Yesod - II
A garotinha corria assustada pelo corredor escuro cujo chão de madeira rangia. Fugia de uma criatura estranha, sombria como um vulto, ágil e flexível, mas principalmente medonha. Ela chegava ao fim do corredor onde havia uma porta que tentava abrir sem sucesso, e ao ver a criatura se aproximar, fechou os olhos e Gritou assustada: "papai!" E a porta se abriu. Dava em um quarto aconchegante iluminado com velas, com uma cadeira de balanço no meio onde estava sentado Yesod. Ele se levantou e abriu os braços, e a garotinha pulou entre eles.
"Olá, meu amor," ele respondeu gentilmente, "tava tendo um pesadelo?"
"Sim," ela soluçou. "Foi assustador."
"Sempre me chame quando acontecer," ele limpou os olhos dela. "Foi porque você me chamou que eu pude te encontrar," e sorriu. "Agora vamos buscar sua mãe." Com ela no colo, abriu a porta por onde ela veio e saíram.
Yesod aproveitava sua habilidade de desdobramento para visitar sua família em seus sonhos e matar a saudade. Meses se passaram desde que começou a viver na tribo de Annu Mogi e aprender seus costumes e filosofias, e também expandir a consciência. Graças à sua alta sensitividade espiritual, no entanto, suas habilidades psíquicas e seu entendimento cosmológico evoluíram exponencialmente, então pelas noites, em suas projeções astrais, encontrava sua esposa e filha dentro de seus sonhos.
"É bom te ver de vez em quando aqui," disse a esposa enquanto flutuava sobre um campo de flores, "mas sinto sua falta durante o dia."
"Pelo menos podemos estar juntos de alguma forma," ele saltou e a agarrou e a encheu de beijos.
"É verdade," ela os retribuiu. "São habilidades impressionantes essas."
"Por que não as desenvolve então?"
"Ah, tenho outras coisas pra me preocupar," suspirou ela. "Te ver aqui é o suficiente. Só acho difícil me acostumar a te chamar de Yesod," ela ria e lhe beijava.
Não apenas interagia com sua família, mas também qualquer ser ou pessoa que encontrava em suas viagens pelo plano astral. A conexão que temos com planos superiores é absoluta e notável, tanto que somos influenciados fundamentalmente pelas frequências emitidas por esses planos. Nossas emoções, nossos pensamentos, nossa essência, cada um sendo manifestado energéticamente de sua respectiva dimensão neste plano físico.
A quinta dimensão é o lugar onde acontecem nossos sonhos todos os dias quando dormimos, por exemplo. Quando nosso corpo adormece, as vibrações das sinapses neuronais de nosso cérebro emitem frequências mais baixas, e ele entra em um estado theta ou delta. Com o corpo relaxado nossos sentidos se desligam e nada percebemos; mas isso é impossível, pois toda consciência DEVE presenciar alguma realidade — a definição mais básica de consciência, perceber a sí mesmo — e por isso, somado com as diferentes frequências emitidas pelo cérebro, nossa mente é enviada até planos que compartilham essa mesma frequência, e ali presenciamos uma realidade alternativa. Isso são sonhos.
Yesod frequentemente encontrava sonhadores inconscientes pelo plano astral. Sempre se aproximava e, com cuidado, chamava sua atenção para os deixar lúcidos e assim poder interagir — já teve algum sonho estranhamente realista alguma vez? Pois é o mesmo.
Percebeu que poderia ajudar as pessoas assim, analisando-as baseadas em seus subconscientemente criados sonhos e dando conselhos e espalhando suas filosofias holísticas. O fazia sempre que encontrava alguém, e normalmente as pessoas acordavam satisfeitas e de bom humor, até inspiradas.
Todos esses eventos enriqueciam o espírito de Yesod e lhe traziam uma sensação de satisfação muito agradável. Até chegou a pensar que isso poderia ser o motivo de sua existência.
Descobriu também grande flexibilidade nas possibilidades causais e no potencial do ser humano. Aprendeu a controlar a frequência vibracional de seu próprio corpo astral e combiná-la com a desejada, podendo visitar lugares e seres específicos.
Foi até os Registros Akashicos, a biblioteca onde está registrada toda a história do universo, e a de todos os seres vivos de todas as dimensões. Suas vidas, pensamentos, temores e aspirações; passado, presente e futuro, em forma de livros, onde qualquer um podia pegar e ler. Yesod passou o equivalente a dias ali, lendo sobre os mais diversos assuntos, incluindo sua própria vida — o que o surpreendeu bastante. Visitou a dimensão dos espelhos, onde fez sua primeira exploração em um universo fractal, calculável e com curvas infinitas sem tangente alguma entre as geometrias, criando um formato espacial caleidoscópico que se extendia ao além. Aprendeu a visitar planos tanto superiores quanto inferiores, habitados por criaturas que bem fazem jus aos nomes "anjos" e "demônios". Percebeu que o céu e o inferno são bem diferentes do que descrito pela religião de sua nação, também mais realistas e fazem muito sentido. Entrou em paz com os valores morais cósmicos, com a lei kármica, e percebeu que o universo é mais justo do que pensava.
No entanto, suas visitas aos planos superiores de luz tinha outro objetivo — que os seres dali evidentemente já conheciam — que era buscar a Pedra Filosofal para mim, seu espírito guia. Não era frequentemente que nos víamos, mas sempre que acontecia ele pedia desculpas por não tê-la encontrado, era realmente uma boa alma, altruísta. Dessa vez, no entanto, ele sentia que estava perto.
Seria difícil manter a individualidade nos planos dimensionais superiores de Kether graças ao sentimento de conexão e amor tão profundo, tão fundamental, que emanava de todos os lados, de cada partícula. Mas só de estar ali significa que o ser alcançou um estado alterado superior de consciência, então não se perde em meio a essas sublimes e sagradas emoções e vibrações graças à sua própria lucidez. Planos de luz e paz, onde o clarão de tudo fluía como ondas pelo ar e transmitia tranquilidade, sem cegar, aceito pelos sentidos astrais e interiores, criando assim uma perspectiva de realidade muito difícil de descrever em palavras.
Yesod se comunicava com os seres mais característicos, que telepaticamente o enviavam direções, coordenadas, oscilações, que o levavam até as paisagens mais lindas e surreais. Chegou então até dois colossais portões brancos, estavam abertos, e olhando de baixo pra cima pareciam ser infinitos. Adentrou aquele lugar e não viu mais que o verde maravilhoso espalhando-se pelo horizonte. Os sentidos de Yesod ali nada se assemelhavam aos cinco normais, mas a melhor forma de descrever aquele lugar é visualizar um infinito e magnífico jardim. De fato, em algumas culturas era conhecido como Jardim do Éden.
Apesar de não conhecer o objeto, Yesod mentalizou a emoção que sentiria ao encontrá-lo, a sensação de tê-lo em mãos e sentir seu peso, sua vibração única. Se concentrava nisso enquanto flutuava de olhos fechados pelo jardim infinito, deixando-se guiar pela intuição e o fluxo.
O tempo foi passando e sua perspectiva de continuidade foi se deturpando cada vez mais; o que pareciam horas foram se tornando dias, semanas, meses, até anos. Flutuou em um estado meditativo profundo pelo que pareceram décadas naquele literalmente interminável jardim.
Quando menos esperou, sentiu uma energia impactante, notavelmente diferente do resto do ambiente. Tal frequência era emitida por uma das inúmeras árvores frutíferas dali. Seus frutos refletiam uma luz impressionante, que ia perdendo o brilho quanto mais se aproximava dela o explorador. Quando já estava debaixo da árvore, percebeu que seu fruto era a maçã. Era uma macieira.
Ele juntou as mãos e se curvou em respeito e agradecimento à árvore e seus frutos, e esticou seu braço para arrancar uma das maçãs de seu galho. Todas emitiam o mesmo intenso brilho vermelho, quase reluzentes, e aparentavam estar bem maduras e suculentas.
Quando a mão astral de Yesod tocou um dos frutos, ele sentiu como uma insurgência energética descia por seu braço e se espalhava pelo corpo todo. Os mais geniais e inovadores pensamentos passavam pela sua mente e o levavam à filosofias, ideologias e conclusões imediatas. Sentia como se uma inspiração divina, um sopro de conhecimento cósmico, adentrasse sua mente e invadisse sua consciência descontroladamente, fazendo vibrar estridentemente seu terceiro olho. Esse sentimento exaltante o fez instintivamente puxar a maçã do galho com força, e ao arrancá-la, tudo voltou ao normal. Olhou para a fruta, apenas uma suculenta maçã brilhante, enquanto ofegava cansado após aquela difusão mental.
"A Pedra Filosofal," ele comentou enquanto olhava para a maçã. "Impressionante. Dá até vontade de usá-la, mas não acho que esteja preparado ainda," suspirou, agora já passada a euforia da experiência. "O formato deve ser subjetivo à perspectiva. Me pergunto o que Cornelius vai fazer com isso."
Ele então concentrou seus pensamentos em mim, como já nos conhecemos pessoalmente, lembrou da impressão que eu o causava, da sensação que sentia ao estar comigo, e ao visualizar esses parâmetros, sua frequência foi alterando e assemelhando-se à minha, até ele instantaneamente aparecer ao meu lado na colina perto da minha casa. Viver na quinta dimensão tinha seus benefícios e conveniências, a locomoção via pensamento era uma delas.
"Saudações, Cornelius!" O homem apareceu sorridente.
"Yesod, meu amigo," o abracei. "Pela sua cara e visita repentina, vejo que a encontrou, não?"
"Pois sim," levantou a mão direita e a mostrou. O que antes era uma maçã agora era uma bola de cristal vermelha e reluzente. "Tá diferente, mas com certeza essa é a Pedra Filosofal," e estendeu a mão para me entregá-la.
"A aparência da pedra filosofal depende do observador, já que ela se comporta como os princípios herméticos mais fundamentais," respondi enquanto a segurava em mãos. Um sentimento nostálgico preencheu meu corpo e as lembranças do livro de pedra surgiram em minha mente. "Consigo sentir. Essa sensação... com certeza é a pedra filosofal." Me curvei em agradecimento, "muito obrigado, Yesod."
"Não se preocupe," ele riu. "Você me deu bons conselhos, me ajudou a abrir os olhos, e também me ensinou bastante coisa. Fico feliz só em poder te ajudar."
"De fato, poucos são os que chegam onde você chegou tão naturalmente. Os planos de Kether são as manifestações dimensionais mais divinas e coligantes. Eu mesmo nunca alcancei tal estágio, nem creio que conseguiria manter minha individualidade por muito tempo num lugar assim."
"Os seres dali realmente eram complexos e todos iluminados. Até agora não consigo nem compreender muito do que aconteceu lá, me deixei levar pela intuição mesmo."
"Essa sempre é a melhor escolha," ri. "Yesod, dentro de você eu vejo todo o potencial do universo. Se quiser continuar nesse caminho da verdade e da luz, tenho outra missão para você. E dessa vez te trará benefícios pessoais e interiores."
"Você sabe que aceito, Cornelius," ele respondeu. "E o que é?"
"Um encontro que o fará crescer como nenhum outro, por motivos que mais pra frente você saberá," comentei. "Você projetará sua consciência através espaço-tempo e se comunicará com Basile Bélanger."
"Basile? Nunca ouvi falar. É um nome estranho."
"Todo o conhecimento dos tempos antigos foi perdido, o que não é muito incomum na história da humanidade, com a ascenção de Sarkan ao poder," expliquei. "Basile foi um homem importante, ajudou no avanço científico da época e foi o principal causante de uma das poucas revoluções na consciência coletiva do ser humano. Você o encontrará pela primeira vez justo antes disso acontecer, e poderá ensiná-lo mais sobre sua verdadeira natureza e a de seus poderes psíquicos."
"Interessante, já quero conhecê-lo," ele sorriu. "Mas como faço? Nem sabia que era possível voltar no tempo."
"As leis universais dos planos superiores são diferentes das do plano físico e, naturalmente, o tempo também se comporta de forma diferente. Nas dimensões superiores, o tempo não existe, é apenas mais uma camada energética manifestada pelas perspectivas de seres de outras dimensões que sim o necessitam para viver. É como outra dimensão espacial. No fim, o tempo é relativo e totalmente dependente do observador. Se o observador elevar sua consciência à estados transcendentes, um momento pode ser infinito enquanto dure." Ele me ouvia atentamente, até porque já havia passado pela experiência do momento eterno em sua epifania. "Eu já sabia onde ele estaria naquele momento, então deixei uma mensagem para que ele fosse até a pirâmide de Buda na Floresta de Mogu, onde você o encontrará."
"Faz anos que não entro na Floresta de Mogu. Imagino como será aquele lugar no mundo etéreo."
"Tome cuidado, pois os seres etéricos que ali habitam podem ser perigosos. Enfim, você desdobrará até um dos planos superiores e de lá manifestará com o pensamento seu encontro com Basile. Acredito que já está pegando o jeito de como funcionam manifestações, não?"
"Bastante," ele respondeu enquanto olhava pras próprias mãos, "concentrar no que quero, na emoção que isso me trará, na vibração que essa emoção cria, e manifestá-la conscientemente. Depois que se pega o jeito, meio que acontece naturalmente."
"Me alegro em ouvir," sorri. "Pois manifeste seu encontro com ele. Tenho certeza que Basile estará em um estado meditativo profundo, esperando sua chamada, esperando qualquer coisa. A própria natureza atemporal dos sefirotes superiores fará com que você o encontre, não importa a barreira temporal."
"Ok, tentarei," disse convicto. "Adoro nossos encontros, Cornelius. Sinto como se sempre aprendesse algo novo."
"Sempre temos espaço para aprender, meu amigo. Eu posso dizer que tudo sei, mas saber não é o suficiente. A diferença entre o saber e o sentir é demasiada, então eu mesmo aprendo e me impressiono com o próprio conhecimento que possuo. Tudo é questão de perspectiva, afinal. Pode ter certeza, meu amigo, que não importa o estágio de consciência que alcancemos ou as conclusões que cheguemos, sempre temos o que evoluir. Essa é a verdadeira busca da liberdade, a busca pelo divino, transcender o espírito e todas as barreiras que nos separam. Emanar o amor sempre e ser parte do todo."
Yesod se curvou em respeito às palavras de sabedoria e agradeceu.
"Quero que leve contigo a Pedra Filosofal."
Yesod estranhou por um momento.
"Quando encontrar Basile, no momento certo, combinem suas habilidades psíquicas, e transportem a pedra até o passado, para mim."
"Então esse era seu objetivo. Isso é possível?"
"Sim. Utilizando suas habilidades naturais de desdobramento e sensação de frequências, junto com a atomicamente precisa telecinese de Basile, os dois conseguirão. Te deixarei o lugar e a data telepaticamente, você saberá perfeitamente," disse. "Também quero que saiba que há diversas outras formas de levar o artefato até o meu eu do passado, mas realmente creio que o destino está armando todos esses encontros e situações."
"Não se preocupe, eu confio em você."
"E eu também confio em você, amigo."
Nos abraçamos, nos despedimos, e ele se foi.
Yesod voltou ao seu corpo físico e percebeu que a Pedra Filosofal estava em sua única mão esquerda. Se impressionou com o fato dela literalmente ter se manifestado ali, e agora de fato, parecia uma pedra. Rústica, natural, com um tom vermelho acinzentado opaco. Ele passou o dia com os índios de Annu Mogi, mostrando seu achado nos planos astrais. Os sábios se impressionavam com a pedra, e começavam a contar lendas ancestrais de objetos parecidos, que no final tinham a mesma raíz.
Na calada da noite, Yesod subiu até o pico da colina da floresta, e meditou sob a lua nova com a Pedra Filosofal em mãos. Projetou sua consciência para fora do corpo e, depois de recolher a pedra de sua mão física e ver como se movia fisicamente por entre os planos, se dirigiu até a Floresta de Mogu.
Ela estava bem longe, um oceano de distância, mas chegar ali não demorou mais que pensar. Se impressionou com o tamanho das árvores enquanto voava sobre elas, e desviava das centrais que já eram bem maiores. A árvore Gaia o deixou sem palavras, vendo-a de baixo, a forma como chegava às nuvens, uma maravilha da natureza. Tampoco demorou para achar a pirâmide de Buda, a qual admirou e parou para sentir as energias positivas, tranquilizantes e harmoniosas que emanavam do lugar. Espirais energéticas de diversas cores rodeavam visivelmente o monumento e geravam um núcleo eletromagnético impressionante. De cima, observou o desenho de círculos no topo da pirâmide.
"A flor da vida," refletiu. "Os índios me ensinaram sobre seu significado e sua relevância na geometria sagrada, não é surpresa que encontraria esse símbolo aqui." A flor da vida realmente é um símbolo espiritual estudado por diversas civilizações antigas e perdidas no tempo, e ainda muito estudada no futuro. Aparentemente, todas as formas geométricas possíveis no universo estão dentro desse formato de seis círculos ao redor de um central, que formam uma flor.
Com seu corpo astral se sentou no centro do símbolo, no meio do topo da pirâmide, e induziu um estado meditativo ainda mais profundo. Pouco a pouco foi transmutando a vibração de seu próprio corpo, e sem se mover no espaço, foi chegando até as dimensões energéticas superiores. O cenário ia mudando com cada acréscimo de frequência, com novas plantas surgindo, fadas, criaturas, até outras estruturas piramidais. A sensação de paz e amor se intensificava exponencialmente e dissipava qualquer ansiedade do subconsciente de Yesod. De lá, ele começou a visualizar seu encontro com esse tal Basile.
Meditou o que foram horas esse encontro. Pouco a pouco, intuitivamente em sua mente, vinha sua voz, sua aparência, suas circunstâncias, suas emoções. Começou a tentar se comunicar com os clarões que apareciam em sua mente de vez em quando, tentando explicar quem era e o que tinha para passar. Sem nem se dar conta, essas ações eram manifestadas no passado como sonhos nas noites de Basile, que passou aquela semana toda sonhando com um homem misterioso de luz. Até que os momentos se cruzaram. Basile se sentou no mesmo lugar onde estava Yesod, apenas em linhas temporais diferentes, mantendo uma conexão telepática. Quando Basile relaxou seu corpo, acalmou sua mente e deixou a consciência fluir: "Basile..." ele ouviu a voz ecoar em sua mente, uma comunicação psíquica multidimensional, e assim, os dois se encontraram pela primeira vez.
Os dois se deram muito bem e conversaram por horas. Sentiram uma conexão ainda mais potente que a de simples amigos, principalmente Yesod. Estranhamente, sentiu como se Basile fizesse parte dele. Um sentimento interessante que apenas fez com que apreciasse ainda mais sua nova amizade. Após muitos assuntos, filosofias, ideologias, histórias pessoais, emoções compartilhadas, explicações sobre perspectivas universais, visões de duas épocas em situações completamente diferentes e muita risada, Yesod tocou no assunto de Cornelius.
"Então essa é a famosa Pedra Filosofal?" Comentou Basile com ela em mãos. "Pensei que seria mais impactante. Também não achei que seria um ovo." Em sua perspectiva, a pedra era um ovo vermelho, com anéis escarlate contornando-o.
"Sua aparência muda com o observador. Primeira vez que vi, era uma maçã."
"Isso sim que é ironia," ele riu.
"Então, você acha que conseguirá enviá-la ao passado?"
"Bom, considerando que você projetou sua consciência desde milênios no futuro até aqui, poucas coisas acho serem impossíveis. Enquanto você falava sobre a conexão energética universal, pensei em algumas teorias e realmente tudo faz sentido. Na verdade, sinto uma espécie de lucidez, sabe. Como se as coisas finalmente começassem a fazer sentido. Einstein disse algo parecido com a teoria da relatividade, apenas de outra perspectiva. Se não me engano, Nikola Tesla também fez alguns comentários assim, mas sempre foi considerado um cientista louco, mesmo com suas invenções geniais. Tenho que pesquisar mais sobre seu trabalho."
"Não conheço esses homens, mas imagino que tenham sido impressionantes."
"Pois sim. Junto com Isaac Newton, são os maiores gênios que passaram pela humanidade. Me inspirei bastante em suas pesquisas enquanto estudava. É uma pena que todo esse conhecimento tenha sido perdido no futuro."
"Realmente é uma pena, mas não foi a primeira nem será a última vez. Bom, espero que seja a última, na verdade," suspirou Yesod.
"Enfim, analisando sua composição química eu posso ter uma melhor noção do que é essa pedra. E sobre as frequências emitidas, sinto que já tô pegando o jeito. Realmente consigo sentir tudo vibrar, principalmente a pedra." Basile já estava ansioso para começar a experimentar com esses novos conhecimentos herméticos e sua telecinese.
"Pois apenas imagine tudo o que necessita," comentou Yesod.
"Imaginar, é..." Basile se concentrou e pensou no microscópio de elétrons que havia inventado, o imaginou em sua outra mão, e ele apareceu como se já estivesse ali. "Impressionante!"
"Vantagens da quinta dimensão!" E rimos.
O jovem analisou calmamente todos os componentes do artefato. Seu microscópio era conectado ao celular, que também materializou, e listava todos os componentes químicos, estrutura molecular, características genéticas e diversas outras informações, inclusive a nível quântico. Como previsto, alguns componentes da pedra eram totalmente desconhecidos, mas saber sua estrutura molecular — geometricamente perfeita e circular, diga-se de passagem — era o suficiente para tentar teletransportá-la.
Então começaram. Yesod, que já sabia que vivi no século XVI na Alemanha, começou a mentalizar minha casa na floresta. Basile também tentou, mesmo que suas habilidades psíquicas — tirando a telecinese — estivessem recém em pleno desenvolvimento. Uma imagem vinha na cabeça de Yesod, uma floresta; uma pequena casa de madeira; muitos livros e tubos com líquidos das mais variadas cores e texturas; um velho dormindo na poltrona com um livro no colo. As imagens vinham claras como o dia, soube que havia transportado sua consciência pelo espaço-tempo com sucesso outra vez.
"Basile," o chamou, "vou fazer o máximo possível pra te passar essa imagem. Projetá-la em sua mente, nesse plano, o que seja, apenas deixe fluir!"
Basile concordou, se concentrou em qualquer tipo de sensação ou imagem que poderia aparecer. Com os olhos fechados, era como se a imagem começasse a entrar em seu campo de visão, como uma alucinação. Chegou a ficar assustado, mas começou a tocar a Pedra Filosofal para sentí-la e, enfocando-a por completo com sua telecinese, visualizou cada quark, eletron, proton, elemento químico, cadeia molecular, geometria interna, tudo transportando-se de sua mão até o tapete na frente da porta da casa do velho. Como não conhecia completamente a composição misteriosa da pedra, era mais difícil do que parecia, e manter a imagem do lugar e cada detalhe na mente enquanto o fazia também era complicado.
"Você consegue, Basile!" O encorajou Yesod. "Não esqueça que dentro de você está todo o potencial do universo. Confie na intuição!"
Basile inspirou fundo, soltou o ar, e deixou com que as imagens fluíssem por sua cabeça. Os pensamentos rápidos, cálculos de vértices complexos, visualização de elementos subatômicos numerosos, a perspectiva em diversas escalas de realidade; Seus pensamentos elevados e sobrehumanos emitiam uma energia quase desigual, e ao deixar-se levar pela intuição, sua intenção consciente primordial disparava todos os potenciais de sua telecinese, e geravam uma energia potente que vibrava em todo seu ser e pelo ambiente, sentida claramente por Yesod, que se impressionava. A Pedra Filosofal logo desapareceu de sua mão, e quando menos esperavam os dois, ao olharem para baixo da porta do velho, ali estava ela, em formato de um livro de pedra com caracteres misteriosos e desconhecidos na capa.
Os dois olharam para o livro por alguns segundos, impressionados com o que acabara de acontecer. Logo, relaxaram, e instantaneamente perderam vista daquela outra linha temporal. Respiraram fundo, quase ofegantes, e se olharam, e então, riram sem parar.
Ah, que nostálgico. Não preciso nem dizer que quando despertei no outro dia, abri a porta e dei de cara com o livro. Lembro até hoje a sensação de pegá-lo do chão, a curiosidade em ler suas letras estranhas, sentir sua capa de pedra, emitia uma sensação tão mística. Abrir ele foi o maior desafio, quase custou minha vida, mas foi aí que despertei minha Faísca e adquiri a onisciência. Quem diria, na época, nunca imaginaria que eu mesmo seria o responsável pelo envio da pedra, com ajuda de seres tão impressionantes quanto Basile e Yesod. Como isso é possível? Isso é apenas mais evidência da estranheza e sutileza da sincronicidade total e multidimensional do universo. Melhor e mais poeticamente dizendo, o paradoxo de tudo que o destino nos aguarda.
~ ☪️ ~
Yesod ficou mais um tempo ali, viajando pela dimensão física naquela linha temporal, completando assim com sucesso sua primeira projeção através do tempo. Basile mostrou pra ele, no pouco tempo que tinham, como era a sociedade na época. A arte, a música, a arquitetura, as pessoas, as culturas; e também as injustiças, a ignorância, a manipulação, a poluição, o desmatamento, a fome e o medo.
"Eu só espero poder ajudar as pessoas, levar a humanidade pra um caminho melhor. Sozinho isso é impossível, mas eu tenho fé no ser humano e sei que no final despertaremos e criaremos um mundo melhor para todos, juntos. Nas minhas viagens aprendi muito sobre o espírito de luta, a resiliência, o instinto de sobrevivência das pessoas. Mesmo com o preconceito, a competitividade e o medo tomando conta da mente das pessoas, por culpa de uns poucos desgraçados, no fundo todo mundo quer um mundo melhor, um mundo de paz. Eu luto e vivo por essa possibilidade," desabafou Basile. "É tudo que eu quero."
"Tenho certeza que você conseguirá," sorriu Yesod, "você e a raça humana. É um pouco triste saber que no futuro distante, a mentalidade do homem voltou a ser primitiva. Mas nunca podemos desistir da luta, desistir da raça humana e do planeta Terra. Tudo é uma constante transformação. Se essa transformação for afetada pelas nossas ações conscientes, isso já é motivo suficiente para continuar lutando pela união, paz e amor." O abracei forte, já que tinha feito tudo que tinha para fazer por ali. "Foi um prazer te conhecer, Basile. Seu nome será lembrado milhares de anos no futuro," disse o homem e riu.
"Hahaha, igualmente," o jovem retribuiu o abraço. "Sei que minha vida não será a mesma depois desse encontro, e por isso te agradeço. Nosso universo realmente é mais misterioso e complexo do que pensamos. Espero que possamos nos ver outra vez."
"Eu também. E só pelo fato de pensarmos assim, é possível que aconteça," riu de novo. "Até mais, fique bem, e confie sempre na intuição."
Yesod então mentalizou seu corpo físico e, em um piscar de olhos, acordou em sua cama de folhas.
Seu corpo estava completamente relaxado, como se tivesse dormido a melhor noite de sua vida. "Isso aconteceu mesmo?" Se perguntou com a mão na cabeça, meio desgovernado, mas é claro que sabia que sim. Experiências em planos superiores necessitam um nível de consciência mais elevado, então a perspectiva de realidade é ainda mais real que a da terceira dimensão. "Basile; quando o encontrei senti uma emoção tão familiar, tão em casa. Por que sinto como se já o conhecesse de anos?"
E de repente, uma visão aparece em sua mente. Fogo. Um incêndio. A tribo. Pessoas correndo. Colonizadores. Yesod levanta rapidamente da cama e sai de sua cabana de folhas, e vê que os outros sábios pajés fizeram o mesmo, exaltados, e começaram a gritar para que todos evacuassem o lugar. Demorou, mas haviam sido encontrados.
Yesod se entristeceu. Depois de uma experiência tão maravilhosa e impressionante, voltar à realidade de violência, conflitos e genocídio, era um tanto deprimente. Balançou a cabeça forte pra afastar esses pensamentos negativos, "venham por aqui!" E começou a ajudar com a evacuação.
~ ✡️ ~
Não vivemos em um mundo perfeito, nem em tempos perfeitos; nunca é assim, bem longe disso. Mas podemos lutar para melhorá-lo. Todos temos o poder divino da criação, afinal, não criamos uma realidade todos os dias ao sermos conscientes?
Yesod sabia disso, e agora Basile mais que nunca. E continuariam a lutar por um mundo melhor, sem injustiças, onde todos são iguais e amam uns aos outros. Uma verdadeira utopia na Terra, a que todos nós merecemos.
Não parece uma má ideia, não?
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top