Capítulo 4

27 de junho de 2012, quarta-feira

Apesar de ser uma quarta-feira, Nona Nuvem estava borbulhando com pessoas pulando, dançando, conversando e bebendo. Ainda faltavam alguns minutos para a meia-noite, que seria quando as pessoas realmente começariam a chegar. A lotação não mais assustava aos atendentes, que majoritariamente estavam trabalhando na boate desde sua abertura, então, embora fosse corrido, eles ainda conseguiam lidar com isso.

Mourana, atrás do balcão, movia-se de um lado para o outro virando garrafas, esmagando frutas, espremendo limões e sacudindo as coqueteleiras. Suor escorria pelas suas omoplatas, imperceptivelmente.

Haviam mais dois bartenders — Alessandra e Daniel —, e um caixa, no momento, Douglas era o encarregado. Os outros três paravam de tempos em tempos para comentar sobre algo e suas risadas altas pareciam atingir contra as costas de Mourana.

Desde que ela começara a trabalhar ali, nenhum deles tinha tentado se aproximar. Na verdade, até houve uma vez em que Douglas a chamou apenas para dizer que ela não devia sonhar em ser amiga deles. Fora infantil? Sim, e fez com que Mourana se sentisse desprezada. Então, agora eles não se falavam, a menos que fosse necessário ou, mais precisamente, nunca.

Mourana se esticou por cima do balcão mais alto para entregar duas taças de Cosmopolitan antes de atender ao próximo cliente. Quando estava virando para repor a garrafa de vodca, Alessandra passou esbarrando contra ela, fazendo-a derrubar a garrafa vazia, vidro espalhando-se pelo chão.

Mourana arfou em choque e deu um passo para trás para desviar dos cacos. Ela levantou o olhar para Alessandra para ver a outra encarando-a de baixo para cima, um sorriso zombeteiro em seus lábios.

— Foi mal, eu tinha esquecido que você estava aí. — então, virou para ir até seu lado do balcão.

Mourana a seguiu com os olhos, sabendo que tinha sido proposital. Não era a primeira vez, não seria a última e ela não devia fazer grande caso disto.

Depois de limpar os cacos e tentar acalmar o cliente irritado pela espera, ela continuou seu trabalho até que chegasse à uma da manhã, hora que precisou ocupar o lugar no caixa. Ficar na posição exigia muito trabalho e era cansativo, devido à alta demanda, a todo momento havia fila de pessoas comprando fichas.

— Cinco cervejas. — um homem gritou, seus olhos e rosto avermelhados.

Mourana buscou pelas respectivas fichas, mas havia apenas duas na gaveta. Ela virou para os bartenders ao lado e apertou um botão que chamava a atenção para a entrega das fichas recebidas por eles. Uma e outra vez, as luzes de chamada piscaram nas bancadas de Alessandra, Douglas e Carlos, porém nenhum deles deu atenção.

Mourana soltou o ar chateada e, pedindo ao cliente que esperasse um pouco, mostrando a palma da mão, ela chegou até a pessoa mais próxima — Carlos —, e o cutucou. O mesmo se sacudiu como se seu toque formigasse e continuou a encarando. Mourana enfiou uma ficha das que ela precisava na frente do seu rosto, balançado a ficha ferozmente.

— O quê? — Carlos gritou por cima do barulho da música. Mourana apontou para a ficha, mais uma vez, e depois para a pochete na cintura dele onde deviam estar as fichas que ele recebera. — Ahm?? Eu não entendo! Fala, o que é?!

Mourana o encarou com olhos fumegantes. Ela apontou, de novo, para a ficha em sua mão e depois para a pochete. Carlos a olhou de lado, rindo dela.

— Se você não falar, eu não vou saber! — então, ele empurrou o braço dela a fazendo tropeçar para trás pela força.

— Ei!! — o cliente bêbado gritou do caixa. Mourana mostrou a palma para ele mais uma vez. — Vai dar pra eu comprar essa merda ou não? Eu tô aqui pagando e ainda tenho que esperar?!

Mourana suspirou. Ela lançou uma olhada para Carlos, mas desistiu dele, indo para a próxima pessoa, Alessandra.

Novamente, ela cutucou primeiro para chamar sua atenção e, novamente, foi ignorada. O que era aquilo? Eles estavam brincando com ela?

— Ei! — o cara no caixa berrou, claramente perdendo a paciência.

Alessandra olhou para ele de longe, sorrindo gentilmente.

— Desculpe, a nossa funcionária é deficiente, ela não consegue trabalhar direito. Eu vou aí em um minuto. — Alessandra gritou de volta.

Com os punhos cerrados em indignação, Mourana empurrou um ombro de Alessandra, duas mãos levantadas ao lado do ombro, perguntando o que era aquilo.

— Inútil, se você não consegue nem pedir, então nem devia estar aqui. — Alessandra grunhiu para ela, olhando-a de cima.

Mourana tentou brigar, mas como ela conseguiria? Suas mãos tentavam apontar para a ficha e então para Carlos, parando no rosto de Alessandra, mas tudo o que ela conseguia era receber olhares zombeteiros.

Um rugido soou.

— AHAHAHAHAHAHAHAH. — o cliente bêbado tirou sarro. — A porra da muda deve ser retardada também! O que esse caralho tá fazendo aqui?! Devia tá internada!

Mourana deixou os braços caírem, seu cérebro mal digerindo as palavras e risadas ao seu redor. Seu peito afundou, o ar abandonando seus pulmões e rindo na sua cara, junto com os outros ao seu redor. Ela estava petrificada, sem saber o que fazer e sem poder se defender. Lágrimas pairaram na sua linha d'água, embaçando a visão. Ela engoliu a bola em sua garganta.

— Sai daqui! — Douglas passou por ela, batendo contra seu ombro, e fazendo seus pés vacilarem. Ela tombou em direção a Carlos que estava pronto para empurrá-la, mas ela conseguiu se parar antes de alcançá-lo. — Sinto muito pela espera, senhor. Nosso chefe acha que é caridoso contratando esse povo doente.

Douglas papeou com o cliente, balançando a cabeça, achando-se engraçado.

— HAHAHAHAHAHA. — o cliente bêbado.

— AHAHAHAHAHA. — Carlos.

— HAHAHAHHAHAHAA. — Alessandra.

— HAHEHEHHAHSHEHAHS. — os clientes.

— Ele quer o quê, ir pro céu?! Como se ajudar essas coisas, fosse salvar a alma dele. Todo mundo sabe que esses bichos vão pro inferno! AHAHAHAHAHAHA. — o cliente bêbado virou para as pessoas atrás dele na fila e riu exagerado, conseguindo fazer os outros rirem ainda mais.

Mourana sentiu suas bochechas ficarem molhadas, e lágrimas escorreram pelo seu pescoço. Tentando fugir das risadas e palavras cortantes, ela correu em direção à porta que levava à saída de funcionários.

No beco escuro e fedido, ela chorou até que seus olhos estivessem inchados e sua cabeça doendo, latejando sem parar.

O que era aquilo? Ela sabia que eles não gostavam dela, ela sabia o porquê e sabia o que eles falavam nas suas costas. Mas eles nunca a tinham atacado daquela forma, tão... cruéis.

Ela se agachou no chão do beco, ao lado do lixo, chorando sem parar. Seus soluços preenchendo os arredores, espantando os ratos.

•••


28 de junho de 2012, quinta-feira

Às três, Sombra entrou na boate, passando direto pelos seguranças que pareceram não ter notado sua presença. Ele caminhou direto para o balcão dos bartenders, passando pela pista de dança, empurrando os corpos febris e embriagados.

Quando ele alcançou o balcão, apenas três pessoas estranhas estavam atendendo. Ele sabia que a mulher escolhida trabalhava todos os dias em que a boate estava aberta e que não havia troca de turno, então, onde ela estava?

Ele se aproximou do rapaz mais próximo de cabelos altos e encaracolados.

— Ei, onde tá a outra bartender? A baixinha, de cabelo escuro? — ele exigiu, seu tom naturalmente arrogante.

O rapaz de cabelo encaracolado abriu a boca, mas nenhum som saiu, seu cenho franzido.

— A muda? — uma mulher feia de olhos esbugalhados perguntou, se jogando na frente do rapaz.

Sombra a encarou esperando que ela falasse, mas a mulher apenas o encarou, erguendo as sobrancelhas grosseiras.

— E aí? Cadê ela? — Sombra perguntou impaciente, sua voz grave assustando aos dois atendentes.

A mulher pigarreou.

— Não sei, ela saiu correndo daqui. Você tá atrás dela pra cobrar dinheiro? — a mulher perguntou, seus lábios oleosos, fazendo Sombra querer cuspir. Não era sobre a aparência mundana, sua aura era horrenda e putrefata, o odor exalando pelos seus olhos cadavéricos e boca imundos. — Não tenha pena, okay? Aquele bicho doente só sabe causar problemas. Ela até brigou hoje com os clientes, já pensou?! Nem tem amor pelo emprego.

Sombra, obviamente, sabia da sua mentira. Ele estreitou os olhos afiados para os dois. Num estrondo, seu punho bateu contra o balcão mais alto, assustando as duas pessoas. Ele se inclinou sobre o balcão, aproximando-se dos seus rostos, o seu próprio sob a sombra de seu olhar enfurecido.

— Cadê ela?

A mulher remexeu os lábios, não entendendo a situação. O rapaz deu um passo para trás. Nenhum dos dois ousou falar mais nada.

Sombra deu as costas a eles e saiu da boate, dando a volta no quarteirão em direção à saída dos fundos. Ali, ao lado da porta, uma sombra pequena estava encolhida. Sombra se aproximou a passos apressados e sonoros, assustando a pessoa sentada numa banqueta baixa.

A mulher pequena olhou para cima para ver quem estava chegando. Ao perceber que não era um bêbado qualquer, ela suspirou.

Sombra parou na frente dela, de pé, encarando-a em silêncio. Mourana fungou.

Vocês acharam alguma coisa? — ela perguntou, suas mãos se movendo um pouco trêmulas.

Diante de Sombra, as letras do feitiço de legenda tremularam no ar.

Ele ficou em silêncio, observando a mulher olhar para as próprias mãos antes de levantar os olhos, respirando fundo.

Vamos. — a mulher gesticulou.

— Tu não tem que voltar?

Mourana deu uma olhada para a porta e então deixou os olhos caírem. Ela não queria voltar ali. Ela precisava, mas não queria. Depois ela se resolveria com Felipe.

Ela balançou a cabeça.

Sombra continuou a encará-la. Quando ela levantou os olhos para ele, ele pôde ver que seus olhos redondos estavam inchados e um pouco vermelhos, o rosto pálido e sem vida. Ele não sabia por quanto tempo ela tinha estado chorando, mas não havia mais lágrimas em seu rosto. Ela parecia vazia.

Mourana levantou as sobrancelhas para ele em questionamentos, suas bochechas ganhando cor, enquanto ele a encarava.

Sombra levou mais alguns segundos até virar as costas e começar a andar, a mulher pequena o seguindo.

A noite gélida balançava as folhas das árvores e soprava por dentro da espinha. A movimentação da animação noturna podia ser ouvida a alguns quarteirões de distância, mas ali, no espaço vazio e mal iluminado, não havia qualquer risada ou falatórios embriagados.

— Não é muita coisa, entretanto, dá para começar. — Otton falou, enquanto pousava uma pasta transparente na mesa da praça.

Mourana, cuja aparência pálida e cansada não havia se regenerado ainda, encarou a pasta inexpressivamente. Otton, apesar de estranhar o comportamento da mulher, não comentou sobre. Ele retirou três documentos: duas folhas envelhecidas, retiradas de algum livro, e uma folha ainda conservada, do que poderia ser um diário ou agenda.

Otton virou as folhas para a mulher ler. No primeiro papel, várias informações pareciam narrar uma visita a algum templo, e alguns detalhes sobre as acomodações se estendiam. Até Mourana encontrar alguma citação, ela teve de revirar a folha duas vezes.

"A maldição lançada vai perdurar até que o desespero atinja o ápice. A salvação não virá de repente, e não há como apressar o inevitável. Sejam pacientes."

Mourana franziu o cenho. Desespero e paciência numa só fala? Não parecia muito controverso?

Ela lançou um olhar incerto para Otton, que a olhava em expectativa, e Sombra, cujas mãos tamborilavam na mesa evidenciando sua impaciência. Ela pescou a outra folha.

Esta, assim como a outra, parecia relatar uma expedição, mas não com fins exploratórios. Aparentemente, o autor estava argumentando sobre semelhanças entre documentos anteriores, relacionados às profecias.

Mourana levantou a cabeça, confusa.

— Há mais de uma versão da profecia? — ela questionou.
Otton suspirou.

— Certamente. Alguns são contos populares, outros são registros oficiais e também não oficiais. Nós levamos mais em conta a primeira visão relatada.

Eu gostaria de ver as outras versões também. Nem sempre o primeiro é o mais correto. — e ela voltou a examinar a folha.

Em algum momento o autor destacou:

"Apesar dos diversos contrapontos, ainda existem concordâncias que levam a reforçar a primeira versão da profecia. A presença de uma mulher, jovem, ainda é enfatizada. No entanto, diferentemente da primeira versão, onde não há especificações levando-nos a crer que pode ser qualquer uma, a versão dos feiticeiros anciões de sangue puro, de décadas atrás, ressalta que não é qualquer mulher irreconhecível que poderá desfazer o feitiço, mas sim uma com sangue misto e cujo poder espiritual seja além do comum. Estas são algumas características notáveis."

Mourana passou para a próxima folha. Nesta que parecia ser recente, estava o que devia ser um ponto de vista pessoal.

"De alguma forma, as informações sobre a cerimônia de quebra de maldição são muito difíceis de encontrar. Depois de passar alguns dias contatando alguns guardiões, eu percebi que, mesmo entre eles, são rasas as informações. No mais, eles sabem sobre a necessidade de haver a presença de algumas pessoas. Mas quem são?
Aparentemente, alguns Guardiões mais velhos acreditam que o Livro Sagrado dará as respostas, mas nem mesmo ele pode ser confiável, já que é ilegível.
Apesar de tudo, eu ainda consegui obter alguma informação: durante a cerimônia, o trecho a ser lido deve ser escrito quando em desespero, cansaço, arrependimento e medo. A pessoa a escrever as palavras precisa estar se redimindo e confessando um ato imoral. No momento presente à cerimônia, a pessoa não deve mais estar viva…"

Mourana contorceu o rosto jogando a folha na mesa enquanto seu cérebro trabalhava.

Olhando para os dois homens, ela suspirou. Eles não pareciam menos confusos do que ela. Ela engoliu em seco.

Quem são os Guardiões? — ela perguntou, enquanto tentava ordenar as coisas, forçando sua mente cansada.

Otton cruzou as mãos sobre a mesa de pedra fria.

— Somos nós. — Sombra falou, surpreendendo mesmo a Otton, que estava prestes a explicar. — Os Guardiões e os Bons Mestiços possuem habilidades semelhantes, mas nossa função é diferente. Bons Mestiços policiam, punem e julgam aqueles que infringem as leis. Guardiões guardam e mantém em proteção àqueles que estão sob a lei e necessitam de seus cuidados, principalmente aqueles vindos de outras dimensões.

Naquele ponto, Mourana sabia sobre as cinco principais dimensões mágicas: a Terra das Fadas; o Cinzaral dos feiticeiros; Aquantis dos seres aquáticos; o Reino Doce e o Etéreo Místico dos seres espirituais. Ela havia lido um resumo breve um dia antes, então a informação ainda estava fresca. Ela sabia também que o Etéreo Místico não era como as outras ― você não podia ir e vir livremente. Às vezes, secularmente, haveria informações vindas de lá, mas este era o máximo de interação. O porquê de ser considerada como ligada à dimensão humana, já não era do conhecimento de Mourana.

Então, quem quer que venha de outras dimensões, vai ser monitorado de qualquer maneira? — ela questionou.

— Óbvio. — Sombra foi curto.

— Enfim, estas foram as únicas coisas que encontramos que se referiam ao que procurávamos. — Otton disse. — O que a senhorita acha?

Claro, novamente ele queria saber se suas linhas de pensamento seguiam pelo mesmo caminho. Ele a tinha visto raciocinar algo que apenas uma pessoa de fora poderia pensar e não fora um absurdo. Talvez ela tivesse algo interessante para acrescentar.

Mourana encarou as folhas a sua frente antes de piscar algumas vezes e balançar a cabeça.

Aqui, o ancião fala sobre desespero em seu ápice. Como estão as coisas no seu mundo? — ela se dirigiu a Sombra na sua esquerda.

Ele ri em escárnio.

— Todo dia alguém morre sem razões específicas. Estamos sempre no limite do desespero.

Talvez não seja o suficiente, ainda.

— Tá louca?! — ele exclamou. Otton o segurou para mantê-lo comportado. Sombra sacudiu o braço. — As pessoas ao nosso redor estão sempre com medo até de atravessar uma rua. Nós temos que comprar nossos túmulos quando crianças, nenhum de nós tem pais ou tios ou avós. Tu acha que viver assim não é desespero o suficiente?! Me diz, o que pode ser pior? Como pode ficar pior?! Hein?

— Sombra! — Otton rugiu, calando-o.

Mourana inclinou-se para trás recebendo a enxurrada de reclamações do outro, seus olhos arregalados em choque e um pouco de medo. O homem diante dela, com certeza, parecia pronto para retirar suas palavras pela garganta. Com o coração batendo no peito, ela o viu lhe lançar um olhar indignado e endurecido, antes de voltar a sentar no banco.

— Senhorita, continue, por favor. — Otton pediu, seus olhos com um pedido de desculpas neles.

Mourana endireitou-se lentamente no banco, ficando involuntariamente mais distante de Sombra e claramente mais desconfortável. Internamente, ela também sabia que tinha sido rude, no entanto.

No primeiro documento ele diz que a pessoa escolhida vai ser percebida e, no segundo, fala sobre poder espiritual. Você disse que me encontrou por um rastreio?

— Sim, eu estive rastreando fontes de energia espiritual pura por muito tempo até conseguir chegar a uma pessoa de fato. Normalmente essas forças costumam vir de animais. Em uma das versões diz que a escolhida tem de estar acima de seus vinte anos. Penso eu que a manifestação do poder pode ter aparecido apenas agora, por este ser o momento certo. — Otton explicou.

Mourana olhou para ele e para os papéis.

Aqui diz que... — ela passou as mãos no ar, relutante, mesmo sem saber o porquê. — Diz que é alguém de sangue misto. Sangue misto?

Otton praguejou e remexeu-se no lugar.

— Na verdade, este ponto pode estar incorreto, como qualquer um dos outros. Mas seria conveniente sabermos sobre os seus progenitores...?

Mourana olhou para Otton, seus lábios se partiram antes de fecharem — um hábito não perdido.

Eu não conheci minha mãe... — ela começou. — Meu pai morreu há cinco anos. Até onde eu sei, eles eram normais... Mas meu pai não falava da minha mãe, então eu realmente não sei.

Otton e Sombra permaneceram quietos. Na verdade, eles já sabiam que os pais da mulher não estavam presentes, já que a mesma morava sozinha e não parecia ter o hábito de fazer viagens para fora. Entretanto, eles não chegaram a deduzir tão longe. Eles não estavam com pena também. Em suas vidas, pessoas órfãs não eram incomuns e nem por isso mais frágeis.

— Afinal, quantos anos tu tem? — Sombra questionou de repente.

Mourana hesitou um pouco. Ao seu ver, parecia como se os dois homens tivessem a investigado anteriormente, mas não devia ser o caso. Tudo o que eles sabiam, talvez, era sua aparência. Ela se sentiu um pouco melhor. Se quisesse manter sua privacidade para si, ela poderia.

Mourana levantou dois dedos no ar e depois quatro. Os dois homens pareceram surpresos por um momento, mas logo se recompuseram. Ela bateu os dedos sobre a mesa de pedra antes de perguntar:

Que cerimônia é essa? — os dois viraram para ela. — No diário, fala sobre uma cerimônia de quebra de maldição. Eu achei que precisasse apenas ler.

Otton assentiu.

— Inicialmente era o que pensávamos, mas, nas últimas décadas, mais e mais anciões vêm falando sobre a necessidade de uma cerimônia. As pistas que procuramos são, em parte, para encontrar a escritura que você precisa ler e para descobrir quem são essas pessoas que precisam estar presentes na cerimônia.

Mourana balançou a cabeça em entendimento, encarando aos papéis.

Onde vamos encontrar uma carta de despedida?

— Hm? — Otton perguntou a encarando confuso.

Carta de despedida — ela apontou para a folha do diário —, aqui.
"A pessoa a escrever as palavras precisa estar se redimindo e confessando um ato imoral."

Otton olhou para ela, e para Sombra, sua mente trabalhando.

Para ser tão importante a ponto de poder quebrar uma maldição, eu suponho que, quem escreveu essa carta cometeu um crime inaceitável contra sua ordem. — e ela apontou para Sombra. — Talvez tenha sido assassinada ou cometido suicídio. Eu acho... Eu acho que ela também sabe quem foi que lançou a maldição.

Sombra franziu o cenho para ela, aparentemente se impondo contra a ideia. Internamente, ele estava se perguntando quão bobos eles pareciam, por não terem pensado em algo tão óbvio. Entretanto, em seu mundo, para alguém ser capaz de saber sobre tal maldição e, ainda assim, mantê-la em segredo... Isso, por si só, já era inaceitável. Tal pessoa, se viva, certamente seria detida e exilada como cúmplice.

Talvez... — Mourana continuou, com um pouco de receio. — Talvez, quando encontrarem esta carta, e souberem o que há escrito nela... Talvez, só aí o desespero de sua raça chegará ao ápice. Talvez... Talvez, este seja o momento certo.


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