14 Anos

— Como isso aconteceu?

— Depois aquela questão do orfanato, certo dia mãe Fernanda trouxe uma menina para passar o fim de semana conosco. Gostei, claro. Teria alguém para brincar e por ser mais nova do que eu, meu instinto protetor ficou aguçado.

— Agiam como irmãs mesmo?

— Sim, no começo dividimos o quarto, brincávamos, fofocávamos e tudo mais.

— Quando se sentiu deixada de lado?

— Uma noite, eu estava arrumando meu quarto e quando finalizei, fui no quarto da mãe e as duas estavam abraçadas, deitadas na cama. Perguntei se poderia me juntar a elas.

— Qual foi a resposta?

— Mãe Fernanda disse que não tinha espaço e a garota ao lado dela estava com um sorrisinho debochado no rosto. Talvez eu tenha visto demais ou interpretado errado, porém me senti mal, elas nem se moveram para saber se me cabia mesmo.

— Algo mais parecido aconteceu?

— Sim. Em um fim de semana, eu e Jaqueline, esse é o nome da menina, estávamos limpando a casa e quando nossa mãe chegou, estava com um pacote e me entregou. Quando abri, era um pijama, alguém tinha pedido para ela me dar mas só soube desse detalhe depois que a abracei e ela me empurrou. Na emoção, tentei abraça-la e ela disse: me solta, não quero abraço", no mesmo instante fiquei sem reação.

— Simplesmente te empurrou?

— Exato, não sabia se tinha feito algo de errado, não que me lembre. Estava limpando a casa quando ela apareceu, porém ela se afastou e ficou de cara fechada.

— E quanto a outra menina? Como foi evoluindo a relação de vocês?

— Como a casa era grande, logo foi desocupado outro quarto e ela saiu do meu. Isso e outras detalhes acabou nos deixando em meio a uma rivalidade, situações de irmãos mesmo. Dividíamos o serviço da casa.

— Como estavam seus hobbies?

— Nessa idade era apaixonada na banda One Direction e através deles comecei a escrever nos cadernos, diários, uma forma de desabafar o que já não conversava mais com minha mãe. Ignorar algumas coisas dolorosas e ficar no mundo da lua, enquanto que Jaqueline era do mundo sertanejo. Ah e as paredes do meu quarto começaram a ficar cheias de pôsteres de cantores internacionais.

— A louca do pôster?

— Com certeza, ainda conversava com eles e xingava quando caiam de noite.

— Seguiu seus gostos pelo caminha da música?

— Sim, foi involuntário, quando percebi minha mente se concentrava mais em músicas do que em outras coisas. Além do que as músicas e frases motivacionais estavam sendo os detalhes positivos, um hobby que me fazia rir e dançar no quarto.

— E quanto sua relação com a Fernanda?

— Aos poucos foi esfriando. Aquela cortada que ela me deu foi muito marcante e não conseguia mais ter uma "relação aberta" com ela. Contar coisas, pedir conselhos ou qualquer outra coisa de mãe e filha, comecei a confiar mais nas amizades.

— Tinha muitas amigas?

— Quando estava no ensino fundamental não tinha o que desabafar, era tudo sobre música, livros, bandas, churrasco da turma, trabalhos. Só que também aos poucos fui sendo privada de muitas coisas. Quando precisava fazer um trabalho, teria que ser em casa, hora exata para sair e para voltar, os outros podiam ir na casa de alguém para tomar teres e eu não. Se ia alguma das meninas em casa, ela ficava de cara fechada e todos tinham medo da cara de brava dela. Então foi uma época de muita restrição.

— Economicamente a família também não estava bem?

— No período que vô Carlos estava hospitalizado, tio Carlinhos foi demitido. Ele e Fernanda abriram um escritório de construção.

— Onde era esse escritório?

— Na minha casa, como ela era muito grande, foi dividida em duas partes. Dois banheiros, quatro quartos de um lado. Salas, um banheiro e cozinha para o outro.

— Não deve ter sido legal.

— Não mesmo, para ir na cozinha teria que passar pela metade do escritório, se deixasse algo na geladeira, a secretaria comia, se eu ficasse por ali, tio Carlinhos brigava.

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