Capítulo 10 - Deveria ir

Disclaimer: Todos os personagens pertencem a JK Rowling. Esta fanfic é uma tradução autorizada de "Falsas Apariencias" postada em 2007 no FanFiction por Sisa Lupin.

Capítulo 10 - Deveria ir.

Passos compassados iam e vinham do outro lado de sua parede. Cada vez mais consciente de que seu vizinho não conseguia pregar os olhos, Tonks incorporou-se sobre sua cama enquanto continuava escutando aquele ruído que não cessava.

Depois colheu o seu travesseiro, o pôs sobre sua cabeça e o pressionou com força contra si. Deixou-se cair outra vez sobre o seu leito, desesperada. Entre o tecido almofadado, viu a hora no relógio de mesa que descansava ao seu lado, já passava da meia-noite. Se continuasse assim, em algumas horas teria que levantar e voltar ao trabalho sem ter descansado nada. Ainda mais irritada, tentou calar sua vontade de gritar pela parede, mas decidiu que era mais sensato aproximar-se do quarto ao lado e perguntar ao seu companheiro se podia se enfiar na cama para deixá-la dormir ou se preferia que lhe lançasse um petrificus totalus.

Depois de jogar as cobertas de lado, deixou os seus pés descalços caírem sobre o piso frio. Algumas horas antes, tinha aberto sua mala para pegar uma blusa das Esquisitonas e bermudas que servissem de pijama, mas tinha esquecido os seus chinelos e isso a deixou de pior humor. Murmurando, com o cabelo despenteado e bocejando, deteve-se diante da porta do lobisomem. Seu primo teve a genial ideia de lhe dar o quarto ao lado do dele, sendo que os três andares da casa estavam cheios de camas vazias, e sabia que isso não tinha sido por coincidência.

Sem pensar muito, abriu a porta e, ainda sonolenta, observou a silhueta do lobisomem de pé ao lado da janela. Estava observando o céu, logo caminhou até a estante e de novo até a janela. Não tinha percebido a sua presença e parecia perturbado sob a luz da vela que tinha sobre a sua escrivaninha.

Quando finalmente a viu, seu coração deu um salto e se deteve no mesmo instante.

— Posso saber por que você não para quieto? — ela perguntou inesperadamente e esfregou os olhos com uma mão — Li que os lobisomens são noturnos, mas também silenciosos!

Remus continuava observando-a surpreso. Estava tão concentrado em seus pensamentos que tinha esquecido de silenciar o quarto, mesmo que, sinceramente, não esperasse que Tonks fosse ser sua vizinha. Sem dúvida, Sirius tinha algo a ver com isso. Mas, principalmente, estava distraído com aquela cor de cabelo. Pelo que se lembrava, já tinha visto todas as cores, menos aquela.

Depois de um silêncio, que ela considerou muito longo, a jovem bufou visivelmente irritada, fechou a porta e aproximou-se para continuar brigando. Então percebeu um reflexo ao seu lado e, por um segundo, assustou-se com aquela imagem. Só era um espelho de pé que tinha sobre uma das portas de um armário antigo, ao lado de uma cama alta e igualmente senhorial, mas a jovem que se refletia nela se parecia com outra pessoa. No começo, não se reconheceu, apesar de ser a sua verdadeira aparência, e deu alguns passos para trás.

Sentindo-se estúpida por se assustar com sua própria imagem, Tonks abaixou o olhar e pensou que devia sair dali o mais rápido possível.

— Se não vai dormir, vou tentar isolar o meu quarto — disse sem levantar o olhar do tapete. Sabia o que pensava ao vê-la sem nenhuma cor que distraísse sua atenção, e não queria descobrir os seus sentimentos a respeito.

Deu a volta com a intenção de ir embora, mas Remus pôs sua mão sobre a porta para impedi-la. Nem mesmo tinha o escutado se aproximar, e agora estava tão próxima que notava sua respiração, quente e pausada, sobre seu rosto.

— Não se parece com ela, se é o que pensa.

Seus olhos se iluminaram sob a débil luz do quarto. Como podia adivinhar o que estava pensando? Talvez não era tão boa oclumente quanto imaginava.

Remus observou de perto seu nariz pequeno e arrebitado, seu rosto em formato de coração, seus lábios carnudos e uma pequena pinta do lado de sua boca que, quando a beijou horas atrás, não estava ali, mas o que mais chamou sua atenção era aquele cabelo escuro como a noite e bagunçado pelo sono.

— Não é verdade — disse e engoliu em seco para evitar a profundidade de seu olhar. Depois, continuou com a voz baixa — Somos idênticas.

Era inegável. Afinal de contas, era a irmã de sua mãe e compartilhavam metade dos genes. Agora que Remus pensava, até aquele momento não tinha percebido o quão enraizado em seu sangue estava o sobrenome Black, aquela descendência relacionada às artes das trevas, era para muitos uma maldição. Sirius sempre tinha renegado suas origens, sua prima Andrômeda também e agora, escondida entre mil cores, Nymphadora.

Parecia impossível que aquela mulher sem sentimentos fosse sua tia. E Narcissa, esposa de Lucius Malfoy que, mesmo que escondesse, continuava sendo tão seguidora do Lorde das Trevas quanto a irmã, e seu filho, Draco, ia pelo mesmo caminho. Remus tinha sido seu professor, conhecia bem as suas aspirações.

— Claro que não — a contradisse. A jovem captou um vislumbre do passado em seu olhar. Depois de alguns segundos, continuou — Bellatrix é malvada e cruel. A única coisa que a mantém com vida é seu desejo de torturar a quem considera inferiores a ela — enfatizou com certa exasperação. Depois, seu semblante se tornou mais amável — Seus olhos têm a mesma cor, mas refletem bondade, Tonks.

Por um instante, ficou muda e confusa. Que não pensasse que ela era tão parecida com Bellatrix era o maior elogio que tinha recebido em toda a sua vida, mas eram tão diferentes? As duas compartilhavam o mesmo sangue, a mesma marca negra em seu braço.

— Como pode ter tanta certeza? — perguntou com um fio de voz.

Ele engoliu em seco antes de responder. Estava com a garganta seca.

— Me torturou há alguns anos. Queria informações sobre a Ordem, mas me recusei a dar. Teria perdido o juízo se James não tivesse chegado a tempo... — refletiu. Depois de uma pausa, voltou a respondê-la — Como vê, eu a conheço bem, por isso sei que não é como ela — salientou com um sorriso de lado.

A surpresa da jovem era evidente. Não queria nem imaginar a cena, mas não podia evitar pensar em uma réplica de si mesma, encolerizada e sem sentimentos, torturando ao lobisomem.

Um estremecimento percorreu sua coluna.

— Eu sinto muito — lhe disse. Agora, mais do que nunca, se envergonhava de sua fraqueza e daquele olhar compassivo — Significa muito para mim, sério. Me sinto mal por ter invadido o seu quarto querendo te dar uma bronca, sem pensar que pudesse estar nervoso por alguma coisa... Só espero que não seja culpa minha, outra vez.

Quase não podia respirar, mas se obrigou a sustentar o seu olhar e ser sincero.

— Em parte — sussurrou — Na verdade, não paro de dar voltas em uma coisa — as palavras ficaram presas na garganta e Tonks parecia cada vez mais preocupada — É sobre o que disse no jantar.

"Ah, isso", ela pensou meio aliviada. Supunha que para ele era inconveniente que a garota que gostasse não tivesse muita experiência na cama. Não sabia muito bem que atitude demonstrar diante dele a respeito desse assunto, e parecia que ele também não.

— Eu não pedi nada, Remus — disse em voz baixa — É claro que nos sentimos atraídos um pelo outro, julgando o que aconteceu hoje de tarde lá embaixo — acrescentou e pôs algumas mechas de cabelo atrás da orelha antes de continuar — Também não seria o primeiro, alguns estiveram perto, mas depois cansaram e foram embora mais rápidos do que uma Firebolt.

Tonks interrompeu seu diálogo por um instante, o suficiente para ver seu olhar preocupado, carregado de contradições.

— Mas não acho que você faria isso — disse.

Lentamente, Remus deixou cair a mão que tinha sobre a porta. Queria dizer algo, mas no final negou com a cabeça e lhe deu as costas.

— Talvez eu seja como eles, você mal me conhece — retrucou.

A mulher notava o seu incômodo em seus gestos, mas isso não lhe atormentou.

— Quando eu te vejo, não vejo alguém que poderia me machucar, e sim uma pessoa que sofre muito. Sinto muito que tenham te magoado, Remus, que tenha que ser algo que odeia, mas principalmente que tente se esconder. Não vê como isso está se matando?

— Não sabe do que está falando — sussurrou com os dentes apertados. Continuava de costas e parado, olhava para mais longe da janela, em direção à lua que se destacava na noite.

— Por que tem essa ideia tão terrível de si mesmo? — acrescentou. Sabia bem o que passava por sua cabeça e odiava que pensasse desse jeito.

— É um fato. Eu sou um monstro, Tonks, e desde que deixei o meu cargo em Hogwarts, todos sabem...

— Então estão todos errados!

Suas palavras a enfureciam. Remus virou-se e viu que seu cabelo estava vermelho pela raiva. Depois de uma pausa, a contra atacou.

— Tem algo dentro de mim que não é certo — confessou com as mãos nos bolsos e o olhar perdido — Algo que acorda e me arranha por dentro.

Ela relaxou o seu cenho franzido. Sabia que os lobisomens sempre costumavam escutar o animal dentro de si, mas Tonks acreditava conhecê-lo suficientemente bem para saber que não era essa a sua situação.

— Continua pensando que não sou um monstro? — ele continuou, interrompendo seus pensamentos. Seu silêncio parecia lhe dar razão.

Tonks levantou o olhar, decidida e arrogante.

— É claro — Remus ficou perplexo — Se fosse um monstro, não tentaria se controlar. Só deixaria que essa coisa te dominasse e destruísse tudo pelo que se importa, mas é mais forte do que ele. O lobo só existe na sua cabeça, Remus. Não é real. O que é real é isso — ela pousou sua mão sobre o lado esquerdo de seu peito — Sente? Aqui é onde realmente está — sentiu os batimentos de seu coração.

Remus a observou, temendo que ela sentisse o quão acelerado eram os seus batimentos. Não era a primeira vez que lhe dizia algo assim, mas era a única que lhe fazia sentir que aquilo era certo. Sentiu os olhos marejarem. Em um reflexo, manteve a mão dela entre as suas mãos. Seria tão fácil dizer o que estava sentindo, mas não o fez, não porque ela o afastaria, mas justamente porque não o faria.

— É tarde — murmurou e, em seguida, a afastou sem conseguir olhá-la mais — Deveria ir — disse. Tinha se apoiado contra a escrivaninha, esperando que ela fosse até a porta e o deixasse a sós, como esteve antes que ela entrasse em sua vida.

Mas Tonks não estava disposta a obedecê-lo, não ia embora. Em dois passos, foi até a cama e enfiou-se debaixo das cobertas, sem lhe dar tempo de protestar. Enquanto isso, ele a olhava alarmado.

— O que está fazendo?

— Vou te mostrar que realmente consegue controlar os seus "instintos animais" — sorriu — Além do mais, não quero que volte a me acordar — provocou. Depois levantou uma sobrancelha — Vai vir ou vai ficar aí plantado pelo resto da noite?

— Claro. Quero dizer, não! — cada vez mais se atrapalhava. Então suspirou, tentando respirar fundo antes que acabasse desmaiado — Isso é mesmo necessário, Tonks? — perguntou, impotente.

Ela assentiu sem parar de sorrir. Remus engoliu em seco.

— Que lado prefere? — ela insistiu.

O lobisomem hesitou e então soltou um longo suspiro antes de responder.

— Acho que o da janela.

"Aí eu posso me jogar, se alguma coisa der errado", disse a si mesmo.

Como resposta, ela moveu-se para o lado. Remus avançou com a respiração agitada até a cama. Depois de um momento de indecisão, recostou-se sobre o colchão, mas as gargalhadas de Tonks fizeram com que virasse a cabeça até ela, interrogativo.

— Vai dormir vestido e de sapatos? — perguntou com o cabelo em um resplandecente rosa chiclete.

O lobisomem olhou-se de cima a baixo. Por que não?

— Tem razão — cedeu, relutante.

Enquanto se erguia, e ia desamarrando os cadarços dos sapatos, Tonks foi fundindo para baixo. Tinha os olhos bem abertos para não perder nada.

Mordeu o lábio inferior quando ele tirou a camisa e descobriu os músculos de suas costas. Em seguida, o lobisomem se levantou e, fechando os olhos com força, se desfez de seu cinto.

Por sua vez, Tonks arregalou os olhos. Para quê negar, Remus Lupin tinha uma bunda que Avada Kedrava...

Remus virou-se a tempo de ver Tonks coberta até o pescoço com o rosto ligeiramente corado e o olhar aceso. Decidiu se esconder sob as cobertas logo, pelo que poderia acontecer se continuasse olhando-o daquele jeito. Além do mais, não queria que descobrisse a cicatriz que tinha embaixo por culpa do ataque de certo lobisomem.

Alguns minutos depois, ambos olhavam para o teto cheio de manchas uniformes de umidade em silêncio, cada um no canto mais afastado do meio e com os olhos bem abertos pela insônia. Depois de um tempo, ela aproximou-se e fez um lugar para si ao lado dele.

Remus ficou surpreso pela proximidade. Ainda não tinha muita certeza sobre o seu autocontrole... e mesmo assim, ergueu seu braço esquerdo para que pudesse se acomodar no espaço do seu ombro. Depois que ela passasse um braço pelo seu peitoral, ele a acomodou.

A metamorfomaga fechou os olhos quando sentiu seu abraço aconchegante. O lobisomem pousou a cabeça contra a sua. Cheirava a flores silvestres e algumas mechas se enrolavam nos pelos da sua barba rala. Teria se barbeado se soubesse que ela passaria a noite ao seu lado.

— Melhor? — perguntou a jovem.

Realmente, não podia se imaginar em um lugar mais agradável do que aquele, mas não lhe disse isso. Tonks não esperou nenhuma resposta, tentou se acomodar melhor e, quando encontrou a postura certa, o abraçou com maior intensidade. Estava frio na casa meio abandonada e o lobisomem tinha uma temperatura corporal mais quente que a sua.

Perguntou-se como seria abraçá-lo no inverno, mas era inútil imaginar. Isso nunca aconteceria. De fato, nem sequer deveria estar acontecendo, mas por nada no mundo lhe teria deixado sozinho naquela noite, sabendo o que pensava sobre si mesmo.

Fechou os olhos, sentindo como o sono a vencia, ao notar a respiração ritmada do lobisomem sob o seu corpo. Logo, chegou a sonolência. Ao seu lado, o lobisomem traçava círculos com a ponta de seus dedos e acabou adormecida em seus braços.

Já Remus não precisou certificar-se de que ela tinha acabado de cair no sono. Todo o seu corpo mostrava isso. Deixou então de acariciar a sua pele para se concentrar em suas mechas rosadas, de uma cor extremamente viva. Brincou com elas entre seus dedos, amava a textura e seu brilho.

Tonks emitiu uma queixa em sonhos quando ele parou. O lobisomem, divertido, voltou a prestar atenção e logo se acalmou.

Então, virou a cabeça para ver as estrelas através de sua janela. Na noite anterior, teria pensado que seria impossível que essa cena estivesse acontecendo em Grimmauld Place, número 12. Pensou que Tonks nunca voltaria a falar como antes, que jamais voltariam a rir juntos de novo, que nunca poderia olhá-la nos olhos sem sentir a sua recusa, e agora... estava ali, sobre o seu tronco. Podia sentir o seu hálito quente no pescoço, as batidas de seu coração contra o seu e os movimentos de sua respiração.

Por um momento, as lágrimas surgiram em seus olhos e embaçaram a visão da lua que brilhava na escuridão.

Era verdade o que ela dizia? Era verdade que não era tão mau quanto pensava? Queria que fosse assim, desejava mais do que nada no mundo, mas duvidava. Ela pensava que não era um monstro, que esse lobo que rugia no seu interior não o controlava. Mesmo assim, o temia. Não tinha nada que lhe causasse mais pavor do que aquela criatura poder acordar naquele momento e lhe machucar. Mas seu coração o dizia o contrário: jamais poderia machucá-la, gostava muito dela para isso.

Passaram as horas e ele parecia imperturbável à mudança do tempo. Não queria que aquela noite acabasse nunca, mesmo sabendo que logo amanheceria e, sentindo como o sono finalmente o vencia, moveu com cuidado a cabeça para o lado e depositou um beijo em sua testa.

Um sorriso surgiu nos lábios dela, mas o lobisomem já estava adormecido para perceber.

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