Capítulo 41 - O Final Que Ninguém Queria
https://youtu.be/V54CEElTF_U
Um dia que se tornou num hábito. Todas as noites os amantes proibidos encontravam-se para estarem juntos e assim alimentarem o amor que nutriam um pelo outro. Dentro de si, ambos sabiam que aquilo se tratava de uma mentira. Artur e Oceana compreendiam que estavam a tornar a tarefa de serem discretos cada vez menos possível. Além disso, Oceana sabia que tinha de voltar. Ela não contara tudo a Artur. Tinha-se esquecido de um pequeno pormenor. A sua imortalidade.
Aquele, no entanto, era o derradeiro dia, Artur ia casar com Mafalda e o palácio não dormia há semanas. As aias de Artur e Mafalda estavam num rodopio de roupas e ornamentos constante. O suor já começava a escorrer mesmo das caras das mais ágeis e os gritos dentro palácio sempre tão silencioso, eram agora, claramente notórios. Artur tentava acalmar as três aias à sua volta a perguntarem-lhe que tom preferia para o seu traje. Ele já dissera no seu tom solene e irresistível aos olhos da sereia, mais de mil vezes o azul, o verde ou o magnânimo vermelho, mas elas sempre insistiam na cor seguinte e a frustração na sua personalidade paciente começava a notar-se. No entanto, Oceana estava lá, ajudando as aias no que podia, e ia sorrindo discretamente para Artur numa tentativa de o acalmar. Parecia estar a resultar. A dúvida era se ele se acalmava pela presença da jovem, ou se o fazia pela tristeza que o arrebatava sempre que os seus olhares se cruzavam.
Mafalda estava no quarto ao lado, e a confusão devia ser a mesma, mas Oceana não se atrevia a estar a menos de dois metros dela naquele dia. Todos os sentimentos contavam naquela altura.
Ricardo permanecia no andar debaixo, no escritório, ocupado a assinar papéis para o seu próprio casamento, matrimónio que nunca chegaria a existir, mas era melhor deixá-lo na ignorância até que Oceana desaparecesse.
-Está lindo, Lorde Artur. - as aias sorriram em concordância e deixaram o seu quarto com uma vénia. Eles estavam sozinhos, com mais ninguém além do barulho infernal dos corredores. A tensão subia e a probabilidade das roupas de Artur ficarem no chão num instante era muita.
-É melhor eu ir. - Oceana apressou-se a pegar no vestido que as aias haviam escolhido para si e dirigiu-se o mais depressa possível à porta.
-Espera, Oceana. - Artur apenas moveu o seu braço como que se a quisesse agarrar, no entanto o seu corpo permanecia estático, as suas emoções roubavam toda a energia que ele pudesse ter a mais.
-Sim. - um sim nervoso, com a mão na maçaneta da porta, olhando por detrás do seu ombro na esperança de que ele não se aproximasse nem mais um milímetro que fosse.
-Existe algo que eu nunca te contei. Tu confiaste-me um dos teus maiores segredos, se não o mais perigoso. Eu podia não ter agido como reagi, os cenários podiam-se ter revelado muito mais sangrentos e eu nem te cheguei a contar a única coisa que me pediste.
-Artur, não... - ela já não queria ouvir mais nada, ela sabia o destino que ambos iriam tomar, sabia que iria partir em breve, que nunca mais o veria e não queria de todo acrescentar mais razões à grande lista que já tinha para o amar, para não o esquecer, mas tinha de partir.
-Ouve-me, eu não me suporto se não te contar. - ela não respondeu, nada podia fazer, a menos correr, mas o chão tinha agarrado os seus pés. - O Condado tornou-se independente como sabes, mas eu não te contei como eu consegui tal mérito.
-Artur, conseguiste-o pela bravura e devoção que dedicaste a este feito.
-Sim, mas a minha intenção era ficar contigo, Oceana. Eu tentei, alguém expôs o nosso caso ao Papa, falei com os mais altos senhores, mas eles não compreenderam. Eles sabem da tua verdadeira identidade. Sabem que não és, Maria Helena, marquesa de Oviedo. Sabem que és galega, pertencente à casa de Trava, sobrinha do amante da minha mãe que tanto prejudicou o Condado.
-Quem? Quem pode ter contado? E o que queres dizer com isso, Artur?
-O Papa reconheceu o meu mérito nos feitos pelo meu povo e queria dar-me a independência do Condado. Eu serei rei do Condado, mas isso pouco ou nada me importa. O facto está em que eu não posso ser rei, assumir um cargo de tanta importância e casar com uma filha de Trava. - Oceana percebeu no momento a escolha de Artur e ao contrário do que ela estava a pensar sentir, o orgulho por ele falou mais alto do que a tristeza por não ser a escolhida - Eu tive de escolher entre ti, Oceana, e o meu povo. Por mais que eu te ame não posso ser egoísta ao ponto de deixar que eles sofram, como vistes, à mercê dos galegos e dos mouros. São muitas vidas em jogo que não posso colocar depois da minha felicidade.
Oceana largou o vestido e correu para os braços de Artur reconfortando-o para que as lágrimas não arruinassem o seu tom magnânimo naquele dia esplendoroso.
-Tu fizeste a escolha certa, um dia tens de me ensinar como sempre o fazes. - as palavras eram sinceras e firmes ao saírem da sua boca. Largou as suas mãos, pegou no seu vestido e saiu finalmente do seu quarto.
- m -
O altar estava arranjado, centenas de nobres e membros de altos cargos chegavam e ocupavam os seus lugares na igreja real. O casamento estava apenas destinado a ser visto pelos membros de alta nobreza, mas o povo esperava lá fora em ânsia por conhecer o seu rei de título e sangue. Oceana estava à porta da catedral com Ricardo a seu lado que lhe sussurrava detalhes do seu casamento aos que ela respondia que sim ou que não com a cabeça conforme o tom com que ele pronunciasse a frase. Ela não estava a prestar a mínima atenção ao que ele lhe dizia, pois, os seus olhos davam toda a atenção ao acontecimento que estava prestes a começar.
O ambiente era de uma autêntica festa e ela sorriu a quem lhe sorria de volta. Poucos minutos depois, a basílica estava cheia, os músicos começaram a soar os primeiros acordes da melodia de casamento e no seu lugar, o privilegiado de Ricardo, Oceana esperava ansiosamente ver Artur a chegar e a ser feliz.
No entanto, no meio de todos os sorrisos e gargalhadas na plateia ansiosa, Oceana destacou na paisagem uma rapariga que lhe era familiar. A sua mente recuou no tempo e o seu coração gelou por momentos ao perceber. Maria Helena, a verdadeira marquesa de Oviedo estava ali, serena como uma manhã de verão trocando palavras comprometedoras por detrás do seu leque com um conde qualquer a seu lado. Ela não percebia, não tinham os convidados sido escolhidos a dedo? Teria Artur a convidado sem querer? O que se estava a passar? Oceana desculpou-se a Ricardo que tinha de ir à casa de banho e aproveitou para se esconder de todos na parte de trás da igreja. Quanta a sua surpresa quando viu Artur correndo até si.
-Maria Helena, precisamos de falar. A sós. - o tom firme de Artur fez dispensar os guardas que os deixaram sozinhos na casa das hóstias.
-A verdadeira Maria Helena está cá...
-Eu sei, eu vinha-lhe dizer, mas pelos vistos já sabe.
-Artur, como é possível? Não escolhem vocês os vossos convidados?
-Sim, escolhemos...
-Deixe, eu manterei a minha posição, ninguém sabe quem eu sou, por agora, são apenas rumores, Ricardo ainda não anunciou a minha identidade a ninguém por isso acho que continuo segura. - Artur beijou os seus lábios como se sentindo que fosse a última vez que o faria. Os lábios dele estavam mais frios do que nunca, mas os dela tinham toda a essência que uma sereia podia ter, toda a essência que a pessoa que ele amava lhe podia dar.
-E depois, Oceana? Vocês vão casar, ele não pode dizer que vai casar com Maria Helena, marquesa de Oviedo, toda a gente perceberá que é uma mentira. Perceberão quem você é...
-Oh não...
-O que se passa, Oceana?
-Isto é uma armadilha.
Nesse instante a porta foi arrombada e o sorriso de Ricardo e Mafalda dominava as expressões de choque de todos os convidados que não tardavam a chegar.
-Como veem esta rapariga é traidora do próprio marido e usou a sua identidade falsa para chegar até mim. - os olhos de Oceana já não demonstravam compreensão, agora ela tinha percebido o jogo de Ricardo. Ele sabia. Desde o dia em que ela entrou no seu quarto depois de falar com Artur e não o viu, que ele sabia, ele tinha-os ouvido. Já para não falar de Mafalda que se tratou de observar cada gesto que ela e Artur tomavam, sabendo perfeitamente para onde Oceana ia naquela noite, sabendo-o todas as noites.
-Eu posso explicar. - Artur tentou falar, mas Ricardo cortou-lhe a palavra no mesmo segundo.
-Oh meu caro, irmão, não tens nada a explicar. Tudo já foi esclarecido e a prova está à nossa frente. Se não pecaram então que deem um passo em frente.
-Se pecar é beijar a pessoa que eu amo então ficarei no meu lugar. - as palavras de Oceana eram firmes e ela conseguia sentir o olhar de preocupação de Artur em si. As flechas dos cavaleiros apontadas na direção do seu peito, os olhares perplexos em si, mas nada disso lhe importava. Ela sabia que não os podia temer, só tinha de arranjar maneira de escapar e voltar para o mar. Naquele momento, já não havia volta a dar. Ela fora egoísta em querer ficar com Artur para si e ficou, adiou o inevitável e agora estava a ser forçada a deixá-lo.
-Levem-na. A sentença é a morte. - os guardas pegaram-lhe nos braços com rudez e firmeza e perante o olhar desesperado de Artur ela apenas lhe disse. - A luz da lua na praia é o consolo dos teus pecados. - Artur ficou ainda mais confuso, mas Oceana apenas sorriu.
- m -
Assim que saíram de cima de todos os olhares, Oceana lutou com os guardas e soltou-se com os seus poderes de sereia. Ela estava livre e por muito que quisesse ficar com Artur sabia que já lhe tinha causado males suficientes para uma vida. Estava na altura de partir.
Horas depois do casamento terminar, Oceana caminhava com roupas de plebeia no seu corpo e a cara tapada por um lenço. Ela dirigia-se para a praia, no entanto, no seu caminho o povo estava agitado, todos a irem para o mesmo lugar. O que se estaria a passar? Oceana seguiu e furou por entre a multidão tendo o seu coração inquebrável quase parado ao perceber o que se passava à sua frente.
Os guardas fizeram-no subir para um palco plano elevado do chão e colocar-se ao lado de um banco e de uma forca. A corda que o estrangularia estava a centímetros do seu pescoço esbelto e no qual ela tantas vezes beijara. A plateia que o observava contava com a presença dos nobres, Ricardo, Mafalda, a própria marquesa de Oviedo e todo o povo que conseguia caber naquela praça. Ele não contivera as lágrimas, a sua face brilhava com o sol a incidir-lhe de tão molhada que estava. Os seus olhos expressavam-se doentes e vermelhos e as suas bochechas ardentes cor de sangue.
O povo protestava. Todos reconheciam Artur naqueles trajes de plebeu e percebiam o rei que deviam ter tido. Em menos de nada, Oceana percebeu o que se estava realmente a passar e era tudo por culpa sua. Com a sua fuga foram perguntar a Artur pelo seu paradeiro e ele como nada sabia, nada pôde dizer. Aliás, se ela bem conhecia Artur nem fora isso que se havia passado. Artur recusara-se a dizer onde ela estava, nunca o diria.
Ele estava assim, a contradizer aquilo que lhe dissera antes. Foi naquele momento que ela percebeu que ele não escolhera o seu povo, ele escolhera-a a ela. Ele apenas não pôde ficar consigo por causa das ameaças de Ricardo, por não se achar bom o suficiente para o superar. Ele amava-a o suficiente para a deixar ir tal como amava o seu povo de tal maneira que abriria mão de uma luta pela sua própria felicidade apenas pelo bem-estar das suas gentes. Sendo assim, seria ele a pagar pelos pecados de Oceana, mas ela não podia deixar que isso acontecesse, não podia deixar que o Condado ficasse como um rei como Ricardo, não podia deixar que ele se ficasse a rir no meio de tudo aquilo.
Mas o que havia ela de fazer? Ela tinha de manter Artur vivo. Tinha de salvá-lo a todo o custo. Essa era uma certeza que ia tornar inalienável. Mas como? Oceana tinha trazido facas para uma batalha de armas de fogo.
Os guardas ajudaram-no a subir para o banco e sentiu finalmente a corda da força roçar-se no seu pescoço. Todos gritavam em protesto e os guardas faziam os possíveis para manter o povo longe dos nobres das frentes. Todas as damas do drama a rirem-se, todos os bobos vestidos como reis, desapareceram quando olhou para ele. Só ele importava.
-Parem tudo! - todos se calaram e olharam para o fundo da multidão onde Oceana estava. Ela furou a multidão que lhe restava para chegar ao palco e quando não a deixaram passar a jovem tirou finalmente o seu lenço. - Artur não vai morrer! Eu não vou deixar que tal barbaridade aconteça! Artur fez tão bem a estas gentes e é isso que lhe dás, Ricardo? És um monstro! Eu não pequei, muito menos o Artur. Tu sim, carregas todos os pecados que para sempre ultrapassarão os nossos. Eu troco de lugar com Artur. Era isso que queriam no final de contas.
Oceana subiu para o palco onde estava o amor da sua vida. Os guardas desvendaram Artur e trocaram-no de lugar rudemente consigo. Vendaram-na e sentiu a corda que antes estava no pescoço de Artur no seu. Ele ainda ripostava e gritava, mas ela nada queria ouvir. Os aplausos dos nobres enchiam a praça e os risos perante a sua figura tomavam lugar nos seus ouvidos. No entanto ela não se arrependia.
Ela sabia que cometia sempre os mesmos erros. Quebrava laços, mas ao menos sabia tomara uma decisão certa.
Em menos de nada ouviram-se mais aplausos quando lhe retiraram o banco por debaixo dos pés. Ela respirava, a sua aparência morta era apenas uma ilusão, porque o seu coração continuava a bater. Ela continuava a ouvir, a sentir, a viver.
Os guardas retiraram-se assim como toda a gente em gargalhadas audíveis no outro lado do mundo. Sentiu os passos de Artur apressados a correr para cima do palco. A sua força por estar consigo tinha lutado contra dois guardas que não o detiveram, ele nada podia fazer. Ou assim eles pensavam.
-Desculpa, Oceana. Peço tanta desculpa. - os seus braços abraçavam-na com força e o seu rosto tocava no dela molhando-o com as suas lágrimas.
-Não peças desculpa. - Artur não falou, ele estava perplexo como era óbvio. Para ele ela tinha voltado do mundo dos mortos. O que ele não sabia era que ela nunca tinha chegado a lá estar sequer. Mas Oceana olhou Artur e apenas disse aquilo porque não sabia o que mais responder. Ela não sabia o que se tinha passado. Ela não sabia quem tinha à frente. Mas o tom de voz dele de preocupação com ela mostrava-lhe o que ela tinha de dizer supostamente. - Eu estou bem, eu vou estar sempre bem. - A sua voz era fria e inexpressiva.
Oceana levantou-se, finalmente, não sabendo o que estava ali a fazer, tirou a venda da visão e sem olhar Artur uma vez nos olhos deixou-o no palco com a sua venda nas mãos. Oceana dirigiu-se até à praia e entrou nas águas que lhe deram vida. Ela tinha de voltar para Atlântida, para o seu povo. Oceana não sabia o que estava a fazer naquela aldeia, naquela praia, apenas que tinha de voltar depressa. Algo lhe dizia que se tinha passado bastante tempo, mas ela não sabia quanto nem o que tinha feito.
As metáforas revelam uma vida
Fatal foi o seu amor por ele
Rosas ditaram a sua história
Odiosas pela sua morte
Deixaram o sangue escorrer
Irradiando o sentido da sua vida
Torturando-a por não o poder ter
Esperando a eternidade para o poder beijar
***
Qual é o segredo da Marina? Só tu o podes descobrir...se ainda anão descobriste a verdade será revelada nos próximos capítulos. Não percas.
Se estás a gostar não te esqueças de deixar a tua estrelinha e de me seguir, de deixar o vosso cometário com a vossa teoria e de me continuar a acompanhar até ao final desta história que perdurará para a eternidade.
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