TRÊS
Emily ia na parte de trás da carruagem, analisando tudo ao seu redor. Seu coração tremia diante das possibilidades imaginadas sobre para onde ela iria e o qual o tipo de trabalho a fariam executar. Mas, por um momento, se deixou levar pelas belezas que a rodeavam. A carruagem tinha tomado uma estrada que se afastava do agito da cidade e se encaminhava pelo lado rural da Capital.
Os bosques eram imensos, a distância visualizou um pastor de ovelha guiando o rebanho por entre aquelas campinas, conseguia ouvir o canto de alguns pássaros e fechou os olhos a fim de inalar mais o ar fresco. Suas emoções se elevaram diante das lembranças que lhe visitaram de quando era criança, passeando com o pai pela praia de Scarborough Fair. Sentia falta daquela época. Tudo parecia tão mais simples.
— Estamos chegando! — Ela ouviu o cocheiro anunciar.
Ao abrir os olhos, a menina avistou um casarão de pedras vermelhas, com grande janelas que iam praticamente até ao chão, as portas largas com marcos brancos e uma alta chaminé de onde saía fumaça. Enquanto a carruagem entrava no vasto terreno, ela reparou no suntuoso jardim cheios de roseiras vermelhas, elas formavam um desenho. Bancos de madeira ao redor de um chafariz eram convidativos para qualquer visitante que gostasse de tomar um chá da tarde.
O trote dos cavalos foram diminuindo até que o veículo parou na parte de trás daquele imenso casarão. Logo veio um cavalariço para tirar as rédeas dos animais e os levar aos estábulo, em seguida a portinhola do transporte se abriu e madame de postura autoritária saiu. O alto e forte lacaio, George, se encaminhou para o local onde Emily estava e a tirou do assento, guiando-a para dentro da imenso construção.
— Para onde está me levando? — a jovem indagou enquanto segurava sua pequena maleta com tamanha força, como se sua vida estivesse ali.
Ele não respondeu. Apenas continuou sério e andando com firmes passos, abriu uma porta grossa de madeira e diante de Emily se revelou um punhado de pessoas que cortavam verdura, carregaram baldes de aço com roupas, limpavam a prataria, cozinham no imenso fogão de barro e todo tipo de serviço doméstico que pudesse fazer.
— Pessoal, essa jovem moça agora fará parte do serviço de limpeza junto com a Meredith e Corina. — Emily não conseguia acreditar no que ouviu. O quê? Ela seria uma criada?
— Eu não! — Foi a primeira fala, mas antes que pudesse continuar, George segurou seu braço com força, avisando com a aquele toque sobre não mais interromper a senhora.
E depois de receber um olhar carrancudo por parte da mulher que falava, fechou a boca de vez.
— Ela ajudará na limpeza dos quartos, as tapeçarias e armários. Por vezes, poderá ajudar com as roseiras assim usufruirá de um pouco de ar fresco — a governanta declarou com um sorriso desdenhoso. — Meninas, a ajudem.
Não demorou para que duas moças, uma de cabelos cacheados, ruiva e sarnenta na região das maçãs do rosto se colocasse diante dela, ela era a Corina. A segunda menina possuía os cabelos igualmente enrolados, de pele escura e olhos quase negros, mas possuía um sorriso gentil, era Meredith.
— Venha conosco! — As moças disseram juntas.
Emily se apresentou a elas durante o percusso até entrarem num corredor meio escuro, de portas de madeiras acinzentadas, e um medo perpassou o coração. Já no final daquele corredor, Meredith abriu uma porta e lá possuía três camas de ferro com um colchão de aparência nada confortável. Uma cômoda e um suporte com uma jarra e bacia de alumínio. Emily arqueou a sombrancelha para tudo aquilo.
— Você dormirá conosco, Emily — Corina declarou. — A sra. Montclair já nos havia informado que encontraria outra moça para ficar conosco. E você chegou! — a garota declarou com leve empolgação.
— Finalmente seremos três. Porque o serviço só para nós duas estava pesado demais! — Meredith se sentando na sua cama.
Emily engoliu em seco.
— Eu não posso ficar aqui! Não sou uma empregada. Esse não era os meus planos. — Emily fechou os olhos e apertou os lábios com força.
Por que seus planos sempre pareciam trilhar um caminho que não deveria? Primeiro com o tenente Scott, quando desejou se casar com ele e armou seu plano na noite do baile, mas, no fim, quem apareceu foi Ian e agora estava fadada aquele arranjo com o homem que a odiava.
— E quais eram os seus planos? — Corina indagou e se deitou na sua cama, que ficava ao meio.
Emily murchou os ombros. Nem ela sabia. Não havia planejado onde ficaria e nem como se sustentaria. Seu desejo era somente partir para longe de Ian Turner.
— Por ora, talvez seja melhor ficar. — Deu-se por vencida depois de analisar que ao menos ali teria um teto e comida por uns dias, mas, tão certo como a luz do sol, ela em breve traçaria uma nova rota e fugiria dali.
Ela seguiu para última cama, ao lado da janela, e colocou sua pequena trouxa em cima da cadeira.
— Corina e eu vamos deixá-la um pouco a sós para se limpar, colocar suas roupas na terceira gaveta e organizar os pensamentos. Acredito que precisa um pouco disso, mas a buscaremos para jantar — Meredith declarou.
As duas jovens saíram do aposento, e Emily se sentou na beirada da cama. Ao se ver sozinha dentro de um lar desconhecido e agora sobre ordens uma velha senhora que parecia não possuir nem sombra de um espírito gentil, deixou-se ser tomada pelas emoções. Oh, céus!
Suas reflexões foram intensas naquele momento ao se deparar com a realidade de que agora não era mais a mocinha a ser cuidada, mas, sim, parte da criadagem. Como viveria assim? Não nascera para ser empregada. Ela se levantou daquela cama e foi até a jarra de água fria e lavou o rosto. Precisava organizar um plano para tudo aquilo. E daria certo. Oh, como daria!
Meia-hora depois as duas moças, que parecia unha e carne, pois não se desgrudavam a buscaram para comer. Na cozinha, Emily se espantou por ver o dobro de empregados que tinha quando chegou. Havia mais homens dessa vez e mulheres mais velhas. Os olhares curiosos sobre ela foi nítido. Meredith a apresentou brevemente para os que ainda não a tinha conhecido e se encerrou aquele assunto. Todos foram servidos com uma sopa de carne e um pedaço de pão, comendo com gosto e podendo até repetir mais uma vez.
— A nossa patroa é boa. Ela nos permite comer, de certa forma, bem — Corina disse ao lado de Emily.
— Tem outras casas que os patrões regram a comida de seus funcionários. É terrível!
Emily não declarou nada, apenas ouviu e resolveu experimentar da sopa de carne e legumes e estava muito boa. Notou como a fome pareceu crescer depois de provar uma comida de verdade. Até pediu para repetir. Às 20h em ponto as meninas já estavam na cama.
— Não está muito certo para dormir? — Emily disse deitada, olhando para o teto.
— Minha querida, se souber a hora que será despertada vai achar que já é bastante tarde. — Corina deu uma risada.
— Por certo, é melhor encerramos os assuntos. Boa noite! — Meredith apagou a vela que iluminava o ambiente.
Emily não conseguiu adormecer. Era acostumada a ir até tarde em sua casa. Por isso, ficou duas horas a mais rolando sobre a cama enquanto via suas colegas de quarto apagadas. Mas, depois o sono começou a visitá-la e se deixou levar.
🍁
— Acorde, Emily, acorde! — Ela sentia uma mão a remexendo com força.
— Não, Else, não desejo acordar. Deixe-me! — resmungou o que seria para sua criada pessoal.
— Quem é Else? Vamos, menina, levante-se! — A voz mais forte de Meredith a chamou. Mas nada fazia Emily levantar-se.
— O que faremos? — Corina perguntou com as mãos na cintura.
Meredith semicerrou os olhos e saiu do lado de Corina.
— Acorda! — Meredith lançou a água da jarra no rosto de Emily, que a fez sentar de abrupto na cama.
— O quê? Quem? Onde estou?
Emily achava que estava se afogando, até que olhou para as duas meninas a sua frente e aos poucos o cérebro voltou as suas funções a estabelecendo na realidade.
— Que sono pesado! — Corina a repreendeu.
— Por que fizeram isso? — ela indagou e tirou os fios molhados de cima do rosto. — Estou toda molhada— averiguou sua condição.
— E tem que colocar o colchão para pegar um sol. Desculpe, você não nos deu outra opção. — Meredith quicou os ombros. — Estamos atrasadas já.
— Pelos Céus! Que horas são? — Emily indagou assombrada.
— 5 horas da manhã. É nesse hora que fazemos o desjejum e começamos o nosso serviço as 5:30 horas e, por sua causa, já perdemos 10 minutos. — Meredith explicou a situação. — Se não se apressar você nem comerá. Então, acelere! Eu e Corina estamos indo.
Ambas saíram do quarto e se foram para a cozinha. Emily ainda tentava se recompor. Os pensamentos foram graves acerca de tudo aquilo. Odiava acordar cedo ao extremo e quem dirá comer antes do sol raiar no horizonte. Ela se levantou e avistou uma roupa igual as das meninas sobre a cadeira. Sabia que era destinada a sua pessoa. Limpou o rosto, a boca e se vestiu. Ao chegar na cozinha, viu como já estava praticamente vazia.
— O que deseja, moça? — uma senhora de cabelo branco perguntou.
— Vim para o café da manhã.
— Oh, sinto muito! Mas já passou cinco minutos do horário.
Emily piscou algumas vezes para ver se tinha entendido bem.
— Não tem um pão ou uma fruta?
A senhora simplesmente balançou a cabeça em negação. Não. Não era possível! Como passaria uma manhã inteira sem comer nada?
— Não posso ir trabalhar sem comer! — Ela reivindicou.
— Então, deveria ter chegado no horário certo. Com licença. — A senhora não quis se prolongar naquele assunto e partiu.
Emily passou a mão sobre o rosto e quis chorar. Que vida infeliz era aquela que precisa ter regras até para comer? Ela se sentou sobre o banco da mesa para mais uma vez se deixar levar pelos seus momentos de lamentações, mas, antes que pudesse ser tomada pelas emoções, ouviu:
— Vamos, Emily, o que faz aí? — Era Corina a chamando.
— Estou chateada porque não consegui comer. Como podem fazer isso com uma pessoa? Eles não podem abrir uma excessão? — questionou com a voz manhosa.
— Infelizmente, não — Corina disse ao seu lado, levando-a até uma sala.
— Ficarei a manhã inteira sem comida? Isso não é justo!
— Se tivesse acordado cedo.
Emily bufou!
— Eu não acordo cedo. Não durmo cedo. Não como tão cedo! Entenda que isso não é pra mim! — Despejou sua irritação para a jovem ruiva.
— Então, deverá se acostumar. Porque aqui as coisas não funcionam como seu querer — Meredith disse ao sair da saleta para encontrá-las no corredor.
Emily não declarou nada mais. Estava farta!
Elas a conduziram para dentro do espaço de decoração de dourado com branco. Havia estantes de livros, uma mesinha, um divã e uma bela visão da sacada.
— Oh, Guerra e Paz de Liev Tolstói! — Emily se lançou a prateleira para a bela edição do autor russo.
As duas meninas se olharam espantadas.
— Sabe ler, Emily? — Corina indagou com curiosidade.
— É claro! — exclamou como se fosse o óbvio. Então, lembrou-se que as criadas não sabiam ler.
— Você parece ser mesmo diferente — Meredith se aproximou dela.
Emily deu um sorriso seco. E olhou novamente para a estante com os livros.
— Eles precisam ser organizados. Deveriam ser feitos por ordem de assuntos. Muito mais fácil para escolher um exemplar depois — ela manifestou sua ideia de organização.
Meredith e Corina pensaram bem.
— Emily, faremos assim — Meredith comunicou sua idea. — Eu e Corina vamos arrumar os quartos e você fica aqui e alinha os livros. Dessa forma pouparemos tempo e poderemos mostrar um serviço eficaz. O que acha?
Emily gostou da ideia e assentiu. As meninas partiram a deixando só. Depois de começar a retirar os livros da prateleira e espanar, espirrar, passar pano nos livros. Isso ela sabia fazer muito bem porque sua pequena biblioteca em casa era parte do seu passa-tempo. Achou na última prateleira uma caixinha atrás dos livros.
Ela seguiu até a porta para ver se alguém vinha e observou está tudo vazio. Encostou mais a porta e averiguou bem a caixa de madeira nas mãos. Sua curiosidade estava em alta e, sem demora, abriu com facilidade. Até estranhou não ter uma pequena fechadura, mas foi bom para sua descoberta. Várias cartas estavam dentro daquele estojo e se estava escondido certeza era um segredo. Aquilo estimulou mais a abelhudice da jovem. Sem vergonha, ela abriu uma das correspondências e leu:
Aquele nosso passeio da tarde fora maravilhoso. Despertou em mim mais amor do que eu poderia achar que sentiria por uma mulher. Madeline, sabe que a amo com toda sinceridade do meu coração. Ver seus lindos cabelos dançantes ao vento, seus olhos castanhos brilharem para mim é como o oásis em meio a terra seca. Estimo o dia em que estaremos para sempre juntos.
Com amor, Evan!
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top