Capítulo 1

"Somos insignificantes. Por mais que você programe sua vida, a qualquer momento tudo pode mudar." - Ayrton Senna

Silverstone — Reino Unido — Classificatória

Foi dada a largada.

Acho que todos os pilotos, quando vêem que as luzes vermelhas se apagam,desligam-se do mundo externo e tentam dar tudo de si. Quando estamos em alta velocidade e a adrenalina já tomou conta de cada célula existente no nosso corpo, nada mais importa. E acredito que todos nós tenhamos nosso próprio ritual. Eu sempre reservo uns minutos antes e ouço uma música que me acalma e peço em oração para que eu finalize a corrida, com vida. Não que eu seja religioso ou algo desse tipo, mas é bom ter fé que alguma força maior do que somente a minha esteja comigo.

Depois do fiasco que foi o último GP, estava começando a acreditar que talvez uma maré de má sorte tivesse me alcançado e nesta pista eu sempre sinto uma inquietação anormal. Eu fiquei irritado com tudo o que estava acontecendo. Nos treinos livres, fui obrigado a sair da corrida por problemas técnicos no carro. Nos classificatórios, o Smith me fechou e tudo foi para os ares. E na classificação, recebi uma punição de 10 segundos e me desestabilizei.

Tento dizer a mim mesmo que está tudo bem e que nem sempre tudo ocorre da forma como queremos que seja. Mas a pressão de ser um piloto da Scuderia Galaretto é muito grande, e de certa forma, a sua equipe e fãs, esperam que o mínimo que você faça é ganhar a corrida. E mesmo saindo em oitava posição, esforcei-me chegando à terceira e tentei manter, atrás do Stevens que, convenhamos, chegou à sua posição por alguma ajuda divina, já que sua equipe o deixou com o pior carro da equipe. Faltando apenas umas quatro voltas para finalmente vermos a tão esperada bandeira quadriculada, Smith perdeu o controle do seu carro, perdendo sua posição. E eu fui para primeira posição, assim que Stevens foi aos boxes.

—Matteo , agora é só manter — Giuseppe, o diretor da equipe, dizia do outro lado do rádio. — Vamos lá!

Eu acelerei um pouco mais para que aumentasse ao menos uns cinco segundos de distância entre mim e os outros pilotos que também tentavam me ultrapassar.

E ao passar pela linha de chegada em primeiro lugar, pude finalmente respirar. Quando recebemos o primeiro lugar ou ao menos podemos subir no pódio, nada além disso importa.

Grazie! — praticamente gritei no rádio — fizemos um bom trabalho, vocês são demais, Scuderia Galaretto — agradeci, pois sabia que não tinha trabalhado sozinho, havia muito suor e dedicação de muitas pessoas nessa vitória. Ao parar o carro, lembrei de agradecer por estar com vida e em especial nesta pista.

É incrível que toda vez que eu subo no pódio, ainda sinto como se fosse a primeira vez. A vitória sempre tem um gosto e experiência maravilhosa e desde do início, o que me incomoda é o que vem depois. Entrevistas e todas as obrigações que eu preferia não ter, sempre me incomodaram bastante.

— Responda só o necessário e não leve em consideração as perguntas infundadas — Calloways disse, enquanto íamos em direção a mais uma entrevista — Boa sorte e depois precisamos repassar sua agenda de amanhã. Ok? — disse, antes de me jogar na cova dos leões.

— Não me deixe — coloquei minha mão no peito e praticamente supliquei.

— Não seja dramático — bateu no meu ombro e fui consumido por um turbilhão de perguntas.

Eu tinha adquirido uma certa aversão às coletivas de imprensa desde o término do meu último relacionamento. Nunca me importei em dar respostas sobre minha vida pessoal, mas depois de um episódio que resultou um caos, eu e toda minha gestão, decidimos apenas ignorar algumas perguntas e às vezes responder algumas. Mas nada relacionado a relacionamentos amorosos tem sido cada vez mais difícil, sou sempre pego em situações as quais eu nem deveria me submeter a estar nelas.

— Lembre-se, só responda o essencial. E se achar que talvez não estejam invadindo seu espaço, pode ir em frente. Não faça nenhuma demonstração de sentimentos em frente às câmeras e tudo vai dar certo! — Gabe repassou tudo comigo antes que eu entrasse no meio de todos os jornalistas sedentos por informações e para quem divulgaria algum furo primeiro.

— Boa noite — tentei passar por todos sem me sentir violado com todos esses flashes e pessoas desesperadas por uma declaração e fiquei ao lado do meu colega de equipe.

— Acha que hoje eles vão pegar leve? — Stevens me deu uma cotovelada.

— Seria um milagre — debochei e meu colega riu.

— Stevens , como se sente em ter terminado a corrida em uma posição tão distante do Giordano? — alguém em meio à multidão perguntou. Em todas essas entrevistas tem sempre alguém perguntando algo na tentativa de abalar a nossa parceria.

— Acredito que estamos aqui por um só objetivo. Fico muito feliz que ele tenha alcançado um lugar no pódio na corrida de hoje e espero que na próxima, possamos estar os dois — Stevens respondeu calmamente como fazia normalmente. Sempre tivemos uma boa relação dentro e fora das pistas, o que certamente causa uma certa inveja nas pessoas que gostam de ter o caos instalado por onde passam.

— Andrea, como é chegar ao pódio depois de uma maré de corridas ruins? — Um cara baixinho e que parecia estar ali pra cumprir seu horário perguntou.

— Chegar no pódio foi e sempre será maravilhoso. Chegar em primeiro lugar me dá a sensação de dever cumprido, sou grato por trabalhar com a Scuderia Galaretto , e ganhar demonstra que todos nós fizemos um bom— respondi, e após isso começaram a perguntar sobre o nosso futuro na Scuderia Galaretto , já que meu contrato vence no final da temporada. E mesmo com bons resultados, ainda não havia recebido proposta alguma.

— Aqui — uma mulher loira de cabelos cacheados se destacou diante de tantos homens que ali estavam e eu sabia que já tinha visto aquele rosto em algum lugar. — Matteo, sua performances ruins estão relacionadas com o estilo de vida ao qual você vive? Você ainda não recebeu uma proposta pra próxima temporada, pelos mesmos motivos? — Senti meu sangue ferver e minha vontade era abandonar a coletiva e deixar que saísse uma matéria de como eu era mal educado com toda a imprensa.

Mas, sobretudo, sua pergunta talvez tivesse uma pontinha de verdade, uma que eu não queria aceitar. Qual equipe bem renomada ficaria com um piloto que pudesse manchar a imagem da empresa? Talvez não valesse a pena ter um cara com bons resultados e com a vida toda bagunçada.

— Não posso afirmar nada! Mas saibam que tudo o que vocês vêem por aqui dentro do Paddock, não é nem a metade do que acontece na realidade, e talvez estejamos em negociações que não foram divulgadas — soou um pouco mais ríspido que eu gostaria, mas também quer se importava — Terminamos aqui? — perguntei, já me levantando da cadeira. Sei que talvez Gabe peça minha cabeça numa bandeja, mas não dá pra suportar esse tipo de coisa.

Após o fiasco da coletiva de imprensa, eu me desloquei até o motorhome. Organizei todas as minhas coisas, conversei com algumas pessoas que estavam ali e peguei meu celular, que estranhamente não tinha nenhuma notificação de nenhuma rede social e fui em direção a saída. Quase todos já haviam ido embora e mesmo sendo fora de época caía uma chuva um tanto quanto fina, eu estava um pouco despercebido quando trombei com ela e derrubei as coisas dela todas na poça de água.

— Me desculpe... Estava despercebido — nem me atentei em quem estava ali, abaixando para apanhar os equipamentos que pareciam ensopados.

— Tudo bem... — ela disse, e assim que me levantei me dei conta de quem era.

— VOCÊ? — o meu estado de humor se transformou. Não era possível que ela iria me perseguir agora — NÃO ACREDITO! — disse, bravo — Está me perseguindo? — perguntei e devolvi a ela seus pertences.

— Não! — disse, um pouco alterada. Além de estar me perseguindo, ela ainda está bravinha — Nem tudo gira ao seu redor, Matteo. Às vezes as pessoas só estão tentando manter o emprego — disse, pegou suas coisas e saiu. Foi aí que me dei conta que eu não tinha pego todos os pertences dela, o celular ainda estava no chão. 

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