeza não é, ele é um idiota e você odeia ele.

-Tá bom, você me pegou. Eu tenho uma enorme paixão platônica pelo Thor, ele é tipo, tão perfeito.

Michelle olhou para a mesa onde estava sentado o grupo que sempre se reunia no intervalo.

-Ele até que é bonitinho. -MJ se rendeu. -Mas não é tudo isso.

-O que? Como assim não é tudo isso? Olha para aquele sorriso! Eu teria trinta filhos com ele.

Michelle caiu na gargalhada chamando atenção de quase todo o refeitório para si, inclusive da mesa que estavam falando.

Será que eles sabiam que os dois falavam deles?

Peter olhou de relance para a mesa e logo seu olhar se encontrou com o de Tony, que deu uma piscadinha para ele. O garoto apenas revirou os olhos e voltou a atenção para Michelle.

Ultimamente Peter percebia que quase sempre que olhava para Tony, o rapaz também o olhava. E Tony não era o tipo que desviava o olhar, ele o mantinha fixo a ponto de fazer com que Peter se sentisse constrangido.

Mas afinal, porque de toda aquela atenção? Será que ele sabia de algo que Peter não sabia? Isso havia começado depois das reuniões do grupo de apoio.

Happy Hogan sempre ligava para Peter, para saber como ele estava e como estava indo a escola. Ele sempre perguntava como estava Tony, e o garoto respondia que estava bem. Peter nunca entrava em detalhes pois não andava com o rapaz Stark como provavelmente Happy acreditava que ele fazia.

Até então, Tony nunca o ajudara a se integrar na escola. Então não havia motivos para eles serem próximos. Ele mentia para Happy porque não queria por o outro em maus lençóis, por mais que não fosse fã de Tony, ainda sim não queria que ele se ferrasse.

Ele imaginava que a rotina em um colégio militar não devia ser nada fácil, então preferia poupar o rapaz.

No fim Peter acabava sendo álibi dele, mesmo sem ter nenhuma intimidade com o mesmo.

Talvez um dia ele fosse canonizado, pensou Peter. Seria um santo facilmente.

Ele sorriu imaginando a cena. São Peter Parker, aquele que protege garotos rebeldes de irem para o colégio militar.

*~*

A tarde estava ensolarada enquanto Peter caminhava calmamente pela calçada. O sol estava um pouco mais forte que nos outros dias e o fez começar a pensar em andar com um guarda sol, mas isso era coisa de velho então preferia sofrer com o calor do que perder sua dignidade.

Aquele dia de aula havia sido calmo, nada de Flash enchendo seu saco, as matérias haviam sido razoáveis e ele havia conversado bastante com MJ.

A rotina no instituto Romanoff acabara por cair na mesmice.

Ele estava pensando em procurar um emprego ou algo do tipo, não aguentava mais ir da escola para casa e vice versa. Queria ter variedades acontecendo em sua vida, queria se divertir. Chegar em casa e fazer o dever, depois assistir televisão e jantar não era bem a visão de diversão que ele tinha.

Peter queria sair com os amigos, por mais que fossem só dois, ele pensou em chamar MJ e Ned para algo. Se ninguém se importava com uma rotina chata, ele se importava e teria que tomar a iniciativa para mudar isso.

Sua atenção foi tomada por uma música alta que tocava em um carro que vinha do fundo da rua. Peter olhou para trás e viu um Opala cor de cereja vindo com o som altíssimo, a música pelo que ele pôde identificar era Highway To Hell do AC/DC. O vidros do carro estavam fechados e ele não conseguiu ver quem era o motorista, então continuou seguindo seu caminho.

A medida que ele ia andando, foi percebendo que o carro estava na velocidade mínima, e... O acompanhando?

Por instinto Peter começou a andar mais rápido e o veículo começou a avançar também. O carro se aproximou e começou andar bem ao seu lado, mais um pouco e estaria na calçada com ele.

Em um momento súbito de coragem, Peter parou e cruzou os braços encarando o vidro fumê do carro, o veículo parou também.

A janela foi se abaixando lentamente para revelar Tony, que chupava um pirulito e usava um Ray Ban preto, e como sempre vestia aquele sorriso arrogante que irritava Peter.

-Fala boneca.

-O que você quer, Tony? -falou Peter impaciente.

-Nada, só tava passando por aqui e vi você aí. -respondeu o moreno.

-E decidiu me seguir? Droga Tony, eu achei que fosse um psicopata ou sei lá.

Tony gargalhou.

-O que? Tá com medo de ser sequestrado?

-Muito engraçado. Tá bom, Tony. Tchau pra você. -Disse Peter enquanto voltou a andar.

-Não, espera! -Tony voltou a seguir Peter com o veículo. -Todo dia eu passo aqui e vejo você andando. Onde é o orfanato que você mora?

Peter parou para encará-lo novamente.

-Que orfanato? -indagou ele, confuso.

-O orfanato que você mora ué.

-Quem te falou que eu moro em um orfanato?

-Eu pensei que como perdeu seus pais, você moraria em um orfanato. -respondeu Tony em tom de obviedade.

-Você mora em um orfanato,Tony?

O rapaz balançou a cabeça negando.

-Pois é, eu também não. Moro com a minha tia.

-Ah, eu não sabia. -disse Tony. -E porque você não volta pra casa de ônibus já que não tem carro.

-Eu não ando de ônibus. -resmungou Peter abaixando a cabeça.

-Ah é, por causa do acidente. Foi mal.

Peter bufou impaciente e falou:

-Vem cá, você é bipolar, ou o quê?

Tony fez que não entendeu a pergunta.

-Primeiro você age que nem um idiota e me trata feito lixo e agora de repente resolve ser legal. Desculpa, mas eu não consigo acompanhar as suas mudanças de humor.

Tony desceu do carro e ficou em pé em frente a Peter.

-Eu não sou bipolar, é só que depois da reunião do grupo, fiquei pensando em como fui idiota com você, foi mal, eu não sabia que você tinha passado por tanta coisa. E também não sabia que você também tinha perdido os pais.

O castanho revirou os olhos.

-Então você só é legal com pessoas que os pais morreram também. Isso é muito estranho, Idiotony.

-Idiotony? -indagou o moreno, confuso.

-É, esse é o apelido que eu te dei por ser um idiota.

Tony gargalhou.

-Essa boa, Bela Adormecida. Você tem um bom senso de humor.

-Preciso ir para casa. -falou Peter se virando para seguir seu caminho, mas Tony o segurou pelo braço.

-Espera. Eu falo sério. Me desculpa por ser tão idiota com você. Às vezes não consigo me controlar, sai sem querer sabe?

-Sei...Parece que você nunca tem o controle, afinal. -falou Peter, desconfiado. -Isso é algum tipo de brincadeira ou sei lá?

-Não! -negou Tony.

-Você fez alguma aposta como em algum daqueles filmes? Tipo, vai jogar sangue de porco em mim no baile? Se for isso, seu plano foi por água abaixo, porque eu não vou no baile de primavera. Enfim, eu realmente não vejo motivo para essa mudança repentina.

Tony suspirou cansado de tentar convencer o outro de que só estava tentando ser amigável.

-Eu juro que não é nada disso. Só estou tentando me redimir. É sério! Olha eu prometo que nunca mais te chamo de bela adormecida, ou qualquer outro apelido, okay?

O moreno estendeu a mão para Peter.

-Isso não me cheira bem...Mas tá bom. -falou Peter desconfiado, em seguida ele apertou a mão de Tony, que ele percebeu ser macia. -E eu não ligo para apelidos.

-Então tá, você continua sendo Bela Adormecida. -Tony lançou um sorriso para Peter. -Olha, como oferta de paz, vou te dar uma carona até em casa. Pode ser?

-Não precisa. -respondeu o castanho. -Minha casa fica a alguns quarteirões daqui.

-Eu faço questão. -Tony correu até a porta do passageiro e a abriu, fazendo um gesto para que Peter entrasse. -Além dos mais você está suando bicas nesse sol.

O castanho decidiu se render e entrou no veículo vermelho. Ele não perderia nada pegando a carona, mas com certeza perderia toda a água que estava em seu corpo se continuasse andando naquele sol.

O carro tinha cheiro de pinho graças ao penduricalho aromático no retrovisor, e também tinha cheiro do perfume que Tony usava.

Peter colocou o cinto e observou o outro dirigir.

-Pode mudar de música se quiser. -ofereceu Tony.

Peter abaixou um pouco do som que estava muito alto para seu gosto e passou a mudar as faixas, parando em uma que lhe chamou a atenção. A música começou com uma guitarra falha e em seguida passou a mostrar uma bateria marcada.

-Gosta de Joy Division? -indagou Tony.

-Nunca ouvi, acho. -respondeu Peter.

O moreno o olhou surpreso.

-Como assim nunca ouviu Joy Division? Eles são uma lenda!!!

-Eu nunca parei para ouvir. -falou Peter indiferente.

-Tá, mas The Smiths você já ouviu né? Ramones? Echo & The Bunnymen?

-Já ouvi falar, mas nunca parei para ouvir.

Tony parou a música, tirou a fita do toca fitas do carro e entregou a Peter.

-Tudo o que precisa está aqui, esse é seu dever de casa. Simplesmente ouvir as melhores bandas do mundo! Caramba, Peter, onde você esteve esse tempo todo?

-Em coma. -respondeu Peter.

-Faz sentido. -disse Tony dando de ombros.

-Pois é.

Tony balançou a cabeça, perplexo.

-Caramba. Nunca ouviu Joy Division...

Eles ficaram em silêncio por alguns minutos. Aquele tipo de silêncio que vai se tornando constrangedor. E como Peter não podia esperar algo diferente, Tony quebrou o silêncio.

-Nossa, bela adormecida, você disse que era só algumas quadras. Já estou dirigindo há vinte minutos.

-Bem, andar tudo isso é melhor do que ter um colapso dentro do ônibus escolar. Além do mais, andar faz bem. -disse Peter com simplicidade.

-Que faz bem eu sei, mas andar isso tudo toda dia deveria te fazer um atleta, e sua pernas ainda estão muito magrinhas. -Tony cutucou a coxa de Peter, que revirou os olhos.

-Infelizmente não faz. Minhas pernas ainda não funcionam como deveriam depois de tanto tempo em coma.

Tony olhou para ele com pena. Aquele foi o primeiro olhar de pena que não fez com que Peter quisesse enfiar o dedo na goela.

Ele odiava quando as pessoas o olhavam daquele jeito, detestava a forma como elas pareciam se sentir tão superiores por achar que ele era digno de pena.

Mas a forma como o moreno o olhou teve haver com empatia, não pena.

Peter o guiou pelas ruas e Tony parou o carro em frente a sua casa.

-Obrigado. -Falou Peter estendendo a mão para o moreno, que retribuiu o cumprimento.

Ele fez menção de sair do veículo, mas Tony o impediu, segurando seu braço.

-Espera um pouco. Vamos fazer assim. -começou o moreno. -Já que você corre essa maratona todo dia, a partir de hoje, todos os dias eu vou te dar carona. Na ida e na vinda. Pode ser?

-Não precisa. -negou Peter. -Minha a tia May me leva e eu não me importo de andar.

-Nada disso, bela adormecida. Se qualquer dia você se desidratar andando nesse sol voltando para casa, eu vou me sentir culpado sabendo disso. Além do mais é quase caminho para minha casa e eu também vou poupar sua tia de te levar. De nada, diga ela que pode me agradecer mais tarde.

-Eu não quero, Tony. Mas agradeço pela gentileza. -Peter fez menção de sair, mas foi impedido pelo outro novamente.

-Amanhã eu estarei aqui às sete e meia da manhã, buzinando. Se você não entrar nesse carro, eu mesmo entro lá, amarro você e coloco aqui dentro.

Peter bufou impaciente.

-Minha nossa como você é chato!

-Meu novo passatempo favorito é te importunar. -Tony deu uma piscadinha para Peter.

-Ta bom. -rendeu-se o castanho. -Amanhã sete e meia eu vou te esperar aqui na frente.

-Sem atrasos. -disse Tony. -E não se esqueça do dever de casa. Essa e a minha mixtape favorita, o que tem aí vale ouro.

Peter bateu a porta do carro e passou pelo gramado.

-Sete e meia, bela adormecida!!! Nada de dormir demais!!! -Ele ouviu Tony gritar.

O castanho se virou para ele e mostrou o dedo do meio, arrancando uma risada do outro.

Ah como aquele Idiotony o tirava do sério.

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Foto do carro do Tony: 

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