Capítulo 09

Você esteve lutando contra a memória, por conta própria

Nada piora, nada melhora

Eu sei como é ficar sozinho na chuva

Todos nós precisamos de alguém que fique — Vancouver Sleep Clinic

Sinto as lágrimas dele tocarem minha pele e seu suspiro mostra que ele está aliviado. Tento não demonstrar o quanto estou chocada com a sua história e me pergunto o quanto uma pessoa pode suportar na vida?

O quanto de dor nosso corpo e mente aguentam sem entrar em um eterno colapso?

— Desculpa — o moreno pede ao separar nossos corpos e limpar suas lágrimas — Talvez tenha sido um pouco demais.

— Não tem que pedir desculpa — falo, e tento encontrar um pouco das palavras.

— Eu sei que é muito para aguentar e muito para guardar. Mas eu te peço que não comente nada com ninguém — respira fundo — por enquanto.

— Matteo, eu agradeço que tenha confiado em mim o seu segredo — pego suas mãos que ainda tremem e gélidas — confesso que estou um pouco surpresa com tudo o que me contou e também sei que foi muita coisa para aguentar. E guardar tudo isso por esses anos só piora tudo ai dentro. A dor de perder um amor e um filho, são inimagináveis para mim e pode contar comigo para um ombro, um desabafo e tudo o que precisar.

Seus olhos claros encontram os meus e transmitem alívio. Os olhos que pareciam sempre cansados, estão aliviados.

— Saiba que tem em mim — talvez fosse um pouco difícil dizer isso pra ele — uma amiga. E que pode contar comigo e que seu segredo está seguro comigo. Mas...

Talvez eu devesse ser um pouco mais humana e eu deveria falar um pouco mais sobre tudo, mas a realidade é que eu não era a única a saber do segredo dele.

— Você não é a única que sabe — disse, e limpou seu rosto.

— Sim... Eu não deveria jamais te contar isso, mas eu vou — suspiro antes de soltar a bomba em cima dele — É só questão de tempo antes que o meu superior descubra tudo e uma parte da história ele já tem.

E de repente, todo o esforço que eu fiz para convencer minha família de que eu sou boa para esse trabalho se tornou pó e incerteza tomou conta de mim. Como eu poderia crescer em uma carreira fazendo esse tipo de jornalismo?

— O importante é continuar respirando, é isso que dizem? — como se fôssemos íntimos ele fez carinho na minha mão.

— É importante respirar e junto com isso viver — disse, encostando minha cabeça em seu ombro.

Estranhamente me senti em casa num abraço ao qual eu deveria consolar, se tornou um abrigo. Olhando toda a evolução da nossa relação nestes dias em que passamos juntos, percebi que ele não era o que nós pensávamos. Matteo Giordano é o típico cara por quem eu claramente me apaixonaria e provavelmente iria cantar no banho "Enchanted" da Taylor Swift pensando nele.

— Está se sentindo leve? — perguntei.

— Sim... Como há muito tempo não sentia — ficamos mais um tempinho quietinhos até que fomos avisados de que nosso passeio tinha acabado.

— Agora o pagamento do meu sequestro — estendi minha mão.

— O que? — perguntou, e arqueou sua sobrancelha pra mim.

— A chave do carro. Eu dirijo — continuei com minha mão estendida e ele mesmo relutando tirou a chave do bolso.

— Por favor, não quebre meu carro — colocou as duas mãos juntas como se estivesse orando — e eu escolhi a música.

E eu quase perguntei para a produção da minha vida se era uma piada com a minha cara quando a playlist dele começou tocar no aleatório e a primeira música era da Taylor.

— Você escuta Taylor Swift? — zombei.

— Não... A Mia que usou meu carro de novo. Certeza — ele negou, mas também não trocou a música.

Eu senti meu brilho sumindo no instante em que chegamos na casa da família Giordano e minha mãe estava dando tchauzinho para nós como se fosse o Mickey no portão da Disney.

— O que ela está fazendo aqui? Não! — disse, irritada.

— O que? — Matteo me olha, um pouco surpreso e para o carro.

Alguns podem olhar pra mim e dizer que não sou grata pela família que tenho. Não é isso. Mas nossa relação é um tanto complicada. Não da família.

Somente eu e minha mãe.

— Este lugar está prestes a explodir — comentei, tentando me acalmar.

— Quem é?

— Minha mãe — revirei os olhos.

— Nossa... Ela é tão má assim? — tentou brincar.

— Imagina — disse, debochada.

É sempre assim quando ela quer algo e eu não quero. O meu prazo de "prestar" contas a ela sobre minha carreira estava acabando e com certeza ela queria ter certeza sobre tudo o que está acontecendo na minha vida, ela surtou quando eu disse que viajaria com um piloto.

— Ela é tipo a Cruella? — Infeliz.

— Quase isso. Até acho que elas são parentes? Você acredita? — disse, retirando o meu cinto.

— Teve a quem puxar então — me deu uma leve cotovelada — Vamos lá, Ursinha.

— Oi mamãe — disse, um pouco impaciente — Como me encontrou? — arranquei o curativo logo de uma vez.

— Nem vai dizer que sentiu minha falta? — me abraçou — Por qual motivo não respondeu às minhas mensagens? — cochichou no meu ouvido.

— Olá, Senhora Proenza — o moreno a cumprimentou.

— Pode me chamar de Angela, sou nova demais para ser chamada de senhora — e o coitado ficou um pouco sem graça.

Dava vontade de dar risada, uma senhora com quase 50 anos não queria esse título. Uma palhaçada.

— Sua mãe veio nos contemplar com a visita dela — Mia disse, se juntando a nós — Já trocamos figurinha sobre modelitos e tudo.

Tudo o que minha mãe queria: uma filha que mostrasse interesse pela moda e fizesse a mesma coisa que ela.

— Venham, vamos se juntar próximo a piscina aberta? — a irmã dele convidou, toda animada.

— Você foi de zero a cem em segundos. Quer contar alguma coisa? — o intrometido tentou arrancar algo de mim.

É claro que eu estaria mal humorada, a maior causadora de todos os meus traumas e a pessoa que mais me perseguia, estava aqui perto de mim novamente. A muralha é só para quando ela não está por perto.

Quando o assunto é relacionado a nós duas, sempre volto a ser a adolescente com transtornos alimentares. 

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