CATORZE
Emily caminhava com dureza e limpava as lágrimas dos olhos com rispidez, pois aquele selvagem não merecia uma gota de nada. Consolou-se com os pensamentos de que havia sido forte o suficiente para não desabar diante dele.
Seu coração estava ferido, não podia negar. Ao perceber, o quanto ele nutria por ela forte aversão. Está certo. Ela falhou miseravelmente com aquele plano e caiu arrastando Ian com ela no fundo do poço. Porém, ele sempre seria tão espinhoso no proceder?
Ela entrou na cozinha e lamentou ser uma criada nesse instante. Seus ânimos machucados a abatia, desejando somente isolar-se e chorar com liberdade. Porém, não poderia entregar-se ao luxo de sofrer como poderia em casa.
— Srta. Brown, ainda não levou as flores para a biblioteca da sra. Wood? — O timbre pesado da governanta estalou nos seus ouvidos.
— Tive um imprevisto, senhora. Mas já estou seguindo para lá. — Ela não se justificou mais e pediu licença, caminhando sob o duro olhar da sra. Montclair.
Enquanto subia as escadas, ela se permitiu derramar mais lágrimas.
"Emily, não seja tão fraca!", ela se repreendeu. Precisava aprender a controlar as emoções que quando afetadas a queriam dominar por completo. O que ela faria? Se sentia presa e frustrada por todos os lados.
Entrou na pequena biblioteca e trocou as flores dos vasos que estavam sobre uma mesa perto da janela. Ao olhar para as flores murchas, se sentiu como elas. Seu destino com Ian Turner talvez a fizesse definhar. Como poderia conviver com um marido que a odiava? Ele a trataria mal para sempre? Diante desses questionamentos, recordou da noite de tempestade em que ele a acolheu. De certa forma, imaginou que poderiam ao menos serem amigos, mas logo ele voltou a ser o terrível de antes.
Ao lado das flores, Emily avistou um livro que não tinha nome e o abriu. Era uma bíblia. Já velha e com algumas folhas soltas. Ela suspirou, pois fazia tempos que não abria as escrituras. Admitia sentir mais prazer em seus romances do que na palavra de Deus. Aquela leitura para ela não passava muitas vezes de apenas obrigações na hora de sua educação religiosa e não fazia muito sentido na sua mente.
Ela folheou o livro e caiu um pedaço de papel. Emily o buscou do chão e se propôs a ler as pequenas palavras descritas na folha amarelada.
"Não permitas que minha devoção seja vazia. Nós ouvimos falar tanto de Ti, mas tão pouco O conhecemos. Não quero ser mais uma que viva sem nunca experimentar as delícias da tua intimidade. Teu amor, Senhor, é o que tenho procurado a vida inteira. Faça-me deleitar em Ti somente".
A jovem engoliu em seco o escrito, certamente, nunca vira pronunciamento ou desejo das pessoas por Deus de modo tão aberto. Emily se voltou ao céu, através da janela, e se perguntou se realmente o Ser Divino podia ser um amigo presente. Alguém, de fato, pessoal. Podia?
— Srta. Brown? — a voz de Madeline invadiu os ouvidos de Emily e a despertou da sua meditação.
— Eu? — Emily se virou para ela com a bíblia na mão e ao perceber isso declarou: — Senhora, eu troquei suas flores e vi esse livro ao lado, despertou-me a curiosidade e o abri para ler. Desculpe a invasão.
Madeline observou o exemplar nas mãos dela e assentiu.
— Não tem problema.
Emily mordeu os lábios inferiores e ousou perguntar algo mais:
— Sei que não temos intimidades para isso. Peço perdão pelo inconveniente desde já. — Emily respirou fundo. — Mas a senhora permitiria que eu ficasse com essa bíblia para ler por um tempo? Claro, se não for de uso particular seu.
Madeline crispou os olhos com aquele pedido. Realmente se surpreendeu.
— Pode ficar com ela — a patroa declarou. — Era da irmã do meu falecido marido. Ela morou conosco por um tempo antes de vir a falecer por escarlatina. — Madeline parou e percebeu como estava dando informações além do necessário. — Por fim, depois de sua morte ficou servindo de decoração.
— Agradeço, senhora. Suas flores já estão alinhadas! — Ele ia fazer uma reverência para sair, mas Madeline levantou as mãos.
— Soube que o sr. Turner voltou a andar? — Madeline indagou com leve apreensão.
— Pude vê-lo do lado de fora hoje. É uma benção sua recuperação — Emily disse com imparcialidade. Não gostaria de travar um assunto sobre Ian Turner.
— Não conseguiu fazer avanços com ele durante sua estadia doente, não? — Madeline perguntou.
— Receio que as variadas recaídas dele não nos deu a oportunidade de fazê-lo relembrar do antigo amor — Emily declarou aquilo e uma pontada aguda pareceu rasgar seu coração. — Minha senhora, me permite falar algo?
Madeline fez um aceno de concordância.
— De fato, anseia reconquistá-lo? Observei que o sr. Turner nada mais tem de similaridade com o antigo Evan das cartas apaixonadas. — Emily respirou fundo e mirou a patroa que estava séria. — Talvez ele não só passe de uma ilusão agora.
— Não serei ingênua a dizer que não notei o comportamento mais rígido dele, mas ponderei que é porque está ferido. Se o fizermos abrir o coração outra vez, encontraremos um homem amoroso.
Madeline possuía tanta certeza de suas palavras, que Emily não ousou questionar mais. Porém, tinha certeza que Ian nunca seria um homem amoroso. Ele era um selvagem!
— Faremos um baile antes do natal e tenho certeza que poderei fazê-lo lembrá-lo de momentos importantes nossos! — Madeline estava entusiasmada e isso feriu mais Emily.
— Certamente o que tiver de ser, será! — ela nada mais proferiu, reverenciou a patroa e saiu da sala com pressa.
🍁
Tempos mais tarde, a sra. Montclair reunia todos os empregados no corredor do casarão. Foi um pedido da sra. Wood para dar alguns avisos pessoais. Emily estava com Corina e Meredith quando observou Peter se posicionando ao lado dela, ele estava elegante com sua roupa formal de lacaio e não como um fazendeiro surrado pelo sol.
Ele deu um sorriso gentil para Emily que acabou retribuindo. Ela gostava de Peter, pois era tão respeitador e amigável. Sentia-se à vontade na presença dele. Contudo, seu coração ameaçou morrer quando se voltou para frente e reparou no olhar fuzilante do noivo para ela, que havia chegado no corredor junto com Madeline e nada poderia fazer naquele momento. Emily estufou o peito e o encarou. Não se deixaria abater.
— Pedi a sra. Montclair para reuni-los a fim de apresentá-los o sr. Ian Turner — Madeline começou a falar e apontou para o jovem alto e de cabelos negros a sua frente. — Ele foi o viajante ferido que trouxemos para casa e gostaria de agradecer a todos que trabalharam na recuperação dele.
Ian fez um aceno de cordialidade a todos.
— O Sr. Turner é médico e gostaria de expressar sua gratidão de maneira prática. Ele ficará conosco até um pouco depois do natal.
Emily conseguiu sentir o leve desespero no tom da patroa, pois tinha consciência que a mulher desejava conquistar o noivo dela antes. Ela pensou como eles sairiam daquela situação.
— Portanto, ele se propôs a atender os empregados que necessitam de auxílio médico.
O som de surpresa e empolgação que saiu da boca dos funcionários foi nítido. Havia muitos empregados com idade avançada que precisam de ajuda da medicina, mas não o faziam porque os recursos eram poucos.
Peter sorriu para Emily novamente, que não pôde deixar de ser recíproca, afinal, ela também fazia parte daquela comunidade de criados, o que a fez experimentar uma alegria por ver os outros felizes mesmo que ela não tenha ganhado nada para si. Que sentimento estranho!
Ian não pôde deixar de reparar na ousadia do criado com sua noiva. Seus sentimentos pesaram dentro do peito e um profundo incômodo parecia comer pedaço por pedaço do seu domínio próprio. Aquele lacaio! Ele estava com suas ações atadas. Mas, por certo, faria algo em relação aquilo. Emily não pareceu se afetar com o olhar dele, o que piorou sua irritação. Tentou se concentrar nas palavras de Madeline.
— Ele ficará hospedado aqui mesmo, na ala dos visitantes enquanto atende as necessidades médicas de vocês. — As palavras de Madeline se encerraram.
— Eu agradeço por todo auxílio que tive. — Ele olhou para Emily rapidamente. — Não poderia ter caído em mãos melhores. Por isso, desejo retribuí-los e informo que os atendimentos começarão semana que vem e daremos mais notícias de como se sucederá.
Todos terminaram suas falas e os criados voltaram as suas obrigações. Corina e Meredith não puderam comentar o que gostariam porque foram chamadas para auxiliar na cozinha. Sra. Montclair parou a frente de Emily e declarou:
— Você hoje arrumará a sala de jantar para o jantar daqui a uma hora. — Emily apenas assentiu para a governanta.
Ela se encaminhou para a suntuosa sala de jantar, que obtinha uma mesa oval, uma pintura azul com arabesco dourados no meio, cadeiras de madeira maciça e uma bela e aconchegante lareira. Ela começou a organizar tudo com os pratos de porcelanas e talheres de prata. Aquele serviço era prazeroso para Emily porque gostava do serviço de mesa quando estava em casa.
Enquanto se aventurava nas dobraduras dos guardanapos, a porta da sala de janta se abriu e era Peter com toras de madeiras no ombros para acender a lareira. Ele riu ao entrar e fechou a porta por causa do frio.
— Como você não congelou aqui dentro? — ele perguntou para a jovem.
— Acho que me empolguei tanto com esse serviço que nem me atinei ao frio — ela declarou e assim que ele acendeu a lareira pode perceber o alívio. — Mas isso é muito melhor. — Os dois riram.
— O que está fazendo? — Peter se aproximou dela com curiosidade.
— Dobradura com os guardanapos? Veja, você prefere a coruja ou esquilo? — Ela mostrou para ele seu trabalho um lado tinha um pano azul e do outro branco.
Peter apertou os dentes.
— Receio ter que ofendê-la, mas para mim não parece com nenhum dos dois.
Emily franziu o cenho e cerrou as pálpebras, fazendo-se de extremamente magoada. Peter se sentiu mal.
— Emily, desculpe-me não foi a intenção...
Ela então soltou uma risada.
— Não seja tão sem humor, Peter! É claro que não parece com nenhum dos dois era somente para testar sua percepção. — Ela sorriu e ele a acompanhou.
Para a completa surpresa dos dois, a porta da sala foi aberta, encerrando o riso de ambos e o que Emily encontrou foi um alto e imponente homem diante deles.
— Por acaso, atrapalho? — A voz de Ian denunciou sua sequidão.
🍁
Divirto-me com esses dois!
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