CAPÍTULO 8
Minhas pernas tremiam.
Minha respiração parecia farpas que desciam por minha garganta até meus pulmões, o suor embaçava minha visão. Aquilo era muito próximo do verdadeiro inferno. Deveria ser mais fácil depois de tantas semanas, mas isso ainda exigia de mim mais do que meu corpo poderia aguentar.
Na parte leste do Complexo, havia um grande lago, e uma enorme floresta até ele. Aquele lugar era enorme, muito maior do que qualquer um poderia imaginar vendo de fora, o grande prédio que se estendia para o céu era apenas a ponta do iceberg.
Melissa havia me colocado com os iniciantes no tópico corrida quando cheguei, e todos os dias no final da tarde eu tinha que me juntar a eles para correr até o lago, que ficava a pelo menos cinco quilômetros de distância. No primeiro dia, fui um fracasso completo, eu simplesmente não conseguia fazer aquilo. Ainda assim, percorri todo o caminho até o lago e voltei carregando dois grandes baldes cheios.
A certa altura, em meio a meus tropeços na mata escura, com ambos os baldes cortando minhas mãos devido ao peso, eu chorei de ódio, frustração e pouquinho de desespero.
Demorou, demorou muito para me acostumar com aquilo, mas a cada dia eu podia sentir a melhora chegando por mais cansativo e duro que fosse.
— Vamos lá seus molengas! Preparem -se para correr! - Makenna gritou, o sotaque dela era puxado e difícil de entender.
Olhei para o céu, vendo as nuvens flutuando calmamente, e segurei firme o bastão em meus ombros, as faixas brancas em minhas mãos ajudando a não machuca-las. Algumas poucas pessoas saíram do lago para se juntar ao restante, todos se posicionaram, ambos os baldes rotineiros cheios aos seus lados. Esses baldes não serviam para absolutamente nada, porém todos carregavam eles como num ritual.
O céu já estava tingido de laranja com o pôr do sol se aproximando quando começamos a corrida de volta.
》《
Depois de ter voltado com os outros, cada um de nós se ocupou com seus próprios afazeres, eu segui para minha última penitência do dia. Encostei a testa no porta de ferro pesado, sentindo o frio do metal contra minha pele e respirei fundo.
Ela já me esperava no tatame com um sorriso largo e maldoso, me observou quando tirei os sapatos e enrolei as tiras de panos nas mãos de novo, tirando as anteriores sujas da corrida na floresta.
— Você parece péssima. - Melissa comentou casualmente. Caminhei até ficar em frente a ela, e firmei minha base de luta.
— Obrigada. - falei secamente. Alguns comentários apenas mereciam ser ignorados.
Ela apenas me observava esperando algum movimento. Os olhos de um cinza intenso brilhavam, eu não duvidava que ela sentisse um prazer enorme em me dá alguns socos.
Como ela não se moveu tive que agir, avancei com uma sequência de socos e chutes, e ela bloqueou a todos com facilidade. Com um movimento rápido ela agarrou meu pulso torcendo meu braço até que eu estivesse de joelhos, foi quando o primeiro golpe veio e eu pude sentir por toda a minha coluna retumbando em meus ossos.
Cai para frente sem fôlego, os pulmões pareciam apertados demais, porém mesmo assim me arrastei até meus joelhos me colocando de pé. Antes que eu estivesse equilibrada outro chute acertou minhas costelas me fazendo grunhir, os hematomas nunca chegavam a se curar por causa disso.
— Você é decepcionante. - Melissa falou com um suspiro obvio, ela se abaixou diante de mim, o rosto torcido numa carranca. — Acha que vai conseguir sobreviver desse jeito?
Mais zangada do que eu já estive em dias, encarei seu olhar cinza. Podia sentir minha própria boca apertada em frustração.
— Acho que você fala demais. - comentei e soquei seu queixo do canto em que eu estava mesmo, ela não esperava por isso e acabou caindo para trás. — E sua voz me irrita.
Ela gargalhou, me ergui franzido as sobrancelhas para a mulher diante de mim, seus olhos agora estavam cheios de diversão.
Foi aí que eu senti a lâmina que foi pressionada contra meu pescoço, me deixando extremamente consciente da pessoa atrás de mim.
— Realmente decepcionante. - foi o comentário feito pela voz masculina. Joguei o cotovelo para trás mirando no estômago mas ele segurou meu braço com facilidade e logo depois me girou.
Encarei outro par de olhos cinzas, a pele morena contrastava com os cabelos em um tom de loiro escuro, ele era realmente bonito de um jeito feroz.
— Precisa está sempre atenta aos arredores.
Eu podia não conhecer o padrão de luta dele, mas conhecia o de Melissa, por isso me joguei para frente sobre ele. Isso fez com que ele ficasse desequilibrado por um curto período, o suficiente para que eu desviasse do chute lateral de Melissa e me virasse para encarar a ambos.
— Ora, isso foi bom, mas não o bastante. - Melissa sorriu ainda mais e então realmente se soltou. Seus golpes eram precisos e certeiros, difíceis de defender ou desviar.
Agora que ela tinha uma companhia o trabalho se tornou ainda mais difícil. Parecia inútil tentar, mas o lado orgulhoso que habitava em mim não me permitiu reclamar ou resmungar nenhuma vez.
》《
A venda que cobria meus olhos era o objeto que teria todos os meus piores desejos por um longo tempo.
O mais novo estágio de treinamento que eu participava visava evoluir meus outros sentidos, segundo alguém que não era eu certamente.
Direita, esquerda, direita.
Pausa.
Esquerda, esquerda, direita.
Pausa.
Sequência de chutes.
Fiz uma careta irritada, me levantando novamente, continuar no chão significava desistir... e eu havia desistido de desistir a algum tempo, se é que isso fazia sentido.
Já tinha se passado alguns dias desde que conheci o irmão de Melissa e agora ele nos acompanhava nos treinamentos todas as noites, ele conseguia ser ainda pior do que Melissa, e me olhava de uma forma tão lasciva que me fazia sentir suja.
Como eu não podia ver, ouvir era a única opção que me restava, esse era o sentindo do treinamento mas por mais que eu me esforçasse, eu nunca conseguia prevê os movimentos dela.
Ouvi passos leves e então uma pausa, desviei dos dois primeiros socos, e segurei uma das suas mãos que ia diretamente para o meu rosto, a satisfação durou poucos minutos pois ela logo acertou outro golpe.
Agarrei meu estômago cambaleando para trás, se eu tinha decorado bem o padrão agora que eu estava vulnerável com uma grande abertura ela acertaria o golpe final. Aguardei, não podia ouvir nada então contei minhas respirações arfantes e cambaleei para a direita.
O som que veio a seguir foi muito satisfatório, caixas caindo sobre caixas e o resmungo irritado de Melissa acompanhado pela risada de Gustavo.
— Isso foi muito bom! Nunca vi Mel errar um chute desses! - a garota rosnou para ele.
Tirei a venda, e rapidamente afastei os fios de cabelo que caiam sobre meu rosto.
— Desculpe! - ele falou ainda risonho para uma Melissa irritada.
Ela agitou as mãos, fazendo pouco caso do pedido dele, então caminhou para a mesa de armas pegando algumas coisas nela.
— Você está indo bem - ele falou estendendo uma mão para mim, aceitei saindo do tatame e descendo os poucos degraus até estar de frente para ele.
Uma tosse forçada me fez virar a cabeça rápido demais, Melissa estava parada, os braços cruzados enquanto nos observava. Seus olhos, pareciam duas facas de gelo para nós.
— Daniel está esperando por ela. - ela falou, balançando o queixo para Gustavo milimetricamente, então nos deu as costas de novo.
— Esqueça, já estou aqui. - Daniel falou, ele era irmão de Melissa, olhando para ambos com calma você podia ver as semelhanças facilmente.
— O quê você precisa? - perguntei, mesmo não querendo saber a resposta.
— Você não pode mais ficar aqui.
Foi Melissa quem falou, sua voz tão tranquila que era inquietante.
— O quê?
Não sei o que me causou surpresa, na verdade deveria me sentir aliviada.
— Você irá para um novo lugar em algumas semanas. - Daniel falou, seu tom de voz não dava abertura para questionamentos.
— Não se preocupe Emma. - Gustavo segurou minha mão outra vez, apertando meus dedos. — Você vai gostar bem mais do novo lugar.
— Uma parte minha esta curiosa com o motivo da minha realocação... - falei.
E era verdade, queria mais do que qualquer outra coisa entender os porquês por trás da minha estadia ali e da minha partida. Era um favor que estavam fazendo ao Gustavo? Ou tinha algo a mais que eu não conseguia ver? E por que Gustavo estava se dando esse trabalho por alguém que sequer conhecia?
Daniel nos interrompeu, as mãos enterradas nos bolsos da calça negra que usava, os olhos cinzas estavam duros.
— Não importa onde seja, você precisa está preparada para qualquer coisa. - foi tudo o que ele disse antes de se virar.
Balancei minha própria cabeça tentando assimilar as informações, e para minha surpresa Daniel falou antes de fechar a porta da sala de treino atrás de si.
— Você irá à Londres.
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top